— Deixem-me sair daqui! — Berrou Amara, mais uma vez trancafiada como um animal.Agarrou-se nas grades, colérica. O metal enferrujado era áspero, grosso o bastante para que não pudesse ser retorcido ou quebrado, as hastes metálicas eram presas no alto, acima de sua cabeça. O buraco que a jogaram era fétido, cheirava a urina, fezes e haviam marcas do que Amara imaginou ser unhas nas paredes, que consistiam de uma mistura de terra vermelha, palha e água.A escuridão talvez fosse o pior, não que a jovem temesse de fato o escuro, mas sim porque ouvia os passos dos soldados acima dela, suas sandálias e botas de couro contra o chão empoeirado. Às vezes, alguns mais afoitos paravam à beira da cela escurecida e iluminavam o rosto de Amara com suas tochas, alguns realizavam comentários infames sussurrados e caíam na gargalhada. Amara saltava sobre as grades feito um grande felino ferido, assustando-os para longe enquanto gritava, gritava sem parar.Mas não era ela quem gritava, os gritos que s
Audaz.Seria o que qualquer um teria pensado se previsse a fuga astuciosa das duas mulheres naquela noite febril tomada pelo caos. Contudo, ninguém a observou quebrar a corrente de sua jaula, saltar para fora com a habilidade que utilizava para escalar as montanhas de pedra. Estavam ocupados demais para mover os olhos na direção do cativeiro. Havia algo maior acontecendo, das quatro torres do palácio as trombetas alarmantes chamavam todos os soldados para as entradas de todo o lugar de modo a proteger o seu soberano. Em meio à movimentação, as duas se aproveitaram das sombras para deslizar na escuridão em direção a grande confusão que se estendia por toda parte.A orgulhosa sultana ao olhar pela primeira vez para a sua algoz, agarrou-a pelos ombros um tanto possessa.— Este vestido é meu! — Exclamou estarrecida.— Eu deveria tê-la deixado para trás. Não me faça mudar de ideia. — Rumorou Amara, puxando-a para um canto escuro, longe de toda a desordem desesperadora.Jamile ergueu o seu
Os gritos impetuosos de Riad podiam ser ouvidos de todos os corredores adjacentes do grande salão dourado. Ansioso, o sultão andava de um lado para o outro dando ordens à guarda do palácio. Esfregou a barba e praguejou baixo, seu humor volátil aumentando a tensão entre todos. A sala repleta de vizires o encarava, os homens falavam alto, discutiam entre si e pareciam se distanciar cada vez mais do assunto principal. — Basta! — sua voz ecoou sonorosa entre os presentes, chamando a atenção de todos repentinamente — Não consigo pensar com todo esse alvoroço. — Não há sobre o que pensar, sultão. Ahmad é o traidor, encontraremos o patife e pagará com a vida. — Janam disse do canto do salão, sua túnica escura o fazendo parecer um fantasma entre eles — Nunca foi nenhuma novidade que o Grão-Vizir desejava o mais alto poder do sultanato, meu senhor. — Janam está correto. — Karim tocou o ombro de Riad com um aperto firme e lhe direcionou um olhar severo, intimidador, quase não lhe dando escol
As areias do deserto que os uniu, cobriram toda a cidade em uma tempestade avermelhada nos dias que antecederam o casamento. Contudo, no dia da celebração, o céu amanheceu limpo e azul infinito como os olhos da jovem noiva. Amara seria a mais bela sultana que aquela terra presenciou, e quando Riad e a garota juraram amor eterno e concretizaram a união, houve uma grande festa. Três dias e três noites se fizeram necessárias para celebrar o casamento, toda a cidade festejou eufórica. Um suntuoso casamento onde as portas do palácio foram abertas, houve comida em abundância e música para alegrar a ocasião. Qualquer um que os visse de relance saberia instantaneamente que em seus olhos iluminados brilhava o amor verdadeiro, o tipo de amor que Amara sempre sonhara. E do palácio que se tornara a casa de Amara, governaram lado a lado. Riad, o justo, teve o seu nome espalhado por todos os cantos. Abal tornou-se próspera e a guerra entre a dinastia dos Abdelkarin com Jawhal Sahid foi selada em
