Uma Vilã Imperial
Uma Vilã Imperial
Por: Juck Olegário
01

Uma gota de chá cai sobre meu vestido branco. Dou um leve pulo na cadeira, causando um pequeno solavanco na mesa, virando a xícara. Levanto-me imediatamente fugindo do liquido quente que escorre pela beirada da mesa. Pensei que não chamaria atenção, mas alguns olhares estão voltados para mim. Meus olhos desesperados encontram o olhar julgador e repreensivo do meu pai, mas depois consigo me sentir um pouco aliviada quando minha mãe pede ajuda aos garçons, que correm até a mim.

Eles limpam o local, mas toda minha preocupação na verdade, está focada na demora do Augusto em chegar. Um dos funcionários se aproxima de mim para se certificar de que estou bem.

— Estou bem! Foi apenas um infeliz e pequeno acidente. — Respondo educadamente com um sorriso.

Respiro fundo, pego meu celular em cima da mesa e após pedi licença, vou para a varanda do espaço do evento.

Estou no lançamento da Revista de um amigo da família e todos meus amigos, na verdade, deveriam estar aqui, mas apenas alguns chegaram.

Analiso a mancha que ficou em meu vestido e ouço um riso familiar. Quando ergo meu olhar, vejo o Augusto abraçado com a Elletra, minha melhor amiga.

O que está acontecendo?

Penso que é apenas um carinho, mas eles se beijam. Meu coração acelera e sinto todo o meu corpo tremer. Quando tornam a andar, nossos olhares se chocam. A vontade que tenho é de pedi um esclarecimento, mas eu vi o bastante.

— Alice, eu posso explicar! — Ele fala desesperado soltando a Elletra.

Entro no salão principal e corro até o banheiro, trancando-me em um dos reservados. Sinto minhas lagrimas quentes escorrerem por minha face.

Meu noivo Augusto, que me chamou para sair há dois anos, me traiu com a minha melhor amiga.

Como eu pude me atrever a me deixar ser enganada por eles? Eu nunca percebi, eu sempre confiei.

Esse seu rostinho inocente... Elletra maldita. Foi apenas uma maneira ridícula para conquistar o Augusto.

Choro como uma criança, mas abafo meus gemidos e engulo as lagrimas quando ouço algumas vozes. São algumas de minhas amigas, Vanessa, Lana e Mel.

— Grandes notícias! Elletra acabou de me contar que Alice descobriu do caso dela com o Augusto. — Vanessa sussurra em tom de riso.

— Nossa... e Alice como deve está com tudo isso? — Mel parece preocupada.

— Deve ser doloroso para ela. — Lana fala. — Eu me pergunto o que ela está pensando agora. Tipo... será que devemos a procurar para lhe consolar?

— Ninguém sabia que isso um dia poderia acontecer... eles pareciam tão felizes juntos. — Vanessa continua achando graça de tudo.

— Elletra com certeza deve fazer melhor que Alice. — Mel comenta e todas riem.

Sinto meu rosto arder de raiva. Fofoqueiras e amigas falsas malditas.

— Bom, Elletra se dizia ser melhor amiga dela... nunca duvidei que ela era ruim, mas não devo negar que também não gosto da Alice. — Lana afirma ligando a torneira de uma das pias.

Que puta... isso é tão humilhante.

— Me sinto tão falsa quanto Elletra falando da Alice pelas costas, mas é tão divertido a imaginar pretendo toda a classe. — Vanessa começa a gargalhar e as outras acompanham.

— Ela sempre preferiu a Elletra e agora tomou no cu. — Mel parece rancorosa.

— Ei... o que há de errado com nossa pobre Alice? — Lana indaga. — Quero dizer... o que ela tem de bom?

Engulo em seco e respiro fundo para não sair desse reservado e estourar a cabeça das três.

— Ela é arrogante! – Mel afirma com convicção.

Eu? Arrogante?

— Talvez seja a aparência dela. — Vanessa zomba e as três riem.

Não resisto. Abro o reservado e cheia de ira, encaro as três, que se assustam ao me ver. Elas se calam imediatamente e esperam uma reação minha, mas tudo que faço é correr para fora do banheiro.

