Passei metade da noite acordado, vigiando o sono da Sulamita. Sono era apenas maneira de dizer, porque a cada instante ela acordava, se debatendo e chorando.Meu coração estava apertado. Achamos por bem, contar logo a ela o que tinha acontecido a respeito do sequestro da mãe dela, e do fim do Zaruk. A Sula precisava encarar os problemas da vida e aprender a se fortalecer com eles, mas para ela, que era uma menina tão cheia de traumas, aquilo não era fácil.De tudo aquilo que vivemos nos últimos meses, a única coisa boa foi a presença da Alina em nossas vidas. Ela chegou e revirou tudo ao nosso redor. A mulher era uma fortaleza e meu amigo estava louco por ela.Eu estava feliz por ele. Leonardo passou por maus bocados na vida e desde que estávamos juntos há mais de dez anos, tudo que fez foi pensando na mãe e na irmã e agora ele merecia um pouco de felicidade.Olhei o relógio da mesinha de cabeceira: 05:00 e o dia ameaçava clarear pela cortina da janela. Fui até lá e fechei, escurecend
As coisas começavam a se resolver lentamente. O processo envolvendo Leonardo e Rafael estava quase no final e ele estava ansioso em virar aquela página.Com base nas declarações que ele e Rafael tinham prestado para a justiça, foram emitidos vários mandados de prisão em comum com a justiça da Turquia e alguns componentes da máfia comandada por Hilal Ramazan foram presos e tiveram seus bens confiscados. Uma grande surpresa foi descobrir que muitos dos bens de Hilal Ramazan estavam em nome da Zaila.— Você disse que o nome dela é Zaila Ramazan?! - Ele perguntou surpreso ao promotor.— Sim. Você não sabia que eles eram casados?— Claro que não!Olhei para ele e pela primeira vez, vi o Leonardo empalidecer mortalmente.Eu também estava surpresa e confusa. Como casados? Porquê? A Zaila disse que odiava Hilal e de acordo com Leonardo sempre o defendeu e a Sula, muitas vezes o enfrentando de igual para igual.Aquela história parecia cortada em fragmentos. A Zaila escondia alguma coisa, com
O Rafael estava meio bobo com aquela ideia de casamento, mas no fundo eu estava preocupado. A Sula ainda não estava pronta para mergulhar em um relacionamento. Eu procurei não pensar no quanto aquela história ainda me incomodava. Era difícil aceitar que minha irmã que acabara de sair da adolescência, ia se casar com meu amigo doze anos mais velho e muito mais vivido que ela. Será que ele sabia o tamanho da responsabilidade que aquilo implicava? Ela era uma menina frágil e cheia de traumas e eu não permitiria que ele a machucasse.Alina estava tentando fazer com que ela e minha mãe começassem a viver a vida de forma mais leve e insistiu para que elas dessem início a sessões de acompanhamento com um psicólogo.Eu estava em meu apartamento com as duas, mas aquela situação estava me incomodando. Eu queria a Alina perto de mim. Não conversamos sobre quem mudaria de casa, mas era preciso definir aquilo o mais rápido possível. Não levei trinta e cinco anos da minha vida sozinho, para agora
Agora não tinha mais como fugir daquela conversa.Observei a Sulamita entrar no carro do Rafael e acenei para os dois. Eles tinham se casado naquela tarde e agora entravam no carro a caminho do apartamento deles. Leonardo aparentemente conformado com a partida da irmã, apenas observava os dois, com as mãos enfiadas nos bolsos da frente do jeans escuro que vestia.Quando o carro sumiu na esquina, ele virou e começou a andar calado para dentro do prédio. Segui atrás dele e só quando ele fechou a porta do apartamento encarei seu rosto sério.— Relaxe homem, ela vai ser feliz.Ele tirou o casaco e se jogou no sofá.— Eu mato o Rafael se ele não cuidar bem dela.Tirei o sapato de salto e sentei no sofá em frente a ele.— Ele vai cuidar. Ele é louco por ela.— Ele não é o único apaixonado! – ele resmungou, baixo.— Como? Não entendi - perguntei confusa.Ele me encarou com os cotovelos apoiados no joelho.— Quando vai parar de ser durona comigo, hein?Sorri com a expressão de cachorro abando
