Selene despertou com a cabeça latejando e o corpo pesado, como se tivesse sido atropelada por uma carruagem. Sua pele ardia, especialmente o braço esquerdo, onde sentia uma dor latejante. Quando tentou se mexer, soltou um gemido baixo.
— Senhorita Arctos? — chamou uma voz feminina, suave, porém insistente. Selene piscou algumas vezes até focar na mulher de uniforme da Academia, que a observava com uma mistura de impaciência e preocupação. — Levante-se. A senhora Irina e o senhor Thornheart estão esperando. É hora do exame. O coração de Selene acelerou. O exame de sangue. Ela se arrastou para fora da cama, percebendo que ainda usava a mesma roupa da noite anterior. O frasco de feromônio agora vazio estava em sua bolsa. O que eu fiz? Pensou. Sentia o corpo quente, como se estivesse febril, e cada passo parecia pesado. A funcionária a guiou pelos corredores silenciosos até o laboratório da Academia. Selene tentou ignorar o cheiro doce que exalava de si mesma, mas a intensidade do aroma era inegável. Quando chegaram à porta, ela hesitou. — Entre, senhorita Arctos — ordenou a funcionária, empurrando-a suavemente para dentro. --- Lá dentro, Madame Irina, Darius, e um homem de aparência séria — o médico responsável — esperavam por ela. Assim que Selene entrou, o ambiente pareceu mudar. O cheiro que ela exalava invadiu o ar, pesado e embriagante. Madame Irina estreitou os olhos com desagrado, enquanto Darius franziu o cenho e cruzou os braços. — Selene Arctos — disse Madame Irina, ríspida. — Sente-se. Selene obedeceu, tentando manter a compostura, embora suas mãos tremessem. O médico deu um passo à frente, ajeitando seus óculos com nervosismo. — Senhorita Arctos… — Ele parou, franzindo o nariz. — Está… se sentindo bem? — Eu… sim. Só estou um pouco… quente. O médico trocou um olhar inquieto com Madame Irina. — Senhor Thornheart, talvez você possa esperar lá fora. Este exame pode ser… complicado. Darius não se moveu. — Vou ficar — disse ele, firme. O médico limpou a garganta e se aproximou de Selene, mas hesitou quando o cheiro se intensificou. — Aparentemente, a senhorita está em seu período de… procriação — disse ele, desconfortável. — O cio. Selene congelou. — O quê? Madame Irina arqueou uma sobrancelha. — Cio? Isso não faz sentido. Ela é uma híbrida. Híbridos não entram no cio. O médico recuou um passo, secando o suor da testa. — Talvez nenhuma tenha entrado até então, mas o cheiro… é muito forte e inconfundível. Nossos instintos lupinos não mentem ou se enganam; ela está no cio. Darius observava Selene com uma expressão ilegível, mas havia tensão em seu olhar. Seus olhos brilharam por um instante, e ele apertou a mandíbula, desviando o olhar. — Não podemos fazer o exame de sangue dela nessas circunstâncias — continuou o médico. — Qualquer resultado seria comprometido pelos hormônios. Madame Irina parecia irritada. — Então, o que sugere, doutor? — Recomendo que aguardemos alguns dias, até que os níveis hormonais se estabilizem. Selene sentiu o alívio correr por seu corpo, mas sabia que era temporário. Madame Irina se aproximou, parando ao lado de Selene. — Senhorita Arctos, algo aqui não faz sentido. Se houver qualquer tentativa de fraude, isso será descoberto. Compreende? Selene assentiu lentamente. — Sim, senhora. — Ótimo. Você está dispensada… por enquanto. Darius a seguiu até a porta, mas antes que Selene pudesse sair, ele a segurou pelo braço — o mesmo braço que ele havia arranhado na noite anterior. Darius olhou para o braço de Selene, onde a ferida que ele havia causado na noite anterior estava completamente cicatrizada. Ele tocou a pele com os dedos, pressionando levemente, e, para sua surpresa, não encontrou nenhuma marca ou indício de lesão. — Isso… — Ele murmurou, mais para si mesmo do que para Selene. — Isso não deveria acontecer. Selene sentiu o olhar dele percorrendo seu braço, seu toque inexplicavelmente intenso. Ela tentou desviar o olhar, incomodada, mas Darius, sem tirar os olhos dela, deu um leve sorriso — algo entre a surpresa e a