— Por que não volta para o seu país sua merdinha?Ela abriu a boca, mas não conseguiu responder, um terceiro ovo foi jogado em seu cabelo, ela se encolheu, não havia muito para aonde fugir, abraçou seu próprio corpo.— Vai lá, responde para nós, é verdade que você come morcegos no jantar? Uuuh deve ser infecciosa.Outro ovo foi jogado em sua cabeça, as risadas ecoaram mais alto, ela disse para si mesma que logo perderia a graça, que se esperasse parariam.— Ouviu? — Sussurrou um perto de seu ouvido — Você é infecciosa, volta para o seu país sua asiática de merda.Logo eles iriam embora, disse para si mesma, estava tudo bem. Logo estaria em casa, poderia ouvir suas músicas e jogar os jogos de sempre.Logo tudo ficaria bem.Tudo ficaria bem.Tudo ficaria bem. — O que vocês pensam que estão fazendo? Uma voz ecoou do outro lado, ela se encolheu mais, com medo que fosse outra pessoa com mais ovos para serem jogados, mas quando abriu os olhos percebeu que todos a sua volta ficaram incomod
— Você parece cansada. — É difícil dormir no meio da floresta — Respondo.Sakura balança levemente a cabeça.— É, mas você parece realmente péssima.Faço uma careta.— Você também não está exatamente uma miss universo. Agora andávamos sobre uma área muito menos aconchegante, as árvores se amontoavam entre nós, tudo parecia cada vez mais e mais apertado, e a cada momento eu sentia que algo iria cair em minha cabeça. Fazem dias desde que achamos Sakura e provavelmente mais de uma semana desde que saí de Green Lake. Ninguém parecia bem, estávamos exaustas, sem conseguir dormir direito, se matando pelos restos de comida e água.As coisas só iam ladeira abaixo.O que fazia com que o humor de todas estivesse péssimo, embora surpreendentemente Sakura não estivesse tão ácida como costumava ser em Green Lake, ela parecia mais nervosa, como quem soubesse que se desse qualquer passo em falso Karen a largaria na floresta e a deixaria por conta própria. Apesar de não dizer nada eu sabia que ela
Seus sonhos estavam cheios de tormento e medo. Ele não sabia se acordaria vivo no outro dia. Não sabia se conseguiria sequer se levantar. Eles esqueciam de o alimentar, até mesmo as crianças passavam fome e choravam nos cantos de suas celas. Seus sonhos estavam cheios de sangue e morte, a cada dia que se passava ele via sua família, via eles morrendo um por um, via tudo desaparecendo e ficando mais distante... cada vez mais distante....Eles estavam sendo cada vez mais esquecidos. Deixados ali apenas para serem usados como barganha.Ninguém se importava com eles.Apenas queriam Emma e Channel.Com um pequeno suspiro ele olhou de longe Claire, deitada em sua cela em meio a aquele chão imundo, longe dele, afastada de todos. Apesar de esquecerem de alimentar os moradores, apesar de ele estar morrendo de fome e sede ele sabia que tanto ele quanto Claire eram os mais privilegiados, sabia que eram mais cuidados do que os outros.Os doutores sabiam. Eles sabiam tudo.Sabiam sobre ele e Emm
Havia uma garotinha.Havia uma garotinha, e ela era linda, os cabelos tinham cor de brasa, ruivos de um vermelho incessante. Os olhos eram verdes, havia puxado os olhos da avó. Ela era realmente linda.Passo as mãos pelos pequenos cachos em seu cabelo, ela parece feliz.A observo brincar com uma boneca. Observo ela servir chá para seus brinquedos, cantar e depois ir dormir em sua cama.Eu a observo.E então ela acorda, seus olhos percorrem todo o local até pararem em mim, como se fosse um pedido, ela me chama:— Eu sei que você está aí — Ela diz — Venha brincar comigo.E então estou dentro do quarto dela, não sei como o reconheço, mas assim que coloco os pés no local eu sei.— Filha...Mas então o rosto dela muda.Não há mais o cabelo cor de brasas, não há mais bonecas, não há mais olhos verdes como um jardim encantado.Tudo se torna um borrão, um borrão vermelho e negro ao mesmo tempo.Até que tudo se desapareça por completo e só sobre sangue.Estava sonhando acordada, e eu sabia di
