Amanda observava Sofia brincar com seus bonecos em um canto da sala. A luz suave que entrava pela janela iluminava o rosto da menina, que exibia uma alegria quase inocente, mas rara. Desde que chegara à mansão Castellani, Amanda havia notado algo que a deixava inquieta: apesar de sua energia e inteligência, Sofia era uma criança solitária. Mesmo rodeada por conforto e luxo, faltava-lhe algo essencial, a presença ativa de seu pai, Victor.
Amanda compreendia que Victor Castellani não era um homem fácil. Sempre impecável, com sua postura altiva e olhar sério, ele parecia carregar o peso do mundo sobre os ombros. Desde a morte de sua esposa, Camila, ele havia se fechado em uma redoma de trabalho e responsabilidades, como se estivesse tentando se proteger de mais perdas. Mas Amanda sabia que, por trás daquela fachada rígida, havia um pai que, mesmo desajeitado, amava sua filha. Ele só precisava de um empurrão na direção certa.
Foi com essa determinação que Amanda se aproximou de Sofia naquela manhã, um sorriso conspiratório nos lábios.
— Sabe, eu estava pensando... Que tal fazermos algo diferente hoje? Algo bem divertido? — perguntou, inclinando-se para olhar Sofia nos olhos.
Sofia, que até então colocava dois bonecos lado a lado como se fossem amigos inseparáveis, levantou os olhos, curiosa.
— Tipo o quê? — perguntou, franzindo a testa.— Uma tarde de lazer! — Amanda exclamou, com entusiasmo teatral. — Podemos brincar, fazer um piquenique no jardim, talvez até assistir a um filme depois.
Sofia sorriu, mas sua empolgação foi rapidamente substituída por uma expressão cética.
— Papai não vai querer. Ele nunca tem tempo pra essas coisas.Amanda abaixou-se ao lado da menina, segurando delicadamente sua mão.
— Deixa isso comigo. Prometo que vou convencer ele, tá bom?Sofia hesitou por um momento antes de assentir, um brilho de esperança começando a aparecer em seus olhos.
Mais tarde, Amanda esperou pacientemente que Victor descesse para o café da manhã. Quando ele surgiu, como sempre impecável em seu terno escuro, ela percebeu a tensão habitual em seus ombros, como se já estivesse mentalmente navegando por reuniões e decisões importantes.
— Bom dia, senhor Castellani — cumprimentou ela, com um tom casual que escondia sua determinação.
— Amanda, bom dia. — Ele respondeu, pegando sua xícara de café sem sequer olhar para ela.
Amanda respirou fundo. Sabia que precisava ser direta.
— Senhor Castellani, gostaria de sugerir algo que acredito ser importante para a Sofia.Victor finalmente ergueu os olhos, franzindo ligeiramente a testa.
— Algo relacionado à educação dela?— Não exatamente. — Amanda cruzou as mãos na frente do corpo, mantendo a postura firme. — Pensei em organizarmos um momento de lazer. Algo simples, mas que permita que vocês dois passem um tempo juntos.
Victor inclinou-se para trás, claramente desconfortável com a ideia.
— Amanda, meu dia já está completamente tomado. Tenho reuniões e uma viagem para planejar. Não há espaço para esse tipo de coisa.Amanda sabia que essa seria sua resposta inicial, mas não recuou.
— Com todo respeito, senhor Castellani, acredito que isso não é apenas sobre tempo, mas sobre prioridade. Sofia sente sua falta, e acredito que momentos como esses podem fazer uma grande diferença para ela.Victor abriu a boca para retrucar, mas foi interrompido pela chegada inesperada de Sofia, que estava ouvindo parte da conversa.
— Papai, por favor. — pediu ela, a voz suave, mas cheia de esperança.
Victor olhou para a filha, e algo em seu olhar pareceu amolecer. Ele suspirou profundamente, como se estivesse travando uma batalha interna.
— Tudo bem — cedeu ele, finalmente. — Mas não se acostumem com isso.
Sofia soltou um gritinho de alegria e correu para abraçar Amanda, que sorriu triunfante.
***
A manhã foi repleta de preparativos. Amanda cuidou de todos os detalhes, desde preparar uma cesta de piquenique com sanduíches e suco de laranja até arrumar um espaço aconchegante no jardim com um cobertor e almofadas. Também selecionou jogos de tabuleiro e uma bola, pensando nas possíveis atividades que poderiam ajudar a quebrar o gelo entre pai e filha.
