Senti um toque suave no meu braço. Era Ryuu, sacudindo-me levemente para acordar, quando chegamos à casa da família Carbone. Pisquei algumas vezes, os olhos ainda embaçados de sono, enquanto ele me ajudava a sair do carro. Apertei sua mão, tentando suprimir os bocejos. Meu foco estava disperso, mas, mesmo assim, a familiaridade daquela casa de estilo italiano diante de mim trouxe uma onda de nostalgia. O telhado baixo, as janelas amplas, tudo ainda do jeito que eu lembrava. Nada havia mudado.As plantas no pátio continuavam desgastadas pelo tempo, a cesta pendurada sob a janela da frente ainda estava quebrada, e a velha fonte de pedra, que nunca funcionou enquanto vivi aqui, continuava tão inoperante quanto antes.— Morunaga — disse Bion, com sua voz grave, assim que atravessamos a porta atrás de Loretta. Ele nos esperava com Anton e Lex, os braços cruzados e a expressão tensa. Só Dario estava ausente.— Rapazes, ponham a mesa. Vou preparar o jantar e fazer algumas bebidas. Café, Ryuu
— É lamentável que tenha demorado tanto para alguém assim pagar por seus crimes — disse Ryuu, sua voz firme, mas serena. — Você tem trabalhado nesse ramo por décadas. Seria cruel da minha parte tomar isso de você por causa dos erros de seu irmão. Não sou um monstro.O leve sorriso de Loretta revelou que ela apreciava a gentileza nas palavras, mas eu não deixei de notar o olhar de Ryuu se desviando discretamente para Bion. A última frase parecia ter sido dita mais para ele.Depois de terminarmos os drinques, Loretta nos guiou apressadamente até a sala de jantar. A mesa estava posta com um capricho incomum. Ela até acendeu velas como peça central.— Estamos comemorando alguma coisa? — perguntei, enquanto observava a disposição cuidadosa das melhores louças e taças, além da garrafa de champanhe ainda fechada no centro.— Você está aqui na Itália conosco. Não é motivo suficiente para comemorar? — Bion falou da cabeceira da mesa, sua voz baixa, porém carregada de significado. Ele permanece
A manhã começou como muitas antes do casamento. Eu e tia Loretta estávamos sentadas no jardim, dividindo um bule de chá e saboreando os cornettos caseiros que ela sempre preparava. Cada mordida doce parecia me reconectar com a Itália, mesmo que a viagem fosse curta.Ryuu ainda estava no quarto, ao telefone com os irmãos, garantindo que tudo estivesse em ordem em Los Angeles. Não havíamos sequer completado vinte e quatro horas fora, mas ele não podia se desconectar completamente. Se essa era a condição para a viagem, eu não me importava — desde que ele estivesse aqui.— Me diga, honestamente, como estão as coisas desde o... incidente? — perguntou tia Loretta, pousando o garfo e me lançando um olhar preocupado.— Incidente? — Fiz uma pausa, mexendo distraída no meu chá. — A invasão — ela esclareceu, com uma expressão carregada de irritação. — Dario só nos avisou pouco antes de Ryuu aparecer. Não contou muitos detalhes, mas sei que está ajudando Ryuu a encontrar os responsáveis. Eu o re
— Merda! — soltei em italiano, saltando da cadeira enquanto a dor irradiava pelas minhas mãos. — Inferno, isso está fervendo!— Porra! Você está bem? — Lex praticamente pulou por cima de Anton, que ainda estava no chão, para se aproximar de mim.— O que diabos aconteceu aqui? — A voz de Ryuu soou repentinamente do outro lado do jardim. Em um piscar de olhos, ele estava ao meu lado, pegando um pano úmido para examinar minhas mãos, agora vermelhas. Seus olhos, normalmente calmos, estavam arregalados de preocupação. — Está doendo muito? — Ele perguntou, lançando um olhar fulminante para os primos, como se estivesse pronto para culpá-los pela minha situação. — Você precisa lavar isso com água fria.— Avisei que isso ia acontecer, idiotas! — Tia Loretta ralhou, enquanto juntava os pedaços da mesa derrubada e olhava para seus filhos como se fossem crianças travessas.— Sério, não foi nada — tentei minimizar, mesmo enquanto Ryuu me puxava em direção à cozinha, ignorando meu protesto. — Foi m
