Cristal olhou-o profundamente, como se tentasse compreender por que razão ele a interrompia justo quando estava prestes a falar. Porém, a menção de Jarret fez com que um arrepio percorresse o seu corpo ao lembrar-se do que tinha deixado para trás. E se o seu passado agora os alcançasse? E se toda aquela calma aparente fosse apenas o prelúdio de uma tempestade muito maior?
—Estás sempre a interromper-me quando quero falar disso, e é realmente decisivo para nós. Quero que saibas que entre ti e eu... —começou Cristal, tentando arrancar aquilo que tanto a atormentava da garganta. —Querida, falaremos disso depois, quando chegarmos à cabana. Perdoa-me por interromper-te, não foi intencional. Mas agora, primeiro conta-me mais sobre o teu ex —insistiu Gerónimo, sem lhe dar muito espaço para evitar o assunto—. Preciso de saber tudo parNão podia acreditar. Sua Cielo, filha do Don da Cosa Nostra... Não, devia haver algum mal-entendido. Se isso fosse verdade, o que o esperava não era simples. Como iria convencê-los de que o aceitassem como genro? E nem falar do que isso implicaria para ele entrar no mundo dela; talvez tivesse que se tornar o mafioso mais poderoso e temível da história. Mas, se fosse pela sua mulher, por ela, faria tudo, qualquer coisa. Só uma pergunta o atormentava: por que a teriam mandado sozinha para América? —Pertences mesmo à Cosa Nostra, minha Cielo? És filha do Don? —perguntou, quase sem conseguir controlar o nervosismo na voz. —Amor, não me interrompas! —cortou-o firme, com aquela doçura autoritária que sempre encontrava forma de o fazer calar—. Depois conto-te. Não me deixaste dizer-te antes, por isso agora esperas! Não tev
Em Nova York, no caos do dia que deveria ter sido o mais feliz para Cristal, Jarret voltou ao hotel frustrado e exausto. Ele havia passado horas procurando sua noiva, percorrendo ruas e interrogando quem conseguia encontrar, mas Cristal parecia ter desaparecido sem deixar rastro. Sua raiva e desespero tomaram conta dele, explodindo em uma tempestade de palavrões e golpes impacientes contra qualquer objeto ao seu alcance.Como pôde permitir que chegasse a esse ponto? Como pôde ser tão estúpido justo no dia do seu casamento? Cinco anos dedicados, investidos em um sonho que agora parecia desmoronar-se diante de um precipício. A imagem do homem que havia levado Cristal rondava como um espectro em sua mente. Um rosto desconhecido, enigmático. Quem era ele? Como era possível que ninguém tivesse respostas?Algumas batidas suaves na porta interromperam sua tormenta interna. Brevemente, Jarret tentou recuperar a compostur
Gerônimo, intrigado com a confissão, sentiu uma curiosidade genuína que iluminou seu rosto ao saber um pouco mais sobre sua ingênua, inocente e bela esposa. Desejava que cada coisa que ela lhe contasse o ajudasse a conquistá-la e a fazê-la desistir de querer romper a relação com ele. Porque, embora ela tivesse aceitado acompanhá-lo até a cabana, seu instinto lhe advertia que ela tinha feito isso por medo de Jarret e que, na verdade, ela tinha algo muito sério para discutir com ele, como, por exemplo, o divórcio. —A que você se refere com isso que sempre sonhou? —disse ele, sem esconder seu interesse, com a intenção de conhecer essa parte da experiência de Cristal que ainda lhe era desconhecida. —Qual é o seu sonho, meu céu? Cristal hesitou um instante. Ela não queria que suas palavras parecessem ridículas, es
