- A menina nasceu naquele mesmo hospital, mas a mãe ainda era menor de idade. Lúcia disse que ela parecia gostar da menina, mas a avó dela não queria a criança. Disse que seria outra criança para ela criar. De alguma forma, provavelmente por ser moradora antiga de um morro bem conhecido daqui da cidade, ela já tinha ouvido que algumas vezes, algumas pessoas, levavam crianças. Ela ofereceu a menina para Lúcia. Poderia ter sido um trabalho bem fácil, mas não foi. Pensei em vender a menina, tinha um casal que até pareceu interessado nela, mas ela não era a mais requisitada, se é que você me entende. Os gringos não queriam uma criança da cor dela e ela foi ficando para trás. Eu não podia perder tanto tempo com ela, porque era só um gasto a mais. Então eu ia manda-la para um outro lugar. Um lugar que sempre aceitam qualquer criança, jove
Ana parou no meio do caminho. Ela estava andando rápido e estava ofegante, nervosa... Ela não queria ter que falar aquilo naquele momento e nem daquele jeito, mas ela sabia que Davi não ia parar de insistir e a última coisa que ela precisava no momento, era ter mais o pai de Davi nos seus pensamentos. Ela sentia nojo e repulsa todas as vezes que lembrava dele e ela não suportava isso. Ela não podia nem se imaginar perto dele, nem ouvir a voz dele, quem dirá morar no mesmo teto que ele.- O seu pai é um tarado e pedófilo, Davi!Davi ficou atônito.- O que, Ana?- É, Davi. Me desculpe não ter falado antes para você, mas em algum momento você ia descobrir, eu ia falar para você. Não queria que fosse desse jeito, mas não daria para prolongar isso por muito mais tempo agora.- Como você sabe disso?- Eu não quero falar s
Tico levou os dois para um motel. Assim que chegou na recepção ele pediu um quarto e pediu para chamar uma moça de nome Alessandra.A recepcionista do motel disse que já ela iria para o quarto dele e ele entrou.Tico estacionou o carro, fechou a porta da garagem, abriu a porta do quarto e verificou todo o ambiente, para ter certeza de que não havia ninguém lá dentro.- Saiam do carro.Ana e Davi saíram e se perguntaram onde estavam.- Fiquem calados e falem baixo. Entrem aí.- Você nos trouxe para um motel? - Davi perguntou. - O que você vai fazer com a gente?- Eu não vou fazer nada com vocês, moleque medroso. Entra aí e fala mais baixo! Já avisei.Entraram no quarto e Tico trancou a porta.Tico foi no frigobar, pegou uma das águas e bebeu. Depois pegou um dos chocolates e abriu a barrinha.-
- Eu vivia com a minha mãe e meus irmãos no Morro do Alemão. Quando eu fiz 17 anos a minha mãe começou a se relacionar com um cara e acabou levando ele para dentro de casa. No começo a gente gostava dele e ele tratava todos nós como se fossemos filhos dele. Comprava roupas novas e até celular ele me deu. Ele não parecia trabalhar, mas sempre tinha dinheiro pra comprar as coisas. No começo a gente gostou bastante. Ele ajudava com as contas de casa e a gente passou a ter mais comida. Ele também parecia tratar bem a nossa mãe. Como ele não trabalhava, saía só as vezes, ele passava muito tempo em casa e toda tarde quando eu chegava da aula, ele estava lá. No começo ele só conversava comigo e tals. Mas quando meus irmãos começaram a estudar a tarde, eu acabei ficando sozinha na parte da tarde com ele, porque a mamãe trabalhava o dia inteiro. D
Thomaz não falou nada, ele apenas ficou me encarando e eu não sei dizer exatamente o motivo, mas eu estava olhando para ele com tanta raiva que acho que ele notou, porque pela primeira vez ele não conseguiu ficar me encarando por muito tempo. Ele logo desviou o olhar, baixando a cabeça, mas fingindo que não havia sido afetado. Estava muito claro pra mim que havia sido ele quem tinha tirado a vida da diretora Carmem. Ele trabalhava com a Lúcia, para alguém que era muito poderoso. Ele sabia de coisas demais e com certeza havia lido a carta que ela escreveu pra mim. Carta que eu guardaria pelo resto da minha vida. Eu senti muita raiva daquele homem ou rapaz. Ele parecia novo sim, mas a expressão dele era de alguém muito mais velho. Por um segundo eu senti que ele poderia ser sim uma pessoa boa, depois que a tal Alessandra, namoradinha dele e faz tudo daquele motel, disse o que ele fez para ela. Mas nem aquilo que ele fez pra ela foi uma coisa boa. Ele não era nada bom e
