Sigmund sabia, mas não tinha experiência prática, mas Jagish ajudou. Sua inteligência marcial era esplêndida e ele compartilhou tudo que pôde. Por quatro longas horas Sigmund se divertiu, sorrindo como uma criança inebriada após um doce bombardear seus sentidos. — Juntem-se e vamos ao uso do chi. Venham ao centro, uma dupla por vez. Terão um raio de dez metros, ultrapassar significa punição. Os que não estiverem praticando, ficam ao meu lado. Maung Jagish e Maung Sanjiv formarão uma dupla. Maung Sigmund se ausentará deste exercício. — Não posso? — questionou Sigmund, olhando-o, frustrado. — Crê conseguir lidar, Maung Sigmund? Não me responda ainda. Sente ao meu lado e observe. Ao fim, se quiser, permitirei que tente. — Se não conseguisse lidar, não teria machucado Maung Tarendra — disse Tarusa, em defesa de seu irmão. — Não quis machucá-lo. Eu estava instável e ele veio. Não podia deixar e o jeito de afastar foi aquele. Se fosse você, teria feito o mesmo. — Ninguém em sã consciê
O corpo de Sigmund revoltou-se, animado pelos sentimentos que o mantinham submerso, se afogando em suas próprias angústias. O menino enxergava, mas não ouvia. O aroma do incenso, queimando no pagode, tão odiado, não podia ser sentido; o cheiro do cabelo de Ranna, perfumando o local, tão amado, não era possível de ser sentido. Enquanto tentava, fracassadamente, retomar o controle de seu corpo, observou o caminho até o monastério… o caminho até Ketu. Ketu aproximou-se, sentando-se próximo, recitando seus mantras. A visão de Sigmund turvou e seu corpo parou. Outros monges juntaram-se a Ketu, buscando alcançar Sigmund, mas o menino, ouvindo suas vozes, irascível, dificultou que o alcançassem. “Não quero vocês aqui!” Foi cerca de seis horas, sem sucesso para Ketu e seus monges. Percebendo que não desistiriam, Sigmund decidiu combatê-los agressivamente. Ainda era seu íntimo e ali ele era mais poderoso. Ao observar leves hemorragias nasais em alguns monges, Ketu gesticulou para para
Foi uma hora e meia de cochilo para Ranna, atrapalhado pelos monges entrando com as refeições. Ela banhou-se e ao voltar, Sigmund estava sentando. Ela correu, deixando o que estava fazendo para depois. — Filho meu, como está? Ranna observou que o púrpuro olhar do menino fora substituído por um castanho bem claro. Suspirou, preocupada, acariciando seu rosto. — Sigmund, está bem? — Ela insistiu. — Bom dia, minha mãe. Estou bem. Faminto. Vou ao banho. — Precisa de ajuda? — Acredito que sim, me sinto fraco. Dormi muito, talvez!? Ranna o pegou no colo, como não o fazia há algum tempo e o levou ao banho. Terminando, o arrumou e ambos tiveram sua refeição juntos. — Devo procurar Ketu Gyi para ir ao treinamento? — É bom que fale com ele, eu estarei em casa, tudo bem? — Sim, senhora. — Sigmund assentiu, terminando de comer. O menino deixou o quarto, guiado a Ketu, por um monge. — Bom dia, Maung Sigmund — cumprimentou Ketu que estava, como sempre, em posição de lótus, de olhos fechad
Sigmund observou Ranna aplicar seu chi para proteger-se, tornando a infusão menos letal. Sua alma começou a distanciar devagar, não tardando para a dor chegar e quanto mais distante, mais intensa era dor. A sensação de tristeza e solidão era maior, frente ao corpo imóvel de Ranna, vendo sua pele empalidecer. Sigmund manteve-se concentrado, lutando contra si enquanto buscava uma forma de lidar com aquilo. Observou o elo, que os ligava tão intimamente, esticado, vibrando. “Este é o motivo da dor, provavelmente.”, presumiu. “Se é uma ligação emocional, só pararei de sentir quando ela morrer ou quando conseguir me desprender…”, refletiu, balançando a cabeça. “Não posso deixar de amá-la, ela me deu a vida! Vulnerável, pensando nos outros, tenho uma responsabilidade com ela.”, argumentou, consigo. Os momentos finais do exercício ocorreram com os sinais de fadiga e o suor espalhando-se por ela até seu retorno efetivo ao corpo. Sua demora para despertar foi inquietante! — Sigmund — cha