Quando Victor apareceu no jardim, Amanda teve que conter o sorriso. Ele havia trocado o usual terno por um jeans escuro e uma camisa azul clara. Apesar de ainda carregar uma postura rígida, o visual mais casual o tornava menos intimidante.
— Não acredito que me convenceram a fazer isso — murmurou ele, cruzando os braços.
— Vai ser divertido, senhor Castellani. — Amanda respondeu, com um sorriso encorajador.
Sofia correu até ele com a bola nas mãos.
— Vamos jogar, papai?Victor suspirou, mas, ao ver o olhar esperançoso da filha, não conseguiu recusar. Amanda observou enquanto eles começavam a brincar. No início, Victor parecia deslocado, jogando a bola com movimentos quase mecânicos. Mas, aos poucos, ele começou a relaxar. Sofia ria alto cada vez que ele fazia algo bobo, como errar de propósito, e logo Amanda percebeu que Victor estava começando a aproveitar o momento.
Após alguns jogos, todos se sentaram no cobertor para comer. Amanda serviu os lanches enquanto Sofia falava sem parar sobre as brincadeiras e os jogos que queria experimentar em seguida.
— E depois disso, podemos assistir a um filme? — perguntou Sofia, os olhos brilhando de expectativa.
Victor arqueou uma sobrancelha e olhou para Amanda, como se estivesse perguntando silenciosamente: Você planejou isso também? Amanda apenas deu de ombros, divertida.
— Acho uma ótima ideia — respondeu ela, descontraída.
***
De volta à sala de estar, Amanda e Sofia passaram um tempo escolhendo o filme perfeito. Sofia escolheu uma animação colorida e divertida, que claramente não era o tipo de entretenimento que Victor estava acostumado. Ele até tentou protestar, sugerindo algo mais sério, mas, no fim, cedeu à escolha da filha.
Quando o filme começou, Sofia se aconchegou no sofá entre Amanda e Victor. No início, ele parecia distraído, mexendo no celular ocasionalmente. No entanto, conforme a história leve e os risos de Sofia preenchiam a sala, ele começou a prestar atenção. Amanda percebeu quando ele soltou uma risada baixa em um momento particularmente engraçado do filme.
Para Amanda, aquele momento foi uma pequena vitória. Ver pai e filha juntos, rindo, mesmo que brevemente, era um sinal de que os muros entre eles estavam começando a ruir.
Após o filme, Sofia subiu para o quarto, alegando estar cansada. Amanda e Victor ficaram sozinhos na sala, o silêncio preenchido apenas pelo som distante de um relógio.
Victor parecia perdido em pensamentos, mas finalmente quebrou o silêncio.
— Eu devo admitir, isso foi... agradável.Amanda sorriu, mas não deixou transparecer o orgulho que sentia.
— Sofia se divertiu muito, e isso significa muito para ela.Victor a olhou, os olhos escuros revelando uma vulnerabilidade rara.
— Não é fácil para mim, Amanda. Depois que Camila morreu... — Ele fez uma pausa, respirando fundo. — É difícil lidar com a ideia de criar memórias sem ela.Amanda sentiu o peso de suas palavras. Por um momento, pensou em como a dor de Victor moldava suas ações e sua resistência em se abrir.
— Eu entendo, senhor Castellani — disse ela, com gentileza. — Mas Sofia precisa de você agora, mais do que nunca. Esses pequenos momentos fazem uma grande diferença para ela.
Victor assentiu lentamente, parecendo absorver suas palavras.
— Obrigado por organizar isso. Sei que foi ideia sua.Amanda deu um pequeno sorriso.
— Foi um prazer. Se precisar de ajuda para criar mais momentos como esse, estarei aqui.Victor ficou em silêncio por um momento antes de algo inesperado acontecer. Ele sorriu, um sorriso tímido, antes de se levantar e sair da sala.
Amanda ficou parada ali por alguns instantes, sentindo que, apesar de todas as dificuldades, havia dado um passo importante para ajudar aquela família a encontrar um pouco de luz em meio à escuridão.