satisfação; Selene não sabia, mas havia passado no teste. Ela não sabia se devia sentir alívio ou apreensão com a expressão dele, mas a única coisa que conseguia sentir era o peso crescente de seu corpo, devido aos efeitos do feromônio. Ter tomado o líquido que deveria ser usado apenas como um perfume era inclusive sua última memória da noite anterior. Todo o resto havia desaparecido. Ele a observou por um momento, a expressão de curiosidade em seus olhos misturada com algo mais, por culpa dos feromônios. Era difícil ler o que ele sentia, mas a presença dele, tão próxima, a deixava desconfortável. Darius, então, pareceu recuperar a compostura, seus ombros tensionando enquanto ele continuava. — Está no cio. Isso não é uma situação comum. É perigoso andar por aí com os hormônios tão descontrolados. Selene estremeceu ao ouvir aquelas palavras. O cio. Sua mente tentava entender, mas a sensação de calor e a necessidade de fugir daquela sala eram mais fortes. A pressão que ela sentia no peito estava ficando insuportável, e tudo o que queria era sair dali. — Mas… Madame Irina me dispensou. — Ela balbuciou, tentando se segurar. Darius a observou por um segundo antes de dar um leve suspiro, como se já tivesse esperado por essa resposta. — Madame Irina pode dispensá-la, mas eu não. — Ele disse, com um tom autoritário. — Venha. Precisa ficar isolada até o cio passar. Não podemos arriscar. Antes que Selene pudesse protestar, ele a puxou levemente, guiando-a para fora da sala com firmeza. Não havia espaço para discussão, e ela, que ainda tentava compreender o que estava acontecendo com seu corpo, se sentiu impotente diante da força que ele exercia, tanto fisicamente quanto psicologicamente. Aquele homem tinha o controle sobre tudo — e parecia saber mais do que ela jamais poderia entender. Enquanto caminhavam pelos corredores, o cheiro de Selene parecia aumentar, tornando o ambiente mais denso e abafado. A cada passo, ela sentia seus pensamentos se dispersando, sua mente turvada por um desejo instintivo, como se o próprio ar estivesse oprimindo sua racionalidade. Ela não sabia o que ele queria dela, mas também sabia que não tinha escolha. Darius a conduziu até um quarto isolado nos fundos da academia, um espaço simples, mas funcional. Não havia janelas, apenas uma cama e uma mesa no centro. O silêncio era incômodo, e ela se sentou, hesitante. Darius olhou para ela, sem dizer uma palavra, mas seu olhar dizia tudo. Ele observava com uma intensidade desconcertante, estudando cada movimento dela. Quando Selene tentou levantar-se, ele fez um sinal para que ficasse quieta. — Não tente fugir. Você está em um estado muito vulnerável agora. — Ele disse, a voz suave, mas com a autoridade que não deixava margem para discussão. — O cio não é algo simples. Quando passar, podemos retomar tudo isso, mas por agora, você precisa descansar. — E o que vai acontecer comigo? — ela perguntou, finalmente. Darius a observou por bastante tempo, quase como se se manter ali fosse magnético, mas saiu sem lhe dizer uma palavra, como se quisesse fugir dali.Selene permaneceu enclausurada por dias, presa a um quarto simples e abafado, sem janelas ou qualquer forma de ventilação. O ar pesado parecia saturado pelo cheiro que emanava de sua pele, resquícios de um feromônio que ainda se recusava a desaparecer por completo. Mesmo após o fim do cio, o aroma característico dos híbridos lobo não deixou seu corpo, tornando-a ainda mais evidente entre os outros. O tempo passava em uma névoa indistinta enquanto ela tentava recuperar o controle sobre seu próprio corpo, sobre sua própria vontade. Mas o medo continuava ali, rastejando sob sua pele.Os boatos se espalharam rápido. Em pouco tempo, toda a Academia sabia da híbrida que entrara no cio, algo impensável. O espanto deu lugar ao fascínio, depois à especulação. Muitos a viam como uma aberração; outros, como um mistério a ser decifrado. Suas colegas, que antes a ignoravam ou desprezavam, agora a observavam com um misto de inveja e incômodo. Como era possível que Selene, filha de uma loba solitári
