3. Ridicularizada - Parte 2

Flora tremia se lembrando do acontecido, o nojo tomou conta do seu corpo, ela se sentia suja e incapaz, se lembrou de tudo o que seu ex havia lhe dito e pensou consigo mesma se tudo aquilo não era verdade. Será que ela só era um pedaço de carne? Não! Ela era muito mais do que aquilo. Seu peito doía e em sua garganta surgiu um nó, faz muito tempo desde que tivera uma crise de ansiedade, a chuva forte caía sem parar, a deixando com muito mais frio do que antes estivera, ela desejou uma ajuda, mas quem faria isso por uma desconhecida?

Uma BMW preta começou a andar lentamente ao seu lado, e novamente a sensação de medo surgiu, o vidro foi baixado, ocultando a verdadeira face do motorista, ela não ousou olhar, até que a voz a fez olhar rapidamente para dentro do carro escuro.

— Assim você ficará doente, sabe disso, não é? — Perguntou o homem no qual ela tentava a todo custo ver quem era, mas só ouvir a voz ela achava familiar, e a calmaria tomou conta. Ela confiava no dono daquela voz. — Você é muda ou algo do tipo? — Indagou novamente.

— Não, eu só… — Calou-se, ela não queria explicar os seus motivos para um completo desconhecido.

— Entra no carro — Ele pediu.

— Estou molhada, não quero molhar o banco e nem suja-lo. No momento não tenho dinheiro para te pagar uma lavagem. — Disse inocente o fazendo rir, só que de forma irônica.

— Lavagem não é o problema para mim, e muito menos o banco molhado. Se te fizer bem, tenho outros carros no qual posso usar. — Respondeu para a moça se gabando.

Enquanto pensava se queria ou não entrar no carro, se queria ou não ficar encharcada, Flora hesitou por alguns segundos até abrir a porta de trás do carro e se sentar, colocando sua mala ao seu lado. Com o carro escuro e as ruas do mesmo jeito, ela pode reparar que o homem dirigindo era forte e musculoso, e que também estava molhado, julgando que ele também teve que passar pela tempestade de chuva.

— Seus pais não te ensinaram a não entrar em um carro de um estranho? — Indagou.

— É que… — Pausou — Se eu não aceitasse, o risco de doença ia aumentar, e que… — Novamente pensou no que falar e em como falar. — Sua voz me passou tranquilidade, senti que não me machucaria.

— É, você tem razão. — Ele responde fazendo a moça arregalar os olhos — Para onde você vai?

— Para a casa de Cibelle Warren, ela mora a três quarteirões daqui.

— Sei bem onde fica a casa dela.

— Você a conhece?

— Claro! E toda a sua família também. Seu esposo, marido, filho e irmão.

— Compreendo.

— Me diz, por que está indo para casa dela a essa hora da noite?

— Razões pessoais. — Respondeu, mas a verdade era que ele já sabia.

Ryan não disfarçava em momento algum, muito menos enquanto a encarava pelo espelho do carro, seus olhos pequenos e cansados, despertavam em Ryan uma vontade enorme de protegê-la de todo o mal, coisa que ele nunca havia sequer feito por qualquer outra pessoa. Os olhos da moça entregavam que ela estava chorando há poucos minutos antes, e aquilo foi o ápice para partir o seu coração. Ryan nada dissera, assim como ela também não. Cerca de dez minutos depois, Ryan a entregou ao seu destino final — parou o carro em frente à casa de sua amiga distante e observou novamente a moça que estava nervosa.

— Chegamos ao seu destino — Disse evitando o contato pelo espelho.

— Obrigada — Apertou ambas as mãos demonstrando nervosismo. — Olha, desculpa ter te incomodado, não tive um dia legal, obrigada por tudo.

— Se cuide — Foi a única coisa que ele disse antes dela sair do carro.

Assim que Flora chegou à porta da mansão, Cibelle saiu antes mesmo que a moça acertasse a campainha, observou o homem no carro que após um aceno de cabeça da mulher saiu cantando os pneus.

