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V - Cada Vez Mais Curiosa...

Nós te deixaremos fugir por hora, ratinha...

                           ~ ♣ ~

– Aaron... – Violet pronunciou lentamente como se não tivesse entendido e desviou o olhar para o chão rapidamente ao perceber que o garoto ainda a encarava de uma forma quase que intensa demais em sua opinião. – Por que está aqui? Por que não está junto dos outros?

– Porque eu era um Perfeito, mas agora sou um Quebrado e Quebrados não servem para ela, até que tenho sorte por ainda estar vivo, os outros foram todos... – ele parou ao ver os olhos arregalados de Violet e riu.

– Ela quem? Dollie? – A menina perguntou franzindo as sobrancelhas e Aaron assentiu.

– Ela aceita os Defeituosos mas nunca um Perfeito que se quebra, não pode aceitar que um de seus falsos sonhos de perfeição se corrompeu.

– O que é um Perfeito? E um Quebrado? Desculpe, não compreendo – Violet admitiu baixinho e ajoelhou-se no chão frio de frente para Aaron, cada vez mais interessada no que aquele estranho tinha pra lhe dizer.

O garoto se aproximou e Violet abaixou a cabeça, desconfortável ao ouvir o som das correntes que prendiam o tornozelo de Aaron se arrastando no chão.

– Eu estou quebrado, literalmente – explicou bateu o dedo indicador na rachadura em seu rosto, sua pele de porcelana tintilando com o toque. – Roxy me quebrou, ela tinha ciúmes, somente ela poderia ser uma perfeita, o que é um tanto injusto já que cheguei primeiro.

– Roxy? Entendo, ela é a única também feita de porcelana como você e Dollie – Violet respondeu, lembrando-se da garota-boneca de cabelos roxos que parecia ser a única no meio dos "filhos" de Dollie a não ter nenhuma anomalia ou deficiência. – Defeituosos são como Allen, Rosalia e Anne e Anna?

– Sim, são aqueles que abusaram de seus sentidos, o que irritou Dollie um pouco mas, estranhamente, também a fez gostar mais de todos eles.

– Abusaram de seus sentidos? Tento entender mas tudo parece só ficar mais confuso.

– Puppet viu o que não deveria, Anne e Anna estavam sempre brigando uma com a outra, Allen escutava demais o que não lhe dizia respeito e Rosalia estava sempre tocando no que não era seu.

Violet tampou a boca em espanto, lembrando-se dos “defeitos” de cada um deles.

Aquela sala pela qual havia passado logo antes de chegar em Aaron, com todas aquelas coisas de costura e tudo o mais... Era Dollie quem causava aquilo tudo a eles?

– Então é Dollie quem...

Aaron riu e Violet se encolheu, por um breve momento sentindo medo do olhar que o garoto lhe lançava.

– Não se deixe enganar pelas coisas bonitas menina, por dentro todos temos sombras, todos abrigamos nossos demônios mesmo sem ter conhecimento na maioria das vezes.

Ela estava prestes a se levantar para ir embora depois daquilo, era informação demais para uma noite só, mas o som de uma porta se abrindo a fez travar em seu lugar.

– Então é esse meu novo garotinho? Como se chama? – Dollie perguntou animada no cômodo ao lado, suas mãos de porcelana fazendo um leve tintilar enquanto ela batia palminhas alegres.

– Jack Mitchell – Violet ouviu Puppet responder e imediatamente levou as mãos à boca para reprimir um gritinho.

– Jack... – ela murmurou assustada e um olhar curioso vindo de Aaron se focou na menina.

– É amigo da princesa! – Ery disse baixinho com certa animação, como se aquele fosse um segredo supervalioso que deveria ser guardado e apreciado com o maior cuidado do mundo.

– Violet? Hum, pelo menos terá um rosto conhecido quando acordar, agora ao trabalho meus queridos, não gosto da língua afiada que dizem ter – Dollie disse com certa autoridade e algo pesado foi jogado em cima de alguma mesa de madeira rangente, provavelmente o corpo desacordado do garoto.

– Não! – Violet deixou escapar mas logo voltou a tampar a boca com rapidez.

Burra, burra, burra! Sua lista de idiotices só aumenta!

Ela cerrou os olhos, tensa e nervosa, suas mãos suavam e seu corpo inteiro tremia uma vez que, qualquer barulho que antes havia na sala ao lado, agora havia cessado. Suspeito, muito suspeito e um tanto amedrontador.

– Aaron? – Dollie chamou desconfiada e, implorando silenciosamente por ajuda com os olhos violeta arregalados, Violet se voltou para o garoto de cabelos coloridos como se naquele momento sua vida dependesse dele e, muito provavelmente, dependia mesmo.

Aaron apontou para um monte de madeiras e tecidos inclinados sobre uma parede e, tentando ser o mais silenciosa e sorrateira possível, a princesa se arrastou até um pequeno vão que havia entre uma das enormes placas de madeira e a parede fria que pareceu lixar a pele de seu ombro esquerdo e de seu joelho já dolorido.

