— Cansei, terminei. Relações de adulto não precisam de tantos porquês. — Viviane disse com uma indiferença que parecia quase natural. Isabela ficou sem palavras, incapaz de decifrar a amiga. Então, aquela noite no bar não tinha sido para afogar as mágoas de um coração partido? — O que está passando pela sua cabeça? — Isabela perguntou, incapaz de conter a curiosidade. Viviane encolheu os ombros, relaxada. — Já não sou mais tão jovem, minha família está me pressionando para casar, mas ele não é a pessoa certa. Meus pais nunca aprovariam. Estar com ele era só uma forma de dar um tempero à vida monótona. Além disso, eu o tratei bem. Agora que terminamos, ele deveria ter a decência de não me perturbar. Isabela ficou impressionada com a frieza da amiga, erguendo o polegar em sinal de aprovação. — Você é mesmo desapegada. — Ela pegou a carta da bolsa e a entregou a Viviane. — Hélio pediu que eu te desse isso. Viviane pegou a carta, mas, sem sequer olhar, a rasgou em pedaços.
Clara se sentou à mesa com delicadeza, segurando os talheres e pegando um pedaço de costela. Assim que colocou na boca, franziu a testa e cuspiu imediatamente a carne malpassada. O gosto metálico se espalhou em seu paladar, a fazendo sorrir amargamente. — Segui o livro de receitas à risca e mesmo assim estraguei tudo? — Ela murmurou para simesma, o rosto marcado por decepção.— Vamos comer fora. — Propôs Sandro, se levantando, sua voz neutra carregando uma inflexão inegociável.Clara mordeu o lábio inferior. Tudo aquilo era para impressioná-lo, ela pretendia conquistá-lo ao mostrar suas habilidades domésticas. Em vez disso, seu ato se transformou numa cena constrangedora.— Não se culpe. Cozinhar exige prática. Você nunca cozinhou, é normal não conseguir fazer isso direito. — Sandro comentou casualmente, tentando amenizar o desconforto dela.— É muito mais difícil do que parece! — Ela protestou, gesticulando com os talheres. — Controlar o fogo, a sequência dos temperos, as medidas ex
Isabela estava diante da pia da cozinha, as mãos imersas em água morna onde pratos deslizavam suavemente. Bolhas de sabão dançavam entre seus dedos quando o toque do celular rompeu a quietude. Ela enxugou as mãos no avental ainda com espumas brilhantes nos dedos antes de pegar o celular vibrante. — Hélio? — Ela leu na tela com sobrancelha levemente arqueada.— Isabela. — A voz do outro lado soou tensa, quase engasgada em urgência.— O que houve? — Sua resposta foi mais suave do que pretendia. Desde que soube do abandono de Viviane, uma ponta de solidariedade teimava em colorir suas palavras.— Você está em casa agora? — Sim. — E o Sandro? — Hélio hesitou, mas acabou perguntando. Ele não sabia que Isabela e Sandro haviam se divorciado. Viviane jamais lhe contaria sobre esses detalhes.O silêncio de Isabela foi cortante como faca aquecida antes da resposta serena: — Você o viu, não foi? — É. — Do outro lado, um suspiro abafado ecoou. — Ele... Ele está... — As palavras de Hélio trava
Um raio de clareza atravessou o rosto da cliente, como se nuvens se dissipassem diante do sol.— O divórcio em si pode esperar. O essencial é consolidar os ativos primeiro. Quando for necessário, devemos ser pacientes, mas quando a hora de agir chegar, não podemos hesitar. — Isabela explicou, os dedos deslizando sobre a lista patrimonial que revelava nove zeros. Seus olhos se estreitaram ao ver a quantia astronômica, reavaliando a mulher de vestido simples sentada à sua frente. Quem diria que aquela figura discreta carregava impérios em pastas de couro?Na primeira consulta, a cliente parecia comum demais para tais cifras. Talvez, devido à traição do marido, ela tivesse optado por se manter discreta naquele dia, sem ostentar o luxo de uma esposa rica. Isabela sentiu algo em seu coração, como se visse um reflexo de si mesma no passado. Quando uma mulher se casava, muitas vezes colocava a família em primeiro lugar, negligenciando suas próprias necessidades e aparência. Ambas haviam enf
