17 de abril, 2005
Se eu pudesse, enfiava uma faca na minha garganta.
Não, definitivamente eu não faria isso. Não tenho coragem (e nem vontade) suficiente para tirar a minha própria vida. Mas sinto mal estares severos quando penso na encrenca em que me meti, quando lembro a loucura que cometi na noite passada ou quando penso no caminho que, inconscientemente, tracei para mim.
Não posso mentir, foi bom. Foi bom ser envolvida nos braços dele, sentir seu corpo transferindo calor para o meu, que estava gélido e trêmulo. Foi bom senti-lo tão perto, saber que não havia distância entre nós. E foi uma sensação dos céus
— Jantar? Ele aquiesceu. — Na casa da Jade? Novamente, mais uma afirmação. — Filho da mãe...! Edgar deu um soco fraco no braço de Fergus. O outro riu. — Achei que você fosse desaprovar — comentou Fergus. — Por você estar com ela após uma semana do término com a Cecília? — Pelo menos, a Flor brigou com
7 de maio, 2005 Entra o dia e eu prossigo acordada, sem conseguir sentir nenhuma pontada de sono, embora meu corpo já demonstre os efeitos de uma estafa medonha. Meus pensamentos estão longe, não consigo manter a minha concentração em muita coisa. Acho que, por isso, a insônia me atormenta – no fundo, penso que não quero dormir de fato. Tenho a plena consciência de que criei um grande problema para mim. Não apenas isso, mas assinei um contrato cruel com a dor. Não sei definir exatamente o que sinto por Fergus, só posso afirmar que é algo intenso, que ocupa grande parte do meu peito. Estar perto dele me trás felicidade, abraçá-lo e sentir-me protegida em seus braços me completa. E
— Tenho um convite a te fazer. Ela apenas virou os olhos, mantendo o rosto ainda voltado para o papel que estava sobreposto à mesa, a posição imutável. Olhou-o de relance e voltou a focar os problemas matemáticos que resolvia na folha antes branca. — Faça — disse, sem encará-lo novamente. Fergus respirou fundo. — Quer ir comigo a um rock bar? Vai ser a apresentação de um amigo meu e... Sua frase foi prontamente interrompida por um risinho sarcástico provindo dela. Olhou-a com cenho franzido, sem compreender o porquê da ri
29 de maio, 2005 Se culpa matasse, eu estaria morta. Não digo de arrependimento, porque não me arrependo do que fiz. Não sou de me arrepender e tampouco serei. Mas me sinto culpada, e isso dói muito. Sim, culpada por não ter respeitado a minha casa, os meus avós e minha irmã. Culpada por ter apressado tanto os passos, por não ter esperado todo o tempo que deveria. Culpada por estar intensificando a minha relação com Fergus e isso tornar cada vez mais difícil a minha partida. Não serei hipócrita em dizer que não valeu a pena nenhum segundo vivido naquele sofá. Por mim, repetiria todos os instantes da madrugada
01 de julho, 2005 Não sei de onde arranquei forças para conseguir escrever hoje neste diário. Não sei nem como estou conseguindo segurar a caneta. Meus dedos tremem tanto que, tudo que for aqui registrado, ficará de maneira ilegível – o que poderá ser considerado bom. As desconfianças apenas aumentaram com o decorrer do tempo. A menstruação não descia mais, os sangramentos que surgiram foram abruptamente interrompidos, sem razão nenhuma para ter ocorrido. As dores de cabeça se intensificavam, o cansaço se unia a enjoos e azias insuportáveis. Meus hormônios inteiros estavam em completa avalanche e só existia apenas uma resposta para aquele completo descontrole metabó
01 de agosto, 2005 Mais do que nunca, tive a certeza de que estou no caminho em que deveria estar. Vi que não valeria a pena largar a minha vida, todos os meus planos tão cuidadosamente pensados por um sentimento que não deveria existir. Fergus está bem. Fui hoje à escola unicamente para conversar com ele, ser bem franca e não tentar mais fugir – era mais do que justo deixá-lo a par dos fatos, minha consciência talvez não pesasse tanto depois. Por mais que a sua opinião não interferisse na minha decisão, avisá-lo seria correto. E então eu o vi. Vi e preferi não ter visto, mas sei que foi o melhor que pod
Para ele, é como se o mundo tivesse perdido uma fonte de energia. Não gostava de exageros românticos ou de histórias ao estilo Romeu e Julieta, mas não conseguia sentir-se melhor, mais animado, entusiasmado com qualquer coisa. Jade havia levado consigo grande parte dele, deixando um vazio que não seria preenchido tão cedo. Nunca pôde imaginar que se apaixonaria por alguém daquele modo, que pudesse amar naquela intensidade. Achava que o que nutrira por Cecília era forte. Só então, percebeu como estava enganado. Passou a mão pelos cabelos desgrenhados e longos. A falta de notícias dela o arrasava. Estava aflito com a saúde física e mental de Jade. A cena que vira na última vez em que estiveram juntos não cons
Ele largou a lapiseira subitamente quando a campainha tocou. Era dezesseis de setembro, e a mãe conseguiu um dia de folga – estava em casa, no quarto, descansando o almoço que fizera especialmente para os dois. Por aquele mesmo motivo, pouparia Rosália da aparentemente complicada tarefa de atender o visitante. Abriu a porta. — Adriano? Adriano Fergus? O susto de ver aquele rapaz parado à sua frente o impediu de responder à pergunta. Não estava atordoado apenas por Quartzo ter ido à sua casa – sabia Deus o que ele queria –, mas por ver o estado decadente que seu rosto mostrava – olheiras fundas, face molhada, magreza. Não era um bom sinal.