03

Alerta de gatilho

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Este capítulo contém cenas de uso de drogas.

Hugo Castro

Desafrocho o nó da minha gravata aliviado por toda cerimônia ter se encerrado. Odeio esses eventos sociais, cheios de pessoas hipócritas da alta sociedade se fazendo de bons samaritanos apenas porque dão pequenas doações que nem fazem cócegas em seu milionário patrimônio.

Bufo me direcionando ao bar, enquanto  o mestre de cerimônia encerra o evento, esta é a melhor parte de todas. Pena que não servem nada forte. Estou aqui apenas, porque, Arthur Bacellar insistiu muito, o presidente da empresa. Alguém precisava representar o escritório. Existe um bom relacionamento  entre minha família e a família Bacellar há anos, muito mais que profissional.

Neste exato momento avisto um Bacellar, o único mal caráter que conheço, isto se o filho não seguir o mesmo caminho de Maicon. Ele veio representar as empresas comerciais da qual ele é o CEO. Nunca me afeiçoei a ele, sempre envolvido em escândalos. Evelyn merecia algo melhor. Sempre ouço falar das orgias das quais ele promove junto a seus amigos tão mal caráter quanto ele, e Evelyn desconhece, ou finge que desconhece.

Hoje não é um dia bom, pelo menos pra mim, na verdade nenhum tem sido. Ao me lembrar do motivo principal da minha raiva, viro a taça de champanhe em um só gole e observo Maicon bem a minha frente conversando com o deputado Mateo Duran do outro lado, outro pervertido. Alguns dos meus amigos do escritório já tiveram que limpar muitas sujeiras desse safado. Sua fama está relacionada a drogas, sua especialidade é trazer "novidades" para as "festinhas". E o infeliz também é casado, aliás muito bem casado. 

Os dois conversam como se tramassem algo. Certamente após o encerramento devem sair para se divertirem de verdade. Maicon parece tenso. Olha em seu relógio de pulso várias vezes. Peço ao garçom mais uma taça e continuo observando os cavalheiros. Vejo Maicon conversar ao telefone e ao desligar sua expressão muda, fica bastante irritado. Parece xingar um palavrão. E Mateo ri como se fosse uma piada. Logo retomam a conversa, Maicon pede a mesma bebida que eu e neste momento ele me nota. Nunca fomos grandes amigos e talvez por isso ele me olhou daquela forma hostil, depois se vira para Mateo e fala algo para ele. Certamente está contando sobre o quanto imbecil eu sou, talvez eu mereça este título, pois sou um idiota por acreditar em amor. Sim, eu acreditei, e essa foi a primeira e espero que seja a última vez, pelo menos no que depender de mim. 

Peço a terceira taça enquanto tenho uma brilhante ideia.Talvez eu precise tentar algo novo, me distrair um pouco. Chega de ser o cara sempre certinho, que vive de trabalho e responsabilidade. Talvez uma boa noite de farra me ajude a colocar a cabeça no lugar. Mesmo que no fundo eu saiba que estou completamente errado. Respiro e inspiro, abandonando minha taça vazia na bancada e devagar me aproximo dos dois folgazões. Cumprimento os rapazes que estavam muito alegres até eu me aproximar.

Sou recebido com desconfiança.

— Boa noite. Mais alguém entediado aqui ou sou somente eu?

— Está tudo bem, Hugo?— Maicon pergunta em tom sarcástico.

Os dois se entreolham.

— Estou muito bem. Melhor vou ficar se sair desse lugar pra algo mais animado.

Mateo dá um gritinho muito discreto.

— Eita! Alguém aqui resolveu aproveitar a vida!

Mesmo assim, Maicon ainda parece desconfiado. Afinal sabe do apreço que tenho por sua esposa e sogro. Faz sentido não confiar.

— Preciso experimentar algo novo.

— Nunca é tarde pra mudar — Maicon fala sorrindo entre os dentes. — Pena que é isso que temos pra hoje — fala pegando o champanhe e bebendo sem tirar os olhos dos meus.

