05 Bola 8 na caçapa!

Ai, Leila, não acredito”, foi a frase que mais ouvi nas semanas que se seguiram ao meu fracasso número um. Foi como acumular fracassos.

Eu fiquei esperando o Renato me ligar como toda adolescente fica esperando — grudada no celular, olhando de 5 em 5 minutos -, esperei domingo, segunda, terça… e ele ligou na quarta. A Ruth achava que eu devia transar com ele e me fez prometer que eu não ia deixar ele escapar, mas jantamos fora e o Renato me deixou em casa de novo.

A Drica quase me enforcou quando eu contei para ela que estava gostando muito se sair com o Renato e que aquele par de olhos verdes me matavam de paixão. E a Ruth queria saber se eu queria desistir do Clube, me apaixonar e casar.

Talvez eu quisesse… mas aí eu achei que três era um bom número de encontros para eu transar com o Renato. Coloquei minha melhor lingerie e depois de irmos em um bar, falei na cara dura que queria transar com ele.

Existem dois tipos de caras. Os que sem delongas te levam pra cama e te amam enlouquecidamente e os que perguntam se você tem certeza. O Renato era do segundo tipo e eu venho dizer a vocês que esses são o PIOR.

Chego a conclusão de que quando um cara pergunta se você tem certeza ele já tá julgando você errado, tipo, você não é a garota virgenzinha que ele achava que você era e eles te passam da prateleira com plaquinha “pra casar” para do “curtir até cansar”. Pode ser que leve 2 dias, 6 meses, 5 anos, mas é só isso, você não tá na prateleira do “casar”. Você é safada, promíscua, suja, não presta pra ser mãe, esposa, nada. Só presta pra ser uma caçapa de bilhar.

Não entendo o que uma coisa tem a ver com a outra, mas prometo não filosofar a respeito… só basta dizer que depois de três meses de amor e sexo nota 3, o Renato cansou de mim. Foi legal enquanto durou… quer dizer, mais ou menos. Era morno na cama, não tinha nenhuma posição de Kama Sutra e eu ainda tinha que aguentar uma porção de menininhas apaixonadas pelo guitarrista de Jazz com olhos verdes sempre que ele me levava para assistí-lo tocar.

Que ego, ein!

O cara precisa mesmo mostrar que é foda em alguma coisa pra mulher, como se precisasse provar que tem qualidades. Repare só que quando vocês estão se conhecendo, ele precisa mostrar a você que entende de alguma coisa, que é bom naquilo que faz. Perceba as palavras que eles usam na paquera, não são aleatórias e jogadas ao vento, eles estão mostrando a você que o pinto deles “é grande” em ao menos alguma coisa. No caso do Renato, era música.

Quero entender porque as pessoas acham que ouvir Jazz e MPB fazem delas mais cultas do que as que ouvem Funk. Posso ouvir funk carioca e ler Nietzsche antes de dormir. Não, ouvir jazz não te torna mais culto musicalmente, só faz de você um idiota arrogante.

Além disso, nós mulheres estamos interessadas em uma única qualidade em vocês homens: aquela que vocês nunca tem. A de ser homem com H maiúsculo e não, ao contrário do que os homens pensam, não tem a ver com virilidade nem com o Kama Sutra, tem a ver com não ter medo de amar, nem de estar apaixonado, nem de ser fiel e nem de se compromissar.

Enquanto eu chorava horrores por ter sido deixada pela vocalista de uma banda em que ele tocava — outra dessas que se acha culta porque canta Maria Carolina e porque é gostosa (e isso ela era, afinal, ele me trocou por coxas grossas e bronzeadas) -, a Ruth e a Drica me enchiam de “eu avisei”.  

Eu avisei”.... Sério?

Algumas amigas precisam de um discurso melhor do que esse, porque não precisa avisar, a gente sabe que vai dar merda, só queremos nos enganar que é eterno até lá.

Chorei, chorei e chorei. Até que eu cansei de chorar e me entupir de Chandon rosé. Fui para outro bar com as meninas repetir o drama de paquerar, mas dessa vez eu não ia me apaixonar, não ia!

Preciso dizer que durou dois minutos toda a minha força e potência de mulher decidida que sabe o que quer, que usa saia com uma fenda lateral e acha que tá abafando como a Angelina Jolie? Não preciso.

No bar mesmo, virei pro lado e meus olhos se grudaram, como que pregados com cola Superbond em um rapaz de visual forte com uma camiseta do Misfits. Ai meu Deus, me matem. Outro músico, não! Não sei se foi o jeito com que ele segurava o copo de uísque, o piercing na língua ou o sorriso super fofo dele, mas tenho que dizer que em dois segundos eu ficaria de quatro por ele! Ou em qualquer outra posição que ele quisesse...