A tia de Cristal arqueou uma sobrancelha; os seus lábios curvaram-se numa expressão de desprezo evidente. Sabia mais do que Jarret imaginava. Antes de o enfrentar, tinha investigado todos os detalhes do incidente, revendo junto com o seu marido as gravações das câmaras de segurança do hotel. Nas imagens, o jovem que tinha ajudado Cristal a escapar era um completo desconhecido, um homem atraente e confiante. Mas, ao procurar os nomes que eles tinham registado, descobriram que eram falsos. Um dado que apenas aumentava a incerteza e agravava o peso sobre os ombros de Jarret. —Mas dizem que ela gritava que o amava —disse ela com uma falsa ingenuidade, deixando cair a frase como um golpe certeiro, enquanto observava com prazer como Jarret cerrava os dentes, amaldiçoando em silêncio. A tia deu mais um passo em frente, deixando evidente a sua intenção de o levar ao limite. &m
Cristal observa Gerónimo, ainda atónita com a forma como ele descreve o efeito que aquele primeiro beijo entre eles lhe provocou. Tem um turbilhão de emoções que não consegue ordenar completamente na sua mente. Ele, que acabava de lhe confessar que tinha estado com quase todas as mulheres de Roma… ou talvez de Itália. Está a dizer-lhe que aquele foi especial. Quer acreditar nele com todas as suas forças, mas uma sombra de dúvida surge: dizia-o com sinceridade ou apenas tentava conquistá-la mais uma vez com as suas palavras hábeis e bem calculadas, típicas de um Casanova experiente? No entanto, uma faísca de alegria floresce dentro dela, que sussurra que poderia ser verdade, que ela poderia ser aquela mulher singular na vida de Gerónimo. A única. Aquela que ele descrevia com fervor, a escolhida que, segundo dizem, os Garibaldi encontravam ao conhece
Cristal não respondeu, tudo tinha sido de facto uma coincidência. Sorriu, percebendo uma verdade que estava bem diante de si, quase um milagre. Jerónimo, sem esperar mais, decidiu avançar. —Nunca tiveste curiosidade em saber quem eu era? —Talvez tivesse sido fácil fazê-lo através de Oliver. Porque não o fizeste se sentias isso? —Sim, mas vi-te apenas por um momento. A luz não era boa para te ver, e depois fugi a correr —confessou Cristal, tentando manter-se firme enquanto o olhava nos olhos—. Uma vez tentei procurar-te entre as modelos, mas ninguém soube dizer-me quem eras nem onde te encontrar. Desisti porque tinha medo que Jarret soubesse. Ele era tão controlador que nem sequer me deixava ter amizade com outros rapazes. Miserável! Era apenas um impostor… Imaginem aproximar-se de mim apenas para matar a minha família! As p
A raiva voltou a misturar-se com a dor. Cristal apertou os lábios, contendo-se. Deixava à mostra uma culpa que a perseguira até aquele instante. Jerónimo mantinha-se em silêncio, medindo cada uma das palavras que estava prestes a dizer. Não podia permitir-se precipitar-se. O seu olhar estava fixo nela, absorvendo não apenas o que dizia, mas também o que calava. Sabia que o momento de se pronunciar chegaria em breve. —Não, meu Céu, não digas isso —disse finalmente, com uma firmeza que não deixava margem para dúvidas—. Tu não tens culpa de nada. Verdadeiramente acreditaste que eles eram teus amigos, que podias confiar neles. Não é tua culpa que fossem uns traidores. Ouvistes mais alguma coisa? Enquanto observava o olhar perturbado de Cristal, que parecia mergulhar nos seus recordos, a mente de Jerónimo já alinhavava as i
Helen não respondeu. Havia algo no seu olhar que sugeria cansaço, mas também prudência; sabia que, naquele estado, qualquer palavra podia desencadear reações ainda mais intensas em Jarret. Ele, por sua vez, respirava ofegante, numa tentativa inútil de recuperar, pelo menos, uma parte da sua compostura. Dentro de si, uma tempestade sibilava: o seu ego ferido, o seu ódio à incerteza, a humilhação que ainda sentia cravada como um espinho doloroso. Cristal podia estar longe porque assim o tinha decidido, e isso, mais do que qualquer outra coisa, era o que tornava a sua raiva incontrolável. Estiveram à espera dos italianos, mas chegaram completamente bêbados, sem sinal de Cristal, e para quando os vigias se aperceberam, já tinham fugido. Apenas conseguiram encontrar uma pista: o carro em que tinham chegado e depois partido pertencia a um médico famoso que não v