O espaço era tão pequeno que a respiração acelerada de Violet batia contra a madeira à sua frente e voltava de encontro a seu rosto, quase sufocando-a com o ar quente que saía de seu nariz junto do cheiro de mofo, umidade e coisas velhas, queria tossir mas segurou até o último momento, sentindo sua garganta coçar enquanto ainda se ajeitava no espacinho minúsculo que, com sorte, a esconderia de Dollie e sua trupe.

A menina se encolheu ali, abraçando as pernas dobradas contra o peito e aguçando o máximo possível sua audição para saber o que se passava do lado de fora de seu mais novo esconderijo.

– Aaron querido, está acordado? – Dollie perguntou e o som de seus saltos batendo no chão se arrastaram por alguns poucos segundos até que chegassem no cômodo onde agora Violet prendia a própria respiração, talvez pela tensão no ar, talvez pelo medo de ser ouvida ou até para não inspirar aquele ar quente horrível novamente, nem ela sabia ao certo.

– Sim minha rainha, peço perdão pelo incômodo – Aaron disse com um falso respeito que até mesmo Violet notou, parecia até que estava sendo irônico.

– Humpf, tudo bem, não poderia esperar menos de alguém como você – a mulher disse de maneira amarga e uma raiva ferveu dentro de Violet. – Apenas espero que não ocorra novamente, você é belo demais para ser desperdiçado assim.

– Não irá, boa noite majestade.

A porta se fechou e um desespero tomou conta de Violet quando o som metálico de uma chave sendo colocada na fechadura e trancando a porta em seguida ecoou pelo quartinho fechado.

Ela esperou mais um pouco, inquieta e com uma ansiedade extremamente ruim percorrendo seu corpo inteiramente arrepiado, até que Aaron finalmente soltou um longo suspiro cansado e a chamou.

Violet saiu de trás das placas de madeira até mais rápido do que deveria, grunhindo ao sentir novamente a pele de seu ombro ser esfolada, desta vez a do direito. Se pôs de pé hiperventilando e, em um gesto desesperado, empurrou a superfície fria e metálica da porta que ao menos se moveu. Não, aquilo não podia estar acontecendo.

Ela se sentia tão idiota, tão imbecil. Deveria ter escutado seus pais, com certeza. Se o tivesse feito agora não estaria presa numa sala estranha com um garoto-boneco estranho que era só mais um e, provavelmente, o menos esquisito no meio de todos os outros.

E agora havia uma boneca-mulher louca que queria transformar Jack Mitchell em um de seus "filhos" e que depois – Violet tinha a absoluta certeza – tentaria o mesmo com ela.

A menina enlaçou os dedos nos cabelos e respirou fundo, andando de um lado para o outro de forma quase frenética antes de parar e encarar Aaron com um olhar louco e desesperado.

– Pelo amor de Deus se é que existe algum, me diz que você pode me tirar daqui – ela disse tropeçando-se nas palavras, já estava perdendo o controle.

– Eu não – Aaron riu, divertindo-se com a situação e o estado da menina que antes parecera tão segura de si e convencida de seu poder. – Mas sei de algo que pode.

– O quê? – Violet perguntou se aproximando e agarrando com força as barras de ferro que prendiam Aaron naquele lugar.

– Está vendo aquele armário? – Ele apontou para um pequeno guarda-roupas de madeira de apenas duas portas encostado no canto esquerdo inferior do quarto, na parede oposta à qual estavam as madeiras e tecidos sob os quais Violet havia se escondido. – Existe uma porta lá dentro que levará a um túnel que segue até o hall de entrada.

– Mas... E se alguém me ver? – Violet indagou já assustada somente por pensar na possibilidade.

– Ninguém usa esses caminhos desde que me jogaram aqui.

– E Jack? Não posso deixá-lo aqui! Sim, ele é insuportável e desrespeita demais a mim e à mamãe, mas Sr. Mitchell está desesperado, não posso simplesmente abandonar essa coisa! Eu estaria sendo uma princesa irresponsável, não estaria? – Se questionou de forma acelerada e quase que desordenada, conversando mais consigo mesma do que com Aaron, que sorriu e cruzou os braços.

– Hã? Uma princesa, é? Sendo assim a senhorita deveria saber que sua própria vida vale mais do que a de qualquer outro, pense bem em suas atitudes.

Violet sentiu sua garganta se fechar e seus olhos se encherem de lágrimas, ela não podia ser tão egoísta quanto parecia, podia?

Uma pontinha de esperança se acendeu na menina quando se lembrou que naquele momento seus pais já deveriam ter mandado os guardas atrás dela, ela só precisava encontrar pelo menos um e levá-lo até Jack.

– Eu vou trazer ajuda, vou tirar Jack daqui e você também, não posso ser tão incompetente quanto dizem por aí, afinal, serei rainha um dia – ela disse apoiando as mãos nos quadris e fitando o teto com olhar sonhador e determinado, de repente voltando a parecer a velha e confiante Violet de sempre.

Aaron soltou uma curta gargalhada que aliviou um pouco a preocupação de Violet e a fez abrir um sorriso fraco.

– Obrigada Aaron, bonequinho arco-íris – ela agradeceu encaminhando-se para o guarda-roupas e rindo suavemente quando o rosto do garoto ruborizou e ele fechou a cara, irritado.

Vamos lá Violet, você é corajosa, você consegue.

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