Vejo Augusto conversando com meu pai e ao seu lado está a Elletra. Ambos se comportando como se nada tivesse acontecido. Caminho exasperadamente em sua direção e antes dele falar algo, dou um tapa em sua cara.

— Seu filho da puta traidor! — Esbravejo e depois dou um tapa na cara da Elletra. — Sua vagabunda falsa!

Meus pais protestam, as pessoas ao redor ficam chocadas e eu corro até o bar, pego uma garrafa de vodca e corro para o lado de fora. Passo por um grande jardim e vejo um lago e sobre ele tem uma ponte. É o lugar ideal para afogar minhas magoas. Vou até ela e abro a bebida a virando em seguida sem fazer cerimonias.

Com certeza eu seria repreendida por estar fazendo isso, mas que se fodam todos eles. Eu não estou bêbada ainda... viro mais a bebida a deixando apenas na metade. Já ultrapassei meu limite de álcool e ainda não me sinto bêbada... ainda consigo lembrar da cena que vi. Augusto beijando Elletra.

Tudo que eu quero é me esquecer disso... esquecer eles, mesmo que seja apenas um pouco.

Vejo notificações chegando em meu celular e dou uma rápida olhadinha. São as três falsas fofoqueiras do banheiro tentando entrar em contato comigo mesmo depois de falar mal pelas minhas costas.

Dou mais uma golada na vodca.

Eu não me importo mais e ler tudo isso só vai me irritar, então preciso ficar calma. Desligo o celular e o jogo de lado.

O que há de errado comigo?

Pergunto-me vislumbrando o casto lago que passa por debaixo de mim.

Eu pensei que ser justa e honesta era uma coisa boa.

“Você é tão inteligente e objetiva. É realmente incrível.”

Mesmo que minha personalidade tenha sido vista como positiva por alguns...

“Ela é tão convencida e imprudente.”

Outros me viram como algo negativo.

Os humanos podem viver uns com os outros sem nenhum problema, mas eu não esperava que elas, minhas amigas, fossem assim nas minhas costas. Eu fui até traída pelo meu noivo.

Volto a chorar.

— Filhos da puta!

Sinto a raiva crescer dentro de mim e meu maior desejo é fazer com que cada um pague pelo que fez comigo.

Eu gostava realmente daquele idiota. O amava muito e queria construir uma família com ele.

Sinto a brisa bailar sobre meu corpo. Está fazendo um friozinho e aos poucos minhas lágrimas vão se secando.

Me sinto melhor depois de chorar. É tão estranho tudo isso... faz anos que não choro dessa maneira, mas isso foi o suficiente para me lembrar o quão cruel é o mundo.

Olho a garrafa vazia em minha mão e ao tentar lhe arremessar lago à fora, tudo gira. Eu pensei que estava sóbria, mas o efeito da bebida chegou de vez. Tento me segurar na barra da ponte, mas ela se multiplica em minha visão turva.

Eu estou caindo. Vejo a ponte se afastar e se tornar pequena diante de meus olhos. O ritmo da brisa que apenas bailava ao redor do meu corpo, agora está rápido e cortante.

Afundo no lago. A água é gelada e me consome por inteira. Ele é profundo e parece que não paro de cair. Não consigo respirar, não consigo nadar de volta para a superfície e quanto mais eu luto, mais fundo eu caio.

Uma imensa escuridão se estende ao meu redor. Não pode ser... eu estou no meio do nada nesse momento. Eu sou tão inútil e vou acabar morrendo assim?

Não.... por favor, me ajudem... alguém por favor.

São gritos no vazio. Gritos desesperador por uma segunda chance.

Afogamento é provavelmente a pior maneira de morrer, nessa imensa escuridão, tão sozinha... começo a me sentir fraca, sem forças...

Abro minha boca respirando fundo em busca do folego que perdi dentro do lago. Eu posso respirar. Tateio ao meu redor. Posso sentir a suavidade de alguns cobertores. Eu estou em um hospital? Estou viva? Respiro mais vezes só para ter certeza e lentamente abro meus olhos.

