O estalo da porta foi como um eco cortante que reverberou pelos corredores da mansão. Laura congelou. O barulho não parecia ter vindo da parte de cima da casa, onde ela estava com as crianças, mas do andar de baixo. Uma sensação de alerta percorreu sua espinha.
Ela olhou para o corredor vazio e, sem hesitar, saiu do quarto das crianças. Seus passos eram silenciosos, mas a tensão estava clara em cada movimento. O que estava acontecendo ali? Desde que chegara, algo parecia estranho na casa. A noite, que sempre trazia uma calmaria ilusória, agora parecia sombria e ameaçadora. E aquele som... Ele não era normal.
Enquanto descia as escadas, um flash de memória a atingiu — a discussão entre Lucas e Vanessa mais cedo. Os gritos. As palavras cortantes. Algo não estava certo entre eles, e ela estava começando a perceber que havia muito mais por trás daquela fachada perfeita de uma família feliz.
Chegando ao final da escada, ela se escondeu nas sombras do corredor, perto do escritório. De onde estava, podia ver uma luz fraca vindo de dentro, como se alguém estivesse lá, mas a porta estava entreaberta. A voz de Vanessa, baixa, mas ainda assim clara, chegou até ela.
— Você está sendo estúpido, Lucas. Não pode continuar fazendo isso.
Laura segurou a respiração, tentando não fazer nenhum ruído. O que estavam discutindo agora? Estaria Vanessa falando sobre ela? Sobre o incidente com a carta? Ela não sabia, mas sentia que aquilo era mais sério do que imaginava.
— Eu sei o que estou fazendo! — a voz de Lucas foi mais firme, mas também carregada de uma frustração que Laura não tinha ouvido antes. — Eu não estou mais suportando isso. Você está me sufocando, Vanessa.
A tensão nas palavras de Lucas fez Laura estremecer. Isso não era uma conversa qualquer. Era algo mais profundo, algo que estava prestes a explodir.
— Sufocando? — Vanessa riu, mas não era um riso de diversão. Era um riso amargo, cheio de veneno. — Eu te dei tudo, Lucas. Tudo o que você queria e precisava. E você ainda tem a audácia de me dizer que está sufocado?
Laura deu um passo atrás, sem querer ser vista, mas não conseguia se mover. Sua curiosidade estava muito além de qualquer receio. O que ela estava ouvindo? O que estava acontecendo entre Lucas e Vanessa? Era mais do que uma briga de casal.
— Você não entende o que está acontecendo, Lucas — continuou Vanessa, sua voz agora mais baixa, mais insidiosa. — Eu sei o que você fez. Sei exatamente o que está escondendo.
Laura franziu a testa. O que ela queria dizer com isso? O que Lucas estava escondendo? E por que ela estava falando assim, com tanta certeza?
Foi quando ela ouviu o som de algo pesado sendo colocado sobre a mesa. Lucas estava agitado.
— Não fale de coisas que você não entende! — ele gritou, sua voz cheia de raiva.
O silêncio se seguiu por alguns segundos, e então Laura ouviu uma porta se abrir rapidamente. Era Vanessa, saindo do escritório e passando perto de onde ela se escondia. Laura se encolheu contra a parede, sem se mover, sem fazer barulho.
Vanessa não a viu, mas a sensação de perigo parecia aumentar. Quando Laura olhou para o escritório, a porta estava ainda aberta, mas agora havia um vazio na atmosfera, uma sensação de que algo muito ruim estava prestes a acontecer.
Ela precisava descobrir o que estava acontecendo ali. Precisava saber mais, não apenas por curiosidade, mas porque algo dentro dela sentia que não podia mais ignorar os sinais. A tensão estava prestes a quebrar. Ela viu quando Lucas abriu a gaveta e tirou algo de dentro e ficou olhando.
—
Horas depois, Laura estava de volta ao quarto das crianças, tentando manter a calma. Shofia e Theo dormiam profundamente, mas ela não conseguia deixar de se perguntar o que tinha ouvido mais cedo. Vanessa estava claramente escondendo algo, e Lucas, por mais que tentasse disfarçar, estava em conflito consigo mesmo. O que ele estava escondendo? E por que estava tão perturbado?
