Esse comentário feriu mais do que Jarret estava disposto a admitir. Os dentes rangeram ao apertar a mandíbula, mas obrigou-se a manter-se firme. —Não fazes ideia do que estás a falar —replicou—. Cristal e eu estamos destinados a casar. Há coisas que tu não entendes… coisas que nada têm a ver contigo. Por isso, se sabes alguma coisa útil, diz de uma vez. Muito bem, compro este carro se me disseres onde a deixaram. Guido ergueu as sobrancelhas, fingindo surpresa, embora os seus gestos não parecessem levar Jarret a sério. —Tens a certeza? Esse carro vale muito dinheiro —avisou, mas sem grande insistência. —Posso dar-me a esse luxo —contestou Jarret com arrogância. Jarret odiava ser tratado como um pedinte incapaz de pagar um carro. O pai tinha muito dinheiro, por isso isto não seria um grande gasto, pensou. Seria o seu presente de formatura e de casamento quando lhe dissessem alguma coisa. Comportara-se bem, portanto merecia-o. —Muito bem, vou dizer-te —aceitou Guido, retoman
Enquanto estava no escritório, Filipo analisava meticulosamente os documentos do carro que Jarret supostamente estava disposto a comprar. Fazia-o com uma precisão quase irritante, deixando que o silêncio se estendesse entre ambos, salvo pelo leve som do deslizar da caneta sobre o papel. Jarret, desconfortável com aquela atmosfera tensa, passeava o olhar pelas fotografias que decoravam as paredes. Eram imagens cheias de movimento e adrenalina, momentos capturados na plena glória das corridas de alta velocidade organizadas pela família Garibaldi. Era inevitável que a curiosidade tomasse conta dele.—Organizam corridas de carros? —soltou ao acaso, tentando quebrar o gelo, mas sobretudo procurando dar mais fluidez à conversa para recolher peças soltas de informação.—Sim, organizamos corridas profissionais e também por entretenimento —respondeu Filipo com uma voz impass&i
Filipo vê-o afastar-se e não gosta nada disso. Sempre teve um bom olho para ler as pessoas, e este Jarret não lhe parece uma boa pessoa; mandará vigiá-lo. Tem de avisar Gerónimo, pensa enquanto pega no telemóvel. —Onde estás, primo? —pergunta num sussurro. —A chegar à cabana —responde Gerónimo. —Então fica lá um tempo —ordena-lhe com firmeza—. O ex-noivo anda à procura da tua mulher e não acredito que seja com boas intenções. Como estão as coisas com ela? —Depois de ela ter descoberto quem sou, não muito bem —confessa Gerónimo; entre eles não há segredos. —Isso é lógico —faz uma pausa antes de dizer—. Bom, estás de férias. Se precisar de ti, eu ligo-te. Aproveita, irmão
Cristal então abre os olhos devagar, incorporando-se para olhá-lo diretamente. No seu olhar há algo diferente, uma urgência que atravessa qualquer tentativa de consolo. —Não, Gerónimo, não passou —afirma, cheia de determinação—. Ainda há coisas que precisamos resolver com urgência, e vais ter de me ajudar. Ou não sei se o terão de fazer os meus pais… Gerónimo sente um arrepio percorrer-lhe a espinha, mas em vez de responder, limita-se a observá-la por mais um instante, tentando decifrar a magnitude do que ela está a pedir. Sabia que isto não tinha terminado. A sombra do passado… esse passado, continuava a persegui-la com ferocidade. —A que te referes? O que é que os teus pais têm de fazer? —pergunta Gerónimo, cravando o olhar na sua esposa, tentando descobrir o qu
Cristal fica em silêncio por um momento, como se reunir as palavras dentro de si fosse mais difícil do que tinha imaginado. Finalmente, tomando forças da mão que a sustenta, responde num fio de voz: —Agapy Papadopulos. Ao ouvir a revelação, Gerónimo acena levemente, como que saboreando o nome pela primeira vez. Mas Cristal, olhando-o com atenção, sente como a tensão se apodera dela. A sua respiração torna-se pesada, o peito preso numa rede invisível de dúvidas. Queria que ele soubesse, sim, mas agora que disse, teme a cada segundo que passa sem que ele reaja. Por que não diz nada? Como pode manter-se tão sereno? A sua mente enche-se de suposições. Estava convencida de que esse apelido seria suficiente para despertar nele algum tipo de reconhecimento, ainda mais tratando-se do terreno em que ambos se movem. Toda R
Cristal encolhe-se ligeiramente, como se quisesse tornar-se mais pequena no seu assento. Esforça-se para responder, mas a incerteza invade-a. —Não sei se é o mesmo, não sei o apelido dele... —balbucia finalmente, mordendo o lábio inferior enquanto desvia o olhar para algum ponto indefinido no chão. E depois, permanece em silêncio. Gerónimo, que por segundos fica imóvel, parece debater-se internamente sobre o que fazer com essa informação. Finalmente, a sua própria determinação prevalece. Segura-lhe a mão outra vez com mais força, embora no toque ainda haja uma carícia reconfortante. O polegar desenha círculos na pele de Cristal. Ele não a olha enquanto o faz, mas a sua aura imponente diz tudo. —Amor... —rompe o silêncio com uma voz grave. Cada palavra pronunciada é uma declara&cced
Ela acenou com a cabeça, mas quase como se fosse um reflexo, sabia que esta batalha ainda não tinha terminado. Gerónimo sentia o mesmo. É por isso que, depois de um instante eterno, ele voltou àquela força que o caracterizava. A sua expressão mudou ligeiramente, mais séria, mais resoluta. —Por isso, querida..., diz-me o que temos de resolver para podermos estar prontos. —Fez uma pausa, olhando-a com a intensidade de alguém disposto a enfrentar o mundo inteiro por amor—. E diz-me também a que família pertences... —O seu tom era firme, decidido—. Preciso de saber para poder proteger-te e defender-te do que for necessário. Cristal desviou o olhar, mordendo o lábio com força, como se esse gesto pudesse conter o turbilhão de emoções que ameaçava transbordar. Sabia que tinha de dizer tudo, que não podia e
Cristal tentou sustentar o olhar dele, mas a sua inquietação era mais forte e acabou por desviar os olhos para as sombras que se projetavam à volta. Parecia que temia que alguém, algo, a encontrasse naquele momento. Sempre que pensava na sua família, nas implicações do seu passado, a incerteza agarrava-se ao seu peito como um nó impossível de desatar. Gerónimo, cuja paciência e amor pareciam feitos de aço temperado, não precisou de ouvir mais. Estendeu o braço naturalmente e puxou-a para si, abraçando-a com uma ternura que não deixava espaço para dúvidas. —Querida, vamos resolver isso, prometo-te —sussurrou-lhe ao ouvido, apertando-a ligeiramente contra o peito. Em cada palavra tentou impregnar-se da segurança que sabia que ela precisava tanto como do ar para respirar. Mas Cristal não encontrou consolo suficiente. Com as mãos trémulas, apertou o tecido da camisa de Gerónimo enquanto tentava organizar os seus pensamentos. Finalmente, levantou a cab