Uma semana depoisMeu pai estava diante de mim, e ele mal conseguia meencarar. Kenneth, é claro, estava do lado dele, como uma sombra, eeu sabia que passaria a ser assim a partir daquele momento, eprovavelmente pioraria depois que eu me tornasse esposa deRichard, já que ele tinha planos... Já que me queria ao lado dosenador por motivos obscuros.— Pronta, querida? — Kenneth perguntou, me olhando decima a baixo.O vestido que conseguimos com o pouco tempo que nosrestou foi algo simples, uma peça de seda, off-white, emprestado daminha madrasta e customizado por uma costureira de confiançadela. Algumas rendas foram colocadas, além de pequenas pérolas.Uma faixa do mesmo tom para alinhar em minha cintura, porque euera um pouco mais magra; uma mudança nas alças para ficaremmais elegantes.Ele era longo, mais bonito do que qualquer coisa que já useidesde que minha mãe morrera, mas ainda não era um vestido denoiva dos sonhos.No entanto, também não era o meu casamento dos sonhos
Eu tinha me tornado uma esposa.Não apenas isso, mas a esposa de um senador. Era ummundo do qual eu não sabia quase nada, e eu me sentia entrandoàs cegas em uma casa cujas luzes estavam todas apagadas.Precisaria de ajuda para tatear as paredes e tentar me encontrar.Eu tinha sido acompanhada novamente até o meu quarto,pela governanta, que foi bem solícita, e sem demora tirei o vestido,guardando-o pendurado em um cabide, com cuidado. Não sabia seVirginia iria pedi-lo de volta em algum momento, por isso o guardariacom zelo. Não havia nenhum apego emocional entre mim e a peça,por isso eu não teria problema nenhum em devolvê-la.Ouvi uma batida na porta, enquanto a ajeitava dentro doimenso closet que me foi designado, e ao erguer os olhos,enxerguei a figura alta e imponente de Richard bem ali, inclinado,pedindo passagem.A porta do quarto tinha sido deixada aberta, caminho livre,mas ele ainda teve o cuidado de não invadir minha privacidade detodo. A frase que Owen me dissera,
— Anna, cancele a minha reunião das dezessete horas, ok?— falei com a minha secretária, passando por sua mesa, já acaminho do elevador.— Mas o Sr. Volt já está a caminho — ela pareceu sesurpreender, porque eu não tinha avisado nada com antecedência.Volt era um especialista em marketing pessoal, que Kennethtinha insistido que era quem deveria trabalhar comigo naquelacampanha à presidência. Nós iríamos discutir alguns pormenores, eíamos adiantar para ele o assunto sobre Isabelle em minha vida.Poderia ficar para outro dia.— Ele vai entender. Peça que cobre a hora nos honorários domês. Será recompensado.Eu sabia que não se podia comprar as pessoas daquele jeito,e nem era a minha intenção, mas estava puto o suficiente para ligaro foda-se e não me importar.Saí do meu gabinete marchando, mal ouvindo as pessoasque me cumprimentavam, partindo para o carro, onde meusegurança me aguardava. Normalmente eu andava com mais deum, mas o outro fora designado para Isabelle naquela tar
Eram tantas sacolas de roupas que a governanta de Richard– a Sra. Mildred Finch – chegou a rir ao me ver olhando para elas,depois de ter direcionado os homens que as levaram lá para cima.— Eu nunca tive tanta coisa assim — comentei meio perdida.— Provavelmente será só o começo. O Sr. Walker é bemgeneroso com os funcionários, imagina com sua esposa.A Sra. Finch era uma das pessoas que não sabiam quenosso arranjo era puramente comercial. Provavelmente estranhouque as coisas tivessem acontecido tão rápido, mas era discreta osuficiente para não perguntar. A explicação dada foi que eu eRichard já nos conhecíamos há mais de um ano, nos apaixonamos,mas mantivemos o relacionamento escondido de todo mundo.Se as pessoas iriam acreditar? Aí já não era mais da minhaconta.— Mas seja como for, você não precisa arrumar isso tudo.Posso fazê-lo por você — a Sra. Finch afirmou, com seu jeitinhoeducado.— É muita coisa. Não quero te dar trabalho.A mulher riu.— É minha função, senhora.
