Entre Irmãos
Entre Irmãos
Por: DmaspUmada
Prólogo

Eu ainda conseguia recordar com tanta clareza o exato dia em que fomos buscá-lo, assim como na enorme animação que os meus pais se encontravam. Nunca fomos de fazer qualquer comemoração durante os dias da semana. Contudo, aquela quarta-feira seria uma exceção à regra, pois faríamos uma modesta e pequena festa para o que em breve aconteceria na nossa família.

Os primeiros raios solares mal tinham despontados no horizonte, mas os meus pais acordaram mais cedo naquela manhã e, logo, a nossa residência se encontrava com inúmeros balões coloridos em diversos tamanhos e formas, refrigerantes que eu mesmo tinha escolhido no dia anterior, um bolo decorado e uma boa quantidade de tanto de salgadinhos quanto de docinhos. Era uma pequena e simplória comemoração, contudo fora feito com muito amor e empolgação. E bastava apenas um único olhar direcionado para a sala de estar, que a impressão de ser encontrar dentro em uma festa de aniversário infantil era instantânea.

A felicidade tão explicita e verdadeira nas expressões dos meus pais, durante todo o tempo em que conversavam entre si e aprontavam aquela pequena festa, também tinha se tornado minha. Todavia, anos depois, as lembranças me faziam sofrer.

Ainda doía tanto na minha alma de uma forma que quase chegava a ser física.

Me virei para o outro lado da cama e tentei ignorar essas malditas lembranças. Contudo, em todas as vezes em que fechava os olhos, eu falhava miseravelmente e as imagens pipocavam na minha mente de uma forma agonizante demais, dolorosa demais. Inferno. Nos flashs, me via dentro do carro com meus pais, a estrada abarrotada com outros inúmeros veículos, as buzinas sendo tocadas de maneira incessantes, as pessoas nervosas e apressadas enquanto o trânsito parecia que não iria fluir em momento algum.

Quando adentramos pelas portas principais do orfanato, já esperavam pelos meus pais na sala de reuniões. Havia outra pessoa que tinha capturado a minha atenção, fazendo-me deixar os adultos de lado. Um garotinho magricela estava lá com uma expressão indecifrável a minha percepção infantil daquela época. Ele possuía cabelos claros, olhos castanhos, feições delicadas. Ainda me recordava de como o achei muito fofo. Enquanto os mais velhos dialogavam entre si, me sentei ao seu lado e tentei puxar assunto, porém foi um fiasco total.

— Me chamo Evan Foster. — Falei, animado, esticando na sua direção. O garoto pareceu tremer ao me ver, enquanto me olhava como se eu fosse brigar com ele ou algo pior. — E você? — Incentivei-o a se apresentar também.

Com medo nos olhos, ele me estendeu a minúscula mão e apertou a minha. O menino deveria ter sete anos no máximo.

— Me chamo...— A sua voz era tão doce e infantil. Não poderia deixar de estar empolgado, pois ele seria meu irmão, eu queria poder fazer tudo o que os irmãos fazem. — Daniel Diaz.

Minha habilidade de interação social estava em falta. Precisava melhorar a comunicação, ou não poderíamos montar uma casa na árvore juntos, andar de patins pelo quarteirão, jogar bola no nosso quintal. Ah, eram tantas possibilidades. A minha mente infantil, naquela época, imaginava que ter um irmão mais novo era como ter um parceiro para tudo, até mesmo para roubar os biscoitos amanteigados do pote antes do almoço.

Só que eu não sabia, que junto com uma criança adotada, vinha também os seus traumas do passado. 

Me lembrava da sua felicidade ao chegar na nossa, sua agora também, casa. Daniel nunca fora em uma festa infantil na vida e muito menos teve a sua. A maneira em que ele olhou cada brinquedo e em como os deixou dentro das embalagens para não estragarem, tive a certeza que o garoto magricela precisava se soltar mais. Então, fora naquela quarta-feira ensolarada, que decidi que sempre estaria ali para tudo o que ele precisasse.

Afinal, era exatamente o que um irmão faria pelo outro, certo? Só que eu nunca poderia ter me enganado tanto na minha vida.

Agora, me encontrava preso na enfermaria da cadeia, após levar uma surra dos outros detentos, e o meu julgamento seria na próxima semana. Em contrapartida, havia uma parte de mim que tinha a certeza que eu não iria sobreviver a mais nenhum dia nesse inferno na terra. 

Eu só queria tocá-lo mais uma vez, antes de morrer atrás das grades

.

Quem acreditaria que eu  era inocente enquanto as evidências diziam exatamente o oposto?

Amar o meu irmão havia sido o meu maior pecado, pior erro.

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