- Não lhe devo satisfações do que vou fazer depois que sair daqui. – Foram as palavras duras dele ao me encarar.
Alguns riram do comentário dele e outros me observaram, com um olhar de dó. Aquele garoto conseguia ser bem cruel quando queria.
Quando a aula acabou e todos se retiravam, chamei-o novamente:
- Guilherme, poderia vir até aqui, por favor?
Ele veio na minha direção, não demonstrando nada. Nossos olhos se encontraram e eu desviei, guardando meu material:
- Posso saber o que está acontecendo? Você está com algum problema? Posso ajudá-lo em algo?
- Não. Só estou fazendo o que você pediu: me mantendo afastado.
- Eu falei com relação a minha vida pessoal... Não de outra forma.
- Estou me mantendo longe, professora, exatamente como pediu. Caso mude de ideia com relação a isso,
- Está me convidando para sair, Sabrina?- Não... Estou convidando para tomar um sorvete comigo e minha filha, Guilherme.- Pode me chamar de Gui... Não estamos na escola.Melody chegou com a mochila nas costas. Eu abri os braços para ela vir no meu colo, no entanto ela foi para o colo do garoto, que disse:- Você é pesada, Medy. Não sei como sua mãe carrega você como se fosse uma pena.Ela gargalhou:- É que eu como muita pizza.- A parte boa é que perde calorias no futebol – ele acenou para a professora – Foi um privilégio acompanhá-la junto de sua turma, senhora Ducan.- O privilégio foi nosso, Gui. – Ela abriu um sorriso, completamente derretida pelo garoto.Ele fechou a porta e eu observei:- Preferia levar Medy do que o hamster. Este bicho parece um rato.- Mas não é. –
Fiquei ruborizada imediatamente.- Posso ensinar você se quiser, Medy. – Ele ofereceu para a minha menina, enquanto eu tentava me recuperar da frase de duplo sentido.- Posso, mamãe?- Você pode ser o que quiser, Medy.Ela derrubou sorvete na roupa e ele limpou rapidamente. Ok, habilidade com crianças ele tinha.- Tem irmãos? – Perguntei.Ele riu:- Mal tenho pais... Que dirá irmãos.- Tem jeito com crianças.- Gosto de crianças, mas confesso que Medy chamou minha atenção de imediato: falante, curiosa, inteligente...- Devem ser os olhos verdes dela. – Brinquei.- Igual os do meu pai. – Ela se exibiu.Ele ficou tenso e eu lembrei de Charles, o que sempre me fazia ficar estagnada e temerosa. Era como se ouvir o nome dele me fizesse ir devagar, esperançosa de que ele pudesse aparecer do nada.<
Eu poderia me entregar àquele beijo, mesmo sabendo o quanto era arriscado. Mas não consegui. Porque eu não sentia Guilherme e sim Charles naquele momento. Minha mente enganava-me tanto que até o perfume barato de “el cantante” tomou conta do lugar.Empurrei-o com certa dificuldade, os lábios dele me deixando vagarosamente, a sensação de querer seguir, mas o medo de as lembranças me deixarem ainda mais vulnerável.- Não podemos, Gui... Não!- Não me deixe assim... Eu estou completamente louco por você. – Os olhos dele brilhavam e meu coração parecia que sairia de dentro do corpo.Desvencilhei-me dele e peguei minha bolsa, indo até a porta e abrindo-a, enquanto saía pelo corredor. Não havia nenhum estudante naquele andar. Desci as escadas sentindo o suor escorrendo pelas minhas costas enquanto ouvia os passos dele atrás de mim.Assim que cheguei ao último degrau, ele pegou-me pelo braço:- Você não pode negar que também me quer, Sabrina.- Fale baixo, porra! – Olhei para os lados, temen
- Bom dia, Sabrina. Será que poderia descer logo depois que encaminhar uma atividade para sua turma? Eu preciso conversar com você e não dá para esperar.Senti um frio na barriga. Eu estava fodida! Sabia que aquilo ia acontecer mais cedo ou mais tarde. E eu era culpada. Nem adiantava pôr a culpa no garoto. Deixei acontecer.- Eu... Farei isso, sim. – Falei, subindo imediatamente.Naquele dia eu não tinha aulas no terceiro ano, felizmente. E o fato de eu ser demitida não me faria envolver-me com Guilherme por não ser mais a professora dele. Nós dois... Simplesmente não podia acontecer. Porque Guilherme era um garoto.Estava entrando na sala do primeiro ano quando o vi escorado na porta da sala do terceiro, mexendo no celular, com os pés cruzados, os tênis de marca estilizados.O observei enquanto ele tirou os olhos do celular, me encarando. Eu deveria entrar na sala, mas fiquei um tempo ali, observando o garoto que me era proibido, mas ao mesmo tempo tirava meu sono e fez sentir-me viv