Quando chegamos no morro já era bem tarde da noite, mas o movimento ainda parecia ser grande. Acho que o incêndio foi realmente algo que atingiu uma proporção maior do que qualquer um esperaria, inclusive a Lúcia. Não acho que ela queria que aquilo tivesse chamado tanta atenção assim, mas chamou. Aparentemente a fumaça acabou indo bem longe e apesar da nossa casa não ser encostada em outras, acho que teve uma preocupação grande com relação ao fogo acabar se espalhando.- Davi, tem gente pra caramba lá.- É, eu estou vendo.- Vou deixar vocês por aqui mesmo. Subam andando. Tem gente demais aí e podem estar revistando os veículos. Não se esquece do que eu te falei, menina.- Eu nunca vou me esquecer de você, Thomaz.Eu não falei isso de uma forma positiva. Estava sentindo tanta raiva daquele homem e es
- É, pode ser sim, senhor.- Então, qual o número do contato telefônico da sua mãe? Pode escrever aqui nesse papel para mim?- Posso sim.Comecei a escrever o número e entreguei para ele.- Obrigado. E como é o nome mesmo da sua mãe?- É Lúcia. Mas eu não sei o sobrenome dela...- Achei bem esquisito quando você disse isso. Não seria o mesmo que o seu?- É... Acho que o senhor vai encontrar o sobrenome lá na escola em que eu estudo. Ela entregou meus documentos lá quando eu comecei a estudar.- Você não sabe o seu sobrenome?- Eu nunca perguntei, senhor Tavares.Tavares me olhava com um olhar de interrogação. Quando eu falava em voz alta, eu percebia o quão absurdo aquilo soava. Como assim eu não sabia qual era o meu sobrenome? Eu sabia porque eu não sabia qu
"Eu devia ter cerca de 5 anos de idade quando comecei a apanhar do meu pai. Ele era militar e nós nos mudávamos constantemente. Eu sei que nasci em Manaus, mas meus pais eram daqui do Rio de Janeiro mesmo. As minhas primeiras lembranças são naquela cidade e apesar de ter passado por poucas e boas por lá, eu ainda guardo com carinho os anos que passei naquele lugar.Minha mãe, que se chamava Leopoldina, era uma mulher muito bonita e era também muito mais nova que meu pai. Depois de adulto eu descobri que ele tinha tirado ela da familia, que morava na Bahia. Eles passavam muitas necessidades lá e um dia ela conheceu meu pai. Ele era 15 anos mais velho do que ela, mas quando ela o conheceu ele era extremamente sorridente e agradável. Ele parecia ser um homem bom e o tempo que esteve na cidade, ele ajudou muito à ela e sua familia. Todos os viam como um homem sábio e inteligente. Mas as aparencias enganam e eles não passaram tempo o suficiente com ele, para saber que ele conseguia fingir
Minha mãe ficou comigo no colo, me protegendo e ela levou não sei quantas lambadas. Lembro que depois disso ela passou vários dias no quarto e foi a partir desse dia que eu passei a ter muito medo de meu pai. Eu também nunca mais tentei fazer bolo. Até hoje eu não sei fazer. Na verdade, eu sou um zero à esquerda com relação a comida. Nunca aprendi a cozinhar nada direito.Depois dessa primeira surra, eu passei a apanhar bastante. Tudo que eu fazia de errado era motivo para eu apanhar. Algumas vezes minha mãe tentava intervir, mesmo sabendo que no final, nós dois iriamos apanhar, porque ele nunca desistia. Teve uma época que isso passou a acontecer quase diariamente.Meu pai também discutia muito com a minha mãe. Muitas vezes ela tentava fazer com que eles nào brigassem na minha frente. Quando ele chegava com grosserias, ela ignorava ou só respondia o que ele