Meus dedos estavam entrelaçados firmemente aos deIsabelle, enquanto caminhávamos. Tínhamos acabado de saltar docarro, passando pelos jornalistas ávidos, que gritavam meu nomecomo se eu fosse um rock star.Apesar dos seguranças que nos cercavam, eu ainda mesentia protetor em relação a Isabelle. Ela era nova naquele mundocaótico, e a última coisa que eu queria era assustá-la. Para osabutres que nos perseguiam, era um prato cheio, porque, porinexperiência, poderia dizer alguma coisa comprometedora, semque tivesse a intenção disso.Coloquei a mão em suas costas, sentindo-a completamenterígida por sob o vestido bonito que compramos no dia anterior. Elamesma arrumara seu cabelo, fazendo alguns cachos nas pontas, semaquiara de forma bem discreta, e eu a considerava perfeita para opapel. A aparência de uma deusa elegante, os olhos doces, acorreta dose de timidez.Não demos nenhuma declaração e Ken foi o responsável poracalmar os jornalistas, enquanto nós entrávamos. Ele era mais
A repercussão da nossa coletiva foi muito mais positiva doque imaginávamos a princípio. Claro que alguns veículos maissensacionalistas tentaram distorcer a história das piores formas –insinuando até mesmo um casamento midiático, que era a verdadesecreta –, mas a equipe de Richard me explicou que era assimmesmo. Que não importava o que fizéssemos, sempre haveriapessoas para criticar.Tentei relaxar e me atentar não só aos elogios que recebi detodos, mas também à nova vida que começaria a partir dali.Amy aceitara na mesma hora a proposta de trabalhar comigo,e era muito bom ter uma pessoa de confiança do meu lado. Elalevava o neném para a minha casa, e de lá nós traçávamos asestratégias que permeariam toda a minha comunicação – tanto coma equipe quanto sozinhas.Passamos a estudar perfis de influenciadoras, de ativistas eaté mesmo de outras esposas de políticos. Até da princesa KateMiddletown. Também fizemos alguns cursos juntas, online, de umjeito bem intensivo, e no fim
Com os cabelos ainda úmidos, me sentei à mesa de jantar,relaxado. O dia tinha sido tenso, com intermináveis reuniões com opessoal do partido, analisando budget e estratégias para acampanha, e eu me via cada dia mais ansioso pelos momentos emque chegava em casa.Tentava me convencer de que era porque os expedientesvinham sendo muito cansativos, que não tinha nada a ver comIsabelle, mas era só um jeito de me enganar.Eu gostava da companhia dela.Adorava a forma como a coisa mais simples poderia deixá-laempolgada e a maneira como cada assunto conseguia se tornarmais divertido com seus relatos cheios de expressões e ênfases.Ela era um ponto de inocência e delicadeza em meio à minharotina estressante e séria.A gente tinha estabelecido uma rotina confortável ondejantávamos juntos todos os dias. Naquela noite não seria diferente.Gostava, também, de como parecia um pouco mais àvontade comigo a cada dia, até mesmo para, como daquela vez,aparecer de pijama, com os cabelos presos
Comparecer a eventos começou a se tornar algo maiscotidiano para mim. Tanto sozinha quanto com Richard. Nossaagenda era um caos, quase nunca conseguíamos ficar em casa ànoite, e para ser sincera, menos ainda ficávamos sozinhos.O beijo que compartilhamos durante aquele jantar nuncamais foi comentado, e eu sentia como se aquela fosse uma enormelacuna entre nós. Não fora um gesto apaixonado, mas mexeucomigo, pelo que poderia ter sido.Pelo que poderia significar.Porque poderia ser um prelúdio de algo mais, ou deabsolutamente nada; uma esperança vã.Talvez fosse melhor não remexer naquele vespeiro, nãomexer nos sentimentos que nos cercavam enquanto nãoentendêssemos direito o que estava acontecendo conosco.De resto, as coisas estavam iguais. Nós acordávamos,tomávamos café da manhã e cada um seguia com seu dia. Ele iapara o gabinete, Amy chegava e o trabalho tinha início. Eu tinhaficado responsável pelo Recanto, não só pelo projeto de parceriacom alguma faculdade, mas por ou