A escuridão tinha olhos e ouvidos. E ela observava Channel, observava cada passo que ela dava. E o cheiro...A coisa estava sentindo o cheiro dela, o cheiro de medo que rodeava Channel, ela sentia os ossos tremerem, sentia a escuridão se deliciando dela, uma garota perdida, a garota solitária. Pobre, pobre Channel. Ela chorava agora. As lágrimas quentes descendo sobre o rosto...— Por que está chorando? — Pergunta a escuridão.— Por causa dos meus erros — Ela responde — Por causa de todas as coisas que já causei.A escuridão ri.— Bom.É a última coisa que escuta antes de ver Mary subir em cima de seu corpo e arrancar a sua garganta.A fogueira ainda crepitava quando acordei, a escuridão permanecia , as estrelas continuavam no céu e a lua ainda reinava.Mas havia algo diferente. Eu ainda estava de certa forma dormindo quando escutei os gritos na floresta, não tive tempo para pensar no que estava acontecendo, me levanto e corro até Channel que grita como se estivesse morrendo.— Está
Sakura se foi. Em todos aqueles dias ela havia mentido e enganado, havia mentido sobre ter nos seguido pela floresta, havia mentido sobre a mudança de comportamento, sobre tudo.Sakura havia nos traído.Os doutores a mandaram para matar Karen, para que pudessem eliminar a ameaça que não era mais do que um pé no saco para eles. Eles a mataram. Sakura a matou. Sakura me traiu, pela segunda vez.Traiu Green Lake.Se ela sempre esteve do lado dos doutores ou se apenas havia feito aquilo para fugir eu não sabia, e nem queria saber. Eu havia sido traída e enganada, de novo, dei tudo de mim e então fui derrubada como se eu não passasse de uma peça em um jogo de xadrez. Mas eu estava cansada. Se sou uma peça de xadrez, então alcançarei ao outro lado, sou um peão, um simples peão sem utilidade alguma, mas chegarei ao outro lado.Me tornarei rainha.E então destruirei cada peça do lado inimigo.Um por um.Uma hora. Dei a mim mesma e a Channel uma hora para ficar de luto por Karen ou até mes
Eu sabia aonde estava antes mesmo de abrir meus olhos. O cheiro era o mesmo, algo como rosas e morangos.E havia mais um cheiro estranho também.Um muito, muito familiar.Quando abro os olhos sei quem eu vou encontrar, e lá está ela, usando um vestido de estrelas e noite, o cabelo ruivo-castanho e os olhos... Era como olhar para um espelho, como olhar para algo além de mim mesma.Eu olhava para minha irmã.Não uma alucinação, não uma imagem ficcional, não mais alguma das vozes em minha cabeça.Era minha irmã.— Acho que você gosta de fazer isso — Ela diz, as primeiras palavras dela direcionadas a mim — Gosta de roubar meu lugar.Olho para ela, os olhos vazios de sempre, a mesma casca.— Mas não importa não é mesmo? — Ela solta uma risadinha — Acho que isso foi apenas uma maneira que o universo achou de fazer piada sobre nosso passado.O passado. Quando éramos pequenas e ela matou a nossa mãe, quando fomos para o orfanato.— As coisas estão se repetindo — É a única resposta que tenho
Depois O cheiro da fumaça do cigarro invadiu o seu apartamento. O doce, refrescante e reconfortante cheiro do cigarro.O cheiro dela.Que um dia já havia sido algo como laranjas e chuva, uma mistura com o da irmã que cheirava a morangos e rosas, hoje não passava de cheiro de fumaça de cigarro.E de bebidas, é claro.Ela se encostou no sofá e inalou tudo, a droga da cidade, a droga da fumaça, o doce e reconfortante cheiro da merda que sua vida havia se tornado.E que grande merda.O único barulho mais irritante do que o da cidade era o da televisão. Aonde se passavam as maiores mentiras existentes. Como se o mundo estivesse voltando a ser como um dia já foi.Mas ao invés de levantar a porcaria da bunda do sofá e mudar de canal, ou para desligar a televisão que fazia sua cabeça doer — é claro que a bebida e os cigarros não tinham nada a ver com suas dores de cabeça — ela assistiu, ficou olhando a garota loira que fingia sorrir.Uma grande piada de fato, até parece que alguém iria acred