Os dias seguintes após o beijo de Kael em Tânia foram um tormento silencioso. Camélia tentava seguir sua rotina normalmente, como se nada tivesse acontecido, mas havia uma sensação de desconforto que a acompanhava constantemente. Seu corpo estava mais pesado, seus sentidos confusos. O cheiro de Kael, que antes a envolvia de maneira inquietante, agora a deixava fraca.
Era como se sua energia estivesse se dissipando, como se algo dentro dela estivesse se fragmentando. E o pior: ela não queria se sentir assim. Não entendia o que estava acontecendo, nem sequer sabia direito quem Kael era para estar gerando tudo isso dentro dela. Não conhecia suas intenções, não sabia o que ele realmente significava para ela. E, ainda assim, a sensação de perda, de vazio, era avassaladora. Ela se sentia totalmente fora de controle, e isso a aterrorizava mais do que qualquer coisa. Tudo estava piorando aos poucos, uma dor crescente que se infiltrava em cada célula de seu ser, como se oO rugido de Camélia ainda ecoava pela casa quando Júlio se moveu primeiro. Seu instinto gritou para agir, para acalmar sua neta antes que fosse tarde demais. Seu coração batia pesado no peito, não apenas pelo medo do que poderia acontecer, mas porque ele já sabia. Sabia o que aquilo significava.— Chame Ricardo! — Sua voz cortou o ambiente, autoritária, sem hesitação.Flor e Gustavo estavam pálidos, os olhos arregalados observando a filha no chão. O corpo dela tremia, os músculos retesados em espasmos involuntários. O pulso, onde a pele queimava há dias, agora parecia uma ferida aberta, latejante com uma energia que não pertencia a esse mundo.Cauã estava ao lado dela, os olhos fixos na irmã. Ele não entendia, mas algo em seu próprio peito parecia pressioná-lo, como se uma corda invisível estivesse prestes a se romper. Gustavo, mesmo sem ser um lupino, sentiu o perigo no ar.— O que está acontecendo com a minha filha? — sua voz saiu baixa, qua
Kael ficou imóvel, a palavra ecoou em sua mente como um trovão e sentiu os músculos se contraírem, cada fibra de seu corpo preparada para a batalha que seu instinto dizia que estava por vir. Mas ele precisava de respostas primeiro.— O que? Minha Luna? O que você tá falando? — Ele exigiu, a voz mais firme do que pretendia. Ricardo respirou fundo, os olhos escuros ainda carregados de incredulidade.— Quando cheguei na cada dela, após de Júlio me chamar, eu falhei em conseguir remediar a situação. Algo que nem Azíria conseguiu, tentamos cercá-la. Ela estava agitada, mas não atacava. Estava desorientada, confusa, como se o próprio corpo fosse um território desconhecido.Kael manteve o olhar fixo no beta. Ela é a sua Luna, sua igual.— Mas então? — Ele questionou —Isso já era de se esperar, já que a loba dela despertou.Ricardo soltou um riso sem humor, passando a mão pelo rosto.— Meu lobo a respeitou, ela é nossa Luna — Ele fez
A consciência voltou como uma onda lenta, arrastando-se pela mente de Camélia como uma maré que hesitava entre recuar ou avançar. O mundo ao seu redor ainda parecia enevoado, uma névoa entre o real e o instintivo. Mas, diferente da última vez, não havia caos. Não havia desespero. Apenas uma certeza profunda e cravada em sua alma: algo dentro dela havia mudado para sempre.Ela piscou, os olhos pesados e a respiração profunda, sentindo o peso familiar dos lençóis de sua cama. O quarto estava mergulhado na penumbra, a luz fraca filtrando-se pela fresta da janela. Mas havia outra coisa, algo dentro dela que pulsava com força, vibrando em sua pele como se sua própria essência tivesse sido reescrita. E, no fundo, tinha sido.Camélia inalou devagar, sentindo cada célula do seu corpo vibrar com uma nova energia. Ela nunca havia se sentido tão viva, tão ciente de cada som, de cada cheiro, de cada batida de seu próprio coração. Flor de laranjeira e mar. E isso a atin
