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Capítulo 02 - Lembranças de um futuro cada vez mais distante

A noite havia caído sobre a propriedade da Cosa Nostra, envolvendo o ambiente em uma penumbra dourada, criada pelas luzes baixas das lanternas espalhadas pelos jardins. O treinamento havia terminado e a maioria dos membros da casa já se recolheram para a segurança das muralhas. 

Aurora permanecia no terraço, observando o céu estrelado. A brisa noturna fazia seus cabelos negros dançarem suavemente, enquanto ela observava a lua. 

Matteo apareceu silenciosamente atrás dela, como uma sombra. Mesmo sem ouvir seus passos, Aurora sentiu sua presença. Ele sempre tinha aquele efeito, não precisava de palavras para preencher o espaço. Era como se o ar ao redor dele fosse diferente, mais denso, mais carregado de algo que ela não conseguia definir.

Não esperava encontrar você aqui a essa hora. — disse ele com sua voz baixa e grave cortando o silêncio.

Aurora virou-se devagar, encontrando os olhos dele. Havia algo intenso no olhar de Matteo, algo que a deixava desconcertada, mas que ela não podia evitar. Ele vestia uma camisa preta que realçava seus ombros largos e o físico que ele havia cultivado nos últimos anos. Mesmo na penumbra, era impossível ignorar o magnetismo que ele exalava.

Prefiro as estrelas ao barulho lá dentro. — respondeu Aurora, tentando soar indiferente.

Matteo deu um pequeno sorriso, aquele que fazia seu coração vacilar. Ele se aproximou, parando ao lado dela e olhou para o céu.

Elas são bonitas mas, nem de longe são tão impressionantes quanto certas pessoas que conheço.

Aurora desviou o olhar rapidamente, sentindo o calor subir em suas bochechas. Ele sabia exatamente o que dizer para deixá-la sem palavras e ela odiava o quanto isso a afetava.

Você é muito confiante, Matteo — retrucou, tentando recuperar a compostura.

Ele riu suavemente, virando-se para encará-la.

Confiança é essencial no nosso mundo, não acha? Além disso, você é minha prometida, Aurora. Eu tenho o direito de elogiá-la.

Aurora sentiu o peso das palavras, um lembrete do destino que os unia. Eles eram peças em um jogo maior, herdeiros de mundos que dependiam de suas alianças. Porém, havia algo mais ali. Algo que ia além do simples dever.

E se eu não quisesse ser sua prometida? — perguntou ela de repente, sua voz um pouco mais baixa, como se temesse a resposta.

Matteo a observou por um longo momento, sua expressão ficou séria. Ele deu um passo à frente, aproximando-se o suficiente para que ela pudesse sentir o calor dele, mesmo na noite fria.

Você tem o direito de escolher, Aurora. Sempre terá. Só quero que saiba que, se depender de mim, farei de tudo para que você queira ficar.

O coração dela disparou com a intensidade daquelas palavras. Havia sinceridade na voz dele, algo que ela não esperava. Aurora não respondeu imediatamente, apenas olhou para ele, tentando decifrar o que havia por trás daquele olhar profundo e daqueles gestos calculados.

Matteo deu mais um passo, agora tão próximo que seus dedos quase se tocavam.

Não quero que você seja minha porque nossos pais decidiram isso. Quero que escolha ficar ao meu lado porque acredita que podemos construir algo juntos.

Aurora segurou a respiração, sentindo o peso da confissão pairar entre eles. Ela desviou o olhar por um instante, voltando a encarar o céu estrelado, mas agora com um sorriso tímido nos lábios.

Talvez você consiga me convencer, Matteo. Talvez.

Ele sorriu, satisfeito com a resposta vaga, mas promissora. Matteo recuou um passo, sabendo que havia plantado uma semente e saiu da varanda. Aurora ficou ali, sozinha novamente, seu coração estava acelerado e a mente cheia de possibilidades.

A brisa noturna trazia uma promessa no ar, de algo que ainda estava por vir e, naquela noite, sob as estrelas, o futuro de Matteo e Aurora parecia cheio de incertezas, mas também de esperança.

✲ ✲ ✲

Algumas semanas depois

Aurora Demetriou

A luz do sol infiltrava-se suavemente pelas cortinas do meu quarto e eu me encontrava em total estado de contemplação, perdida em pensamentos que dançavam como as sombras nos cantos do ambiente. Era como se a vida que eu conhecia há quinze anos estivesse desabrochando diante de mim, revelando camadas de emoções que eu lutava para entender.

Há pouco mais de 10 anos, deixei a Grécia e a segurança da minha família para viver na Itália, com a família daquele a quem fui prometida, um garoto que mal conhecia. A tradição dos casamentos arranjados ainda era forte e eu era apenas uma peça em um jogo sobre o qual não tinha controle algum. 

Desde antes de estarmos no ventre de nossas mães, nossos destinos foram entrelaçados. Hoje, ao refletir sobre isso, um nó de revolta e impotência se formava em meu estômago. 

Lembro-me, com clareza, da raiva que senti aos quatro anos, quando olhei nos olhos do meu pai e o considerei cruel por me afastar da minha mãe e me forçar a aceitar um futuro escolhido por ele, não por mim.

A única coisa que eu sabia era que meu escolhido era o filho do Don mais poderoso da máfia, só por isso, já o odiei antes mesmo de conhecê-lo. 

Quando cheguei à Itália, algo inesperado aconteceu. O que deveria ser desprezo se transformou em confusão, a forma como cuidava de mim e os olhos azuis daquele garoto me fizeram sentir em casa.

Enquanto observava o jardim pela janela, refletia sobre o meu destino ter tomado um rumo que jamais imaginei. Os primeiros raios de sol dançavam entre as folhas, e eu via Matteo conversando alegremente com Vincenzo. O sorriso dele parecia tão familiar, mas ao mesmo tempo inatingível. 

Morar com sua família desde pequena tinha como objetivo promover nossa aproximação, por conta do nosso casamento ser arranjado. Quando éramos crianças vivíamos juntos, mas agora na adolescência, era como se uma barreira invisível nos separasse.

Os momentos de cumplicidade que vivemos naquela noite no jardim pareciam ter se dissipado, deixando no ar apenas o eco de promessas vazias. Conforme os dias avançavam, eu sentia que o futuro que ele desenhava em palavras suaves, tornava-se cada vez mais distante — uma miragem se esvaindo aos poucos, como se o calor do sol estivesse evaporando.

No fundo, eu me perguntava se aquilo tudo, a tradição, o dever, as aparências, não acabaria nos engolindo por completo. 

O olhar de Matteo atravessava o jardim, mas já não me encontrava. 

“Até quando conseguiríamos ignorar a verdade que pulsava sob o peso desse ritual?” — essa pergunta não sai da minha cabeça.

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