O amanhecer trouxe um frio ainda mais cortante, que parecia penetrar os ossos. O céu estava encoberto por nuvens pesadas, e o vento trazia consigo o uivo distante de algo que nenhum de nós conseguia identificar. — Vamos nos mover — disse Kyra, já de pé, ajustando seu casaco de pele. — Ficar parado nesse frio vai nos matar antes mesmo de encontrarmos qualquer inimigo. Stella e eu concordamos silenciosamente, arrumando nossas coisas rapidamente. A tensão da noite anterior ainda pairava sobre nós, mas havia uma determinação renovada. Começamos a subir pela encosta íngreme. As pedras estavam cobertas de gelo, tornando cada passo perigoso. Kyra liderava o caminho, seus olhos atentos a qualquer movimento, enquanto Stella seguia logo atrás, com os olhos varrendo a paisagem como se esperasse que a "presença" da noite anterior voltasse a se manifestar. — Espere — Kyra disse de repente, erguendo uma mão para nos parar. — O que foi? — perguntei, já pronto para qualquer ameaça. Ela ap
O rosnado profundo ficou mais alto, reverberando pela montanha e fazendo as pedras sob nossos pés tremerem. Quando olhei à frente, o ar parecia se distorcer, como se algo estivesse tomando forma diretamente diante de nós. A figura emergiu lentamente das sombras que as ruínas projetavam. Era colossal, mais alta do que qualquer humano, com uma forma vagamente lupina, mas envolta em uma aura de magia. Os olhos brilhavam com um tom dourado ameaçador, e uma voz grave e retumbante preencheu o espaço. — Quem ousa pisar na trilha sagrada e perturbar o descanso da montanha? Era o guardião da caverna. A criatura se postava como um verdadeiro desafio, com uma presença que tornava impossível desviar o olhar. Ele segurava um cajado esculpido com runas semelhantes às que vimos nas rochas. — Somos viajantes em busca da verdade — respondi, dando um passo à frente. — Procuramos respostas sobre a Guardiã e a Rainha. A criatura nos avaliou, como se tentasse medir nossa determinação. — Muitos
Adentramos na nova passagem, com o coração batendo em sincronia, como se o destino nos aguardasse no próximo passo. A luz tênue dos cristais que adornavam as paredes iluminava nossos rostos cansados, mas determinados. O ar era mais pesado ali, como se a própria montanha sussurrasse segredos antigos. No fim do corredor, chegamos a uma sala circular. Ao centro, uma mesa de pedra negra repousava, e sobre ela, um manuscrito velho, protegido por um campo de energia dourada. As runas nas paredes pulsavam em sincronia com o brilho do manuscrito, como se reconhecessem sua importância. — O manuscrito principal... — sussurrou Stella, maravilhada. — A verdade sobre a Rainha e a Guardiã deve estar ali. Eu dei um passo à frente, com a mão estendida, mas antes que pudesse tocar a barreira dourada, um riso grave e cheio de desprezo ecoou pela sala. — Finalmente — uma voz sombria e poderosa preencheu o ar, reverberando pelas paredes. — Vocês chegaram longe demais... mas todo o esforço será em
Caminhamos pela passagem escura, nossos passos ecoando como um lembrete da urgência. O Rei Bruxo estava em vantagem, mas sabíamos que ele deixaria rastros. Era sua natureza se gabar, e isso poderia ser sua ruína. Kyra liderava o grupo com sua lâmina ainda em mãos, enquanto Stella analisava as runas desvanecidas nas paredes, murmurando palavras em uma língua antiga. Eu seguia atrás, tentando manter a calma, mas a raiva crescia em meu peito. O Rei Bruxo tinha roubado mais do que um manuscrito — ele tinha levado nossa chance de restaurar o equilíbrio entre a Rainha e a Guardiã. De repente, Stella parou, seus olhos se estreitando enquanto estudava uma das runas. — Aqui — ela disse, apontando para um símbolo que ainda brilhava fracamente. — Ele abriu um portal para o Vale das Sombras. — Vale das Sombras? — Kyra perguntou, girando sua lâmina. — Não é apenas uma lenda? Stella balançou a cabeça. — Não. É real. É um lugar onde a luz e a escuridão se enfrentam, mas nunca se misturam.