— Sei que é mentira, Maicon. Vocês sabem como se divertir. E eu só quero um pouco disso.

— Hugo, você não deveria acreditar em tudo que escuta por aí.

— Você mesmo sempre me diz que eu deveria levar as coisas menos a sério, Maicon, olha eu aqui, disposto a tentar qualquer coisa! 

Mateo fica empolgado e é nítido em sua expressão.

— Qualquer coisa?

Maicon desvia o olhar.

— Sim, qualquer coisa que envolva prazer e diversão.

Talvez eu ainda não esteja sendo convincente o suficiente, vejo um pequeno sorriso sarcástico surgir no canto da boca de Maicon.

— Pare Hugo. Não seja patético.

Dou um passo para trás e ergo as mãos.

— Tudo bem. Sabem que tenho outros meios de conseguir diversão? Vocês dois não são os únicos que conhecem o caminho. A noite está apenas começando…

Falo e dou as costas, já que são babacas não pretendo insistir. Então, ouço Mateo:

— Dá uma chance pro cara, Maicon, vai ser divertido.

Porém, Maicon permanece irredutível. Deve me achar muito correto para participar de suas festinhas.

Então sinto Maicon tocar meus ombros. Paro por um instante e volto para eles.

— Caramba, você quer isso mesmo, Hugo?

Ele me analisa como se me desafiasse.

— Você não imagina o quanto.

De repente sua expressão muda, acho que o convenci.

O cara é mais imbecil do que eu imaginava.

Sinto um tapa nas costas. 

— Talvez seja uma boa ideia te mostrar o quanto a vida pode ser boa.

Mateo fica cada vez mais animado.

— Se prepare para ter a melhor noite da sua vida!

Maicon pede uma bebida para um brinde. Nada mudou, continuo sem grandes afetos por ele, pois tenho outros interesses, um que envolva, muita bebida e sexo, e o caminho para me desfrutar disto ele conhece muito bem.

Maicon mostra as chaves de um luxuoso hotel da cidade.

— Uoooou!— Mateo fala mais animado.

— Tenho uma reserva na suíte principal.Vou fazer alguns contatos pra não ficarmos sozinhos.

O garçom nos entrega mais bebidas e fazemos um brinde.

— E aquela encomenda, Mateo?— Maicon pergunta.

Ele sorri malicioso.

— Alguma vez te decepcionei? Tenho uma grande novidade. Vou receber a entrega no caminho, já fiz o pedido.

No mesmo instante imagino que seja algum tipo de droga. Mas que se dane, essa noite pretendo experimentar tudo que possa me trazer prazer. Minha vida já é a porra de uma droga!

— Ainda dá tempo de desistir.

Maicon fala com ar de deboche.

Me irrito com suas piadinhas. Já que estamos do lado de fora, retiro um cigarro do bolso e acendo. Não sou fumante, mas há três dias comprei esses, a fim de tentar acabar com minha ansiedade. Dou o primeiro trago sobre o olhar de Maicon.

— Espero realmente que supere minhas expectativas — Maicon fala incrédulo.

Dou mais um trago e jogo o cigarro no chão.

Os manobristas trazem nossos carros e sigo os dois. E quanto a mim, espero que realmente tudo isso vá valer a pena.

*

A suíte estava toda preparada, tive a impressão de que os planos de Maicon eram outros e que talvez estivesse mudado de ideia. Com apenas uma ligação ele providenciou três garotas, todas lindas, dignamente de capa de revista. Talvez se tratasse de uma agência de modelos. Elas estavam super animadas. As bebidas também já estavam lá. Fui retirando o paletó e me servindo de um whisky, precisava de algo forte. A ruiva já queria sexo. Me acompanhava tentando tirar o restante das minhas roupas, pedi que fosse para hidro e me esperasse por lá, assim me livrei dela por um momento, e ela foi obediente. 

