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ANA MARIA Eu prometi estar com ele. E foi por essas palavras que liguei para Felipe e pedi para ele me justificar no trabalho, coloquei Malú no transporte escolar e agora estamos aqui, chegando na rua onde Pedro mora. Chegamos na portaria e Miguel apertou a campainha. — Por gentileza, viemos ver o Pedro Monteiro. — Doutor Miguel, o senhor pode subir, o senhor nunca pediu para ser anunciado antes, já é de casa. Miguel me olhou confuso e segurou minha mão. Entramos pelo elevador no qual Pedro nos trouxe da última vez e subimos até o vigésimo terceiro andar. O frio na barriga era incontrolável, minhas mãos suavam mais que o habitual. — Que bom ter vocês aqui. Fico feliz que aceitou minha proposta, irmão. Miguel o cumprimentou com um aperto de mão e assentiu com a cabeça. — Entre, vamos tomar café, enquanto esperamos a chave. Queria te falar antes, que tio Antônio quer muito falar com você. — Não tenho nada para falar com eles. — Miguel, tio Antônio gosta muito de você
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MIGUEL Acordei num quarto branco e com um acesso no braço. Ouvia sons de batimentos e ninguém no quarto. Parecia hospital. Olhei tudo ao redor e nada se parecia com o que passei, quando estava na rua. Em silêncio, aguardei que alguém viesse, sempre aparece, mesmo que eu não queira. A verdade é que eu queria apenas uma, naquele momento: Ana. Onde ela está? Procurei alguma coisa que fizesse alguém entrar no quarto e não encontrei, ainda bem que a porta se abriu, revelando Antônio e Agnes. — Meu filho, como você está? Seu pai me ligou, avisando que você tinha desmaiado. Está tudo bem, querido? — Eu estou bem. A Ana? — Ela teve que ir para casa. Não pôde ficar, disse que tinha que pegar a Malú, me pediu para dar notícias sobre você, assim que acordasse. —: Mais tarde, Antônio. Não vamos perturbar a mente do nosso filho agora. Ele teve um desmaio, com certeza é sua lucidez voltando. Devemos deixá-lo respirar. Um outro homem entrou no quarto. — Boa noite. — Doutor Brancco, alguma
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FELIPE Malú, muito espertinha, já correu para o carro. Adora passear. Eu amo essa menina, amo a mãe dela. Ana foi a família que eu não tive desde que me assumi, e apesar do meu jeito hétero, que tive que aprender a ser, porque não é só da parte da minha mãe que sofria retaliação, tive que me virar com primos e tios também. Tive que esconder desde sempre minha orientação, por medo do que as pessoas pudessem pensar, pois aqueles que deveriam me dar apoio, me humilhavam e cuspiam barbaridades. Foi duro me descobrir gay e não ter nenhum tipo de suporte de nenhum lado onde eu morava. E por saber disso, meus primos achavam que podiam fazer o que quisessem comigo, tive que me livrar de muitos deles no soco, e de um tio meu também, que encheu a porra do cu de cachaça e achou que tinha liberdades comigo. Por morar em barraco e num quintal compartilhado, ele foi parar dentro da nossa casa, no canto onde eu dormia. Dei uma surra no capeta que queria abusar de mim, quando era um adolescente
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ANA MARIA Miguel dormia calmamente na cama do hospital, enquanto eu o observava. Na noite passada o médico fez alguns exames e disse que hoje, na parte da manhã, nos traria todos os resultados juntos para dar um diagnóstico claro sobre seu estado. Espero que fique tudo bem, desejo o melhor para ele. Uma enfermeira passou e me entregou um kit para a minha higiene pessoal, agora de manhã. Nem para isso eu tinha me preparado. Quando o carro chegou lá em casa, eu apenas troquei Malú e Felipe, que estava comigo, também veio. Ainda bem que ele veio e pôde passar a noite cuidando da minha filha, para que eu pudesse acompanhar Miguel. Ainda cheguei aqui e encontramos sua mãe no corredor, ela não fez questão de ser gentil e foi embora logo em seguida. Não entendo como o pai, uma pessoa tão agradável e gentil, suporta uma mulher tão mesquinha e amarga como ela. Depois de usar o banheiro, que ficava no quarto, voltei e Miguel já estava acordado. — Bom dia, meu mel. — Bom dia. — Vem cá,
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ANA MARIA O momento dos dois foi tão lindo. A Íris chorou, e eu compreendo. Depois de todo o desespero que foi o desaparecimento do irmão e agora esse bálsamo, quando até túmulo já havia sido construído. São tantas coisas na vida de Miguel que precisam ser colocadas no lugar, que eu espero que sobre um espaço para mim. Eles ficaram conversando enquanto eu arrumava as coisas da Malú, para o tio levá-la. Não preciso nem dizer que minha princesa fica super animada quando vai para a casa do Rodrigo e da Kátia. Quando foi à tardezinha, Rodrigo foi anunciado na portaria. Miguel, claro, liberou sua passagem e ele chegou no apartamento com o queixo no chão, exatamente como eu fiquei. — E aí, cara? Que fita braba é essa? — Nem me fale, está sendo uma verdadeira confusão. Veio ver minhas meninas? — Ele veio busca a Malú. — Miguel me olhou junto com a irmã. — Para eu poder cuidar de você melhor, sem me preocupar se ela vai estar bem. — Não quero que ela vá. Ela precisa das história
