Seis meses haviam se passado desde que Aurora saíra de sua vida. Se é que poderia chamar de saída, afinal, Enrico nunca a considerara parte de sua realidade. O que tiveram foi um erro, uma colisão acidental de mundos que nunca deveriam ter se cruzado. Ele havia seguido em frente.
Mergulhou ainda mais nos negócios, afundando-se em reuniões, negociações e novos investimentos que expandiam sua influência. Quanto mais trabalhava, menos tempo sobrava para pensar no passado. E era exatamente isso que queria. Os números, os contratos, as fusões... Tudo isso era sólido, previsível. Diferente de sentimentos, diferente dela.
A rotina era exaustiva, mas era disso que ele precisava. Acordava cedo, revisava relatórios antes mesmo do café da manhã, participava de re
Os rumores sobre a nova atração da boate haviam se tornado onipresentes, sussurrados em festas, mencionados em reuniões e exaltados entre os entusiastas da vida noturna. Enrico não dera muita atenção no começo. Afinal, novidades vinham e iam sem causar grandes impactos em sua rotina. No entanto, quando percebeu que até Leonardo, seu irmão, e Matteo, um de seus assessores mais próximos, falavam sobre ela com um entusiasmo incomum, resolveu escutar.— Estou te dizendo, Enrico, essa mulher é um fenômeno. Nunca vi nada parecido — disse Matteo, gesticulando como se tentasse descrever algo indescritível. — Ela tem uma presença de palco absurda. Não é só dança, é um espetáculo.— Exatamente! — Leonardo
Enrico não estava interessado apenas no espetáculo, ele queria respostas. A Sirena era um mistério absoluto, e isso o incomodava mais do que ele estava disposto a admitir. Na manhã seguinte ele estava reunido em sua suíte particular com Leonardo e Matteo, ele observava seus assessores com expressão séria.— Certo — começou, cruzando os braços. — O que sabemos sobre ela?Matteo e Leonardo se entreolharam. Matteo foi o primeiro a falar:— Quase nada. O nome dela não consta em nenhum registro da casa. A única coisa que sabemos é que ela aparece para os shows e depois desaparece. Ninguém a vê entrando ou saindo. Não tem camarim fixo e nunca passa tempo no bar ou em qualquer outro lugar pú
Ainda abalada por ter visto Enrico, Aurora se vestiu rapidamente com seu uniforme de camareira. Seu coração ainda batia acelerado, mas sua mente já trabalhava na estratégia para desaparecer dali o mais rápido possível. Respirou fundo, encarando o reflexo no espelho do camarim.Com gestos ágeis, retirou toda a maquiagem, apagando qualquer vestígio da Sirena. Seus olhos, antes destacados pelo delineado preciso e os lábios tingidos de um vermelho vibrante, agora pareciam comuns, pálidos, parte da figura apagada que ela precisava ser. Prendeu o cabelo em um coque firme e ajustou a pequena touca branca que o escondia quase por completo. Vestiu novamente o uniforme azul discreto e os sapatos simples de borracha. Agora, não passava de uma camareira qualquer, mais uma entre tantas, invisível aos olhos dos frequentadores do hotel.
A semana havia passado exatamente como todas as outras, sem nenhuma intercorrência. Aurora seguia sua rotina mecânica: do trabalho para casa e da casa para o trabalho. Mas algo dentro dela já havia mudado. O simples pensamento de que aquela era sua última semana ali fazia cada gesto e cada olhar carregarem um peso diferente.Naquela semana sua folga caiu na segunda-feira, e ao acordar, sentiu uma urgência estranha. Precisava fazer algo significativo, pois logo partiria e queria se despedir à sua maneira. Vestiu-se sem pressa e saiu. O ar da manhã estava fresco, e a cidade parecia mais silenciosa do que de costume.Foi primeiro ao cemitério, caminhou devagar entre os túmulos até chegar ao dos pais. A pedra fria trazia seus nomes gravados com letras firmes, imutáveis, como o destino que os
Lá estava ele, sentado atrás de sua imponente mesa, com aquele ar familiar de superioridade e poder. O olhar afiado de Enrico analisava cada detalhe da mulher diante dele, como um predador estudando sua presa. Com certeza era o Dark Enrico que estava ali, e Aurora agora se perguntava se alguma vez havia existido outro que não fosse esse.— Boa noite, senhorita Vidal! — Sua voz soou tão segura quanto sempre. — Devo admitir que estou surpreso em encontrá-la compondo o meu quadro de funcionários!Fora ele quem falou primeiro, pois ela ainda se encontrava muda, como se seu cérebro tivesse perdido a capacidade de processar informações e articular palavras devido ao choque de encontrá-lo ali, sentado diante dela como se fosse dono do destino de ambos. Mas tinha que se recuperar. T
— Já que entrou nesse mérito, você pelo visto não deve andar comendo como de costume. Está muito magra!Aurora o encarou, colocando as mãos na cintura.— Eu não estou muito magra, só devo ter perdido aqueles quilos a mais que sempre te incomodaram tanto! É sério que você me chamou aqui para falar sobre o meu peso? Porque se você não tem, eu tenho mais o que fazer. Aliás, quem é você para falar de mim? Olha para o seu tamanho, está tomando bomba por acaso?Dessa vez Enrico não conseguiu controlar um sorriso diante do comentário estapafúrdio dela.— E você continua um poço de disparates
Aurora sentiu o sangue gelar. Seus olhos fixaram-se nos de Enrico, buscando qualquer sinal de que ele estivesse apenas brincando, exagerando, tentando provocá-la. Mas o brilho frio e calculista em seu olhar dizia o contrário.Ela cerrou os punhos, obrigando-se a manter a compostura. Não podia demonstrar fraqueza, não diante dele.— Você está me chantageando? — sua voz saiu baixa, mas carregada de desafio.— Eu estou te dando uma opção — ele rebateu, cruzando os braços. — Fique e colabore com a investigação. Se for inocente, não há com o que se preocupar.Aurora soltou um riso sem humor, balançando a cabeça. Enrico recostou-se na cadeira de couro de seu escritório, massageando as têmporas enquanto Leonardo, seu irmão, o fitava com olhos faiscantes. Do outro lado da sala, Matteo, seu assessor, cruzava os braços, impaciente.— Então é isso? — Leonardo foi o primeiro a romper o silêncio. — Você simplesmente cancelou o show? O show, Enrico? A Sirena poderia ser a nossa galinha dos ovos de ouro!— Ah, sim — Matteo interveio, erguendo as sobrancelhas. — E ela parecia bem empolgada com isso. O que exatamente você disse para ela aceitar desistir?Enrico suspirou e ajeitou a gravata, tentando manter a compostura. Era como pisar em um campo minado. Ele precisava escolher bem as palavras.&mdCapítulo 53