Estava exausta. E suja, amedrontada e desorientada.
Mas não ousaria parar. Continuar significava estar cada vez mais próxima de seu destino. De sua liberdade.
Não que soubesse muito bem para onde deveria ir. Tinha apenas um mapa nas mãos e um carro cuja gasolina já estava quase acabando. A cidade mais próxima chamava-se Green Hill e ficava a apenas quinze quilômetros de distância. Sim, ela conseguiria chegar. Devia ser um bom sinal.
Enquanto dirigia o carro velho ― roubado, é claro ―, começava a perceber que suas mãos tremiam. Pensara que quando estivesse longe de todo aquele pesadelo sentiria-se melhor, que aqueles sentimentos de medo e insegurança iriam desaparecer. Mas talvez ainda fosse cedo demais. Talvez precisasse de um tempo para se adaptar à nova realidade e superar o passado. Porque esquecer, ela jamais conseguiria. Era algo que ficaria gravado em sua mente e em seu corpo como uma tatuagem.
Tentando afastar aqueles pensamentos, respirou bem fundo e começou a cantarolar uma música, acompanhando o rádio. Começou discreta, quase em um sussurro, não demorando muito para aumentar o tom de voz, passando a gritar letra e melodia. Seus berros logo se sobrepuseram à voz de sua mente, que insistia em mantê-la em pânico, repetindo para seus neurônios que aquilo não daria certo, que seria uma felicidade temporária, efêmera. Mas precisava acreditar. Ao menos para manter sua sanidade.
Ainda cantava desesperadamente, por mais que não conhecesse todas as músicas, quando avistou a placa de "Bem-vindo a Green Hill".
A visão daquela cidade trouxe um imediato alívio ao seu coração. Estava em um lugar aparentemente seguro, com um posto de gasolina, pessoas que poderiam ajudá-la e, provavelmente, restaurantes e uma pensão onde poderia passar a noite, caso fosse necessário. Não que fosse seu plano, mas se conseguisse um emprego ali, quem sabe não pudesse ficar? Parecia um bom lugar para recomeçar.
Foi recebida por uma estradinha com muito verde, permeada por palmeiras que proporcionavam sombra e uma agradável brisa, muito bem-vinda, levando em consideração a falta de ar-condicionado do seu carro. Não demorou muito para que pudesse enxergar a costa de águas cristalinas e a areia branquinha. Sendo uma pequena cidade dentro da Califórnia, era de se esperar que houvesse mar e belas paisagens.
Observando aquela vista, que praticamente acariciava seus olhos, tão acostumados à feiúra de sua realidade escura e sombria, sentia-se cada vez mais decidida a encontrar um espaço para si mesma naquela cidadezinha simpática. Era uma escolha improvável, o que a tornava ainda mais perfeita.
Precisava abastecer o carro, mas sentia muito mais necessidade de abastecer a si mesma. Podia quase ouvir o estômago roncando e as entranhas se revirando de fome. Parou, então, o carro e dirigiu-se a uma cafeteria estrategicamente localizada de frente para a praia.
Entrou no estabelecimento e foi recebida por um delicioso cheiro de hamburger e bacon. Fazia um bom tempo que não tinha uma refeição decente, principalmente porque estava na estrada há alguns dias. Estratégia totalmente planejada para despistar.
Sentou-se e observou o cardápio que estava em cima da mesa. A fome era tanta que seria capazz de comer tudo que estava sendo oferecido, mas optou por um hamburger e batatas fritas com refrigerante, fazendo o pedido à garçonete.
Enquanto esperava, ficou observando as pessoas ao redor. Todas pareciam sorridentes, satisfeitas com o que faziam, por mais simples que pudesse parecer. Era isso que queria para sua vida... queria aquela paz de espírito, aquela sensação de liberdade e de independência. Precisava renovar-se, criar uma nova identidade, uma nova alma.
Interrompendo seus pensamentos, escutou uma voz alegre cumprimentá-la. Assim que voltou seus olhos para quem falava, viu que se tratava de uma senhora de meia idade, de cabelos curtos e pintados com um forte tom de acajú, usando óculos de aro colorido, posicionado na ponta do nariz. Na verdade, tudo em relação àquela mulher era cheio de cores e vida.
