Perto da porta, Vitória finalmente acordou. Viu que Gabriel já estava de pé e, apoiando-se na parede, tentou se levantar. Sua voz saiu rouca, quase um sussurro:— Gabi... Vamos recomeçar? Esquece esses dois anos... Tanto você quanto eu erramos.Gabriel saiu do quarto e foi imediatamente segurado por Vitória. Com expressão fria, ele puxou o braço com força, livrando-se dela:— Eu deixei tudo bem claro ontem à noite. Não adianta usar esse joguinho de coitada. Hoje mesmo você vai sair da minha casa.— Gabi, por favor... Gabi... — Vitória tentou acompanhá-lo, mas depois de passar a noite inteira encostada na porta, seus membros estavam dormentes. Cambaleou... E caiu no chão.Ela esperava que ele, como fazia antes, voltasse correndo para ajudá-la, perguntando se estava tudo bem, com aquele olhar preocupado. Mas, dessa vez, Gabriel nem olhou para trás. Foi direto até o hall, trocando os sapatos com indiferença.Quando terminou de calçá-los, virou-se. Vitória ainda estava no chão, olhando pra
— Naquela época, você ainda estava no nono ano, prestes a entrar no ensino médio. Eu jurei que aquela mulher jamais pisaria nesta casa. Fiz de tudo pra proteger o seu lugar como neto legítimo, o herdeiro da família Pereira, e impedir que o bastardo da amante do seu pai fosse reconhecido no nosso clã. — A voz do Sr. Henrique era firme, cada palavra carregada de lembrança e decepção. — E você? Cresceu... E virou exatamente igual ao seu pai. Igualzinho. Tinha que ser... Tal pai, tal filho!As palavras não traziam um único palavrão, mas para Gabriel soavam mais sujas, mais dolorosas do que qualquer insulto vulgar. Era como se cada sílaba cortasse sua pele e sangrasse direto no coração.— Desculpa, vô... — Murmurou Gabriel, quase num sussurro. — O hotel da Vi foi cercado por paparazzi... Levaram a bolsa dela. Sem documentos, ela não conseguiu se hospedar em lugar nenhum.— E aí você achou uma boa ideia levar ela para sua casa? Todo esse coração caridoso... Por que não pega uns cachorros de
Após o café da manhã, Rafael chegou à família Pereira com o advogado a tiracolo. Mal os dois entraram, Gabriel já queria mandá-los embora.— Ué, ficou nervosinho? Tá com medo de confronto? Assim a gente evita que você continue acusando a Bia de falsificação. — Disse o Sr. Henrique, soltando um riso frio, sarcástico.Gabriel cerrou os dentes e lançou um olhar ameaçador ao advogado, um aviso silencioso para que ele mantivesse a boca fechada. Chegou até a mandar uma mensagem escondido, pedindo que dissesse que a assinatura era falsa.Mas tudo isso foi percebido, em segundos, pelo olhar afiado do Sr. Henrique.Ele ordenou que o mordomo recolhesse os celulares e qualquer meio de comunicação dos dois advogados. Em seguida, mandou trazer o documento original para comparação imediata. Dois empregados foram chamados para impedir Gabriel de se aproximar.O silêncio na sala era tenso.Os advogados analisaram cuidadosamente os papéis. Depois de alguns minutos, se levantaram e um deles disse com fi
— Bia, o Gabi... Ele percebeu que errou. Esses dias, ele tá te procurando por toda parte. — A voz do Sr. Henrique saiu com um tom de súplica. — Aquela mulher, eu vou resolver. Mas me escuta... Perdoa o Gabi, só mais uma vez. Dá para ele outra chance. Ele te ama, Bia. Só não tinha percebido antes. Hoje mesmo ele me disse que não quer se divorciar... Chegou até a chorar. Eu prometo, dessa vez ele vai ser um marido de verdade.Do outro lado da linha, Beatriz escutou cada palavra em silêncio, o rosto impassível. Nenhuma emoção. Nenhuma brecha.Ela já devia saber que o Sr. Henrique não teria dificuldade em intervir num processo de divórcio.Não devia nem ter atendido a ligação.Interceder por Gabriel?A Terra podia explodir, a humanidade ser extinta, o sol nascer do oeste...Tudo isso parecia mais plausível do que Gabriel merecer confiança de novo.— Sr. Henrique, o senhor quer que eu dê uma segunda chance a ele... Mas e quanto a mim? O senhor poderia me dar uma chance de sobreviver?A voz