Por sorte, o músico nem me notou, ocupado com os amigos, em não errar a letra da música, enfim… ocupado com a vida dele. E eu já tinha tido a minha cota de maria-guitarra, queria algo totalmente diferente e novo…

Procurei, procurei, procurei, mas não achei ninguém legal naquele bar. A Ruth perdeu a paciência comigo, a Drica pediu para ela me dar tempo porque eu estava na fossa por causa do Renato e eu, que queria provar que era mais gostosa que a Angelina Jolie quebrei o salto dançando na pista e voltei para casa contando o que seria o meu décimo quinto dia de fracasso. Acho que não sirvo pra essa vida de mulher alpha.

As meninas se divertiam, eu escrevia posts amargurados com a raça masculina e fomos levando o blog assim por um tempo. Estava dando meio certo, porque a Ruth sempre me lembrava que eu não estava cumprindo com a parte do acordo, me acusando de não estar levando a sério o blog. Poxa, eu estava! Enquanto elas escreviam contos eróticos, eu escrevia a crítica amargurada quase feminista, pra mim, estava funcionando muito bem! E era uma forma de desabafar todas aquelas coisas presas na garganta e que eu nunca tinha coragem de falar pra ninguém.

Mas meu celibato durou pouco, para alegria da Ruth e da Drica que já não aguentavam mais meus lamentos e fracassos.

De volta ao mesmo bar de sempre o garçom colocou na minha mesa um Sex on the Beach e me apontou no meio da multidão o gostosão que tinha me mandado um recado. Eu nunca imaginei que alguém pudesse usar nomes de drinks como cantada, mas lembrei que uma vez a Ruth ficou com um carinha que deu a ela um Orgasm. Na verdade, foram dois: um de álccol e um na cama.

Meu Deus, Leila, é hoje! — Ruth se empolgou puxando meu braço e eu me distraí, sem conseguir ver quem era o rapaz. — Vai tirar as teias de aranha!

Eu examinei bem minha amiga que a cada dia se transformava naquele visual de perigueti: vestido tubinho, salto plataforma de travesti e cabelos escovados. Uma versão da Valdirene… não, não aquela da novela Amor à Vida, aquela de Mulheres Ricas, mesmo. Ruth estava cada vez mais loira, linda, gostosa e saindo com os caras mais ricos do pedaço, colocando em prática o seu plano maléfico de nunca mais dividir as contas e fazer eles pagarem a tudo sozinhos: o melhor quarto de motel e a garrafa de Champagne. Ela inclusive judiava dos rapazes que se apaixonavam por ela, se mandassem flores e não fossem rosas columbianas, ela dava nota 2, mas se o chocolate fosse Kopenhagen, ela subia meio ponto. Suas notas no blog eram calculadas com precisão de acordo com a conta paga pela vítima no Motel. Era meio engraçado, ao contrário de mim ela não queria direitos iguais em nada, aliás, se pudesse ela voltaria no tempo e impediria que queimassem um sutiã em praça pública só para que quando se casasse, não precisasse mais trabalhar e fosse para sempre sustentada por seu macho.

Que indiscrição! — Drica reclamou. Ela só saía com os delícias do mundo businness, numa versão menos escrava de 50 tons de cinza, já que seria a Drica a dona das chaves das algemas, amarrando os gatões com suas gravatas na cama. E eu, o fracasso, só queria saber quem tinha me enviado aquele drink. — Opa, ele vem ai!

Virei a cabeça e vi justo quem? O vocalista com a camiseta do Misfits — mas dessa vez era do Ramones, com as mangas cortadas — calça jeans rasgada bem justa e uma touca preta nos cabelos meio lisos e meio enrolados que chegavam até o queixo, como uma versão melhorada — sim, me-lho-ra-da — do Ville Valo.

Ai, gente, socorro!

Vamos dançar. — eu vi Ruth dizer caçando sua taça de espumante levantando da mesa com o cigarro entre os dedos, dando a dica para que Drica se movesse também.

Não vale se apaixonar, ein, Leila. — Drica falou antes de sair com seu coque perfeito na cabeça, sua maquiagem forte impecável e seu vestidinho nude e discreto.

Eu olhei para o dono do drink, que vinha segurando uma long neck e um cigarro e me perguntei: Não me apaixonar COMO? Antes mesmo dele virar a cadeira ao contrário para se sentar naquele estilo rockstar eu já estaria caída no chão sem forças no joelho.

Sorte que eu estava sentada.

Oi. — ele falou com um sorrisinho fofo por entre um cavanhaque ridículo. Quem foi que inventou cavanhaque?! Quem?! Se mata, por favor. — Eu me chamo Fabrício.

Ainda bem que ele tinha um nome ridículos desses, ou meu desespero latente ia me impedir de sorrir. Dei um risinho e remexi o drink misturando o amarelo com o rosa, até ficar da cor de um tomate, com o canudo.

