Capítulo 70O silêncio de Marselha nunca o deixou em paz.Mesmo agora, enquanto Gael encarava o céu estrelado no jardim da mansão, a lembrança daquela cidade parecia mais próxima do que ele gostaria. Os sons, os cheiros, até o toque do vento — tudo o levava de volta para lá, para as ruas antigas e para um passado que ele preferia esquecer.Mas esquecer não era uma opção. Não mais.Depois que Paco voltou para dentro, deixando-o sozinho novamente, Gael permaneceu sentado no degrau de pedra. Ele fechou os olhos por um momento, permitindo-se respirar fundo, mas o ar parecia denso, carregado de memórias.Marselha.Ele sabia que aquele momento chegaria. Jack o havia preparado desde cedo, sutilmente, como quem prepara um soldado para a batalha. Gael sempre soube que, eventualmente, seria enviado para lá. A cidade onde tudo começou. Onde ele perdeu mais do que estava preparado para perder.A cidade onde ela ainda estava.Ele passou as mãos pelo rosto, tentando afastar os pensamentos. Mas não
Capítulo 71O dia amanheceu nublado, refletindo a atmosfera pesada que parecia envolver a mansão. Dandara observava o céu cinzento pela janela de seu quarto, perdida em pensamentos. Paco não estava na mansão naquela manhã. Jack o havia enviado para tratar de questões urgentes relacionadas à parceria com os LeBlanc, e a viagem parecia inevitável, mesmo que ele relutasse em partir. Havia algo de inquietante em deixar aquela casa, especialmente com tanto em jogo.Ele sabia que sua ausência poderia ser usada contra ele — tanto pelos negócios quanto pela própria família, sempre tão rápida em apontar qualquer fraqueza. Mas, naquele momento, ele não tinha escolha.Ele sabia que enquanto os dias se desenrolassem sem sua presença, e ele estaria longe, imerso em reuniões que o afastavam ainda mais das sombras e dos segredos da mansão. E talvez, só talvez, aquilo fosse um alívio temporário do caos que havia se tornado sua relação com Dandara. Com a saída de Paco, o café da manhã na sala de jan
Capítulo 72— Gael! — Dandara exclamou, tentando protestar enquanto ele a erguia nos braços. — Eu consigo sozinha.— Claramente, não consegue — ele retrucou com uma frieza prática, mas sem hesitar em segurá-la com firmeza.Ela tentou afastar o rosto, lutando contra o embaraço que começava a surgir. Estar tão próxima de Gael, alguém que sempre mantinha uma distância deliberada, a fazia se sentir desconfortável de um jeito que ela não conseguia explicar.— Isso é totalmente desnecessário — Dandara insistiu, ainda em um tom de protesto. — Eu posso andar!— Claro — ele respondeu secamente, mas sem colocá-la no chão. — E transformar um tornozelo torcido em algo pior. Não se preocupe, não estou pedindo permissão.Dandara bufou, cruzando os braços enquanto ele a carregava para dentro da mansão. Ela tentou não pensar no calor reconfortante que emanava dele, na maneira como ele parecia incrivelmente à vontade, como se carregar alguém fosse algo que ele fazia todos os dias.Ao chegarem à sala d
Capítulo 73Paco estava de volta à mansão, mas o lugar parecia mais estranho do que nunca. Apesar de tudo o que conhecia ali, cada cômodo, cada rosto, ele sentia como se tivesse retornado para uma terra estrangeira.Depois de deixar a pasta de documentos na biblioteca, sua mente ainda estava inundada pelos desafios da parceria com os LeBlanc. Mas, mais do que os negócios, havia outra coisa que o perturbava.Dandara.Desde o momento em que a viu naquela manhã, algo dentro dele estava inquieto. Havia algo diferente nela — um ar de determinação misturado com uma distância que ele não sabia explicar. E, para piorar, parecia que Gael também estava no centro dessa equação.Ele estava sentado na biblioteca, as mãos pressionando as têmporas, quando ela chegou.— Você realmente parece cansado — ela disse novamente, quebrando o silêncio que se seguiu. — A viagem foi tão difícil assim?Paco soltou um riso seco.— Digamos que foi mais do que gostaria de enfrentar agora. — Ele gesticulou para a ca
