Capitulo 3

JACK

Ela é tão adorável dormindo. O seu rosto pálido lhe dava a forma perfeita de um anjo. Seu cabelo preto comprido escorria em minha mão feito fios de seda.

Fiquei analisando cada detalhe de seu rosto, cada sinal e marca, para não precisar vir aqui toda noite. O que me parecia ser impossivel

Passei a analizar o seu quarto. Ursos e brinquedos espalhados em cada canto. Ou ela gosta de brinquedos ou não morava aqui há muito tempo.

Sim, ela não morava aqui, eu teria percebido. Voltei a observar o quarto. Em cima do criado mudo havia muitos livros fictícios e romances, ela deve gostar muito de ler,  e também alguma quantia em dinheiro jogado por ali.

Voltei a minha atenção ao anjo quando ela se mexeu e virou para o outro lado, exibindo o seu corpo em seu pijama listrado rosa.

Eu tenho que sair daqui o mais rápido possível, ou não responderia por minhas atitudes.

Cobri o seu corpo e a olhei mais uma vez. Com muita dificuldade, me afastei daquela obra e sai pela janela, que esqueci aberta e não iria voltar para fechar.

Não sei se isso é certo, eu mas eu não posso evitar, eu não consigo. Mas,

isso deveria estar certo. Afinal, a luz brilhou com ela. Tem que ser ela. Tantos anos esperando que isso acontecesse comigo,e quando acontece, não sei se é permitido. Afinal, ela é humana.

(...)

ISADORA

A claridade do sol que atravessava a janela aberta me acordou. 

Aberta? Mas eu não deixei aberta quando fui dormir.

Levantei já sentindo minhas costas gritarem de dor. Me espreguicei e caminhei em direção a janela. Escorei meus braços na barra e senti o vendo meio frio bater em meu rosto. Fechei os olhos, soltando um leve sorriso ao lembrar que finalmente estou em casa. Ao abrir os olhos, me deparei com a imensa floresta à minha frente, o que me fez lembrar do acontecido de ontem.

De onde vinha aquela luz? E o que era? Não era fogo, eu sei muito bem como é o fogo e não tinha a ver. E por que o transe? Por que não consegui me mover, por mais que quisesse?

Perguntas sem respostas.

Soltei o ar do meu pulmão e fechei a janela, frustrada. Me virei para o quarto, olhando tudo com mais cuidado. Desde que eu fui embora quando era pequena, poucas coisas foram mudadas. Eu me lembro de exatamente todos os móveis e alguns brinquedos dentro de caixas. Dentro do guarda-roupa também haviam caixas cheias de roupas antigas e pequenas. 

- Isadora? Está tudo bem? - Meu pai entrou no quarto. Nós ficamos até tarde ontem conversando sobre tudo o que aconteceu quando minha mãe me levou embora. Falei da casa onde a gente morava, falei que nunca tive notícias dele e tudo mais. Todas essas caixas empilhadas era pra doação, mas ele não conseguiu se desfazer de nada que lembrava a mim.

- Estou sim, só estava observando minhas coisas antigas. - Falei sorrindo.

- Semana que vem eu vou começar a arrumar seu quarto... Vamos fazer uma reforma. - Falou subindo as calças animado.

- Não precisa fazer isso. - falei interrompendo - Está ótimo pra mim.

- ... Não vou mudar muitas coisas. - Ele me ignorou e ficou olhando ao redor. - Como você disse, são coisas velhas, vou deixar o quarto do jeito que você quiser

- Tudo bem então. - Sorri vendo que não tinha jeito.  - Bom... eu vou tomar banho. Já já eu desço pra tomar café.

Ele assentiu e fechou a porta.

Conversar com ele ainda é meio estranho, mas com o tempo a gente ganha a intimidade pai  e filha. Agora, só faltava a minha mãe pra completar, mas eu sei que mesmo sabendo que estou aqui, ela preferia ficar onde está e na situação que está.

Depois do banho notei que trouxe poucas roupas e sabia que uma hora ou outra tinha que fazer compras. Tirei da mala os meus livros e mais algumas coisinhas que trouxe e os coloquei no lugar dos ursinhos, em cima do criado mudo. Desci às escadas depois de pronta e notei a mesa farta, com tudo o que eu tinha direito.

- Parece que alguém fez compras.

- Eu sei que você tem fome, então coma tudo.  - Falou. - Bom, eu vou vou trabalhar. Quando terminar vai dar uma volta pela cidade, por perto é claro, ajuda a relembrar de tudo.

Fiz que sim com a cabeça.

Comi algumas torradas, um misto quente e um copo de suco de laranja. Vou seguir o conselho do meu pai, apesar de preferir ficar em casa e me afundar nos meus livros. Quero tentar fazer alguns amigos, ou pelo menos relembrar os velhos.

Depois de me arrumar, peguei o casaco e sai. A casa é de frente ao vasto verde e árvores grandes. Fiquei parada observando ao fundo por entre as árvores, tentando descobrir o mistérios que elas carregam e na expectativa de ver aquela luz outra vez, mas nada aconteceu. 

- Você esta ficando é louca, Isadora.- Falei em voz alta, maneando a cabeça para os lados e virei-me para caminhar.

Ao me virar, senti uma coisa invadir meu corpo. Uma sensação diferente e, por incrível que pareça, foi a mesma de ontem. Antes de mais nada, me virei novamente pra floresta e sim, meus pensamentos estavam corretos. É aquela luz novamente.

Minhas pernas agiram antes que meu cérebro mandasse as ordens e então comecei a andar em direção a floresta misteriosa, sendo guiada pela luz. Uma luz dourada, um pequeno flash saindo por dentro das árvores. Não sei o que de tão estranho existia lá, mas eu pretendo descobrir.