O café que Ryuu havia escolhido era pequeno, tranquilo, quase escondido entre as pedras antigas de uma rua estreita. Àquela hora do dia, os cafés costumavam estar lotados, com pessoas desfrutando de longos almoços ao sol. Mas aquele lugar tinha uma paz diferente, uma privacidade que, por um momento, me fez suspirar aliviada. Era claro que ele escolheu aquele ambiente para que pudéssemos escapar dos olhares curiosos, e eu silenciosamente agradeci.Seguimos para uma pequena cabine de couro desgastado no fundo do café, onde ele me deixou de costas para a sala enquanto mantinha uma visão perfeita de tudo ao redor. Notei como seus olhos varriam o ambiente a cada minuto, sempre vigilantes, como se estivessem à espera de algo. O silêncio que nos acompanhava desde que saímos da casa da minha tia parecia mais pesado ali, e eu não sabia como quebrá-lo. Ainda me perguntava por que ele me chamou para almoçar, porque esse café.O garçom logo trouxe nossas bebidas. Ryuu pediu um expresso, enquanto
A expressão de Ryuu mudou, seus olhos se arregalaram levemente, como se uma compreensão tardia finalmente o alcançasse. — Eu não tinha percebido o quanto o ataque te afetou — ele murmurou, quase como se estivesse falando consigo mesmo.Dei de ombros, sem saber o que mais poderia dizer. As palavras pareciam pequenas diante da enormidade do que eu sentia.Ryuu então estendeu a mão, pegando a minha com uma suavidade que contrastava com o peso da conversa. Ele virou minha palma na dele, os dedos traçando lentamente as linhas que ele parecia querer decorar. Seu toque era firme, mas o olhar fixo em mim me fez engolir em seco. Sentia minha boca seca, enquanto meu coração batia forte contra o peito.— Não é estúpido querer confiar nas pessoas. Não é estúpido querer confiar em mim — disse ele, com uma vulnerabilidade que me surpreendeu.Eu desviei o olhar, soltando um suspiro frustrado.— Talvez não seja estúpido, mas foi ingênuo. Eu esperei demais de você.— Não, você não foi ingênua — sua v
&Ryuu& Eu a observei se afastar, acomodando-se na cama com aquele jeito tranquilo que sempre me deixava à deriva. Eu não queria dormir, ainda não. Meus olhos ardiam de cansaço, mas minha mente estava em alerta. Queria... mais. O toque dela, a preocupação que sempre via em seus olhos. O silêncio entre nós estava me matando, sufocante. Ela podia estar ali, ao meu lado, mas parecia tão distante que doía. O pior é que eu sabia que a culpa era minha. Estive ocupando minha mente com cada palavra que trocamos nas últimas semanas. Cada gesto. Beatrice se importava, era óbvio. Ela queria que eu fizesse parte da vida dela, que eu fosse aceito por sua família. Mas será que o que tínhamos podia mesmo ser chamado de "relacionamento"? Eu já tive muitas mulheres, mas nada parecido com isso. Nunca me importei com o que elas sentiam, nunca quis saber. Mas Beatrice... ela mexia com algo que eu nem sabia que existia em mim.Era um orgulho estranho, quase incômodo, que eu sentia ao pensar nisso. Como s
Suspirei profundamente, fitando Bion com uma expressão carregada antes de me dirigir à porta. Eu precisava descansar; caso contrário, estaria exausta na manhã seguinte. No entanto, ao dar o primeiro passo para sair, a voz dele me deteve.— Conheci Mateo quando eu tinha vinte e dois. Ele tinha dezenove. Nós… — Bion fez uma pausa, sua cabeça pendendo como se o peso das palavras fosse demais para carregar. Me virei, o coração acelerando. — Começamos a namorar um ano depois.As peças finalmente se encaixaram. A aversão de Mateo pela nossa família… Não era o rancor entre rivais, mas algo muito mais profundo: um desgosto nascido de um rompimento. Eu jamais teria adivinhado isso. Para alguém como Bion, com sua posição e cercado pelas tradições da nossa cultura, admitir algo assim não devia ser fácil. Me perguntei quantas pessoas sabiam, e logo percebi que deviam ser poucas. O fato de que ele estava confiando essa informação a mim agora… me deixou surpresa.— Ficamos juntos por dois anos — el