Aurora desceu a trilha até a praia com passos firmes, o cardigan apertado contra o corpo para se proteger do vento. Mas, na verdade, não era o vento que a fazia tremer — era a mistura de raiva e confusão que Enrico havia provocado nela.Ao ver a silhueta dele ao longe, sentiu o coração apertar. Claro que ele estaria lá, no meio da noite, parecendo um modelo em uma campanha de fragrância masculina: a camisa branca entreaberta, os cabelos bagunçados pelo vento.Ela respirou fundo, ajustando a postura antes de marchar até ele. Enrico pareceu notar sua presença antes mesmo de ela chegar, mas não se virou. Continuou sentado na areia, as pernas dobradas, os cotovelos apoiados sobre os joelhos, encarando o mar como se estivesse em um universo à parte.— Ah, claro, você tinha que estar aqui — começou Aurora, a voz carregada de sarcasmo.— Meditando sobre suas péssimas escolhas de palavras, talvez?Enrico ergueu o olhar para ela, os olhos brilhando na penumbra como se estivesse se divertindo.—
Enrico ficou parado na praia, observando Aurora se afastar com passos firmes. As palavras dela ainda reverberavam em sua mente, cada uma como um golpe certeiro. Pela primeira vez em muito tempo, ele não tinha uma resposta na ponta da língua, algo que o deixava inquieto.Ele passou as mãos pelos cabelos, frustrado, e se sentou novamente na areia. Enrico sabia que era impulsivo, sabia que às vezes deixava a língua correr mais rápido que o cérebro, mas aquilo tinha sido um erro monumental. Ele queria provocá-la, talvez até empurrá-la para fora de sua zona de conforto, mas ao invés disso, só conseguiu afundá-los ainda mais em um abismo de ressentimento.Aurora. Ela era uma força da natureza, tão determinada a esconder suas vulnerabilidades quanto ele estava em desvendá-las. Mas o olhar dela antes de virar as costas... aquilo foi como um soco. Não era apenas raiva, era dor. E ele tinha sido o responsável por isso.“Droga”, murmurou, jogando a cabeça para trás e olhando para o céu estrelad
Aurora passou o resto da noite acordada, alternando entre a raiva, a confusão e uma ponta de curiosidade sobre as intenções de Enrico. Por mais que quisesse ignorar o incidente na praia, as palavras dele ficaram gravadas em sua mente. Mas, mais do que isso, a sinceridade inesperada de seu pedido de desculpas parecia ecoar em um canto vulnerável do coração dela — um canto que ela preferia manter trancado.Na manhã seguinte, o som das ondas a despertou do sono inquieto que finalmente a havia vencido. Levantou-se lentamente, os raios de sol entrando pela janela e iluminando a pequena sala. Tentou se concentrar na rotina: preparar um café, lavar o rosto, organizar as ideias. Os amigos de Enrico haviam partido cedo pela manhã, o que de certa forma foi um grande alívio. Ter que interagir com mais pessoas no meio de toda aquela confusão tornava tudo ainda mais estressante.Decidiu sair, pois uma caminhada pela praia, talvez, ajudaria a limpar sua mente. Mas ao chegar à areia, percebeu que nã
No inicio da tarde, Aurora estava determinada a encontrar um momento de paz. Ela então decide fazer um passeio diferente e explorar uma trilha localizada no extremo da propriedade particular que pertencia a Enrico. É um lugar bonito, com dunas altas, vegetação densa e um ar de isolamento. Ela tinha ouvido os empregados falando da trilha, e de como Enrico recentemente havia proibido turistas de percorrer o antigo caminho que levava a outra praia fora da propriedade. A paisagem era de cair o queixo, com trechos de vegetação rasteira e partes em que a mata tomava conta do cenário.Havia colocado uma calça comprida e um tênis, e preparado uma mochila com água e uns sanduíches e biscoitos, pensou que seria interessante fazer uma espécie de piquenique na outra praia. Seguindo a trilha ela se perde nos próprios pensamentos, tentando esquecer as palavras dele e a confusão que ele causa dentro dela.Depois de apenas alguns minutos de caminhada, o céu começou a se fechar e Aurora percebeu que