Entrei na imensa floresta determinada a encontrar a origem dessa luz misteriosa que causa tantas coisas em mim. Olhava pra trás e a cada passo eu me distanciava mais e mais da cidade, e não prestei atenção na raiz de uma árvore que estava para fora e cai no chão com tudo ao começar  correr.  luz estava se afastando de mim e eu já estava tão perto...

- ...Que merda...- Murmurei, respirando fundo. O que eu estava achando? que ia entrar numa floresta desconhecida e ia ser fácil?

Levantei, limpei minha blusa e continuei a andar, agora com mais cuidado. A luz dourada não estava mais se distanciando, então caminhei mais devagar porque o fôlego se acabou. A floresta que me parece assustadora vista de fora devido a escuridão, mas é linda vista por dentro. 

Um cervo apareceu em minha frente e eu dei um grito de susto. Ele ficou me encarando de uma forma estranha com seus olhos brilhantes. Tenho certeza que esse é o dia mais esquisito da minha vida. Seu pelo era grisalho e curto, seu corpo magro estava tremendo. Parou de me olhar e continuou a correr para longe em velocidade.

Voltei a olhar para a luz. Mas ela não estava mais lá.

Mesmo assim continuei a andar, dessa vez observando a floresta com mais cuidado, pois agora que percebi que estava escurecendo e eu estou completamente sozinha com vários perigos me rodeando, mesmo não sabendo quais.

Andei, andei e andei. Já não conseguia dar mais um passo, estava muito cansada e tudo por conta de uma luz. Não vou ficar aqui no meio do nada sozinha, então dei meia volta com a intenção de voltar pra cidade e foi então que caiu a ficha.

Estou perdida.

Andei de um lado para o outro desesperada. Já estava anoitecendo e eu aqui no meio do nada. Comecei a andar no automático para uma direção qualquer em que o sol estava mais forte e me dava uma melhor visão de onde estava.

Enquanto andava, ouvi barulhos de galhos se quebrando atrás de mim, então parei para ver se era o som dos meus passos, e realmente era.

Fiquei mais calma no momento, mas quando ia começar a andar, o barulho começou novamente e mais veloz. Meu coração acelerou e arranjei forcas, não sei de onde, começando a correr para qualquer lado o mais rápido que podia, pois o barulho estava se intensificando atrás de mim.

Já não estava mais olhando para onde ia, só pensei em correr e tentar ficar com os olhos secos. E então em uma tentativa de olhar para trás, tropecei em alguma coisa e cai com tudo no chão.Tentei levantar mais não consegui, então me encolhi e comecei a chorar ouvindo algo ou alguém se aproximando com rapidez de mim.

Nada aconteceu. Na verdade, o barulho de alguém correndo atrás de mim parou. Não havia sequer vento. 

Abri os olhos e olhei em volta. Só havia árvores e mais árvores.

Me levantei com dificuldade, devido a queda, e olhei mais uma vez para o lado pra ter certeza que estava só. Olhei para trás na tentativa de achar minha mochila, que deve ter caído na correria, e suspirei depois que vi onde estava.

Era um campo enorme de Flores. Flores roxas que eu não conhecia. Fiquei muito surpresa ao ver aquilo e de sentir aquela brisa de paz que invadia meus poros. Não tinha mais árvores gigantes e sequer algum predador atrás de mim, era um campo livre e a céu aberto.

Andei a passos lentos observando cada detalhe de cada flor, peguei uma na mão e seu perfume exalava um cheiro doce que me deixou tonta no momento.

Mas outra coisa me chamou atenção logo depois.

Na outra ponta do campo, havia alguém. Estava virado de costas para mim. Parado. Eu também não me mexia, não conseguia por mais que quisesse por conta da exaustão e não aguentava dar mais nenhum passo.

Ele se virou para mim. Um garoto vestido de preto, que aparenta ter uns 19 anos.

Ficamos parados de frente um para o outro e senti uma sensação diferente subindo dos meus pés a cabeça. Não sei explicar o que seria, mas essa sensação é muito boa. Ou deve ser apenas medo.

Ele começou a andar até mim com passos lentos e as mãos no bolso, se aproximando mais e mais, até que chegou a um metro de mim. Eu não sabia o que fazer, não sabia como reagir. Parte de mim queria gritar, mas outra parte de mim queria continuar encarando esses olhos misteriosos e não me mover. 

Então ele se aproximou e ficamos cara a cara.

Seus olhos eram hipnotizantes. O tom de azul mais lindo que ja vi. É meio impossível não encara-lo e não conseguir tirar os olhos dos dele, e foi nesse momento que eu soube que a expressão "um olhar vale mais que mil palavras" não era nada além da verdade. Seu cabelo era preto bagunçado, bonito. Seus lábios úmidos, carnudos e rosados me fez engolir a saliva. Conseguia ouvir sua respiração forte, o que me fez entender que estávamos próximos 

demais.

Ele levantou o braço esquerdo em minha direção e me assustei, mas seus olhos ainda continuavam em cima de mim me passando confiança. Senti o toque dos seus dedos em minha bochecha e fechei os meus olhos para sentir aquele momento de paz tomando o meu corpo que seu contato me trouxe. 

Uma brisa que passou, trouxe o seu perfume doce, como o da erva, fazendo-me ficar tonta outra vez.

Senti falta dos seus olhos azuis marcantes e abri novamente os meus, mas em vez de encara-lo, tudo estava girando ao meu redor. Seu rosto se multiplicava em minha frente. Senti braços quentes me agarrando, me envolvendo em um aconchegante abraço. A ultima coisa que vi foram seus olhos com uma expressão de preocupado, e meu corpo sendo carregado por entre a floresta.

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