Isabella Duarte Ricci
A presença de Tomas me dava alguma paz. Mas quando vi Aurora encostada na parede do corredor, os braços cruzados e o olhar fixo em mim, percebi que ela sabia. Ela sempre soube. Era minha irmã, mas também o alarme que nunca me deixava esquecer de onde eu vinha. — E então? — ela perguntou, assim que nos aproximamos. — Os meus sobrinhos estão bem? Tomas lançou um sorriso paciente, mas eu vi o jeito que ele segurou mais firme minha cintura. A proteção dele era silenciosa, mas constante. — Estão ótimos. Gêmeos fortes, coraçãozinho acelerado. Já estão quase prontos pra causar um caos em casa — ele respondeu, tentando aliviar o clima. Aurora não sorriu. Seus olhos estavam atentos demais. Não era só sobre os bebês. Aurora se aproximou e tocou meu rosto com carinho, mas havia uma firmeza no gesto. — Você sabe que eu mato por você, né? Tomas respirou fundo ao ouvir isso, mas não disse nada. Ele entendia. Sabia que eu e minha irmã fomos criadas num mundo onde o amor, às vezes, vinha com ameaça velada. — E você sabe que eu não quero mais viver nesse ciclo de violência — murmurei. — Eu só quero paz. Por mim. Por eles. — E é isso que vamos garantir — disse Tomas, com firmeza. — Eu vou reforçar a segurança na casa. Amanhã, começo com repouso total. Nada de estresse, e também o nosso tio Ares está chegando para ficar a frente dos negócios da família, não posso arriscar agora que vou ter os meus filhos, antes de estar prestes a trazer dois filhos ao mundo, não tinha nada a perder e a máfia era tudo que eu desejava, mas agora, eu só quero que meus filhos possam crescer sem eu ter que me preocupar se posso ficar tranquila ou não com o meu trabalho caótico. —E o que Dimitri queria? —Nada que eu fosse dar a ele. Aurora assentiu, mas seu olhar dizia que ela não confiava em tranquilidade quando o nome Dimitri voltava a circular. — Eu vou descobrir o que Dimitri está querendo — ela declarou. — E se ele ousar e tocar em você ou nesses bebês sem seu consentimento, vai conhecer nosso tio Ares da pior forma possível. Sorri, mesmo com o coração pesado. Aurora era fogo, Tomas era equilíbrio. E eu… estava no meio de uma guerra entre dois mundos. Enquanto saíamos do hospital, cada passo parecia mais difícil. Não por dor física. Mas pela certeza de que algo se aproximava. Algo que vinha do passado. Algo que poderia destruir meu presente. E mesmo com Tomas do meu lado, e Aurora pronta para me defender de tudo se fosse preciso… O nome dele ainda latejava na minha mente. Dimitri Carter. Eu precisava estar pronta. Porque a próxima decisão que eu tomasse, poderia mudar tudo. Isabella Duarte Ricci Após sair do hospital, saímos os três, o Tomas nos acompanhou e fomos a algumas lojas comprar algumas peças com a Aurora. Após jantarmos os três juntos, já era noite, quando voltei para casa, sem minha irmã, Tomas me deixou na porta, com um beijo demorado na testa e aquele olhar dele que parecia prometer o mundo, mesmo sem palavras. — Cuide de você e deles — ele disse, colocando a mão sobre minha barriga antes de se afastar. Assenti, observando enquanto ele entrava no carro e sumia naquela rua escura. Eu sabia que ele odiava me deixar sozinha, ainda mais agora. Mas essa era minha vida. E ele não pertencia a esse mundo, apesar de demonstrar o que sentia por mim. A mansão estava diferente. Mais movimentada. Homens novos ocupavam os corredores, alguns que eu não via há anos. Os mesmos que atendiam apenas uma voz dentro da família Ricci: Ares. Meu tio havia chegado. Subi devagar os degraus da escadaria principal e o encontrei no escritório, como se nunca tivesse ido embora. De pé, olhando os relatórios que um dos capangas lhe entregava, ele virou lentamente o rosto ao perceber minha presença. — Sobrinha — disse ele, com aquele sorriso calculado. — Você cresceu. E agora carrega dois Ricci no ventre. Temos muito o que proteger. — Não quero mais o caos, tio. Só paz — falei, de braços cruzados. Ele me analisou por um longo momento antes de