Adenium obesum – Rosa do desertoNativo de regiões desérticas e de fácil manejo, o Adenium obesum é um arbusto comumente conhecido como rosa do deserto. Embora suas delicadas flores rosa de cinco pétalas tornem a planta comum para decoração de interiores, as rosas do deserto são altamente venenosas.As tribos africanas a usam há séculos como uma ponta de flecha mortal para fins de caça, e a seiva de Adenium obesum é capaz de matar até animais grandes.E humanos...Antes das grandes guerras e das invenções do mundo moderno, em um lugar no meio do deserto da península arábica, haviam dois reinos em constante disputa. A paz nunca durou muito tempo para nenhuma das famílias que detinham o poder daquelas terras.O mais jovem sultão de sua dinastia, Riad Abdelkarin, estava disposto a mudar o cenário de guerra e fome que se instaurava por ambos os reinos, o curso do principal rio que atendia aos sultanatos e desaguava a quilômetros no mar, havia sido desviado há quase cinquenta anos pelo pai
Ao pé de uma cadeia de colinas avermelhadas de arenito, um casebre de tijolos de terra crua e palha se assemelhava a uma grotesca caverna. Uma solitária tamareira sombreava a entrada da porta de madeira já gasta pelo tempo, pequenas janelas haviam sido esculpidas nas laterais que se projetavam da pedra, cobertas com pele grossas e secas de animais.Ao pé de uma cadeia de colinas avermelhadas de arenito, um casebre de tijolos de terra crua e palha se assemelhava a uma grotesca caverna. Uma solitária tamareira sombreava a entrada da porta de madeira já gasta pelo tempo, pequenas janelas haviam sido esculpidas nas laterais que se projetavam da pedra, cobertas com pele grossas e secas de animais.Amara Al Jabri amarrou as rédeas do cavalo no caule da tamareira com um laço firme, acariciou o pelo do animal com a ponta dos dedos e andou em direção à entrada de seu casebre para trazer água para cansado cavalo que acabara de roubar. Apesar de velho, era um animal bem cuidado e sadio, para a m
Amara sentiu as cordas pinicarem a sua pele, quanto mais tentava se mover, mais o material áspero cravava em sua carne. Furiosa, emitiu um grunhido que nem sequer abalou Riad. Na verdade, Riad optou por ignorá-la por todo o seu caminho, seus grunhidos e suspiros já não lhe afetavam mais desde os cinco primeiros minutos de estrada. Aquela malfeitora perversa se mostrou muito pouco agradável como companhia viajante, apesar de não dizer nem sequer uma palavra, não parou de tentar uma fuga nem por um momento. Se rebatia, andava de má vontade e o atrasava cada vez mais, Riad já começava a sentir a sua paciência se esvair depressa. Não possuía tato para com as mulheres, tampouco paciência, nenhuma mulher antes havia lhe desafiado daquela maneira tão desgostosa. Estava mais que acostumado a viver cercado de mulheres prontas para satisfazer a cada uma de suas vontades, de concubinas, criadas e esposas, o seu círculo privado era feito. Era sempre tratado com respeito e muito decoro, a sua pos
A abertura da caverna era quase imperceptível. Entre as colossais cadeias montanhosas que abrigavam o berço do deserto arenoso, e escondida entre espessas dunas no pé de uma montanha, uma abertura na pedra podia ser vista somente com muita atenção por olhos perspicazes. Era quase impossível ver a fresta na pedra devido à ação do tempo e do vento, que ocasionalmente movia as colinas de areia. Parecia pouco natural, como se houvesse sido escavada pelos homens há centenas de anos. Não era surpresa, haviam pelo menos uma centena de cavernas como aquelas espalhadas por toda parte no deserto até o sul do sultanato de Abal. Além de servir como moradia aos beduínos, também serviam como proteção contra as tempestades de areia e contra o frio temeroso das noites. A noite, as temperaturas despencavam drasticamente. Era necessário se aquecer em algum lugar onde o vento cortante do deserto não acertasse o seu rosto como laminas afiadas. No céu, as nuvens amarelas pinceladas de um laranja intimid