― Olá, querida. Aqui está seu pedido. Nova na cidade? ― Seu sorriso denunciava que estava interessada em uma boa conversa.
Por mais que não estivesse muito disposta a falar sobre si, não poderia se isolar do mundo e afastar das pessoas. Tinha plena consciência de que ninguém era uma ilha, ou seja, viver sem a ajuda de alguém, ainda mais na situação em que vivia, era impraticável.
― Olá! Sim, acabei de chegar. ― Era a primeira vez que falava com uma pessoa desconhecida em anos. Não imaginara que sua voz soaria tão frágil ou insegura, levando em consideração que costumava ser uma pessoa tão comunicativa. Pelo menos era disso que se lembrava.
― Pretende ficar?
Uau! Ela era direta! Era um desafio e tanto já ser recebida em sua nova vida por uma pessoa tão peculiar.
― Ainda não sei.
― Se resolver ficar, vai ser muito bem-vinda. ― Ela sorriu de forma muito simpática.
― Obrigada.
― Qual é o seu nome?
Antes de responder, respirou fundo, pois sabia que aquela pergunta iniciaria sua nova fase. Era como a senha para abrir uma porta pela qual não se poderia sair nunca. Uma bola de neve interminável.
― Paige. Paige O'Brien. ― O nome saiu como um sussurro, como se ela quase não quisesse que fosse ouvido.
― Muito prazer, Paige. Sou Cora Fairlane. Se precisar de qualquer coisa, pode chamar.
Quando Cora se afastou, Paige teve a nítida impressão de que aquela oferta não se estendia apenas à cafeteria. Era como se ela estivesse oferecendo ajuda em qualquer momento, em qualquer ocasião. E, de alguma forma, ela sentia que poderia confiar naquela estranha.
Embora confiança fosse algo que ela não estava muito disposta muito disposta a distribuir.
***
O gosto amargo da cerveja gelada descia por sua garganta lhe proporcionando deleite. A solidão também contribuía para que o momento fosse o mais positivo possível. Não que não apreciasse uma boa companhia, mas sempre sentia que, quando estava sozinho, conseguia ouvir melhor seus pensamentos. Porque já fazia um bom tempo que sua mente trabalhava em silêncio, quase sussurrando.
Enquanto bebia, seus olhos percorriam todo o ambiente. Era uma atividade quase diária. Todos os dias, depois do trabalho, ele sempre ia à cafeteria de Cora para tomar a mesma caneca de cerveja sentado à mesma mesa e observando as mesmas pessoas de sempre. Era uma rotina entediante, mas ao mesmo tempo confortadora. Ele sabia que por mais que tivesse vontade de desaparecer, de se arriscar em outro lugar, estava enraizado em Green Hill.
― Mais uma cerveja, Jake?
Aquela pergunta também fazia parte da rotina. Sandra, a garçonete do "Fair Cafe" sabia que Jacob nunca tomava mais do que uma caneca, mas ela sempre perguntava. Ele acreditava que era apenas uma questão de educação, mas muitas vezes ficava irritado.
― Não, obrigado.
E como sempre ela não respondeu nada, apenas balançou a cabeça positivamente e retirou a louça suja da mesa de Jacob, levando-a para a cozinha.
Com a mesa vazia, ele endireitou seu corpo enorme na cadeira, acomodando-se de forma mais confortável, tencionando ficar um pouco mais de tempo ali. Afinal, por qual motivo voltaria para casa? Para assistir a um maldito jogo de futebol na televisão, tomar mais uma cerveja e dormir na poltrona e acordar cheio de dores em músculos que ele nem sabia que existiam?
A verdade era que Jacob odiava voltar para casa. Odiava o fato de que toda a mobília parecia ter o cheiro dela... Todas as paredes estavam impregnadas de lembranças e histórias. E olha que já tinham se passado dois anos desde que ela tinha ido embora, mas ele não tinha perdido aquela maldita obsessão.
Já estava quase decidido a pagar a conta e ir embora quando viu uma mulher desconhecida entrar na cafeteria, o que, em Green Hill, com seus cinco mil habitantes, era quase impossível. Não conhecer uma pessoa, ao menos de vista, era algo totalmente incomum.
