Capítulo 7Thalia Passado - Horas depois...Sentada no sofá da sala, com um livro aberto no colo, deixei minha leitura de lado para observar aquele momento que aquecia meu coração. O cheiro de alho refogado pairava no ar, misturando-se ao som da música suave que minha mãe cantarolava. As cortinas leves balançavam com a brisa que entrava pela janela aberta, trazendo consigo o perfume das flores do jardim.Como sempre, minha mãe já estava na cozinha, mexendo uma panela sobre o fogão, preparando nosso jantar. Ela cantava uma melodia qualquer, mas sua voz era tão doce que parecia composta especialmente para aquele momento. Meu pai, Efraim, entrou pela porta com um sorriso largo em seu rosto bonito, mas já marcado por algumas rugas.Antes de chegar à cozinha, ir abraçar e demonstrar à mamãe todo seu amor e a saudade que sentira dela, ele passou por mim. Estava ansiosa por vê-lo, já que hoje tínhamos almoçado sem ele, pois estava trabalhando e não pôde se juntar a nós nessa refeição sagrad
Capítulo 8.Thalia.Presente...Meu coração estava apertado depois das lembranças que vieram à minha mente. A dor de não ter minha mãe em minha vida era esmagadora. Ainda mais depois do que eu acabara de descobrir.Sentei-me na cadeira, tentando manter a compostura enquanto digeria tudo o que havia acabado de saber. Hoje era um daqueles dias em que tudo parecia dar errado. Para ser sincera, minha vida inteira vinha sendo uma sequência interminável de dias ruins. Há meses, eu estava com o aluguel atrasado, e o síndico já tinha me ameaçado com a expulsão mais vezes do que eu podia contar.Desde que minha mãe morreu, há dez anos, minha vida virou de cabeça para baixo. Meu pai, devastado pela perda,afundou-se na bebida. Saímos do bairro em que vivíamos confortavelmente e fomos parar em um lugar decadente, morando em um prédio caindo aos pedaços. Dinheiro era escasso, e eu tive que amadurecer rápido, começando a trabalhar antes mesmo de completar 18 anos.Por anos, minha rotina foi solitár
Capítulo 9.Thalia.Presente.Como eu conseguiria criar uma criança? Como poderia ser mãe se estava prestes a perder o único teto que tinha sobre minha cabeça? A pergunta ecoava em minha mente, repetindo-se como um mantra cruel. Deus, bebês gastam muito. Fraldas, roupas, consultas médicas... Até o que parecia pequeno tornava-se gigante no meu bolso vazio.Meus pensamentos começaram a girar como um redemoinho. Os cálculos, os cenários, as alternativas — tudo me levava de volta ao mesmo ponto: o fracasso parecia inevitável. Cada preocupação parecia pesar uma tonelada, pressionando meu peito, e o ar começou a me faltar.Eu estava sufocando.O que seria de nós dois? Eu, uma mulher que mal conseguia sustentar a si mesma, teria que dar conta de uma vida que dependia de mim para tudo. A ideia era esmagadora.Desespero me dominou, tomando conta de cada célula do meu corpo. Minhas mãos tremiam e minha visão ficou turva. A vontade de fugir — não apenas da situação, mas de mim mesma — era quase
Capítulo 10.Marcelo.Encostado na parede áspera de concreto e tentando ignorar o vento que soprava contra minha camisa, eu busco normalizar minha respiração. Meus olhos, quase fechados por causa da luz forte que ilumina essa manhã ensolarada, acabaram de se chocar com uma cena que parecia ter saído direto de um maldito comercial de família feliz.A poucos metros, uma mulher segurava um bebê enrolado em uma manta azul clara, rindo enquanto o marido dela brincava com um garoto que devia ter uns quatro anos. O moleque gargalhava alto enquanto era jogado para o alto e segurado de volta nos braços do pai. A mulher os observava com um olhar cheio de carinho, os olhos brilhando como se o amor dela pudesse iluminar o mundo.Eu desviei o olhar, mas não consegui escapar daquela sensação incômoda que parecia prender minha atenção. A alegria deles me atingia de um jeito estranho, como se esfregasse na minha cara o que eu não tinha e nunca teria.Suspirei, tentando ignorar, mas minha mente já est