Leila, muito prazer. — “Muito prazer”, devo ser idiota por dizer algo assim, não é? Mas agora já falei. Eu queria ser como a Ruth, que sabe o que dizer na hora certa e sem ficar vermelha, ou ainda como a Drica, que diz só o necessário e acerta na mosca. Mas ei, eu sou a Leila, a que fala e faz tudo errado. Pra não dizer mais nada, dei um gole no drink.

Quando somos mais novas, nossas mães dizem certas coisas pra gente que teimamos em não escutar quando ficamos mais velhas: não aceite drinks de estranhos, use camisinha e não leve estranhos para dentro de casa. Com o sósia do Ville Valo só não cometi o erro número dois.

Não tinha nada no drink que ele me deu, por sorte, mas eu perdi noção dos meus atos ainda assim. Nem avisei a Drica e a Ruth para onde eu ia quando deixei o bar aos beijos com o roqueiro desajustado com bafo de uísque e cigarro. Ele tinha um carro meio caindo aos pedaços e verde com um adesivo do Hulk na traseira. Como o banco de trás estava tomado por seus equipamentos de música, só fomos tirar a roupa mesmo quando entramos no meu quarto.

Eu estava enebriada e não era pela bebida, mas pelo perfume dele. Era uma noite quente, mas eu nem lembrei de ligar o ar condicionado instalado no meu flat e caímos na cama que ficava há cinco passos da porta. Não é um flat grande, não tem cozinha, só uma bancada, mas tem varanda e uma porta que separa meu quarto da sala — viu, não é uma kitchenette, embora na prática, dê no mesmo ou existam kitches maiores em São Paulo… credo, o mercado imobiliário anda mesmo um lixo ultimamente.

Ele tinha olhos da cor do mel e músculos fortes. Subi por cima dele, beijei sua boca deliciosa enquanto ele puxou meu cabelo e tirou minha blusinha. Por sorte naquela noite eu estava com um sutiã melhorzinho que tinha acabado de comprar, mas me arrependi por não estar usando nada muito sexy como uma cinta liga… arranquei sua camiseta só para ver aquele corpo trabalhado na academia, com um tanquinho mais gostoso que um… pudim. Ele era bem branquinho, só consegui pensar em pudim, porque era mesmo um doce… e eu, como formiga doida por aquele açúcar.

Por que quando falamos de sexo, lembramos de comida? Já pararam para pensar nisso? O prazer carnal deve ser bem palatável de alguma forma… mas eu não estava em condições de pensar direito com ele me agarrando forte, beijando minha boca com seus lábios frescos e nossos corpos se chocando em labaredas ferventes enquanto ele tirava minha roupa e eu a dele.

Não sei como não morri desidratada de tanto calor, meu corpo parecia colado com o dele em uma sincronia que até então eu nunca tinha experimentado. Ao fim do maravilhoso sexo e melhor orgasmo que eu podia ter tido (eu daria nota 10, mas o blog só vai de 0 a 5), caí exausta por cima dele, escutando seu coração bater forte… foi como estar no céu.

Adormeci, sonhei com uma praia, muito sol. Acordei com sede, ainda na mesma posição, abraçada com ele como se fôssemos um só, tipo alma gêmeas. E daí eu me toquei que já nem lembrava mais do nome dele e de que eu só podia estar louca de estar fazendo tudo aquilo!

Eu nunca tinha transado com um cara que conheci na mesma noite e apesar de ter sido divertido, delicioso, perfeito… eu já estava me apaixonando e não era essa a intenção.

Ai! — falei no susto, sentando-me. Cobri meu corpo com o lençol sentindo vergonha de mim mesma. Eu transei com um cara que tem um carro verde com adesivo do Hulk! Será que eu estava cega de tanto tomar vodca para ignorar todos aqueles sinais? Puxei o lençol e acabei descobrindo ele. Que vergonha. O empurrei da cama, até ele cair, para não ter que olhar mais para aquele corpo perfeito. — Acorda, ô, inútil! — berrei.

Ele caiu com um estalido seco no chão e se sentou, ainda sonolento, coçando os olhos:

Nossa, que foi? Tá pegando fogo no prédio?

Não e você tem que ir embora! — joguei um travesseiro entre suas pernas, cobrindo a tentação. Virei de costas.

Ah, não, são três e meia da manhã. — ele voltou para a cama, beijou meu ombro e deitou de bruços. — Vou embora depois.

Eu queria tirar ele dali, mas fiquei com medo de tudo e com vergonha também, fora que o beijinho que ele me deu no ombro foi considerado romântico imediatamente e eu perdi coragem de expulsá-lo. Corri pro banheiro, tomei banho, vesti rapidamente uma roupa no maior silêncio para ele não acordar e fui para o sofá dormir depois de cinco copos de água.

Amanhã, logo cedo, quando recuperasse as forças no joelho, eu ia expulsá-lo aos tapas de casa!

Eu me sentia como um perdedor que acha que ganhou muitos pontos num jogo e descobre que perdeu. Como encaçapar a bola 8 na primeira jogada.

Saldo? -7.

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