A expressão da mulher endureceu instantaneamente. Maria, ruborizada, explodiu como um vulcão em erupção, olhos arregalados, veias saltadas, toda a fúria do mundo contida naquele corpo.— Que falta de educação! — Maria gritou com voz estridente, o rosto ruborizado de raiva.Isabela sempre sustentava o fervor em silêncio por Sandro. Mas, com o divórcio já concretizado, não sentia mais a necessidade de aguentar tais ofensas.— E a senhora tem educação? Pode gritar feito uma louca por aqui? — Replicou Isabela com calma glacial, cada sílaba cortante como navalha. — Se berrar em público é seu conceito de refinamento, prefiro mil vezes minha suposta grosseria.Maria tremeu como uma folha ao vento e, a voz subindo oitavas, cuspiu as palavras com veneno:— Pare com essa língua afiada, Isabela! Meu filho jamais voltará para você. Nem se chorar de joelhos! Ele está comprometido com a herdeira da família Neves. E para você? Só restou a sobra usada, a esposa descartada. Quero ver que futuro terá!O
— O sabor estava bom, bem do meu gosto. Pensei em ir hoje no restaurante onde você comprou para experimentar outros pratos. — A voz de Jorge era plana, mas carregava uma nuance de autoridade inegável.Isabela hesitou, então explicou constrangida: — Na verdade, aquilo foi feito por mim. — Fez uma pausa e acrescentou rapidamente. — Quando o senhor pediu comida, eu tinha acabado de preparar. Pensei que, desde que entrei no escritório, o doutor sempre me apoiou, e comida caseira é mais higiênica, então tomei a liberdade de lhe oferecer. Jorge fixou nela um olhar penetrante por alguns segundos antes de murmurar de forma neutra: — Parece que minha sorte gastronômica acabou aqui. — Eu posso cozinhar para o senhor! — A resposta veio imediata, quase impulsiva. Depois acrescentou com um tom de ansiedade. — Desde que me dê mais oportunidades de aprendizado. Jorge ergueu uma sobrancelha com um sorriso de leve ironia, e retrucou: — Não fui generoso o bastante? Deixei uma estagiária assumir ca
Jorge recebeu a marmita com gesto contido. — Obrigado. — A gratidão soou mais como formalidade burocrática.— Imagina. — Isabela sorriu aliviada, os dedos ainda formigando do breve contato.— Como é apartamento de solteiro, então não vou convidar você para entrar. — Ele recuou meio passo. A porta se fechou com click decisivo.Isabela pestanejou diante da madeira lacrada. Nem um copo de água? Embora ninguém tivesse visto, ela não pôde deixar de se sentir um tanto constrangida. Tossiu discretamente e saiu cambaleando de fadiga.Ela passou algumas horas se dedicando à tarefa e ainda não havia comido. Felizmente, enquanto fazia o ravioli, ela havia preparado uma porção para si mesma, então só precisava aquecer a comida e poderia se alimentar....Enquanto isso, Sandro foi chamado por Maria de volta para a mansão da família.Quando ele entrou, encontrou Clara o aguardando na sala com um sorriso de novela das sete. — Que bom que veio! Sandro acenou com a cabeça, como uma forma de reconhec
Sandro estava parado na porta, com as sobrancelhas franzidas e um olhar de incredulidade. Alguém teve a audácia de pregar uma peça dessas na entrada de sua casa? Parecia que aquela pessoa não valorizava a própria vida.Ele pegou o celular, pensando em ligar para a polícia, mas então reconsiderou. Quem mais o chamaria de cafajeste? Além de Isabela, ele não tinha feito mal a ninguém. Será que ela finalmente havia perdido a paciência?Embora fosse uma situação que deveria deixá-lo furioso, algo difícil de acreditar, um sorriso quase imperceptível começou a se formar no rosto de Sandro. Ele discou o número de Isabela, mas ouviu apenas a mensagem automática: [Desculpe, o número que você ligou está ocupado...]Foi então que ele se lembrou de que Isabela havia o bloqueado. Ele suspirou, passando a mão pela testa, mas longe de se sentir derrotado, uma sensação de expectativa começou a crescer dentro dele. Ele sabia que ela iria até ele....Na manhã seguinte, Isabela foi acordada por batidas i