Ao se aproximar, Enrico viu a porta da cabana encostada. A luz lá dentro era fraca, mas claramente havia movimento. Ele parou na entrada, bateu duas vezes com os nós dos dedos e anunciou, com seu tom habitual de provocação:-Se eu for um assassino, você acabou de cometer o maior erro da sua vida deixando a porta aberta. Só para constar.Do outro lado da porta, Aurora congelou, mas logo reconheceu a voz. Revirando os olhos, ela abriu a porta de supetão, encontrando Enrico ensopado, com um sorriso irritantemente satisfeito no rosto.-Você veio me salvar ou testar sua teoria de que pessoas podem ser idiotas mesmo debaixo de chuva?-ela disparou, cruzando os braços.-Ah, então você admite que é idiota por estar aqui. - ele rebateu, entrando sem ser convidado e tirando o capuz. -Boa, o primeiro passo é a aceitação.-Você podia ter ficado onde estava, sabe? Não pedi pra você me seguir.-Eu sei, mas aí você ia morrer de frio ou ser comida por sei lá o quê, e eu ia ter que explicar sua burrice
Enrico para e pergunta com uma sobrancelha arqueada: — Estou fazendo cócegas ou você está rindo de mim? — É que... É simplesmente ridículo que até em um momento como esse a gente não consegue parar de discutir.— Não, você está equivocada, nós não estamos discutindo, não agora, estamos no máximo discordando amigavelmente. Porque se estivéssemos discutindo mesmo, não poderíamos fazer o que estou imaginando em detalhes na minha mente.Ele comentou com a voz grave e em um tom quente.Aurora sentiu o coração disparar. Era impossível negar o que estava acontecendo, por mais que sua mente tentasse argumentar contra. O ar parecia denso entre eles, como se algo inevitável estivesse prestes a acontecer. Quando ele se inclinou lentamente, ela não se moveu. E, no momento em que os lábios dele tocaram os dela, foi como se o mundo tivesse parado.O beijo recomeçou hesitante, como se ambos testassem os limites daquele momento, mas logo se tornou mais intenso, mais urgente. Aurora sentiu as mãos
Aurora não entendeu por um momento a declaração dele, mas quando se deu conta do significado daquelas palavras não conseguiu esconder uma expressão de incredulidade.— O que? Você tá falando sério? É tipo diagnosticado mesmo, e não apenas um pé no saco narcisista e egomaníaco?— Pelo menos eu tenho um laudo médico, e você que dá sinais exacerbados de desequilíbrio mental e pelo visto nunca procurou ajuda?No meio de toda aquela tensão, Aurora começou a rir inesperadamente. Ria tanto que se jogou para trás, escorando-se no pequeno sofá. — Viu, eu estou falando, totalmente maluca!Enrico disse, voltando a caminhar pelo pequeno espaço. Quando Aurora conseguiu controlar o riso, voltou a se pronunciar.— Cara, eu não acredito. Você quase fez eu me sentir péssima por ter debochado todo esse tempo, mas é tão absolutamente insuportável, que nem um laudo pode te defender.— Sim, mas você sabe o que estava a ponto de fazer com esse insuportável, aí mesmo nesse chão! E não me vem com essa his
— Eu não falei isso para fazer nenhum tipo de drama. É que você me confunde e eu não sei o que fazer. Eu estou cansada de me fechar nesse limbo de ressentimento e medo. Eu só queria me divertir, mas confesso que tenho medo de gostar e terminar enlouquecendo. Sei lá, eu acho que o desejo mexe com a cabeça das pessoas. Aurora desabafou para um Enrico ainda silencioso ao seu lado.— Eu poderia dizer, que essa informação muda alguma coisa sobre o que eu quero, mas seria mentira. A verdade é que para mim não faz a mínima diferença o número de homens com quem já esteve, se estivermos em um consenso de que somos adultos e podemos nos divertir juntos. E também já cheguei a conclusão de que por mais que você fuja de mim, eu continuarei te desejando, então acredito que não tem sentido nós dois remarmos para lados opostos, quando na verdade queremos a mesma coisa.Ele disse finalmente, Aurora virou a cabeça em direção a ele para encará-lo enquanto argumentava — E você não liga de eu não saber