Capítulo 6 Amanda terminava de arrumar a mesa para o café da manhã quando notou que Sofia ainda não havia descido. Era estranho. Geralmente, a menina era a primeira a aparecer, cheia de energia e perguntas curiosas sobre o que fariam naquele dia. Mas naquela manhã, o silêncio parecia mais predominante que o de costume, e Amanda sentiu um calafrio de preocupação.— Dona Teresa, Sofia ainda está dormindo? — Amanda perguntou, tentando disfarçar a inquietação em sua voz.A governanta, que colocava cuidadosamente uma bandeja sobre o balcão, balançou a cabeça. — Não, querida. Eu a vi no jardim mais cedo, mas parecia… diferente. Não sei explicar. Talvez seja bom você ir falar com ela.Amanda assentiu, pegou um suéter para proteger-se do ar frio da manhã e seguiu em direção ao jardim. Passando pelas portas de vidro, avistou Sofia sentada sob o carvalho imponente que dominava o centro do espaço. A menina estava encolhida, com as pernas dobradas contra o peito, o rosto parcialmente escondido p
Capítulo 7 Amanda estava ajudando Dona Teresa a finalizar a arrumação da mesa de jantar. Depois da conversa com Sofia e Victor mais cedo, sentiu que precisava participar, de algum modo, para ajudar a quebrar a barreira de frieza que dominava aquele lugar. — Tem certeza de que ele vai vir? — Dona Teresa perguntou, cética, enquanto temperava uma salada. — O senhor Victor não costuma jantar na mesa com ninguém. Ultimamente, ele mal come. — Tenho, sim — Amanda respondeu, com mais convicção do que realmente sentia. — Hoje foi diferente. Ele prometeu que tentaria passar mais tempo com Sofia. E eu acredito nele. Dona Teresa deu de ombros, mas não disse mais nada. Havia algo na determinação de Amanda que lhe dava uma ponta de esperança. Pouco antes do jantar, Amanda foi até o quarto de Sofia para buscá-la. Bateu de leve na porta e entrou quando ouviu o murmúrio tímido da menina. Sofia estava deitada na cama, folheando distraída um livro de desenhos animados. Seus olhos se iluminaram
Capítulo 8Enquanto Amanda cruzava o extenso jardim em direção à entrada, seu coração estava cheio de expectativa. Após o jantar harmonioso da noite anterior, Amanda percebeu que Victor estava começando a baixar a guarda, e ela queria aproveitar aquele momento para criar novas memórias com Sofia e, talvez, ajudar Victor a se reconectar ainda mais com a filha. No caminho, avistou o jardineiro, o senhor Augusto, que podava cuidadosamente as roseiras próximas à fonte.— Bom dia, senhor Augusto! — cumprimentou Amanda com um sorriso caloroso.— Bom dia, dona Amanda. Está um dia bonito hoje, não? — respondeu ele, levantando-se e limpando as mãos no avental.— Está sim, perfeito para renovar energias — disse Amanda, sentindo o aroma das flores ao seu redor antes de seguir adiante.Ao entrar na mansão, Dona Teresa já estava na cozinha preparando o café da manhã. Amanda cumprimentou-a rapidamente e subiu até o quarto de Sofia. Bateu de leve na porta e ouviu a voz son
Capítulo 9Amanda saiu do carro entrando na casa, modesta, mas aconchegante, parecia envolvê-la em um abraço de calma e segurança, algo que Amanda valorizava, caminhou até a cozinha. A cozinha era pequena com armários antigos onde tantas conversas com sua mãe haviam acontecido. Amanda acendeu a luz, iluminando o ambiente com um tom amarelado, e começou a preparar um jantar rápido.Enquanto picava legumes para fazer uma sopa, seus pensamentos vagavam. Finalmente, depois de meses de busca, tinha conseguido um emprego estável. O alívio que sentia era imenso, quase como se pudesse respirar fundo pela primeira vez em muito tempo. As contas acumuladas, o peso do aluguel e, principalmente, o custo do tratamento de sua mãe haviam se tornado um fardo que ela carregava sozinha. Agora, Amanda sentia que começava a ver a luz no fim do túnel.Porém, mesmo aliviada, não podia deixar de pensar nas pessoas para quem agora trabalhava. Victor Castellani, um homem tão sério e reservado, parecia carregar