— O que houve com você? — Perguntou Cibelle a Flora a olhando da cabeça aos pés.

— Adam pediu o divorcio e me expulsou de casa. — Disse.

Flora desabou em lágrimas no ombro da sua amiga, que não se importou da amiga estar molhada, melhor do que ninguém, Cibelle conhecia a história do casal, como foi uma das maiores apoiadoras da relação. Era visível o desespero de Flora, depois de tudo o que passou ao lado de seu ex-esposo, ela não merecia nada daquilo.

Levando a amiga para dentro da mansão, Cibelle acalmou a sua amiga e prometeu ajudá-la em tudo o que ela precisar, acolheu com roupas e um quarto quente e confortável, além de mandar os seus empregados secar a roupa da amiga e levar uma refeição em seu quarto. Flora não poderia estar mais grata por tudo o que a amiga estava fazendo. Flora já não tinha mais forças para chorar, tudo se repetia como um looping, então ela percebeu que aquela não era verdadeiramente ela. Seus olhos foram pesando, sua mágoa e indignação não a permitiram que comesse a sua refeição, e se entregando ao cansaço, ela adormeceu.

*————*————*

Quando o dia raiou, Cibelle ajudou Flora a se recompor por causa da noite anterior, ajudou a amiga em sua maquiagem e roupas, além de levá-la após o café da manhã, para a empresa. A fofoca se espalhou rapidamente pela empresa, alguns olhavam para a moça com pena, outras pessoas cochichavam palavras maldosas que a fizeram se sentir mal, mas a mulher não deixou transparecer, pois tinha ouvido as palavras que a amiga lhe dissera logo pela manhã.

‘’Você é melhor que todos eles, em todos os aspectos.’’

Seguindo para a sala de reunião da empresa que ela conhecia bem e que tinha várias lembranças nela com o seu ex-marido, Flora esperou que cada um chegasse à empresa para a grande notícia. Demorou cerca de trinta minutos até que todos os funcionários e patrocinadores chegassem, sendo o último, Adam. Que olhou para a ex-esposa e mãe do seu filho com desprezo e nojo.

Os homens reunidos na mesa não entendiam o que Flora estava fazendo ali, já que por eles, ela era vista como apenas uma dona de casa incompetente, mas isso passava longe da sua realidade, já que uma boa parte dos itens vendidos na empresa, era ela que fazia o designer.

— Bom dia a todos e a todas! — Anunciou Adam — Reuni todos vocês aqui hoje para anunciar que a Flora Louise, minha ex-esposa, se tornará a partir de hoje a Acionista Majoritária da empresa — Disse com desdém, e então, os comentários de insatisfação começaram.

— Você está fazendo alguma piada de mal gosto conosco? — Perguntou Annah, uma das sócias da empresa.

— Ela não é qualificada para esse papel, e você sabe perfeitamente bem disso Adam. — Meyer disse indignado, afrouxando a gola de sua camisa já vermelho de tanta raiva que estava pela notícia.

— Sei que essa mulher só serve para ser dona de casa, mas devemos aceitá-la em nossa empresa. — Disse Adam, com seu tom de arrogância fazendo de tudo para humilhá-la.

— Devo lembrá-los que essa empresa também é minha? Já que fui uma das responsáveis por criá-las? — Lembrou ela, fazendo com que todos se calassem — Vocês terão que me aceitar nessa empresa como uma superior, querendo ou não. A decisão foi tomada e creio que ninguém aqui será contra, correto?

Ninguém respondeu a sua pergunta, todos estavam calados de cabeças baixas, mas no fundo ela sabia que ninguém ali a queria no poder. Sem mais perguntas e apontamento de seus colegas de trabalho, Flora levantou-se, pegou sua bolsa e seguiu para a porta da sala para ir em direção a sua nova sala na empresa, mas antes que fosse, olhou no fundo dos olhos do seu esposo e sorriu para ele, que ficou pálido com a atitude da esposa.