Kael passava dias inquieto, os sentidos aguçados demais, o cheiro de flor de laranjeira impregnado em sua mente. Ele se pegava distraído, vagando pela cidade sem perceber, até se dar conta de que estava perto da casa dos Alencar. O reconhecimento o atingia como um soco no estômago, e irritado consigo mesmo, forçava-se a se afastar. Ricardo percebeu.— De novo, Kael?Kael trincou o maxilar, sem responder.— Você pode tentar lutar contra isso o quanto quiser, mas não adianta. Seu lobo já decidiu.— Eu não vou ceder. — Kael rosnou, a fúria mascarando o conflito interno que queimava dentro dele. Ricardo cruzou os braços, exasperado.— Então continue se enganando, mas não venha reclamar quando isso explodir na sua cara.Enquanto isso, Camélia vivia sua própria tortura. Não importava o quanto tentasse ignorar, a presença de Kael era como um fantasma ao seu redor. O cheiro dele parecia assombrá-la, e a marca em seu pulso pulsava c
Tânia já tinha sido manipulada pelas palavras de Bianca, e isso foi a gota d’água. Seu controle se rompeu. Ela avançou sem hesitar, rápida. A movimentação de seu corpo foi um borrão antes que Camélia pudesse reagir. O impacto veio forte e certeiro, seu punho atingindo a lateral do rosto de Camélia. A dor explodiu em sua mandíbula, fazendo sua cabeça virar violentamente para o lado. O gosto metálico de sangue se espalhou em sua boca enquanto ela cambaleava para trás, os joelhos tremendo por um segundo.Mas não caiu.Camélia se estabilizou e, antes que Tânia recuasse, respondeu. Seus reflexos assumiram o controle, e seu punho disparou em um movimento certeiro, atingindo Tânia no estômago. O baque fez a outra loba recuar um passo, o ar saindo de seus pulmões em um grunhido de dor. Mas Tânia não era uma oponente fácil. Ela se recuperou rápido, avançando de novo, garras se estendendo levemente.As duas começaram a circular uma à outra, avaliando cada movimento.
A noite estava pesada, abafada, como se o próprio ar estivesse carregado da tensão que vinha consumindo Camélia. Sentada no alpendre da casa dos avós, ela encarava o nada, o peito apertado pela pressão crescente do vínculo que não lhe dava descanso. Desde a assembleia, desde a briga com Tânia, tudo parecia ter saído ainda mais do controle. Os cochichos pelas ruas haviam aumentado. Alguns olhares eram de curiosidade, outros de desconfiança. Os lupinos evitavam seu caminho, e os mais ousados até esbarravam nela de propósito. Ela não pertencia ali. Ou, pelo menos, era o que queriam que ela acreditasse. Mas o que a corroía de verdade não era a matilha. Era Kael.Ela sabia que ele a sentia tanto quanto ela o sentia. Ele evitava olhá-la por muito tempo, mantinha distância, mas seu corpo sempre reagia quando estavam perto. E, pior, seu cheiro estava por toda parte. Camélia se sentia sufocada.Quando o ouviu se aproximar, seu corpo reagiu antes que ela pudesse
Camélia se virou a tempo de ver Cauã parado na entrada do quintal, o olhar arregalado de incredulidade. Atrás dele, Madalena e Júlio estavam imóveis, como se tivessem testemunhado algo impossível de ignorar.Kael permaneceu firme. Seu olhar fixo nela. Sua Luna. Sua igual. Não havia mais volta. Mas o momento foi interrompido de forma abrupta.O som de passos pesados ecoou no quintal. Cauã avançava, punhos cerrados, o rosto carregado de fúria. Antes que alguém reagisse, tentou desferir um soco em Kael.O Alfa se moveu rápido, desviou com facilidade e, em um único gesto, empurrou Cauã, que caiu no chão com um rosnado. A força da voz de Kael fez os pelos do irmão de Camélia se arrepiarem. Seu corpo respondeu ao comando do Alfa, reconhecendo a hierarquia. Mas sua raiva fervia. Ele ergueu o olhar, acusador.Júlio e Madalena se aproximaram, ajudando Cauã a levantar. As mãos firmes nos ombros dele eram um aviso silencioso.— O que você pensa que
A manhã parecia se arrastar para Camélia. Desde que havia se levantado, tudo parecia estar dando errado. Mas, no fundo, ela sabia que não era exatamente o dia que estava ruim, era ela. Era a certeza esmagadora que sentia vindo de Kael.Agora, sentada diante do notebook, tentando focar na reunião, sentia-se cada vez mais distante. As vozes ao seu redor pareciam abafadas, como se viessem de um cômodo muito longe. Cauã e seus pais estavam ali, trabalhando ao seu lado, mas sua mente vagava.Quando a reunião finalmente terminou, ela ainda não conseguia se sentir presente. Algo dentro dela se revirava inquieto, como uma tempestade contida. Seu pai e Cauã já haviam saído, mas ela e Flor permaneceram, revisando documentos. Camélia tentava se concentrar, mas seu pensamento retornava, vez após vez, ao toque de Kael, ao calor dele, à forma como seu vínculo rugia sempre que tentava afastá-lo da mente.E então, veio de novo.Uma onda quente subiu por s