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Descuido - Parte 1

As garotas tinham voltado para casa pouco depois das dez, mais de uma hora antes do combinado com a mãe de Ash. Deborah costumava permitir que elas chegassem até onze e meia nos finais de semana, mas a dupla nunca chegara no prazo limite. Tinham costume de ficar mais em casa que na rua e sempre voltavam mais cedo.

Agora tinham um motivo maior para querer estar na privacidade do quarto da morena.

Naquela noite, após voltarem, Debbie assara uma pizza para as duas e como de costume, Ash comera quase tudo. Lori ficava se perguntando como a namorada era capaz de comer cinco pedaços de pizza e não engordar. Ela mesmo comera dois porque fora forçada, duplamente forçada, uma vez que Ash e a mãe insistiam para que ela desencanasse da ideia de que estava engordando demais. Não eram as duas que sentiam o soutien apertando toda vez que tinha de vesti-lo. E não queria admitir que precisava comprar um número maior. Isso seria o mesmo que reconhecer que tinha engordado.

Após comerem mais que o necessário, tinham seguido para o quarto. Desde sempre havia um colchão extra no quarto de ambas em suas casas, justamente pelo fato de que uma sempre estava dormindo na casa da outra. Agora, por precaução, continuavam arrumando a segunda “cama” ao lado da cama principal, para o caso de alguma visita imprevista das mães ao quarto, mas acabavam dormindo ao lado uma da outra quando tinham privacidade.

A intenção era assistir filmes e fazer amor, mas Ashley admitira que havia comido demais e estava exausta, caindo em um sono profundo bem antes da amiga. Para Lorena era irrelevante, sabia que iriam fazer amor tão logo acordassem, o que realmente aconteceu na manhã seguinte. Contudo, naquela noite, após a porta do quarto estar trancada e as duas nuas dividindo o mesmo abraço na enorme cama de casal de Ash, a loira ficara pensando no quanto era feliz, mesmo com a dificuldade de manter o namoro em segredo.

Lori sequer se lembrava de já ter gostado de algum menino. Claro que já tinha gostado, mas não daquela forma, não do jeito que se sentia em relação à amiga. Deitada ali com seus braços enlaçados em sua cintura, sob a luz cálida de um único abajur bege, a garota sentia o cheiro da pele e dos cabelos da namorada. A cada suspiro de Ash enquanto dormia ela suspirava também. Seu coração disparado no peito.

As coisas podiam ser diferentes, mais fáceis. Elas poderiam ter famílias mais tolerantes. Mas infelizmente não tinham. Ninguém escolhe a família em que vai nascer. E apesar de tudo, mesmo com as dificuldades, ela nunca trocaria os pais que tinha por nada.

Ao menos enquanto elas conseguissem manter a discrição e o sigilo tudo estaria bem.

♥♥♥

Lori espreguiçou-se na cama esticando os braços para os lados enquanto torcia os lábios ainda com os olhos fechados. Ao abrir de leve os olhos vira o vulto próximo ao grande espelho, um vulto de uma mulher magra com longos cabelos negros.

—Sonhei que estava fazendo amor essa manhã, queria que não acabasse nunca – disse ela com um suspiro, sabia perfeitamente que não havia sido um sonho.

—Hum – respondeu a outra figura no quarto – Com quem sonhou que estava fazendo amor, querida? Me conte mais, estou curiosa.

A menina arregalara os olhos no mesmo instante ao identificar que aquela não era a voz de Ash. Para sua surpresa, Debbie estava ali em pé próxima do guarda-roupa lhe observando. Não havia mais ninguém no quarto. Só então a loira lembrara-se que Ash e a mãe se pareciam muito em seus perfis. A diferença de altura era de poucos centímetros, ambas tinham cabelos longos e negros e eram magras.

—Eu… eu… eu… – começara a gaguejar a menina vermelha como um tomate, do jeito que sempre ficava quando se envergonhava. Por sorte não dissera nada mais incriminador enquanto cochilava, por pouco não dissera o nome da namorada e se confessara para ela – Não… não me lembro, tia – Lori chamava Debbie de tia desde pequena, ao passo que Ash chamava Sarah de tia também – Digo, acho que ainda estava sonhando. Me desculpe. Cadê a Ash?