O som estava alto em uma música dançante. Me sento numa poltrona ainda tentando compreender por qual motivo ainda estava insatisfeito. Olho para o lado e vejo igualmente Maicon com seu olhar vagando enquanto a morena tentava o excitar a qualquer custo. Percebo que ambos não estávamos muito satisfeitos.

— Me deixe! — Ouço Maicon gritar com a jovem se levantando. Ele parecia bem irritado. Vejo o copo se quebrando em várias partes, ele o lança na parede. — Não era você que eu queria. Porra!

Assim eu tive a certeza de que ele tinha outros planos.

Me lembro de um boato no qual falavam que ele tinha uma amante na cidade. Mas nada nunca foi comprovado. Seria essa tal mulher que ele estivesse esperando?

Quer sabe, foda-se não é da minha conta.

A morena que estava com ele vem ao meu encontro e começa a fazer uma espécie de striptease à minha frente. Vejo Mateo surgir somente de roupão todo molhado.

— Isso que é vida, cara!  — ele grita comemorando: — aquela loira é  gostosa pra caralho, ela faz de tudo.

Sorrio fingindo estar adorando.

Ele caminha próximo de onde estou, retira vários saquinhos e deposita um pó na mesa.

— Toma, gata!

Vejo a mulher se aproximando sorridente, ela se ajoelha, enrola um papel e cheira aquilo.

Mateo se junta a ela, na sequência os dois se beijam. Confesso que sinto mesmo é nojo daquela cena. Enquanto suas línguas são compartilhadas, a morena me convida a se juntar a eles. Logo penso em algo que justifique minha negativa.

Pego um saquinho, preparo o pó bem ao meu lado em uma mesa de vidro e mostro a eles que vou estar ocupado. É uma loucura, nunca fiz isso. Mas prefiro do que me misturar naquela orgia nojenta. Tento preparar a mistura, não sou ingênuo a ponto de não saber como se faz. Utilizo meu cartão de crédito, depois faço um canudo com uma nota de cinquenta e início o processo. A princípio a sensação é estranha, mas logo sinto minha frequência cardíaca aumentar, o som parece mais alto, uma adrenalina invade meu corpo, tenho a sensação de que meu corpo pulsa, é estranho.

Vejo Maicon comemorar eufórico se divertindo com a cena. Agora ele tem certeza de que eu vim pra me divertir.

Após algum tempo, ainda estou lúcido, e por mais que tenha gostado da sensação que aquela porcaria me trouxe, vou deixar um pouco pra mais tarde, afinal a noite vai ser longa.

A morena desfalece no sofá depois de toda droga que Mateo lhe deu.

A tal loira da piscina surge e tenta convencer Maicon a transar com ela. Ela está por trás dele lhe massageando os ombros, mas não sei o que está acontecendo, ele parece não querer sexo nesta noite.

Tomo mais um copo de whisky.

A ruiva surge usando um micro biquíni, toda molhada, confesso que ela me deixou excitado. Talvez eu devesse aproveitar. 

A música está muito alta e começa a tocar um som dançante. A loira se junta com a ruiva e juntas começam a dançar um passo praticamente ensaiado. Pulam, cantam a letra usando as mãos como microfone. A ruiva me busca puxando a lapela da minha camisa e depois a loira busca Maicon. Os quatro estamos dançando, ele parece um pouco mais animado. Vejo passar as mãos no corpo da loira e beijá-lá. O clima começa a ficar quente, ela tira sua blusa enquanto rebola. Sinto a ruiva também rebolar em meu membro. Mateo surge bêbado feito um porco. Insiste em participar da dança. Ele se enrosca em minha parceira e já estou com nojo outra vez. Droga! Desse jeito não transo essa noite.

Empurro Mateo, ele começa a balbuciar algo, mas o som está alto e não consigo compreender, Maicon começa a rir da cena. Porém aos poucos seu sorriso vai se empalidecendo e seus olhos estão fixos na entrada principal.