Sigmund despertou, saltando da cama. Olhou ao redor buscando pelo mau espírito. Ouvindo-o, Ava correu para acudi-lo, deixando o que fazia. — Calma… estou cozinhando para levá-lo em casa — disse, deitando-o. — Você está bem, na minha casa. Lembra o que aconteceu? — Tarusa. Acertou o ombro e caí. Pedi para parar e ele chutou, deve ter machucado porque senti um gosto estranho. A peta enraiveceu e falou e puniu! Não quero mais, Ava Gyi… — O menino chorou. — Não aguento! Estou cansado, não quero mais! Fiz tudo certo, aguento diariamente e não é suficiente!? Ava Gyi, precisa me curar, me consertar! — Me perdoe, maung! — disse Ava, impotente, abraçando-o. — Não sei o que acontece e por isto não posso oferecer mais ajuda. Preciso que seja forte, quero te ajudar. Então, conversa comigo. — Não quero. Não aguento. Continua doendo. Todos fingem que não acontece. Não aguento! Ava Gyi, me ajuda! — Ele implorou. Ava o abraçou forte e Sigmund chorou até desfalecer em seu colo. *** Sigmund acord
Sigmund despertou com Ava o banhando com um tecido úmido, olhou ao redor e, apesar da visão embaçada, identificou estar em casa. Ava sorriu, aliviada ao vê-lo desperto. — Bom dia, maung. Como está? Presumo que faminto! — Ela sorriu. — Sim. Posso me banhar, Ava Gyi. Não se preocupe. — Ele sentou. — Claro que me preocupo, maung! Você dormiu sete dias ininterruptos. Os únicos sinais de consciência que observei foram nos momentos inquietos das sessões de Ranna. Como se sente? — Os olhos estão pesados, a visão está embaçada, mas estou bem, Ava Gyi. Faminto! — exclamou, sentindo o estômago reclamar. — Terminarei de banhá-lo e trarei a refeição. Mi Ranna está descansando, teve um péssimo desempenho nas sessões esta semana, logo está muito cansada. Mantive você nutrido e hidratado com o chi, mas, nos próximos dias, você precisa se alimentar e beber bastante água. — Sim, senhora! — assentiu Sigmund, se ajeitando para ajudar Ava. Ao fim do banho, Ava o trouxe uma refeição leve e um lahpe
Sigmund despertou, deitado em uma cama confortável. Observou o cômodo e a arquitetura era diferente. Uma das velas de um castiçal, próximo à porta, mantinha o nível baixo de luz possibilitando-o ver a acomodação. As paredes eram ornadas com escritos, acesos com um leve brilho fátuo. Havia uma mesa de cabeceira próxima — com livros e cadernos de partitura em branco, canetas-tinteiro e tinta nas gavetas. Um jarro com água e uma caneca de barro vazia, estavam sobre a pequena mesa. Sigmund sentou, observou estar vestindo calças largas; o tronco estava enfaixado, embebido por um unguento de cheiro bom. Ele se levantou e foi ao armário nos pés da cama, onde encontrou alguns quítons — vestes gregas — negros, sandálias de tamanhos variados, feitas com tiras de couro trançadas. Uma partitura estava entalhada no interior do armário, o que dava sofisticação ao simples móvel. Dado o nulo contato, Sigmund entendeu as notas musicais como iguais aos caracteres na parede. Deixando o quarto, ele
— Criança, precisa lavar o rosto antes do jantar — chamou Althea. Ela segurava uma bacia com água e uma toalha limpa. Sigmund acordou, lavou o rosto e o secou na toalha, manchando-a com as lágrimas negras. Ele acanhou-se ao vê-las e desconcertado, disse: — Desculpa sujar a toalha. — É só uma toalha. — Althea sorriu. — Sujamos todas para que não as chore. Uma criança não deveria derramá-las. É triste, mas reparável. — Creio que ninguém normal deveria chorar assim, não!? — Elas percorrem um longo caminho do interior de nossa alma até se manifestarem através de nossos olhos. Carregam consigo sentimentos e memórias, bons ou ruins. Às vezes, carregam parte de nós e estas são as piores! Pois, levam este pedaço embora, de forma irreversível. Ela deixou a bacia sobre a mesa de centro e caminhou com Sigmund. — Temos três refeições no dia, uma ao amanhecer, uma à tarde e uma à noite, opcionalmente há uma refeição antes de dormir. São quarenta sacerdotes, incluindo-me, no templo. Então, s