Estou deitada em uma cama cercada por uma cortina vermelha. As colunas em cada canto dela, segura um teto ornamentado e com grandes figuras angelicais. Sonolenta, tento olhar o máximo possível ao meu redor e percebo que não estou em um hospital. Onde estou? Tateio a cama, sinto os tecidos. Ela parece ser tão cara.

Ouço alguns passos e uma sombra se aproximando de mim. Não estou sozinha. Sinto meu corpo estremecer e aos poucos, vou puxando a coberta para tentar me esconder.

– Milady? – Uma mulher mais velha surge espantada me assustando.

Milady? Quem é essa senhora estrangeira?

– Está acordada! Eu sabia que você acordaria!

Do que ela está falando?

– Você não teve um resfriado desde que era criança.

Ela me conhece?

Não! Espera ai...!

Eu posso entende-la, embora eu não saiba o idioma que ela está usando.

O que aconteceu comigo?

Ao olhá-la, algumas informações vieram em minha cabeça, como lembranças.

Ela é minha babá e ela parece tão feliz em me ver acordar..., mas de fato não consigo entender o porque eu tenho uma babá. Minha cabeça está confusa e estou ficando desesperada.

Isso é um sonho? Só pode ser apenas um sonho.

Respiro fundo e com um falso sorriso, respondo a minha babá.

– Agradeço a sua preocupação senhora...

– Oh! – Ela se surpreende com algo e eu me calo. – Por favor, não precisa usar honoríficos comigo, Milady.

Como não posso? Ela é muito mais velha do que eu, então é educação.

– Você! Melhorou? – Pergunto tentando ser simpática, mas na verdade quero perguntar o que de fato está acontecendo e onde estou.

– Estou com sede... – Sussurro sentindo minha boca seca.

A babá me olha bem e sente-se culpada por algo.

– Eu sinto muito. – Murmura. – Eu vou trazer para você imediatamente e eu tenho que dizer a madame que você acordou.

A mulher mais velha corre me deixando sozinha. Sento-me na cama. É um sonho interessante... bem, pelo menos não é um sonho ruim.

Analiso meu corpo por inteiro e depois meu cabelo que de castanho ficou loiro. Eu realmente pareço assim? Tiro a coberta de mim e vejo minha roupa de dormir chique. Eu pareço uma princesa.

Tudo parece um sonho, então, preciso voltar logo para a realidade.

Fecho os olhos e mentalizo minha cama de verdade, mas nada acontece. Abro os olhos e ainda me vejo em um grande quarto de estilo colonial.

Eu não apenas acordei nesse lugar, como também me afoguei. Eu terminei com o Augusto por ele me trair com minha melhor amiga e...

– Lissandra!!

Ouço uma voz chamar um nome estranho... nome que não é meu, mas que eu sinto que é, então assusto-me e vejo uma linda mulher de longos cabelos loiros se aproximando.

– Você acordou minha filha! – Ela parece surpresa e feliz.

Ao seu lado tem um rapaz alto e corpulento, também de cabelo loiro e por sinal, muito bonito.

Eles me abraçam.

O que está acontecendo?

Por que não consigo acordar? Quando tudo isso vai acabar?

O tempo passa e eu continuo trancada em meu quarto sem saber o que fazer ou o que de fato está acontecendo. Eu pensei por alguns momentos que acordaria, mas está demorando... e se eu estiver presa nesse sonho? Devo confessar que não é tão ruim assim, mas eu tenho uma vida lá fora... ou tinha.

Eu estou sentada diante de uma escrivaninha cheia de papeis rabiscados. Estou tentando resumir tudo que aconteceu comigo para ver o que de fato faz sentindo.

Eu era a Alice e eu morri porque caí e me afoguei no rio.

Paro de escrever, leio e sinto uma raiva enorme. Não faz sentindo... não faz!

Um, dois, três dias se passaram e eu continuo nesse lugar. Estou sendo tratada como se todos me conhecessem, mas eles não sabem que eu não sou essa Lissandra e sim Alice.

Todas as vezes que sento para escrever um resumo sobre minha vida, leio em voz alta e as funcionárias ouvem. Em seguida, percebo que elas me encaram de forma estranha e cochicham, mas eu consigo ouvi-las muito bem.

“Ei, o que há com ela?”

“Ela tem feito isso por três dias!”