Era bonita. Não que fizesse qualquer diferença, mas era algo difícil de não reparar. Os cabelos eram loiros e lisos, na altura do ombro; os olhos, ao longe pareciam azuis, mas não podia afirmar com certeza. Era magra ― talvez um pouco magra demais demais em sua opinião ―, mas compensava na altura. Não era baixinha, mas estava acima da média, por volta de um e setenta, pelo que ele podia calcular à distância.
Apesar da aparência agradável de se olhar, não era isso que mais chamava a atenção em um primeiro contato visual. Era a forma como ela agia. Sua linguagem corporal dizia muito mais coisas do que qualquer palavra que trocasse com ela; coisa que não pretendia fazer, é claro. Mas era fácil perceber que estava amedrontada, acuada e desconfiada. Olhava para todos e tudo ao redor com cautela, como se esperasse o pior das pessoas. Isso era suficiente para que concluísse que havia um trauma muito grande em sua mente. Algo recente e poderoso que parecia persegui-la.
Jacob não queria ficar pensando nessas coisas, pois sabia que iria acabar elaborando várias teorias até ficar completamente curioso e ligado a uma história que nem sabia se era verdadeira, mas que já alimentaria um senso protetor e uma necessidade de descobrir todos os detalhes, como um bom policial faria.
Mas, novamente ajeitando-se na cadeira, tentou se convencer que todo seu interesse por aquela mulher limitava-se ao fato de que, como xerife da cidade, tinha que prezar pela segurança das pessoas. E uma forasteira era sempre uma forasteira.
― E ai, parceiro? ― Pronto! Já era a solidão. Alguém o tinha encontrado ali, e, ao reconhecer a voz, por mais que gostasse muito da pessoa que falava, sabia que ele o alugaria por um bom tempo.
― Oi, Tate! Já estou de saída. ― Curto e grosso. Talvez mais grosso do que gostaria, mas com Tate Barlow não havia muita escolha. Era isso ou duas horas de papo furado e mais umas três cervejas na conta.
Em qualquer outro dia Jacob até gostaria da ideia de uma cerveja com um bom amigo, mas não estava de muito bom humor.
― Eu também. Só estou esperando a Julie chegar. ― Julie era uma das várias garotas da cidade com quem Tate saía.
E, como não poderia ser diferente, assim que ele pousou os olhos na desconhecida, a expressão de cobiça instalou-se em seus olhos.
― Uau! Quem será a loirinha? Você conhece?
― Não. Mas tenho certeza que ela não é daqui.
― Ah, mas não é mesmo. Eu com certeza me lembraria dela. ― Tate fez uma pausa, fixando o olhar na moça por algum tempo, e depois voltou-se para o amigo novamente: ― Ei, você, como xerife da cidade, poderia ir até lá, descobrir quem ela é. A nível informação, é claro.
Jacob não conseguiu não rir da expressão no rosto de Tate e da forma como ele falou.
― Fica para outro dia, tudo bem? Contente-se com a Julie por enquanto. ― O que sem dúvida não era uma opção nem um pouco ruim, levando em consideração que Julie era uma das garotas mais bonitas da cidade.
Assim que terminou de falar, Julie deu dois tapinhas no ombro do amigo e se virou para ir embora.
Contudo, ao passar pela mesa da forasteira, não pôde evitar olhar para ela, por mais que tivesse feito um imenso esforço para resistir. Daquela vez, porém, ela retribuiu o olhar, permitindo que ele tivesse um vislumbre de uma cor de safira completamente incomum. Eram olhos límpidos, únicos, que sustentavam um olhar cheio de sofrimento. Ou seja, não era apenas o seu corpo que gritava que havia algo de errado. Os olhos também...
Maldição! Não ia conseguir mais parar de pensar na mulher!
***
Seu estômago praticamente agradecia por ter recebido comida de tão boa qualidade, principalmente porque, depois do hamburger, ainda pediu um pedaço de torta de limão que estava igualmente deliciosa.
Sentia-se bem ali. Confortável, segura e calma. Ao pensar nisso olhou para as próprias mãos e percebeu que elas não estavam mais tremendo. Já fazia alguns anos que não as via tão firmes ao levantar um copo ou um talher.
Era mais um bom sinal. Mais uma prova de que se conseguisse passar algum tempo longe daquela loucura que fora sua realidade por tantos anos, acabaria tendo a oportunidade de voltar a ser pelo menos um pouco da mulher que fora um dia.
