Capítulo 57 Maeve Jhosef“A vida tem um talento cruel para florescer onde menos esperamos. E mesmo assim... floresce.”Era para eu estar em paz.Era para o fim daquela noite ser apenas mais um fim. Mais um descanso ao lado dele, um lugar onde o mundo não gritasse, onde o tempo não acelerasse.Mas desde aquele banheiro, desde as três linhas azuis que sorriram para mim sem que eu estivesse pronta para sorrir de volta, tudo dentro de mim se tornou ruído.Isaac tentou esconder o medo por trás da firmeza.Eu tentei esconder o desespero por trás da negação.E juntos, passamos os dois dias seguintes como quem caminha sobre o gelo: medindo cada palavra, temendo cada passo.— Você ainda acha que pode ser só estresse? — ele perguntou baixinho, no segundo dia, quando me encontrou sentada na varanda do escritório com os olhos perdidos no céu nublado.— Eu não sei o que acho — respondi.Era verdade.A verdade é que nada estava em seu lugar.O meu corpo parecia não ser mais meu.A empresa nos pres
Capítulo 58 Isaac Aubinngétorix “Há dores que o tempo não desfaz. Apenas ensina a respirar por entre elas.”A casa dos meus pais nunca pareceu tão sufocante.As palavras malditas, cuspidas como veneno na mesa de jantar, ainda ardiam na pele.Minha mãe, de olhos duros, exigia explicações. Meu pai, com o cenho pesado, cobrava escolhas.E tudo o que eu conseguia pensar era em como, mesmo depois de tudo, eles ainda tentavam controlar minha vida como se fosse uma empresa mal administrada.— Isso é um absurdo, Isaac — meu pai disse. — Você se deu conta do que está fazendo com a sua reputação? Com o nome da nossa família?— Eu estou construindo a minha família agora — respondi. — Com ou sem a bênção de vocês.— E a Arlene? — minha mãe gritou. — Ela é sua noiva!— Ela nunca foi nada além de uma estratégia — cuspi com a voz firme. — E não vai mais se aproximar de mim. De nenhum de nós. Se insistir, terá que lidar com os advogados.O silêncio caiu com peso. Um silêncio que não era aceitação.
Capítulo 59 Maeve Jhosef“Antes do silêncio… vem a dor. E ela grita.”Eu não sabia quanto tempo fiquei ali parada.Talvez um minuto. Talvez uma vida inteira.O chão sob meus pés parecia frio demais. O vento, denso demais. Meu corpo, pesado demais para se manter ereto diante daquela verdade que, sem aviso, partiu tudo o que eu conhecia ao meio.Ezra escolheu morrer.Essas três palavras rasgaram meu peito com a ferocidade de mil navalhas silenciosas.Ele escolheu.E Isaac... Isaac sabia.O amor que me sustentava até então se dissolveu em névoa.Não porque deixou de existir. Mas porque agora ele ardia.E ardiam as perguntas que se amontoavam como destroços atrás dos olhos.Por que ele nunca me contou?Por que ele carregou sozinho esse fardo tão monstruoso?Por que me deixou mergulhar na culpa de acreditar que eu não fiz o suficiente, que não corri o bastante, que não o salvei?Minhas pernas cederam antes mesmo de eu perceber.Sentei na grama úmida ao lado da lápide, sem olhar para Isaac
Capítulo 60 Isaac Aubinngétorix “Algumas guerras só terminam quando se decide parar de sangrar.”Era estranho.Estranho acordar e não carregar mais sozinho o segredo que me consumia por dentro.Estranho ver Maeve ali, inteira… e ainda assim quebrada pelo peso da verdade que mantive escondida por tempo demais.Ela não me odiava.Mas a mágoa… era uma presença densa, constante, ocupando o espaço entre nossos corpos mesmo quando dividíamos o mesmo lençol.Eu a entendia.Porque, de todas as pessoas no mundo, ela foi a que mais amou Ezra.E ele… decidiu partir sem permitir que ela lutasse por ele.Agora estávamos aqui — eu, ela e o filho que crescerá dentro dela — tentando dar um nome novo para tudo o que restou.A gravidez trouxe uma urgência silenciosa para nossa realidade.Mudamos pequenas rotinas.Ela passou a comer em horários mais regrados.Eu passei a verificar três vezes se a escada tinha o corrimão firme.Mas mesmo nas pequenas coisas, havia um cuidado assustado, como se qualquer