Capítulo 74A sala de reuniões estava mergulhada em um silêncio desconfortável. Todos os Benrouissi estavam presentes, incluindo Dandara, que sentia o peso dos olhares em sua direção. Paco, sentado ao lado dela, mantinha a expressão impassível, mas seus olhos escuros estavam fixos em Jack, como se tentasse antecipar o que estava por vir. Gael estava mais reservado do que o normal, mas sua postura sugeria que estava atento a cada palavra.Jack, no entanto, parecia no controle total, sentado à cabeceira da mesa. Seus dedos tamborilavam levemente contra o tampo de madeira enquanto ele observava os rostos à sua volta. Quando ele finalmente falou, sua voz era baixa, mas carregada de autoridade.— Antes de continuarmos com as discussões sobre os setores e os próximos passos da empresa — ele começou, seus olhos fixando-se diretamente em Dandara — há um assunto de família que precisa ser abordado.Dandara sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Ela se endireitou na cadeira, tentando parecer
Capítulo 75A porta do quarto de Dandara se fechou com força, o som ecoando pelo corredor. Suas mãos tremiam enquanto ela se apoiava contra a madeira, tentando recuperar o fôlego. O que havia acabado de acontecer? Como Jack sabia? Como ele poderia conhecer detalhes de um passado que sequer deveria existir?Ela deslizou para o chão, os olhos fixos no nada, enquanto sua mente se agitava com perguntas. Curtis. O casamento. A traição. A morte. Era tudo parte de uma vida que ela havia deixado para trás... ou que pensou ter deixado. Jack havia jogado aquilo na mesa como uma carta de um jogo que ela não sabia estar jogando. E agora, ela precisava descobrir como ele sabia.Enquanto isso, na sala de reuniões, Paco permanecia sentado, a cadeira empurrada para trás como se ele precisasse de mais espaço para respirar. Sua mente estava em caos absoluto, revirando cada palavra que ouvira.Ele pensava em Dandara. No mistério constante que ela parecia carregar, na barreira invisível que sempre separa
Capítulo 76O peso na mansão era tão denso que parecia impregnar o ar, tornando cada respiração um esforço. Dandara estava no corredor, tentando se afastar de tudo — dos olhares inquisitivos, das palavras de Jack que ainda ecoavam em sua mente e, principalmente, de Paco.Suas mãos tremendo levemente enquanto tentava organizar os próprios pensamentos. Seu coração estava pesado, e cada respiração parecia uma luta para manter a calma. Mas antes que pudesse se recompor, passos rápidos ecoaram pelo mármore.Ela virou para o lado apenas para encontrar Paco vindo em sua direção. Seus olhos se encontraram, e naquele instante, ela soube que ele estava procurando por ela. Havia algo no olhar dele — um misto de raiva, confusão e algo que parecia... mágoa.— Precisamos conversar — ele disse, a voz baixa, mas carregada de firmeza.Dandara respirou fundo, sabendo que não tinha como evitar aquele confronto.— Agora não, Paco — ela respondeu, tentando passar por ele.Mas ele se moveu, bloqueando seu
Capítulo 77A mansão estava em silêncio, exceto pelo som da chuva que martelava contra as janelas. Paco caminhava pelo corredor principal, os passos ecoando suavemente pelo mármore. Ainda havia um peso em seus ombros, uma raiva que lutava para controlar.A discussão com Dandara deixara um gosto amargo em sua boca, mas ele sabia que havia passado dos limites. Talvez ela também tivesse, mas a maneira como tudo terminara... Não deveria ter sido daquele jeito.Ele passou pela sala de jantar, depois pela biblioteca. Em cada lugar, esperava vê-la, talvez ainda irritada, mas presente. No entanto, cada sala vazia apenas aumentava o nó em seu estômago. Quando chegou ao escritório principal e também não a encontrou, um pensamento inquietante começou a se formar.Dandara saiu? Na chuva?Ele tentou afastar a ideia, mas ela insistia. "Ela não faria isso," disse a si mesmo. "Não no meio de uma tempestade." Ainda assim, a culpa começou a rastejar em seu peito. Se ela tivesse saído, ele sabia que sua