Capítulo 11.Marcelo.Sorri ao ouvir os gritos de alegria do meu irmão. Ele havia acabado de sair da sala de partos, viera comemorar com nossa família a chegada de Ravi, que nascera para nos encher de alegria e unir ainda mais os seus pais.Mateus e Mariah tiveram um começo conturbado e, por pouco, ele não perdeu o nascimento do próprio filho. Agora eles estavam bem, felizes, e Ravi só iria acrescentar mais felicidade à relação deles.— Parabéns, irmão. — O abracei. — Obrigado, mano. Não sabe como estou feliz com o nascimento do meu filho.— Fico muito feliz por vocês, irmãos. Por você e pela Mariah. Vocês merecem toda a felicidade do mundo depois de tudo o que passaram.— Você também merece, Marcelo. Acredite quando digo que há algo especial à sua espera por aí. Era o momento dele e não iria estragar isso falando das minhas dores. O trauma que passara no passado era grande demais e a dor ainda está latente em meu ser. Se não fosse por minha família, não saberia o que teria sido
Capítulo 12.Marcelo.Segui para o estacionamento e retirei a chave do bolso da minha calça. Apertei o botão e destravei o carro, abri a porta e entrei. Conferi as horas no relógio em meu pulso e suspirei. Já passava das duas da tarde e eu ainda nem havia almoçado. Teria que parar em um restaurante para comer algo, pois minha barriga já começava a reclamar pela falta de alimento.Liguei o carro e saí do estacionamento. Ao me afastar do hospital, meus olhos focaram em uma bunda avantajada, desenhada pela calça jeans apertada e se movimentando à medida que sua dona caminhava.— Uma bela bunda. — falei e sorri de lado.Estava há alguns dias sem foder e a falta de sexo já começava a dar sinais.Ao passar pela dona da bunda gostosa, vi ser a mesma jovem, que trombei quando saía da ala da maternidade, e resolvi ignorá-la. Porém, algo me impediu de acelerar o carro e permaneci olhando-a pelo retrovisor. Fingi parar no sinal e vi o momento em que ela se sentou no ponto de ônibus. Estava mais
Capítulo 13.Marcelo.— Olha aqui, garota. — Perdi a paciência. — Meu sobrinho acabou de nascer e isso me deixou de bom humor. Estou vendo que não está bem e quero te ajudar, deixa de ser chata e entra logo no carro. — Elevei o tom e apontei para o Audi R8 Spyder Black parado à nossa frente.Os lábios da jovem tremeram e ela, do nada, começou a chorar. — Ah! E-seu carro é muito bonito. — Mal entendi o que falou devido ao choro.Respirei fundo para não surtar e me inclinei para pegar em seu braço.— Vou te levar para casa, vamos. — Não posso entrar no carro de um estranho. — Ela seguia chorando, mas entrou.— Não vou te sequestrar. Sou um bom samaritano, lembra?Ela assentiu, fungando.Sorri do biquinho fofo que ela fez. Ela era linda, mas louca. Maluca da cabeça. E talvez eu também estive, já que insistia em algo que claramente daria em uma merda bem grande.Voltei a ligar o carro e perguntei onde ela morava.— Não é muito longe daqui. — falou, tentando parar d
Capítulo 14.Thalia.Saí do carro do Marcelo sem olhar para trás. Estava tomada de vergonha e ver seu olhar de pena sobre mim me deixou ainda pior. Minha vida era fodida demais e eu sabia disso, então não precisava que ele ficasse, percebesse isso e sentisse pena de mim.Pena era algo que não suportava. Eu morava em um lugar que não queria e havia uma vida que jamais desejei, mas era o que havia, então precisava ser grata por ela. Perdi minha mãe aos quatorze anos e, desde então, vivi apenas com meu pai bêbado. Perdi a conta de quantas noites me arrisquei ao sair sozinha para buscá-lo nos bares e nas praças, e o encontrei quase desmaiado de tanto beber.Meu pai amava demais a minha mãe e, quando ela morreu, ele se perdeu em si. Afundou-se na bebida e não me restou opção senão o colocar em uma clínica para dependentes alcoólicos.Eu já não suportava mais ver seu estado lamentável e ainda sofrer ao tentar trazer de volta o homem bom e amoroso que seu Efraim era antes da morte da minha