— Então... Quer dizer que tudo era verdade??! — Do outro lado da linha, mesmo tendo ouvido a confirmação, o Sr. Henrique ainda não conseguia acreditar.— Não só é verdade, tem mais coisa ainda. — Respondeu Rafael, com firmeza. — Vou fazer o seguinte, vou te mandar tudo por mensagem.Assim que encerrou a chamada, Rafael começou a digitar. Escreveu tudo o que sabia sobre os sofrimentos de Beatriz, incluindo o episódio em que o Sr. Gabriel levou a amante para dentro de casa.De qualquer forma, agora que os dois já estavam oficialmente divorciados, ele tinha certeza de que o Sr. Henrique continuava do lado de Beatriz e que talvez, só talvez, ele pudesse fazer algo para que ela tivesse um pouco de justiça.Dentro do carro, o silêncio era quase sufocante. No banco de trás, Gabriel permanecia imóvel, encarando o nada com o olhar perdido.Ele ainda não conseguia aceitar que realmente havia se divorciado de Beatriz. E, ao mesmo tempo, sua mente remoía uma verdade revelada dois anos atrás.Foi o
No banco do passageiro, Rafael ouvia os gritos desesperados misturados ao choro de Gabriel e não conseguiu evitar uma expressão de desaprovação. Franziu a testa e suspirou em silêncio.“Se soubesse que ia chegar a esse ponto, por que fez o que fez lá atrás...Dias atrás, ele já tinha alertado Gabriel: “Enfrente o que sente, antes que seja tarde.”Mas naquela época, ele respondeu com arrogância, convicto de que nunca se arrependeria.Na família Pereira, não adiantava o quanto o neto implorasse, chorasse ou gritasse.Dessa vez, o Sr. Henrique estava irredutível.Qualquer resquício de boa vontade que ainda pudesse ter sentido... Evaporou por completo. Sem um pingo de hesitação, desligou a ligação na cara do neto e ainda disparou uma última frase, seca como uma lâmina:— Você não é digno da Bia.No banco de trás do carro, Gabriel tentou ligar de novo. Uma, duas, três vezes. Mas o avô não atendia mais.Foi nesse instante que ele quebrou por dentro. Seu coração, já em frangalhos, se despedaç
Daniel virou o rosto discretamente e a observou de perfil.Beatriz estava maquiada de forma leve. Os lábios tingidos de um vermelho suave nada chamativo, deixavam seu visual ainda mais limpo, fresco e elegante.Havia algo nela que transmitia uma beleza serena, quase etérea.— Nada de “estranha”, pelo contrário... Você está lindíssima. — Disse Daniel, sem economizar nos elogios. — Na época da faculdade, você já era a garota mais bonita do curso. E ainda por cima, inteligente. Tinha tanto pretendente que dava pra dar a volta na Cidade A umas três vezes. — Comentou ele, sorrindo.— Ah, Daniel... Para com isso. — Respondeu Beatriz, um pouco sem graça.Ela ficou visivelmente envergonhada, o que só arrancou um sorriso divertido de Daniel.Aquela timidez natural... O jeito dela não havia mudado nada. Era como voltar no tempo, aos dias da universidade.Ele chegou a pensar em perguntar se ela estava namorando...Mas ponderou por um instante, eles tinham acabado de se reencontrar, e jogar essa p
Na mesma hora, todos na sala entenderam o recado por trás da fala de Daniel.Um dos entrevistadores se adiantou com um sorriso diplomático:— A Srta. Beatriz tem uma base técnica muito sólida, além de já ter liderado equipes em várias competições universitárias. Acredito que seria uma excelente candidata ao cargo de diretora de design.Beatriz ouviu com atenção e apertou levemente os lábios. Depois, virou o rosto na direção de Daniel e disse com firmeza:— Desculpa, mas acho que meu nível ainda não é suficiente para isso. Ficaria muito grata se pudesse começar como designer da equipe. Um cargo normal já está ótimo.A sala ficou em silêncio por um segundo. Os entrevistadores se entreolharam, claramente surpresos com a recusa.— Agradeço muito o voto de confiança de vocês. — Continuou Beatriz, com um sorriso calmo. — Mas as competições na universidade eram em grupo. O responsável principal era o próprio Sr. Daniel. Eu só atuava como apoio, então não posso me apropriar de méritos que não