O primeiro baile do ano se aproximava, e a tensão na academia crescia a cada dia. As meninas se preparavam com esmero, escolhendo vestidos luxuosos e maquiagens impecáveis, tudo planejado para atrair a atenção dos alfas. Para elas, era uma oportunidade de conquistar aqueles que governavam o mundo e podiam mudar suas vidas com um único olhar. Mas, para Selene, a expectativa da noite era sufocante.Diferente das outras, ela não tinha a intenção de se tornar um prêmio. Era humana, e humanos não podiam se envolver com híbridos de lobo. O simples toque de um alfa selaria seu destino de forma trágica. Casar-se com um deles significaria sua morte inevitável. Essa era a regra implacável de seu mundo.Mesmo assim, não tinha escolha a não ser comparecer ao baile. Para sua sorte, desde que ingerira a essência com feromônios, o cheiro lupino não sumira, a deixando ao menos segura, já que como estava sendo extremamente observada, sair da cidade Alta para comprar mais essência, era impossível. Na
— É claro que não é humana; se fosse, Selene, você acha que estaria aqui? — Darius sorriu, um brilho desdenhoso nos olhos. Ele se aproximou com calma, mas sua presença dominadora tornava o ambiente sufocante. — Engraçado você ter tanto medo de um alfa. Nunca quis estar com um homem? Sentir prazer?As palavras a atingiram como um golpe, deixando um gosto amargo na boca. Um nó se formou em seu estômago, e, por um instante, Selene sentiu as pernas fraquejarem. Mas não podia ceder. Ele queria exatamente isso: ver sua expressão se desfazer em vulnerabilidade.— Eu… — tentou dizer algo, mas sua voz morreu antes de sair completamente. Humilhação queimava sob sua pele. Como ele ousava?— Nunca se sentiu atraída por um homem? Nem mesmo por um alfa? — Darius insistiu, a voz sedosa, carregada de desafio.Selene desviou o olhar, lutando para manter a compostura.— Eu não sou esse tipo de garota… — murmurou, esforçando-se para manter o tom firme.Ele soltou uma risada baixa, cheia de escárnio.— M
Naquela tarde, o alojamento de Selene fervilhava de animação. As garotas riam e tagarelavam enquanto pacotes luxuosos eram entregues, envoltos em fitas de cetim e embalagens sofisticadas. Cada presente parecia ser um troféu silencioso, um reflexo de status e atenção. Os olhos brilhavam de expectativa, os sorrisos eram largos, mas Selene sentia-se alheia àquele frenesi.Ao entrar no quarto, seu coração disparou ao ver a pilha de caixas sobre a cama. Não eram apenas lembranças triviais. Roupas de grife, sapatos impecáveis, joias reluzentes. Tudo parecia exagerado, excessivo. No meio de tantos luxos, algo prendeu sua atenção: um pequeno envelope repousava ao lado de uma rosa negra, tão perfeitamente preservada que exalava um perfume suave e envolvente.Com dedos hesitantes, Selene pegou o bilhete. A caligrafia era elegante, desenhada com precisão e intenção. As palavras eram simples, mas carregadas de significado:"Para a bela Selene, Que me fez esquecer o mundo por uma noite. Que esta r
Após uma semana do baile, o nome de Aiden Vasquez ainda pairava nos corredores da academia, sussurrado entre risinhos e comentários cobiçosos. Ele era um dos alfas mais influentes e desejados, e o fato de ter demonstrado interesse por Selene não passou despercebido. Era a primeira vez que ele se interessava por alguém e toda a academia estava ansiosa, curiosa para seu próximo passo.A constatação de que ele com toda certeza já havia escolhido sua luna, veio na sexta-feira à tarde, quando Selene encontrou um bilhete delicadamente perfumado em sua mesa. As palavras eram diretas, sem espaço para recusas:"Selene, Gostaria que me acompanhasse amanhã para um passeio. Aguardarei você às dez horas, próximo ao portão principal."Ela segurou o papel entre os dedos, hesitante. A ideia de aceitar o convite fazia seu coração acelerar, mas recusar Aiden Vasquez poderia ser uma afronta perigosa, madame Irina ficaria sabendo e voltaria a persegui-la. No fundo, sabia que sua escolha já estava feita.
