Rubem virou a cabeça e percebeu que Mônica não tinha nenhuma cerimônia enquanto comia, claramente aproveitando cada mordida com satisfação. Ao vê-la tão à vontade, ele também deixou de lado a sua postura rígida. O caldo, que por si só era simples, ganhou um sabor especial ao ser cozido com os miúdos de porco. Cada colherada quente aquecia o estômago e surpreendia o paladar com um gosto reconfortante e delicioso. — Está bom. — Rubem arqueou as sobrancelhas, surpreso. Era a primeira vez que comia um prato assim, e estava muito melhor do que ele imaginava. Além disso, ele reconheceu que Mônica tinha talento na cozinha. Mônica, ao receber o elogio, abriu um sorriso satisfeito. — É claro que está! Eu treinei... Mas, no meio da frase, ela parou. Pensando bem, para que explicar isso? E se Rubem achasse que ela estava tentando ganhar a compaixão dele? Imediatamente, ela encerrou o assunto e voltou a comer, como se nada tivesse acontecido. Rubem franziu a testa, intrigado. — O quê?
Rubem viu Kelly caminhando em direção à sala de reuniões e empurrou a cadeira de rodas para segui-la, mas não entrou. Através da porta entreaberta, ele conseguiu enxergar Mônica, que estava em pé ao lado da mesa, apontando para a projeção do retroprojetor enquanto explicava algo com firmeza. Ele a observou em silêncio. A silhueta dela parecia ainda mais delicada naquela posição. Mônica usava um vestido de tricô ajustado, de tom bege claro, que destacava sua postura elegante. O cabelo estava preso de forma prática, deixando seu rosto bem definido e realçando seus traços refinados. Ela emanava uma aura fria e imponente, com uma confiança cortante em cada movimento. Era o retrato de uma profissional de sucesso. Rubem não pôde deixar de comparar com a Mônica de meses atrás, tão serena e até um pouco submissa. Agora, ela exalava autoconfiança e orgulho, características que ele mesmo ajudara a cultivar nela. Ao vê-la comandar a reunião com tanta determinação, Rubem sentiu algo raro: um
No dia seguinte, Mônica acordou se sentindo revigorada. Quando percebeu que estava deitada na cama com as roupas do dia anterior, ficou intrigada. Ela não conseguia lembrar o que tinha acontecido na noite passada. Ao descer as escadas e encontrar Rubem, resolveu perguntar.— Você desmaiou na cozinha. Eu te carreguei para o quarto. — Explicou Rubem.— Eu realmente desmaiei na cozinha? — Mônica ficou atônita, olhando para ele sem saber o que dizer. — Sr. Rubem, era só ter me coberto com uma manta, não precisava... O simples pensamento de Rubem, com sua mobilidade reduzida, carregando ela escada acima já a deixava desconfortável.— Você não é tão pesada assim, tem mais ou menos o peso da Íris. — Disse Rubem, enquanto abria o jornal e o folheava calmamente. — Mas, enquanto eu te arrastava, sua cabeça bateu algumas vezes no corrimão.— Será que eu fiquei lesada? — Mônica perguntou, alarmada, levando a mão à cabeça instintivamente.Rubem levantou os olhos e a olhou por alguns segundos. Depo
Mônica ficou com o rosto completamente vermelho de vergonha. Ela soltou um riso sem graça, virou-se rapidamente e, por dentro, se xingou de tudo quanto era nome. Justo na casa dos outros, precisava agir daquele jeito tão espalhafatoso?Rubem percebeu que o celular de Mônica, que estava em cima da mesa, começou a tocar. Ele aproveitou e desligou a música.— Mônica, seu celular.— Deve ser o entregador. — Disse Mônica, que, naquele momento, não queria encarar Rubem de jeito nenhum. Ainda se sentia constrangida. Então, falou. — Sr. Rubem, atenda por mim.Rubem olhou para a tela e viu que o nome exibido era "Mamãe". Ele ergueu uma sobrancelha. Definitivamente, não era o entregador.Como Mônica estava ocupada até os cotovelos com a massa e parecia bem concentrada, Rubem decidiu atender. Ele colocou no viva-voz.— Alô.— Ah, meu querido genro, como você está? — Malena reconheceu a voz de Rubem imediatamente. — E minha filha querida, onde ela está?Assim que ouviu a voz animada da mãe, Mônica