Freei o carro bruscamente, meu corpo arremessado para frente com o impacto. Olhei na direção de Melody, que riu:- Faz de novo?- Medy, isso não foi uma brincadeira. Mamãe se machucou. – Toquei meu peito, que doeu com a força do impacto que o cinto fez contra ele.- Desculpe.- Medy está falando coisas estranhas. E mamãe pode ficar triste com isso... Principalmente se for mentiras.- Eu vi a foto dele... É igual a do meu pai... Eu juro. Meu pai canta a música da Garota Riquinha e eu quero ir até lá convidar ele para jantar.Peguei imediatamente meu celular e digitei no Google: Charles. Eu sequer sabia o sobrenome dele.Haviam mil Charles... Mas nenhum era o meu. Tentei “el cantante”. Apareceram inúmeros artistas latinos, menos o meu.- Qual é o nome da música, mesmo? – Olhei para Melody.- A música da Garota Riquinha.Digitei somente “Garota”. E lá estava ele... Charlie B. : novo nome, embora quase o verdadeiro. Ou seria Charlie o nome verdadeiro e Charles o que ele usava antes da fam
Inicialmente meu peito se encheu de alegria... Ou não, porque não entendi, exceto o fato de dizer que estava apaixonado por uma garota riquinha, o que ele tentava expressar com o restante da letra.A música entrava pelos meus ouvidos, passava pelo meu pescoço, ardendo a garganta, descendo pelo estômago, que se retraía, dando um enorme frio na barria e molhava minha calcinha. A voz dele era doce e envolvente. Eu sempre soube que ele estouraria um dia e seria um sucesso. Porque ele era perfeito... E a música... Diferente, carregada de emoção.E talvez não fosse para mim. Tantos anos haviam passado. E se Charles não lembrasse de mim? Deus, isso seria horrível. Se eu chegasse até ele e mostrasse que tínhamos uma filha e Charles já tivesse uma esposa?Melody estava tão cheia de expectativas. E por um momento me culpei por ter sempre lhe dito que Charles esperava por nós, em algum lugar e que nos encontraríamos um dia e seríamos uma família feliz. Entenderia ela se não acontecesse como semp
Faltava quinze minutos para às 22 horas quando eu e Melody chegamos à porta de entrada no Ginásio de Esportes.Entreguei os ingressos à pessoa responsável, que disse:- Sinto muito, senhora. A menina não pode entrar.Fiquei olhando para a mulher, confusa. Como assim ela não podia entrar? Melody era filha de Charles.- Ela... É minha filha. – Comecei a retirar nossos documentos da bolsa e tentei lhe entregar.Ela se recusou a pegar:- Não. A menina não entra.- Sou a responsável por ela. Como lhe disse, é minha filha e autorizo a entrada dela.- Só pode entrar a partir de dezoito anos.- Mas ele canta a porra de uma música sobre a Garota Riquinha que a minha filha escuta o tempo todo.- Mamãe, você falou palavrão. – Melody puxou minha mão, lembrando-me do “porra”.
Olhei no relógio. Pensei em ligar para Yuna ou Do-Yoon, mas era muito tarde. Eles dormiam cedo. Como eu gostaria de compartilhar com eles o que tinha acontecido naquela noite.Peguei meu notebook e digitei o nome dele. Num caderno comecei a anotar tudo que era importante. Ao final, ficou claro que ele havia começado há menos de seis meses sua carreira oficialmente. Antes deste período, ele era só um borrão na minha lembrança, como se nunca tivesse existido. Charlie B. parecia não ter nenhuma ligação com Charles. Aliás, Charles era um fantasma nas redes, tendo tudo que um dia existiu sobre ele simplesmente apagado.Era agenciado pela J.R Recording, mas todos os dados do contrato eram sigilosos. Ele não tinha rede social própria e dava para ver que tudo que era postado sobre ele era feito por uma assessoria. Estritamente profissional.Muitas fotos de fãs que o marcava