Capítulo 61 Maeve Jhosef “Antes do sim, há o silêncio que antecede a coragem.”Eu não respondi naquele momento.Não com palavras.Mas com o peso do olhar que repousou no dele, dizendo: “Talvez... sim.”Ou talvez fosse só o medo dizendo que eu ainda não sabia como amar alguém depois da morte.Mas a vida — a nova vida — não esperava nossas hesitações.Era madrugada quando me sentei no chão do quarto, com a agenda de anotações aberta no colo e o coração descompassado.Não era um casamento qualquer.Era o início de uma história que ninguém imaginou que existiria.Eu e Isaac...E o filho que vinha como um novo elo entre dois mundos partidos.**Contei primeiro para os meus pais.A notícia da gravidez já havia os transformado em guardiões discretos de mim.Mas quando pronunciei a palavra casamento, algo brilhou nos olhos deles — como se, enfim, vissem futuro onde antes só havia ruína.— Vocês vão se casar? — minha mãe, Helena, repetiu, como se quisesse ter certeza de que ouviu corretament
Capítulo 62 Isaac Aubinngétorix “Alguns amores não fazem barulho. Eles apenas acontecem — como a respiração, como o tempo, como um milagre que ninguém ousa nomear.”Dois meses se passaram.Rápidos, intensos e suaves ao mesmo tempo.Como se a vida, cansada de tanto nos testar, estivesse finalmente nos concedendo trégua.Maeve agora caminhava com as mãos quase sempre sobre a barriga — um gesto instintivo, como se estivesse sempre protegendo o mundo inteiro.E talvez estivesse.Ali, dentro dela, pulsava uma nova vida.Nosso filho.Nosso começo.Havia um tipo de poesia em vê-la assim, todos os dias um pouco mais redonda, mais delicada, mais forte.Como se estivesse se transformando diante dos meus olhos, e ao mesmo tempo permanecesse ela mesma: selvagem, silenciosa, intensa.**Decidimos nos casar no jardim dos pais dela.Nada grandioso.Sem listas de convidados intermináveis.Sem fotógrafos escondidos atrás de árvores.Apenas flores.Apenas o essencial.Apenas o que éramos: um casal qu
Capítulo 63 – Maeve Jhosef "O amor verdadeiro não grita. Ele sussurra entre as dores, floresce no meio da ruína e permanece mesmo quando tudo o mais se vai."O dia amanheceu com um silêncio raro. O tipo de silêncio que não fere, mas embala. Que não pesa, mas acolhe.O vento dançava entre as folhas do jardim dos meus pais como uma bênção antiga, e as flores - ah, as flores... - pareciam mais vivas do que nunca. Talvez soubessem que estavam testemunhando algo que vai muito além de um simples "sim".Eu ainda me lembrava de tudo que perdemos. Ainda carregava os fantasmas. Mas, naquele dia, vesti meu vestido leve como quem veste uma nova pele. A pele da mulher que sobreviveu. Que amou e foi amada. Que caiu e levantou, mais de uma vez.Zola ajeitou meu cabelo com lágrimas nos olhos. Amanda não parava de sorrir. Minha mãe, ao me ver pronta, levou as mãos à boca e chorou como se me visse nascer de novo.E talvez visse.Quando caminhei pelo jardim, meus olhos só encontraram os dele. Isaac. M
Epílogo – Anos depoisMaeve JhosefA vida acontece nas brechas.Entre uma risada que explode no fim da tarde e o silêncio sereno de mãos entrelaçadas sob a mesa do café da manhã.A vida acontece enquanto se varre o quintal, se embala uma criança no colo e se observa o mundo girar — menos cruel do que parecia no início.Ezra — nosso filho — tem os olhos do tio que ele nunca conheceu.Olhos que carregam um oceano de histórias e um brilho curioso demais para caber num corpo tão pequeno.Ele corre pelo jardim agora, segurando o avião de madeira que Isaac mesmo esculpiu numa noite de insônia e saudade.É engraçado como a dor nos ensinou a amar com mais coragem.Como as perdas nos ensinaram a ser inteiros.talvez não sejamos capazes de superar totalmente todos os nossos traumas, mas aprendemos a conviver com a dor de forma que não interfere na nossa confiança ou no amor que sentimos um pelo outro.— Mamãe, olha! Ele voa! — ele grita, e eu rio.Porque não importa que o avião tenha caído no m