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ANA MARIA — Eu quero ir para casa. Sua voz saía carregada de dor, após o silêncio esmagador que se fez, depois de eu colocar aquela mulher no seu lugar. — Vamos, eu te levo, você não está bem para dirigir. — Pedro se ofereceu. — Quem ela pensa que é, para falar assim comigo? — Agnes, vamos. Ele saiu arrastando-a pelo braço, até sumirem de nossas vistas. — Pedro, leve-o para casa, ele não está bem para passar por essas situações — solicitou Luiz. — E Ana, perdoa a Agnes, ela tem um bom coração, só protege demais o filho. — Às vezes, desnecessariamente — completou Mariana. — Preciosa! — Agnes é um amor de pessoa, não tem porque você levantar a voz para ela. O mínimo de educação, já que está na sua casa. — Foi a vez da tal Gabriela. — Gabriela. — Pedro a repreendeu. — Vamos, por favor, não quero mais ficar nesta casa. Eu saí me tremendo, parece que todos conseguiam ver uma boa pessoa naquela mulher, mas só eu tinha que suportar a antipatia. Se ela demonstrar acidez comigo, n
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FELIPE Porra, estou nervoso perto de um cara. Foda isso! Entramos no elevador em silêncio. Percebia as olhadas que ele me lançava, mas permanecia no meu canto. Eu sempre fui cheio de atitude, uma gracinha aqui e outra ali e agora, nem sei o que dizer. Percebi a cara de surpresa que ele fez, quando me viu no quarto do Miguel. Depois da noite que tivemos, eu esperei um novo contato, só que não veio. Já estava acostumado a ter lances de uma noite ou algumas horas, afinal, a minha aceitação foi tão difícil de engolir e depois mais difícil ainda de assumir, que não sei o que é relacionamento. Nunca estive em um. Talvez pela minha falta de segurança, e também se a minha própria família ficou com vergonha de mim, quem é que vai querer, né? Não sou indeciso na minha opção, só que esses traumas são fodas, bagunça a cabeça de uma forma que quando você vai ver, já está todo fodido. — Quer comer o quê? — Pedro me perguntou. — Qualquer coisa. Só vim para distrair a mente e deixar a Ana respi
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ANA MARIA Hoje faz três dias que Miguel passou pela cirurgia. Ele ainda não acordou, os médicos dizem ser normal, pois seu cérebro sofreu uma pressão por longo tempo, então precisa se reestabelecer no seu devido lugar. Eu acabei retornando para casa, afinal, precisava trabalhar e mais, tenho uma filha para cuidar. Parece que se passaram anos, foram as duas semanas mais longas da minha vida, estive em lugares que nem imaginei estar, passei por situações que nem cogitava e conheci pessoas que levarei para toda minha vida. Algumas eu não faço questão. Mas, o bom é que foi tudo para o bem do homem que eu amo. Ele vai ficar bem. Foi nesse pensamento positivo que eu trabalhei durante a quinta-feira. — Vocês tão fazendo panelinha. — Tales nos perguntou. — Acertou, miserável, não te suportamos. — Felipe? Mentira, Tales, nós te amamos. — Fale por você. Felipe, todo debochado, arrumava as latas pequenas de tinta na prateleira. — Vamo ver se no próximo churrasco tu vai ser convidado,
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ANA MARIA A dor em meu coração era dilacerante. Destruída como se um rolo compressor passasse por cima de meu corpo, deixando cada parte esmigalhada. Era assim que eu me sentia. Ele não se lembrava de mim, não lembra de nada que viveu comigo, o amor que dizia sentir não estava mais lá. O seu olhar frio para mim, sem nenhum sentimento. Caminhei por um longo tempo. Eu estava tão desolada que não podia ir para casa. A minha dor era tão intragável que foi pior do que quando Anderson me deixou, grávida. Eu me sentia uma incapaz. Não sei se tinha coragem para fazer qualquer coisa nesse momento. Eu não poderia ir para casa dessa maneira. Como eu falaria com Malú que o tio Miguel não voltaria mais? Como vamos viver sem a alegria que ele nos acostumou? Chorei o caminho todo até a casa do meu amigo. Já era noite quando bati na porta e Kátia me atendeu com um sorriso que logo se desfez quando notou a minha cara. — O que houve? A Butterfly me mandou mensagem falando que o Miguel aco
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20
ANA MARIA Cheguei em casa de manhã, aproveitei para passar na padaria para comprar algumas coisas para o café da manhã. Rodrigo só me permitiu sair, depois que viu que eu estava mais calma. Seu apoio junto ao de Kátia é tão fundamental para mim. Sempre serei eternamente grata pelas amizades que cultivo. Assim que cheguei no meu portão, liguei para Felipe abri-lo para mim. Demorou um tempo até que veio, mas veio com uma cara de cansado e toda amassada. No meio da calçada mesmo, ele me abraçou. — Tá bem? — Vou ficar. — Estamos do seu lado. — Obrigada, obrigada por ficar com a Malú. — Sempre. Comemos pizza ontem. Fomos entrando até a sala onde vi o sofá bagunçado. — Tudo bem, quem dormiu no sofá? — Eu, a última vez que eu deitei na sua cama, Miguel teve ataque de pelanca. — Não sei se ele volta, está muito feliz ao lado da sua noiva. — Ele não se lembrou de você, gatinha? — Seu rosto assumiu preocupação. — Não, não se lembrou de mim, nem da Malú. Não sei como vai ser para e
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