Isso é tão embaraçoso e eu já estou de saco cheio.

Todo mundo vai pensar que eu, Alice, me matei só por causa daquele maldito traidor Augusto, que me trocou por minha melhor amiga, outra traidora.

Respiro fundo e tento me acalmar, afinal, não quero que as funcionárias me chamem de louca pelos corredores.

O que mais faz sentindo em minha cabeça é que a alma da Alice veio descansar em outro corpo para ser mais exata e toda vez que penso, lembranças desse corpo invadem as minhas lembranças antes de cair no rio... é como se fossem duas mentes em uma.

Aqui, eu me chamo “Lissandra Milton Griffin”, a única filha do Duque de Griffin. Eu posso ler suas memórias. Isso é louco e ao mesmo tempo incrível. Surpreendentemente, ela estava inconsciente com uma doença grave por vários dias antes de eu tomar o seu corpo. A pessoa que acordou sou eu, Alice, parecendo com ela, Lissandra.

Pego uma pena, molho seu bico em um tinteiro e começo a escrever: “Eu suponho que ela morreu...”. Dou uma pausa e penso.

– Que inferno de situação é essa? – Resmungo sozinha e cruzo os braços chateada. – Eu tenho que viver uma outra vida agora? – Desisto de tentar compreender melhor o que está acontecendo, afinal, cada vez que crio teorias, mas confusa eu fico. – Tenho certeza que será difícil... – Respiro fundo. – De qualquer forma, eu preciso saber quem ela é...

Fecho meus olhos, respiro fundo e tento acessar as lembranças da Lissandra, mas eu vejo apenas um enorme vazio.

Não encontrei nada, vamos pensar mais um pouco.

Tento novamente, repetindo a mesma técnica, como se eu estivesse me preparando para uma meditação profunda.

Nada?

Apenas silencio.

Eu ainda não consigo encontrar nada!

Quando paro de tentar, tudo que me vem na cabeça são fragmentos de sua vida e de tudo que ela já fez. Ela não fez nenhum bom trabalho e isso me deixa desesperada. Ela é uma pessoa totalmente contraria a mim. Ela é uma vilã?

Lissandra é conhecida por tratar as pessoas pior que lixo. É muito gananciosa e se ela quiser algo, ela consegue, fazendo birras, gritando e ficando com raiva de todos.

Não é apenas isso, ela se comporta de maneira infantil.

A imagem de um rapaz moreno lindo vem em minha cabeça. Eu coloquei meus olhos nele e ele já tem namorada... consigo perceber que ele não é um homem qualquer, mas é um dos Príncipes do Império Decraberom.

Ele está em um relacionamento com a Senhorita Danielle, a filha do Conde.

É claro, bonito desse jeito, e da realeza, existem várias mulheres que o adoram, porém, o problema é que, no caso de Lissandra, ela não se contentou apenas com a admiração.

Suspiro profundamente, muito decepcionada com a personalidade do corpo em que minha alma está hospedada.

Eu não quero mais ver nada... eu não quero mais ver a próxima memória.

Tento relutar, mas ela vem assim mesmo.

Ela intimidou a Danielle em todos os sentidos possíveis. Eu vejo Lissandra gritando e a insultando. Vejo-a atirando bebida na cara da Danielle em eventos, na frente de todos.

Ela estava tão apegada ao Príncipe Herdeiro... calma..., espera um pouco! Ninguém gosta da Lissandra... a temem, a desprezam... e se eu estou nesse corpo, eu sou a vilã?

Levanto-me exasperada. Eu sou a vilã! Afirmo para mim mesma, perplexa e ainda confusa. Meu rosto fica todo vermelho.

De maneira nenhuma... ando de um lado para o outro em meu quarto, quase explodindo de tanta raiva.

Eu simplesmente não poderia ter ido parar em uma pessoa mais equilibrada e amável? Não faz sentido isso está acontecendo comigo. Apesar de tudo, eu morri enquanto Alice, por causa de frustrações em um relacionamento com o Augustos. Mas pelo que estou vendo, reencarnei e me tornei uma vilã nesse mundo. Eu me tornei uma garota má como minha amiga traidora, Elletra.

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