Debbie fora até a janela e fechara a minúscula fresta por onde um raio de sol tentava invadir o quarto. Quando se voltara para a cama Lori puxara as cobertas cobrindo-se até o pescoço.

—Não precisa ficar com vergonha de mim, Lori, já te vi nua centenas de vezes quando era criança – riu a mulher – E não tenho nenhuma intenção de ver agora. Ash levantou e foi à padaria. Ainda é cedo, pode dormir mais, ela logo deve estar de volta. Ash dorme apenas de calcinha há anos, faz muito tempo que ela abandonou as camisolas e pijamas que compro para ela, não me surpreende que você faça o mesmo, vocês são muito parecidas. Ela disse que estava dormindo na cama e eu vim pegar algumas roupas para colocar na lavanderia, achei que não fosse fazer barulho para lhe acordar.

—Não… não foi nada – respondeu Lori tentando disfarçar o nervosismo, ainda apavorada. Quase dera uma gafe irreparável.

—Bom, vou deixá-la dormir mais. Ainda são nove horas e hoje é domingo, descanse – sorriu a tia – Vou preparar um almoço caprichado para vocês, não é sempre que tenho a chance de comer com você e a Ash mais.

De fato, Debbie vivia ocupada com o trabalho, passava o dia fora e normalmente chegava em casa tarde. Mesmo assim nunca perdia as reuniões e eventos escolares de Ash ou mesmo de Lori e mandava centenas de mensagens no W******p durante o dia a fim de saber o que as meninas estavam fazendo.

Quando Ash voltara, Lori estava sentada na cama. Já havia ido ao banheiro, lavado o rosto e escovado os dentes. Os cabelos ainda estavam desgrenhados, mas costumava escová-los depois de tomar um banho, o que ainda não havia feito. Vestia uma camisola de algodão cor de rosa com estampa de gatinhos e tomava achocolatado em uma caneca oferecida por Debbie.

—Isso engorda, sabia? – disse Ashley apontando para o leite com chocolate na caneca – Pensei que estivesse querendo fazer regime – comentou rindo.

Lori arregalara os olhos ainda mais e a morena, arrependendo-se do que dissera, pegara a caneca de suas mãos, colocando-a no criado mudo bem ao lado. A loira a abraçara com força e Ash lhe pedira desculpas, dizendo que havia sido idiota com as palavras e a brincadeira.

—Eu quase nos delatei – dissera a menina dos lábios carnudos com os olhos marejados de lágrimas – Me perdoe.

Ash não entendera nada. Aproximara suas faces e lhe beijara nos lábios.

—Do que é que você está falando? Aconteceu alguma coisa enquanto eu saí?

Ainda nervosa com a cena anterior, Lori explicara o que havia acontecido.

—Eu… – disse gaguejando – Eu juro que pensei ser você e só ia dizer o quanto tinha sido bom. Tenho certeza que não falei nada antes e ela não ficou desconfiada, mas por um instante eu quase estraguei tudo – concluiu.

A morena deitou-se ao lado da namorada e puxou-a para junto de si. Enxugara as lágrimas nos olhos da menina dizendo que não havia acontecido nada demais. Debbie não desconfiava de nada, na verdade desconfiava, mas não sobre as duas.

—Lorena Silverstone – disse Ashley tentando manter o tom sério que nunca conseguia levar adiante, mesmo quando usava o nome completo da amiga para começar a falar – Relaxe, não aconteceu nada, está tudo bem. Amanhã é seu aniversário, não vamos criar um caso hoje.

—Eu quase disse seu nome – sussurrou a loira deitando a face no pescoço da namorada – Eu nunca me perdoaria se tivesse feito isso. Mesmo que não tenha acontecido nada, mesmo que me desculpe pelo meu descuido, não consigo deixar de imaginar o que sua mãe teria feito. Por pouco eu não disse que havia feito amor com você. E mesmo que pudesse alegar que tinha sido só um sonho, o que felizmente não foi, o que ela teria pensado?

Ashley passara uma das mãos por trás da cabeça da menina e acariciar seus cabelos, lhe puxando devagar para cima, a fim de olhar em seus olhos. Quando Lorena erguera a face, como ainda estivessem alguns centímetros distantes, Ash dissera que precisava de um beijo dela.

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