Então, vemos uma mulher parada bem a porta chocada com a cena que assiste.

Chego a pensar que fosse outra garota de programa, porém, essa é diferente, e sexy sem ser vulgar. Tem uma beleza diferenciada.

Engulo seco enquanto Maicon mais parece ter visto um fantasma.

Sinto as mãos da ruiva desabotoar minha camisa, ainda estamos dançando, mas fica difícil não olhar a nova visitante, sua pele é negra, tem curvas magníficas, rosto perfeito, lábios carnudos. Seus traços mostram delicadeza e elegância, um conjunto perfeito, é alta, cabelos médios com leves cachos nas pontas, usa um sexy vestido de renda que parece ter sido costurado em seu corpo. Logo tenho uma leve sensação de que já a vi em algum lugar.

Apesar de tanta beleza, a mulher não parece muito satisfeita com a cena que vê. Ela observa tudo com seus braços cruzados arqueando as sobrancelhas.

Vejo Maicon largar a loira que continua dançando sozinha e ir atrás da recém chegada. De repente, a dança não tem mais graça, a ruiva não me atrai mais.

As mãos da ruiva se livram de minha camisa, entretanto, lhe afasto pedindo por um instante. 

Maicon foi atrás da mulher misteriosa que saiu do nosso campo de visão.

Não entendo por qual motivo fico tão inquieto.

Talvez seja pura curiosidade. Afinal quem será ela e por que está aqui? De repente fico interessado em descobrir. Estou perturbado, escolho me afastar para pegar mais uma bebida, porém decido por uma garrafinha de água, chega de bebidas por um momento. Ainda me esforço para saber onde Maicon teria ido com a moça, mas não consigo vê-los.

Mateo se diverte, aliás acho que foi o único que aproveitou tudo e de todas as formas. As duas mulheres se esfregam nele pra completar minha antipatia da noite. Mas fico imaginando se Mateo sabe de algo, sobre a tal garota que Maicon levou. Me aproximo dos três patetas dançando a minha frente e me esforço para entrar na dança carregado de outra intenção.

— Maicon guardou a melhor garota só pra ele  — falo.

Mateo dá uma enorme gargalhada. Mas vale a pena, pois ele sabe de tudo e logo abre a boca.

— Que nada, aquela não é garota de programa. — ele ri — Aquela é somente dele! E nem chegue perto dela ou Maicon te mata!

A ruiva invade meu espaço tentando me beijar, eu me esquivo. Quase comemoro quando a música termina. Mateo busca uma garrafa de champanhe e bebe no bico da garrafa mesmo. E pra minha infelicidade se inicia outra música tão animada quanto a última.

— E por que ela é tão especial?

— A única coisa que eu sei é que estão juntos... — ele para pra beber mais champanhe. Mateo está tão bêbado que despeja o líquido para fora mais do que ingere.

Já estou cansado. Me jogo no sofá e quando a ruiva me acompanha eu a dispenso. Ela aproveita a droga deixada na mesinha e se abaixa para usar.

Começo a fazer uma reflexão sobre tudo. Percebo que de nada adiantou vir até aqui. Não fiz sexo, apenas bebi um pouco mais e usei um pouco de droga. Entretanto não quero mais.

Me levanto e sigo para varanda me lançando sobre o guarda corpo de vidro. Observo a noite e acendo um cigarro. Me sinto entediado, frustrado talvez, não desejava que essa noite terminasse assim. Mas sei que isso aqui não tem nada a ver comigo, acho melhor eu ir embora e me esquecer de tudo isso. Talvez ainda haja tempo de ir para outro lugar.

Então sigo para o hall, passo por Mateo que desta vez está usando outro tipo de droga.

Pego meu paletó, quando termino de vestir escuto os gritos vindo do quarto. A voz feminina soa desesperada, pedindo socorro.

Merda! O que está acontecendo ali dentro?

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