Seu celular vibrou, quebrando o silêncio da noite. Ela olhou para a tela, esperando ver uma mensagem de sua mãe ou do irmão, mas o número era desconhecido. Desconfiada, ela hesitou por um momento antes de atender.
— Laura? — a voz do outro lado da linha era familiar, mas ao mesmo tempo estranha. — Sou eu, Clara. Você está bem?
Ela levou um segundo para processar a pergunta, mas a sensação de algo errado a fez responder rapidamente.
— Sim, estou. Por quê?
— Eu não sei como te dizer isso, mas... a situação em casa está piorando. Sua mãe... ela não está reagindo bem ao tratamento. Você precisa voltar logo.
Laura sentiu uma onda de pânico tomar conta de seu corpo. Sua mãe. O estado dela. Aquelas palavras, simples e diretas, fizeram seu coração disparar.
— O que está acontecendo, Clara? Ela... ela está pior? — Laura perguntou, sua voz agora mais tremida.
— Não sei. Ela não está falando. O médico diz que é melhor você vir. Você tem que estar aqui.
Laura sentiu uma pressão na cabeça, uma mistura de angústia e confusão. O que ela deveria fazer? O que era mais importante agora? A situação com sua mãe? Ou a casa, as crianças e a questão de Lucas e Vanessa?
Antes que ela pudesse responder, a ligação caiu. Clara tinha desligado abruptamente. Isso era sério. Sua mãe não estava bem. Ela precisava tomar uma decisão.
—
No momento em que ela fechou os olhos, uma sensação de urgência a envolveu. Não podia mais ignorar o peso da situação em sua vida. Sua família precisava dela. Mas o que isso significava para o trabalho que ela tinha agora? E para as crianças?
Ela respirou fundo e decidiu que precisava sair daquela casa por um tempo, precisava ir até sua mãe, garantir que ela estivesse bem. Mas, enquanto se preparava, uma ideia percorreu sua mente: e se Vanessa estivesse envolvida de alguma forma na situação que estava acontecendo com Lucas? O que ela sabia sobre tudo aquilo?
De repente, uma batida na porta do quarto das crianças fez seu coração parar por um momento. Era ela mesma que estava prestes a sair, mas a figura de Lucas apareceu no vão da porta.
— Laura, precisamos conversar. Agora.
O tom dele não deixava dúvidas: ele estava sério, furioso, mas também cansado. Havia algo de diferente em seu olhar, algo que ela não conseguia identificar.
Ela hesitou por um momento, sentindo um misto de medo e curiosidade, mas sabia que, naquele momento, precisava agir. Precisava saber o que ele queria. Não podia mais ficar no escuro.
Ela se levantou devagar da cadeira, se preparando para encarar o que fosse.
— O que aconteceu, Sr.? — perguntou, sua voz firme, mas o coração batendo forte no peito.
Antes que ele pudesse responder, um som distante, como um grito, cortou o ar da mansão. Algo não estava certo. E, no fundo, Laura sabia que nada seria como antes.
O grito ecoou pelos corredores da mansão, uma explosão de terror que fez o sangue de Laura gelar. Ela olhou para Lucas, que estava imóvel, com os olhos arregalados de surpresa. O som vinha de baixo, parecia ser da sala de estar.
Lucas balançou a cabeça, como se estivesse tentando se convencer de que aquilo não era real.
— Não pode ser... — ele murmurou, antes de sair correndo na direção da escada.
Laura, com o coração acelerado, seguiu-o imediatamente, sem saber o que esperar, mas sentindo que algo estava prestes a acontecer que mudaria tudo.