O tempo na academia passava mais rápido do que Selene imaginava. Em três meses, ela já se sentia parte daquele mundo, tão diferente de tudo o que conhecia. Não havia mais a sensação de deslocamento ou a hesitação ao atravessar os corredores de pedra. Agora, cada canto do imenso edifício lhe parecia familiar, os rostos antes desconhecidos se tornaram comuns, e as aulas, que antes eram desafiadoras, passaram a ser parte de sua rotina.E, claro, havia Aiden.Havia um mês e meio que saíam juntos. Passeios por bosques floridos, visitas a vilarejos charmosos, tardes tranquilas sob o céu dourado do entardecer. Ele sempre segurava sua mão, seu toque leve e deliberado, como se quisesse que cada momento fosse gravado em sua pele. E naquela tarde, com um sorriso satisfeito, ele lhe prometera algo novo: uma viagem na próxima temporada. A promessa pairava em sua mente, aquecendo seu peito de um jeito que ela não queria admitir.Mas sua vida na academia não se resumia apenas a encontros românticos.
Selene caminhava pelos corredores da Academia, sentindo cada passo pesar mais do que o anterior. O ar lhe parecia denso, como se as paredes ao redor estivessem se fechando sobre ela. Seus dedos tremiam levemente, mas manteve os punhos cerrados para esconder o nervosismo. O exame de sangue aconteceria naquela manhã, e seu destino parecia selado.Ao entrar na sala onde o exame seria realizado, encontrou Darius já lá, recostado contra a parede, braços cruzados. Seu rosto estava impassível, mas Selene conseguia sentir o ar de provocação emanando dele. Raiva cresceu dentro dela. Não era justo. O que ela havia feito de tão grave para merecer ser destruída dessa forma? O tempo que passou na Academia havia sido um sonho, um vislumbre de uma vida que nunca teria na Cidade Baixa. Se fosse morrer, que fosse com a lembrança desses meses. Mas Darius precisava mesmo garantir que fosse humilhada antes?Ela se sentou na cadeira, forçando-se a respirar fundo enquanto uma enfermeira prendia o torniquet
O dia do baile finalmente chegou e, para a surpresa de Selene, nenhuma notícia sobre o exame de linhagem havia sido divulgada. A ausência de informações a inquietava. Ela não sabia se o exame realmente demorava ou se Darius estava planejando uma humilhação pública meticulosa. No entanto, naquela noite, ela decidiu que aproveitaria. Talvez fosse a última.O vestido que usaria foi enviado por Aiden. Um tecido fino e fluido, em um tom azul profundo, moldava-se perfeitamente ao seu corpo, destacando sua silhueta. As mangas longas tinham um caimento delicado e o decote em V era elegante, sem ser exagerado. O tecido cintilava sob a luz, como se refletisse as estrelas do céu noturno. Para complementar, pediu a ajuda de Astrid para fazer uma maquiagem mais elaborada. A amiga, habilidosa, desenhou um delineado impecável, sombreando seus olhos com tons suaves e realçando seus lábios com um tom avermelhado sutil.Quando Selene entrou no salão, Aiden já a aguardava. Seu olhar sobre ela era replet