Ao retornarmos à matilha, o peso da jornada e a tensão dos últimos acontecimentos nos acompanhavam. Kyra liderava o grupo, sua presença imponente inspirando confiança nos outros lobos que aguardavam ansiosos. Stella ainda segurava sua metade do manuscrito com cuidado, envolvida em uma camada de tecido para protegê-lo. Assim que cruzamos os limites do território da matilha, a segurança familiar do lugar nos envolveu, mas o ar ainda estava carregado de incerteza. Fomos direto para o salão principal, onde os conselheiros e guerreiros aguardavam notícias. — O Rei Bruxo conseguiu metade do manuscrito — anunciei, com firmeza, encarando o olhar preocupado de todos. — Mas a outra metade está conosco. Houve murmúrios de tensão, mas Stella ergueu o fragmento dourado, que parecia pulsar levemente com energia. — Precisamos decifrar isso imediatamente — disse ela, sua voz clara e determinada. — Esta parte pode conter respostas vitais sobre como impedir os planos dele. Passamos horas estu
O rei bruxo, com suas mãos esqueléticas e dedos longos como garras, segurava o manuscrito diante de seus olhos. A luz das velas refletia nas páginas amareladas, cada palavra dançando diante dele com um brilho macabro. O fragmento que ele encontrara nas ruínas de um templo antigo agora se revelava como a chave para algo ainda maior, algo que poderia finalmente lhe conceder o poder absoluto que tanto desejava. Ele leu em silêncio, absorvendo cada sílaba com a mesma precisão de um predador observando sua presa. A primeira parte do fragmento, que ele já conhecia, descrevia o feitiço que lhe permitiria alcançar a imortalidade, mas a segunda parte... a parte que até então permanecera oculta, começou a tomar forma diante dele. "A chave", dizia o manuscrito, "está em um ser híbrido, um ser de duas naturezas, que carrega o sangue de ambos os mundos." O rei franziu a testa, seus olhos vermelhos como brasas piscando com um brilho mais intenso. O termo "híbrido" o perturbava. Ele sabia que a ma
Eu sou Stella, a híbrida que ele procura. Metade bruxa, metade humana, mas nunca completamente nenhuma das duas coisas. E nos últimos dias, tudo o que conhecemos foi caos. A princípio, os ataques do rei bruxo eram esporádicos, quase como se ele estivesse testando nossas defesas. Mas agora, eles se tornaram constantes, brutais. A cada noite, sentinelas da matilha voltam feridos, exaustos — quando voltam. Há um silêncio pesado em nosso território, o tipo de silêncio que vem antes de uma tempestade devastadora. Eu não posso mais ignorar o que está acontecendo. Por mais que eu tente me esconder, sinto que ele está me caçando. Não sei como, mas ele sabe sobre mim. Na última noite, enquanto a lua cheia iluminava nosso refúgio, ele mandou suas criaturas mais horrendas — sombras com olhos brilhantes e dentes que pareciam feitos de ossos partidos. Não eram apenas ataques; eram mensagens. Ele está me chamando, forçando minha mão. As vozes na minha cabeça dizem para lutar. Mas Kyra, noss
A batalha foi feroz, mas terminou de forma que eu não esperava. O rei bruxo era implacável, cada ataque dele parecia estudado, calculado para me desgastar. Lutei com tudo que tinha, mas no fim, ele me venceu — não pela força, mas por algo que eu não conseguia entender. Quando ele lançou o feitiço final, um círculo de sombras me envolveu, prendendo-me em um casulo de energia. Tentei lutar, mas minha força parecia drenada, como se algo profundo dentro de mim estivesse sendo arrancado. Foi nesse momento que percebi: ele não queria apenas minha captura, ele queria algo que estava dentro de mim. Quando acordei, estava em seu reino. O ar era pesado, carregado de magia negra. As paredes de pedra eram escuras, refletindo um brilho fraco das chamas azuis que dançavam em candelabros ornamentados. Eu estava em uma cela, mas não uma comum. Os símbolos gravados no chão brilhavam com uma luz opaca, uma barreira que impedia qualquer tentativa de transformação ou fuga. O rei bruxo entrou na sal