— Volte para o quarto e fique com as crianças, Laura. Eu cuido disso. — A voz de Lucas era cortante, deixando claro que aquilo não era um pedido, mas uma ordem.Laura hesitou, mas assentiu lentamente. Não era o momento de discutir. Ele desapareceu rapidamente pelas escadas, a tensão estampada em cada movimento. Ela tentou se convencer de que deveria obedecer e voltar para as crianças, mas a curiosidade era mais forte. Algo estava acontecendo naquela casa, algo maior do que ela podia entender, e ela precisava saber o que era.Movendo-se silenciosamente, Laura desceu atrás de Lucas, mantendo distância suficiente para não ser notada. Quando chegou perto do escritório, viu a porta entreaberta e o som abafado de vozes exaltadas.— O que está fazendo com isso? — Lucas perguntava, a voz grave e carregada de frustração.— Isso? — Vanessa respondeu, com um tom de ironia cortante. — Estou tentando entender como você deixou isso aqui, tão à vista. — A palavra "isso" foi acompanhada de um som de
O amanhecer trouxe uma mistura de alívio e peso ao coração de Laura. Ela havia passado a noite inteira acordada, revendo sua decisão. Era o melhor a ser feito. A tensão naquela casa não era mais sustentável, e sua família precisava dela.Ela respirou fundo ao descer as escadas. O silêncio ainda pairava pela mansão, mas ela sabia que, em breve, todos estariam acordados. O café seria servido, as crianças correriam pela casa, e, naquele momento, ela precisaria se despedir.Ao entrar na cozinha, encontrou Maria já ocupada preparando o café. A governanta ergueu os olhos e sorriu de leve, mas sua expressão logo mudou ao perceber a bolsa pequena ao lado de Laura.— Você vai embora? — perguntou Maria, baixando o tom de voz.Laura assentiu, tentando sorrir.— Sim. Chegou a hora.Maria suspirou, enxugando as mãos no avental.— Vou sentir sua falta, Laura. Mas você sabe o que é melhor para você.Laura queria responder, mas foi interrompida por passos apressados no corredor. Shofia entrou na cozi
Laura colocou a última peça de roupa de volta no armário, respirando fundo para acalmar a tempestade de emoções que sentia. O reencontro com as crianças havia sido avassalador, mas ela sabia que ainda tinha muito o que resolver. Ao fechar a pequena bolsa, um som inesperado a trouxe de volta ao momento.Toque, toque, toque.A batida na porta a fez gelar por um segundo. Assim que abriu, Lucas estava ali, imponente como sempre, mas com um olhar que misturava seriedade e algo mais que ela não conseguia decifrar.— Laura, precisamos conversar.Ela assentiu, dando um passo para o lado para que ele entrasse. Lucas caminhou até o centro do quarto, as mãos nos bolsos, enquanto Laura encostava a porta.— Eu sei que você está passando por um momento difícil — começou ele, a voz baixa, mas carregada de intenção. — Mas preciso entender exatamente o que está acontecendo.Laura respirou fundo, tentando organizar os pensamentos.— Sr., eu não estava planejando contar isso, mas minha mãe... — Sua voz
— Chegamos, senhorita Laura. — A voz calma do motorista cortou o silêncio.Laura olhou pela janela, respirando fundo ao reconhecer a casa simples onde cresceu. As luzes da sala estavam acesas, lançando sombras familiares pelas cortinas gastas. Ela agradeceu ao motorista e desceu do carro, sentindo o coração pesado enquanto atravessava o portão enferrujado.No banco da frente, o motorista observava, mas não disse nada. Ele sabia que aquela visita tinha um peso maior do que aparentava.— Laura! — A voz de Davi, seu irmão mais novo, ecoou quando ele a viu na porta. — Você está aqui!Ele correu para abraçá-la, e Laura retribuiu com força, percebendo como ele estava magro.— Como estão as coisas, Davi? E a mamãe? — perguntou ela, olhando além dele para o corredor que levava ao quarto da mãe.Davi hesitou, mas finalmente respondeu:— Não muito bem. Os remédios estão acabando, e o médico disse que ela precisa de cuidados constantes.O peso das palavras caiu sobre Laura como uma avalanche. El