— Passarei na mansão para buscar o resto das minhas coisas.

Adam não falou nada, e se sentindo vitoriosa, Flora foi até a sua sala radiante. Os funcionários a olhavam com nojo e a julgavam como incapaz, ela ouviu cada palavra de desgosto vindo de algumas dela, que ignorou, agora todos teriam que aguentá-la na empresa, porque essa, também era dela. Empolgada, antes que ela abrisse a porta por completo, uma voz que doeu seus tímpanos a fez se sentir enjoada. Rosalyn e sua mãe estavam em sua empresa.

— Aproveite o seu tempo de sucesso enquanto você pode, isso não durará por muito tempo — Ameaçou Rosalyn tirando risos de sua genitora.

— Bom, o mesmo digo para você Rosalyn, se ele me traiu com você, com certeza fará o mesmo assim que se cansar.

— Não me compare querida — Ela se aproximou e pegou o seu pulso, gravando as suas grandes unhas na pele clara da moça. — Em todos os aspectos, sou melhor do que você. — Disse, e sem paciência Flora a empurrou que caiu no chão de forma vitimista.

— Amor, eu não fiz nada com ela, ela me agrediu!

Rosalyn se fez de vítima novamente e a sua mãe concordou com as mentiras da filha. Aquilo foi a gota d’água para Adam, que reagiu de forma inesperada deixando todos no lugar em choque. Sem que Flora esperasse, Adam deu-lhe um tapa em seu rosto, fazendo a sua cabeça virar bruscamente para a parede, onde a bateu, adquirindo um corte. Ninguém ousou defendê-la, ninguém ousou ajudá-la e novamente ela se viu sozinha.

Flora novamente não conseguiu segurar o choro, colocou a sua mão na queimação do seu rosto e encarou Adam que aparentava estar arrependido, mas não demonstrou. Depois de muito tempo, ele a havia agredido novamente, não era a primeira vez, mas seria a última.

— Quem você se tornou, Adam? — Indagou para o ex-marido que tentou se aproximar.

— Flora…

Ignorando completamente o seu ex-marido, Flora saiu da empresa o mais rápido que pôde indo direto para a delegacia mais próxima, não era a primeira vez que Adam a agredia em momentos de raiva, ela acreditou em suas palavras quando ele jurou-lhe que seria a última vez, e no fim das contas, não foi. Chegando à delegacia, o coração de Flora disparou quando ela bateu em uma grande costa larga, e reconheceu o dono dela. Foi então que as memórias da noite anterior vieram à tona, Ryan novamente a encontrou, só que dessa vez, o homem cheirava a sangue.

A encarando com desejo e saudade, Ryan a observou da cabeça aos pés, que corou de imediato, mas sua face não era tranquila, e sim raivosa — afastou cuidadosamente o seu cabelo e verificou o seu corte, saindo em seguida sem dizer nada, ele era capaz de matar quem fizera isso com a moça.

Flora encontrou-se com o delgado e o escrivão, que após ouvi-la com atenção, elaborou uma intimação para que seu ex-esposo comparecesse à delegacia para esclarecer a sua parte da história. Ryan do outro lado se encontrava furioso, e fazia questão de demonstrar, toda a sua vida fora protegendo-a, mesmo que indiretamente, e novamente ela precisou de ajuda e ele não pôde fazer nada.

Ryan e seus subordinados, planejavam algo, e com aquilo, logo ele fora se acalmando, percebendo que Flora havia acabado de chegar à recepção, Igor, seu subordinado, fora mandando até a moça com um remédio para dor de cabeça, enquanto a enfermeira da delegacia tratava o seu pequeno ferimento.

— É para a senhorita — Entregou o medicamento com uma garrafa de água para a moça — Isso cuidará das dores.

— Quem entregou?

— O meu senhor. — Respondeu dando uma breve curvada — Com licença madame.

Flora olhou em direção ao carro, onde viu as costas largas de Ryan entrando em seu carro, e mesmo depois de tudo o que aconteceu entre eles, ele ainda a protegia.

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