Conviver com Leonardo estava saindo melhor do que eu imaginei. Ele era o cara que toda mulher queria ter como marido e nem de longe se parecia com o Leonardo de um ano atrás, quando o conheci.Não se podia dizer que ele era um homem calmo e pacifico. O sangue quente as vezes aflorava e a gente tinha discussões homéricas, tipo aquela de quando ele quis me impedir de viajar com o Lucas para uma operação fora da cidade e precisávamos dormir em um hotel, próximo ao local em que seria realizada a missão.— Não vai de jeito nenhum!Ele falou calmo, deitado na cama com as mão atrás da cabeça, me olhando afivelar o coldre e colocar a arma na perna.— Claro que eu vou, Leonardo! É meu trabalho!— Tsc Tsc, com o Lucas você não vai.Respirei fundo. Eu não queria começar uma briga aquela hora da manhã.Coloquei as mãos na cintura e o encarei desafiante.— Você não manda em mim não, sabia?Ele levantou da cama e se aproximou calmo demais para o Leonardo que eu conhecia.— Não vou deixar você viaja
Aquela era uma operação mais que importante. Era a culminância de meses de investigação sobre pessoas que praticavam o golpe denominado saidinha bancária. Eram bandidos que ficavam à espreita de pessoas que iam fazer grandes movimentações bancárias ou simplesmente pensionistas que sacavam um mísero salário e ao saírem do estabelecimento, eram abordados por pessoas que diziam vender algo e ali, distraiam as pessoas para os acompanharem a algum local mais afastado e praticavam o golpe. Era uma rede bem estruturada de bandidos ligados a um chefe, que muitas vezes mantinha até um escritório, para se encontrarem e planejarem os golpes. Tinham espiões em empresas que se infiltravam para acompanhar a movimentação financeira e saber os dias que os funcionários iam aos Bancos e poder fazer a investida.O Rafael tinha sido essencial naquele trabalho. Ele era um investigador muito competente e foi responsável por colher informações importantes sobre a quadrilha que nos possibilitou chegar ao che
Era um momento difícil para mim.Voltar à Turquia me fazia lembrar de coisas que eu não queria trazer de volta para minha vida. Me fazia lembrar da infância ao lado da minha mãe e da violência sofrida nas mãos do meu pai. As memórias que guardo até os dez anos de idade são as melhores, pois ali eu ainda não tinha sido marcado pelas maldades da minha família. No entanto, quando minha mãe foi expulsa do pais e meu pai resolveu descontar sua frustração em mim, eu conheci o lado cruel da minha família. Foram longos anos de tristeza, revolta, desistência, resiliência e agora de liberdade e felicidade e voltar ali, era reviver tudo aquilo de novo.Olhei para minha mulher sentada ao meu lado, dentro do veículo que alugamos no dia anterior, no aeroporto. Só ela para estar ao meu lado sempre. Alina era daqueles tesouros que você demora a encontrar e eu tive a sorte grande, tive minha redenção aqui na terra e eu agradecia a Deus todos os dias por ter me dado uma pessoa tão especial.Olhei para
— Vamos Alina, atira!Minha mão tremia em volta do cabo da pistola 765 prateada, que fazia um contraste gritante com minhas unhas impecáveis e pintadas de vermelho. O homem estava ajoelhado em minha frente e ao invés de implorar para que eu não atirasse nele, parecia rir da minha cara de medo apontando a pistola para a cabeça dele.Lucas estava logo atrás de mim e engatilhou a arma dele, falando de forma a me encorajar:— Você vai atirar ou vai amarelar de novo, Alina!?Eu nunca tinha atirado em ninguém antes e a voz da minha mãe choramingando quando eu decidi ser policial, estava mais do que nítida em minha cabeça:— Minha filha, você vai se tornar uma assassina!— Não, mãe! Eu vou caçar os assassinos, é diferente!— Não é, não. Não se pode vencer o mal fazendo o mal.— Eu vou fazer o bem para a população!O bem seria livrar a sociedade daquele traste ajoelhado em minha frente. Sabia muito bem que se o levasse para a Delegacia, algum advogado de merda ia achar um jeito de devolvê-lo