— Lucas, precisamos conversar agora! — A voz de Vanessa ecoou pela sala de estar, cortando o silêncio da casa.Lucas, que acabara de descer para buscar um café, parou na escada e olhou para ela, cansado.— Vanessa, não é o momento. As crianças acabaram de dormir, e eu não quero discussões.Ela se aproximou rapidamente, o som dos saltos batendo contra o piso de madeira.— Não é uma discussão, Lucas. É uma questão de prioridade. Eu sou a mãe do seu próximo filho, ou isso já não significa nada para você?Ele passou a mão pelos cabelos, visivelmente incomodado com a intensidade dela.— Claro que significa. Mas você precisa parar de usar isso como um trunfo a cada conversa. Eu estou tentando lidar com muitas coisas ao mesmo tempo.— Muitas coisas? — Vanessa cruzou os braços, a raiva evidente em seus olhos. — Ou apenas uma coisa: Laura.Lucas estreitou os olhos, sua paciência finalmente chegando ao limite.— Vanessa, isso é ridículo. Você está tentando transformar Laura em um problema que e
— Sr., você já pensou sobre o que conversamos? — Laura perguntou com cautela, enquanto Lucas organizava os papéis que estavam espalhados pela mesa do escritório.Ele olhou para ela, distraído. Não era sobre os papéis ou as decisões que precisavam ser tomadas a respeito das escolas. Era sobre o espaço que Laura começava a ocupar, não só na casa, mas em sua vida. Ultimamente Lucas andava distraído e não sabia como lidar com que estava começando a sentir por Laura.— Sim, eu pensei. Acho que visitar algumas escolas na próxima semana seria o primeiro passo a se fazer. — Lucas respondeu, tentando manter o foco na conversa prática, embora sua mente estivesse mergulhada no tumulto de emoções que Laura sempre parecia trazer consigo.Antes que Laura pudesse responder, Vanessa entrou abruptamente na sala, seu salto alto ecoando no chão.— Lucas, querido, preciso falar com você. É algo importante. — Sua voz carregava um tom calculado, quase açucarado, que fazia Laura recuar instintivamente.— Cl
As risadas ecoavam pelo salão principal, misturadas ao tilintar das taças de cristal. Vanessa era o centro das atenções, deslumbrante em um vestido vermelho, exibindo um sorriso radiante enquanto circulava entre os convidados. Lucas estava ao seu lado, mas sua expressão era distante, quase ausente, como se estivesse ali apenas em corpo.Laura, depois de colocar as crianças para dormir deixou sua curiosidade falar mais alto e escondida atrás da porta semiaberta do corredor, observava tudo com o coração pesado. A cena à sua frente parecia um teatro bem ensaiado, uma peça em que ela não tinha lugar, mas cujas consequências a afetavam profundamente.Ela mordeu o lábio, reprimindo as lágrimas, enquanto Vanessa levantava a taça e fazia um brinde.— A uma nova fase em nossas vidas! — Vanessa proclamou, sorrindo triunfante para os convidados. — E, claro, ao homem que eu amo, Lucas!O salão explodiu em aplausos, mas Laura sentia cada palmas como um golpe.Mais cedo naquela noite, Vanessa fez s
O som do motor do ônibus soava como um zumbido interminável enquanto Laura olhava pela janela, apertando a alça de sua bolsa surrada. Seus pensamentos dançavam entre o nervosismo e a esperança. Era a última chance. Se não conseguisse esse emprego, a luz no fim do túnel ficaria mais distante.A cidade passava em flashes ao seu lado: prédios altos, ruas movimentadas e, finalmente, as áreas mais calmas e arborizadas. Quando o ônibus parou, ela desceu rapidamente, ajeitando o cabelo preso de maneira prática. A mansão era ainda mais imponente do que parecia na foto do anúncio. Portões altos de ferro e um jardim perfeitamente aparado anunciavam o status da família para quem ela esperava trabalhar."É agora ou nunca", murmurou para si mesma, endireitando a postura antes de tocar a campainha.A porta foi aberta por uma mulher de uniforme, de meia-idade, que parecia estar na casa há mais tempo do que qualquer móvel.— Você é a Laura?— Sim, sou eu — respondeu, com um sorriso tímido.— Entre. O