caminhar até mim e colocar a mão em meu ombro com firmeza. — Paz é algo que a gente compra, Isabella. E às vezes… com sangue. Não respondi. Porque no fundo, eu sabia que ele estava certo. Eu só queria acreditar que existia outro caminho, já que agora eu me dedicaria a cuidar dos meus dois bebês que estavam para chegar ao meu mundo, ao mundo da família Ricci. Ares começou a dar ordens. A segurança foi triplicada. As rotas de fuga da casa foram revisadas. Cada funcionário antigo foi checado, cada entrega, monitorada. A mansão virou uma fortaleza, algo que sempre foi, mas agora o cuidado, havia sido totalmente exagerado. E eu, a mulher que um dia liderou operações inteiras, agora precisava ser protegida por dentro de suas próprias paredes. Mais tarde naquela noite, quando sentei na varanda com uma xícara de chocolate quente, Aurora se juntou a mim. Os olhos dela pareciam tão cansados quanto os meus. Ela insistia em passar as noite comigo, por querer estar ao meu lado quando fosse o momento de ter os bebês, já que faltavam poucos dias para o parto. — Recebi uma mensagem de Dimitri — falei. Ela não se surpreendeu. — Ele sabe que você está vulnerável. Mas também sabe que agora tem o Tomas e nosso tio Ares por perto. E se ele for burro o bastante pra tentar alguma coisa, vai acabar com a cabeça pendurada no portão da mansão. Suspirei, acariciando o ventre. Os gêmeos estavam inquietos. Como se sentissem o que se aproximava. — Não é só o Dimitri. É o que ele representa. É o passado todo tentando me puxar de volta. — E o que você vai fazer? — perguntou Aurora. Olhei para o céu escuro, onde não havia estrelas naquela noite. — O que for preciso. Porque a verdade era essa. Eu podia querer paz. Mas a guerra ainda me pertencia. —Entendo! —Ele é o pai dos meus filhos, não posso ser inimiga dele e nem evitá-lo para sempre, então quando meus bebês nascerem, vou permitir que ele possa ser o pai deles. —Ser apenas o pai dos meus sobrinhos ou também o esposo da minha irmã?—Aurora perguntou tentando me entender. continua....Tomas Cilfford O silêncio do meu apartamento sempre me recebeu com conforto. Hoje, me engolia. Joguei a chave sobre a bancada da cozinha e fui direto para o quarto, tirando a camisa pelo caminho. A cidade estava viva lá fora, cheia de luzes e sons abafados, mas aqui dentro tudo parecia estagnado. Como se o tempo estivesse em suspenso desde que a deixei naquela mansão. O chuveiro quente ajudou a relaxar os músculos, mas não a mente. A mente, essa, continuava presa a ela. Depois do banho, tomei as medicações em silêncio, quase automático, o comprimido azul para dormir, o branco para conter a dor nas articulações, e o comprimido que me mantia estável no tratamento, desde que eu havia descoberto minha doença sem cura. Tudo isso para manter o controle. Porque se eu me perdesse, eu voltava. Corria até a mansão dela e esquecia qualquer limite que eu mesmo me impus e que meu corpo também possuía. Me deitei, sentindo o lençol frio contra a pele quente. E fechei os olhos. Foi inevitável
Dimitri Carter — Você não sabe o que está fazendo. — ela me olha com um olhar gelado, tentando se manter forte. — Isso não vai acabar bem. Eu não vou ser sua prisioneira.— as palavras dela são frias como gelo. Isso não vai acabar bem. Eu não vou ser sua prisioneira. Nem você, nem ninguém, vai me controlar assim.É certo que você foi meu primeiro amor e pode até ser o pai dos meus filhos que estão para nascer, mas eu não consigo te amar, não consigo mais sentir aquele desejo e não tenho mais forças para jogos ou seja lá o que for que você agora esteja planejando. Eu já perdi tudo. O primeiro amor verdadeiro, o meu primogênito, a parte mais pura de mim, e agora, vou perder a Isabella, grávida de gêmeos. Eu já perdi tudo. O primeiro amor verdadeiro que tive, a dor de perda constante que ainda me assombra. Perdi meu primogênito, a parte mais pura de mim, e a dor de vê-lo partir me dilacerou por dentro de uma forma que eu nunca imaginei ser possível. E Isabella. Ela se tornou o ú