Enquanto descansava depois da refeição, que fora sua primeira do dia, por mais que já fossem seis e meia da tarde, percebeu que alguém a observava. E aquilo a incomodou.
Tratava-se de um homem não muito mais velho do que ela, com uma expressão séria no rosto másculo. Os cabelos eram curtos como os de um militar, castanhos, combinando com os olhos da mesma cor. A altura e o corpo eram intimidadores. E foi exatamente isso que fez com que se sentisse preocupada. Mais ainda quando ele passou por ela para ir embora, não deixando de observá-la uma última vez com aquela sua expressão sisuda.
Um segundo depois de ele ter saído, Cora Fairlane se aproximou de sua mesa, pronta para recolher o prato, talheres e copo.
― Estava bom? ― perguntou, com certeza muito interessada em ouvir um sim.
― Muito. ― Paige fez uma pausa e acrescentou: ― Quem era aquele homem que acabou de sair? Ele estava me olhando de uma forma estranha.
Cora olhou na direção da porta e avistou, ao longe, Jacob se afastando da cafeteria.
― Ah, aquele é Jacob Barnham. Não se preocupe, querida, Jake é assim mesmo. É o xerife da cidade e descofia de todas as pessoas novas que aparecem por aqui.
Xerife? Bem, não precisava ter medo de um homem da lei. Precisava?
― Deseja mais algum coisa? ― Cora indagou, voltando a atenção de Paige novamente para ela.
― Para comer, não, estou satisfeita. Mas pode me informar onde encontro um lugar para passar a noite?
― Claro. Tem a pousada da Zhoe bem pertinho daqui. É só seguir a rua à esquerda até o final. Dá para ir andando, se quiser.
― Estou de carro. Mas acho que vou precisar abastecê-lo.
― Veja se não é sei dia de sorte? Na frente da pousada tem um pousada tem um posto. É só atravessar a rua.
― Muito obrigada! Quanto te devo? ― Paige perguntou, enquanto remexia na bolsa, procurando por dinheiro.
― Nada. Fica por conta da casa.
― O quê? Não, não posso aceitar.
― Claro que pode! Encare isso como um presente de boas-vindas. Se resolver mesmo ficar em Green Hill, volte mais vezes.
Paige não soube o que dizer. Era a primeira gentileza que recebia e não estava naquela cidade nem há duas horas. Talvez fosse um sinal de que era ali mesmo que deveria ficar.
― Obrigada. Espero retribuir um dia ― emocionada, tentou conter as lágrimas. Não saberia dizer se eram de cansaço, alívio ou alegria.
― Não estou pedindo nada em troca. É assim que fazemos aqui em Green Hill: recebemos bem os nossos hóspedes. Vai gostar de Zhoe também.
Sorrindo, Paige se levantou e deixou o restaurante. Mas ela nem sabia que Cora também sorria. Por um motivo muito diferente.
Com o carro devidamente abastecido, deixando-o estacionado em uma vaga no próprio posto de gasolina, Paige seguiu para a pousada indicada por Cora, que realmente ficava logo em frente. A pousada "Z" era bastante simples, mas tinha seu charme. Era limpa, rodeada por flores na entrada, além de um balanço branquinho e romântico. Mesmo que Paige não tivesse sido informada sobre a dona, rapidamente concluiria que se tratava de uma mulher. Tocou a campainha, ansiosa para que alguém a atendesse logo, pois tudo que mais queria era um banho e deitar em uma cama macia e quentinha. Contudo, a pessoa que abriu a porta não devia ter muito mais do que sete anos
Todo mundo dizia que Zhoe Nolan acordava com as galinhas. E talvez estivessem certos. Mas não havia nada que ela gostasse mais no mundo do que assistir ao nascer do sol, sentada em seu balanço na varanda, com uma boa caneca de café na mão. Era a hora do dia que mais apreciava, pois não precisava lidar com o barulho dos hóspedes ― embora não houvesse nenhum ali além de Paige ―, podia relaxar um pouco de sua função ininterrupta como mãe, tendo liberdade para colocar seus pensamentos em ordem. Naquele momento, porém, seus pensamentos estavam voltados para Paige O'Brien. Tudo bem que Zhoe tinha acabado de conhecê-la, mas isso não mudava em nada o fato de que tinha um faro muito bom para pessoas. E a