— Seu celular tá me atrapalhando a dormir. — Resmungou Íris, sem nem abrir os olhos, enquanto encostava a cabeça no peito de Lucas. Lucas pensou nos milhões que devia para ela e decidiu engolir o incômodo. Antes que a cabeça dela encostasse de fato nele, Lucas a empurrou de volta para a cama e foi direto para o banheiro. Íris caiu no colchão, sem muito impacto, mas perdeu o sono. Coçou os olhos, bocejou e, ainda meio sonolenta, foi atrás dele no banheiro. Ela abriu a boca, esperando que Lucas colocasse a escova de dentes em sua mão. Enquanto ela escovava os dentes, perguntou: — O que a gente vai comer hoje? — Vamos pedir comida. — Lucas foi rápido e, em poucos minutos, já tinha terminado de se arrumar. — Eu preciso sair agora. Íris virou-se para ele com um olhar incrédulo, parando de escovar os dentes. — Eu não quero! É o Rubem que tá te chamando? Se for, manda o Bruno ir no seu lugar. Eu não vou comer comida de delivery! Lucas sentiu a veia na testa pulsar. — É só u
— Para, chega! — Lucas interrompeu a fala de Mônica. — Irmã, você tá pensando besteira demais. — Então, quem era a garota que atendeu o celular? Vendo que Mônica não ia deixar o assunto morrer, Lucas massageou a testa, já se preparando para inventar uma desculpa: — Não era uma garota. Era um amigo meu. Ele só tem a voz fina... Parece mulher. Mônica ficou tão chocada com a resposta que pisou no freio bruscamente, parando o carro. Ela virou a cabeça para ele, incrédula: — Você... É gay? Lucas fechou a cara na hora e respondeu, quase gritando: — Claro que não! Mônica, no entanto, achou que ele estava tentando esconder. Para não pressioná-lo, tentou soar tranquila enquanto dizia: — Tá tudo bem, sabia? Hoje em dia isso é super comum. Mas, por enquanto, não fala nada pra mamãe. Conheça ele melhor antes, sem pressa. Durante o resto do caminho, o clima ficou um tanto desconfortável. Mônica acreditava que homossexuais geralmente enfrentavam muitas dificuldades de aceitação e
Lucas já tinha desistido de corrigir as suspeitas sobre sua orientação sexual. Ele sabia que, mesmo explicando cem vezes, Mônica não iria acreditar. — Essa casa foi comprada no financiamento. Você e a mamãe podem morar nela tranquilas. — Disse ele, tentando encerrar o assunto. Mônica ficou em silêncio por alguns segundos e depois deu um leve tapa no ombro dele: — Certo. Você se esforçou bastante. Lucas ficou desconfortável. Ele tinha a impressão de que aquele "se esforçou" da irmã soava mais como se ela estivesse falando de alguém que se sacrificava fisicamente para agradar o parceiro. Quando os dois saíram de lá à tarde, Malena fez questão de entregar as garrafas de vinho que havia preparado. Ela ainda falou muito, dando conselhos e recomendações, e os dois irmãos a ouviram pacientemente antes de irem embora. Depois de deixar Lucas no lugar combinado, Mônica dirigiu de volta para casa com a mente pesada e o humor abatido. Ela não conseguia aceitar a ideia de que seu irmão,
— Eles não são diferentes de ninguém. — Respondeu Rubem. Ele parecia ter entendido o ponto de Mônica e continuou. — Você quer saber se o fato de a orientação deles mudar tem algum tipo de sinal, certo? — Exatamente isso! — Mônica bateu na perna, empolgada. — Você é muito inteligente! — Não tem sinal nenhum. — Disse Rubem, seco. Mônica ficou sem reação por um instante. Rubem lançou um olhar na direção dela e começou a explicar calmamente: — Eles são como qualquer outra pessoa, não têm nenhuma diferença. Quando encontram alguém de quem gostam, o que importa é a conexão, a afinidade. Se eles gostam, não se importam com o gênero. — Ah, entendi... — Murmurou Mônica, com o olhar perdido. Não era à toa que ela nunca tinha percebido nada de estranho com Lucas, mesmo depois de tantos anos vivendo com ele. — Por que você tá perguntando isso? — Rubem questionou. Assim que ele perguntou, Mônica sentiu um nó na garganta, como se estivesse prestes a chorar. O rosto dela murchou imedi