Capítulo 10Diante do espelho, ajeitava os fios soltos de seu rabo de cavalo. Vestia uma roupa simples, mas confortável, adequada para mais um dia de trabalho. Apesar da aparência tranquila, sua mente estava inquieta.Desde que começara a trabalhar para Victor Castellani, sua rotina havia ganhado uma estabilidade que há muito tempo não conhecia. Porém, nos últimos dias, um sentimento novo vinha em uma crescente nela, algo que ela não sabia como lidar.Amanda balançou a cabeça, como se pudesse afastar os pensamentos.— Não, Amanda. Isso é errado — murmurou para si mesma.Lembrou-se de sua posição na casa. Era a babá de Sofia, apenas isso. Victor era seu chefe, um homem marcado pela tragédia, que dedicava todos os esforços à filha e ao trabalho. Além disso, a última coisa que Amanda queria era complicar sua vida com sentimentos que poderiam arruinar tudo o que ela havia conquistado.Pegou sua bolsa e desceu as escadas rapidamente. Antes de sair, foi até o quarto de sua mãe para verifica
Capítulo 11Era uma tarde tranquila na Mansão dos Castellani. Amanda estava terminando de organizar a agenda de Sofia, enquanto a menina brincava no tapete da sala com suas bonecas. Victor, recém-chegado do trabalho, folheava alguns papéis em uma poltrona próxima. A serenidade da cena era um contraste com o ritmo acelerado que Victor estava acostumado no mundo dos negócios.Amanda hesitou por alguns instantes antes de falar.— Senhor Castellani? — chamou, sua voz suave mas firme o suficiente para chamar sua atenção.Victor ergueu os olhos dos documentos, franzindo levemente a testa.— Sim, Amanda?Ela respirou fundo antes de continuar.— Eu estava pensando... O que acha de levarmos Sofia ao parque de diversões hoje à noite? Está um clima agradável, e acho que ela iria adorar.Victor arqueou uma sobrancelha, claramente surpreso com a sugestão. Ele raramente saía de casa para atividades de lazer, muito menos em público, onde ele e Sofia poderiam ser o centro de atenção.— Ao parque? — p
Capítulo 12Amanda entrou no quarto de hóspedes da mansão dos Castellani com passos lentos, ainda sentindo o peso da intensidade da noite que passara ao lado de Victor e Sofia no parque de diversões. Sua mente estava tumultuada, com pensamentos que insistiam em girar ao redor do olhar intenso que Victor lhe lançara antes de ela subir para o quarto.Colocando sua bolsa e pequenos pertences no criado-mudo ao lado da cama, ela respirou fundo, tentando acalmar os nervos. Dirigiu-se ao banheiro com sua nécessaire, decidida a tomar um banho quente para relaxar antes de dormir.A água escorria por seu corpo, levando embora a tensão, mas não os pensamentos. Por que Victor a havia pedido para ficar? E aquele olhar... aquele toque breve e intenso que ele lhe dirigira antes. Amanda balançou a cabeça, tentando afastar os devaneios. Ele era seu chefe, um homem poderoso e reservado. Não fazia sentido ela sequer cogitar outra coisa.Após se vestir com seu pijama, uma camisola simples e confortável,
Capítulo 13Amanda preparava Sofia para a escola, enquanto a menina, com a típica energia infantil, tagarelava sobre o dia anterior. A lembrança da noite passada, quando Victor a beijou, ainda pairava na mente de Amanda. Mesmo que ele fosse reservado e, às vezes, difícil de ler, o beijo parecia carregado de emoções. Ela não sabia ao certo como lidar com isso, mas uma pequena faísca de esperança brilhava dentro dela. Talvez, apenas talvez, Victor estivesse começando a baixar as muralhas que o cercavam.Victor, por outro lado, não tinha a mesma serenidade. Ele estava no escritório de sua mansão, revisando alguns contratos, quando foi abruptamente interrompido pelo som do interfone. O segurança informou que Rodrigo, um antigo sócio, estava no portão insistindo para entrar.— Diga que estou ocupado — Victor respondeu, impaciente.— Senhor, ele está ameaçando criar uma cena — insistiu o segurança.Victor respirou fundo, sentindo o peso da irritação crescer. Sabia que Rodrigo não era do tip