A casa do xerife era bem mais promissora por dentro, se é que Paige tinha conseguido perceber qualquer coisa quando a olhou, sentindo-se da forma como se sentia. Não que estivesse muito melhor naquele momento, mas ao menos estava tentando. Jacob Barnham era surpreendentemente organizado e limpo. Não parecia haver nada fora do lugar em sua casa, tudo cheirava a lima-limão, como se tivesse feito uma faxina pesada há poucas horas. Não havia quase mobília, só o realmente necessário, mas o que faltava em móveis, ele compensava com porta-retratos. E todos eles guardavam fotos de uma mulher. Paige nem sequer sabia que ele era casado. A mulher das fotos era muito bonita, o que ela não pôde deixar de reparar. Cabelos
A caminhada até a pensão fez bem para Paige. Não saberia explicar o motivo, mas a conversa com Jacob a tinha afetado de forma bastante intensa. Ele quase tinha lhe arrancado uma confissão, algo que ela ainda não sabia se estava preparada. Não que não confiasse em seus novos amigos. O que era estranho, afinal, mal os conhecia, mas sentia que eram boas pessoas. Apesar disso, o problema era outro. Ainda não se sentia pronta para falar sobre o assunto, e talvez nunca se sentisse, mas algum ia teria que desabafar antes que as lembranças explodissem dentro de sua cabeça. Chegando até a pensão de Zhoe, abriu a porta com a chave que ela tinha lhe dado e um sentimento de segurança preencheu seu coraç&at
― E foi isso... nem sei por que ele resolveu aparecer na pensão a uma hora daquelas, mas preferi nem perguntar. Acho que tive medo da resposta ― Zhoe contava à sua tia sobre o episódio da noite anterior, na manhã seguinte. ― Quer dizer então que realmente há um potencial no casal? ― Cora falou enquanto picava uma cebola para preparar o almoço. Ela tinha convidado Zhoe, Paige e Colin para almoçarem em sua casa. ― Tia! Fala baixo! ― Zhoe repreendeu, espiando pela porta da cozinha. Para sua sorte, Paige ainda estava brincando com Colin, observando-o enquanto ele desenhava e falava pelos cotovelos. Vendo que ela não tinha escutado nada milagrosamente, Zhoe voltou-se para a tia: ― Além do mais, você não ouviu nada
Paige andava de um lado para o outro, completamente descontrolada. Fazia tempo demais que não saía para se divertir, ainda mais com um homem. Seu coração estava disparado desde a hora que começou a se arrumar, uma vez que não fazia ideia de que roupa poderia usar, sendo que em sua pequena mochila só havia uma calça jeans, um short e blusinhas básicas. Ainda bem que Zhoe tinha lhe emprestado um vestido azul, florido, leve e lindo, que lhe caíra perfeitamente no corpo. ― Você vai acabar cavando um buraco no chão de tanto andar em círculos. ― Zhoe brincou, enquanto lia uma revista. ― Estou nervosa. E não deveria estar. Vamos sair como amigos.&
― Você é uma vergonha para mim, um demônio! Ela se lembrava de cada ofensa, cada palavra terrível que ainda ecoava em sua cabeça. Lembrava-se de cada golpe que recebia enquanto as frases feriam tanto quanto as mãos pesadas e o cinto. ― Eu deveria ter te deixado sozinha para sobreviver sem a ajuda de ninguém. Só assim você veria o quanto é difícil ter que se virar sem ninguém. Ainda mais sendo tão burra e vadia como você. A força de outro golpe a atingiu em cheio, mas finalmente também fez com que ela acordasse. Sentou-se com um pulo, com a respiração entrecortada e uma
A bebida tinha gosto de mágoa. Cada gole que colocava para dentro descia por sua garganta como uma lâmina afiada que ia cortando cada partezinha do seu corpo. Até o uísque tinha um gosto diferente. Tinha gosto de Zhoe. Estava entupido de frustrações dentro de si. Seu coração parecia pronto para explodir a qualquer momento. Só que ele não fazia ideia de quais sentimentos resultariam daquela explosão, quais seriam espalhados por todo lado. ― Está com uma cara péssima, parceiro ― Peter falou, aproximando-se do amigo.&n