Isabella Duarte Ricci Eu não sabia onde isso ia dar. Eu não sabia se algum dia abriria mais do que essa janela para Tomas. Mas, por agora, saber que ele estava ali era o suficiente. O suficiente para me fazer sentir, pela primeira vez em muito tempo, que na verdade houvesse um caminho de volta para mim. Tomas não soltou minha mão. Ele ficou ali, olhando para mim como se tentasse decifrar cada parte do que eu não dizia, do que eu não conseguia admitir nem para mim mesma. O vento frio da noite pareceu me despertar um pouco da névoa de sensações que aquele beijo havia deixado para trás. Eu deveria dizer algo, me afastar, colocar uma barreira entre nós. Mas a verdade era que eu não queria. Pela primeira vez em anos, eu não queria fugir. — Quer dar uma volta? — Ele perguntou, puxando-me levemente pela mão. Eu hesitei. O hospital ainda estava às minhas costas, e o peso do passado tentava me puxar de volta. Mas Tomas era calor, era presença. E naquele momento, eu precisava disso mais
Isabella Duarte Ricci O silêncio pairava na sala depois que Tomas saiu. Meus pais ainda estavam tensos, e eu sabia que não escaparia de uma conversa mais profunda. — Isabella, você está namorando o doutor Tomas? — minha mãe perguntou, cruzando os braços e me analisando com atenção. Suspirei e passei a mão pelos cabelos úmidos de suor e tensão. — Nós estamos nos conhecendo — respondi, tentando soar casual. Meu pai bufou, claramente insatisfeito com a resposta. — Um obstetra, Isabella? Você acha que ele é capaz de te proteger?Não acha um pouco irônico? Namorar um homem que salva vidas enquanto você destrói outras, ele sabe que é uma mafiosa? — Lorenzo retrucou, ainda frustrado. — Pai, o Tomas me salvou esta noite. Isso já não é prova suficiente de que ele se importa comigo? — Cruzei os braços, mantendo o olhar firme no dele. Minha mãe tocou o braço do meu pai, tentando acalmá-lo. — O que importa é que nossa filha está bem — ela disse, em um tom mais suave. — Vamos dar
Isabella Duarte Ricci O cheiro de pão fresco e café recém-passado se espalhava pela cozinha da casa dos meus pais, trazendo uma sensação momentânea de paz. Eu me sentava à mesa com uma xícara de chocolate quente entre as mãos, tentando ignorar o turbilhão de pensamentos que girava incessantemente dentro da minha cabeça. Aurora, minha irmã, estava do outro lado da mesa, passando geleia em uma torrada com o tipo de leveza que só quem ainda não carregava um mundo nos ombros conseguia ter. — Você dormiu bem? — ela perguntou, sem tirar os olhos da torrada. Assenti vagamente, levando a xícara aos lábios. O chocolate quente estava delicioso, do jeito que eu precisava. — O suficiente para esquecer por algumas horas que minha vida virou um caos completo — respondi com um sorriso cansado. Aurora ergueu os olhos, observando minha expressão por alguns segundos antes de soltar um suspiro longo. Sabia que vinha algo a seguir, e estava certa. — Isa... o que você pretende fazer quando os
Dimitri Carter O gosto metálico do sangue na minha boca não era nada comparado à dor que explodia no meu peito. Não por causa dos socos. Não por causa da briga ridícula com Tomas. Mas porque eu vi, com meus próprios olhos, o olhar dela. Isabella. O olhar de quem já não me pertence mais. Aquela porta entreaberta nos expôs. Toda a nossa verdade escancarada ali, como uma ferida aberta para o mundo. E quando nossos olhos se encontraram, eu soube que ela sabia. Soube que tudo estava desmoronando. — Até quando vai continuar me rejeitando, Isabella? — minha voz saiu rouca, baixa, como um apelo. Ela me olhava como se eu fosse o próprio veneno que corria nas veias dela. E talvez eu fosse. Mas isso não me impedia de querer ser a cura. Aquilo me atingiu com mais força do que qualquer soco de Tomas. Recuei um passo, engolindo a raiva, o desespero. Ela me encarou por um longo segundo. Longo o bastante para o tempo parar. Para meu coração despencar. — Na mesma medida em que te amei, Dimitri