A chuva fina tamborilava no vidro da janela, misturando-se ao som suave das ondas quebrando na praia. Meu peito subia e descia devagar, tentando acompanhar a calma ao meu redor, mas a verdade era que dentro de mim tudo parecia desmoronar.Matia entrou na casa com passos firmes, seus olhos varrendo o ambiente antes de pousarem em mim. Ele me cumprimentou com um aceno de cabeça, respeitoso, e foi nesse momento que percebi o peso do que estava prestes a acontecer. Eu não era mais apenas Elena, eu era a matriarca da Cosa Nostra. E seja lá o que estava por vir, exigiria mais de mim do que eu poderia imaginar.Os três nos sentamos à mesa da cozinha. Luca estava tenso ao meu lado, os dedos entrelaçados sobre a superfície de madeira como se precisasse de algo para se agarrar. Matia manteve-se impassível, mas eu percebia a sombra em seu olhar. Do lado de fora, os soldados permaneciam atentos, suas silhuetas rígidas contra a escuridão da noite.— O que está acontecendo? — minha voz cortou o sil
O ar dentro da cozinha parecia rarefeito, como se o peso daquela revelação tivesse drenado todo o oxigênio do ambiente. Meu peito subia e descia em um ritmo errático, e, por um momento, tudo ao meu redor ficou turvo. Precisava sair dali. Precisava de ar. De espaço. De silêncio.Levantei-me de súbito, a cadeira arrastando no chão com um ruído agudo. Luca e Matia me observaram, alertas, mas não disseram nada. Apenas deixaram que eu passasse pela porta da cozinha e saísse para a varanda, onde a chuva fina ainda caía sobre o mar agitado.A brisa fria bateu contra meu rosto, e fechei os olhos, tentando me ancorar na sensação. Mas nada parecia real. Nada fazia sentido.Meu pai… não era meu pai. Eu não era quem pensei ser a minha vida inteira. Eu era filha de um inimigo, de um homem que estava disposto a me usar como
Quando o barco finalmente tocou o cais de Palermo, senti a tensão crescer. O ar salgado da baía parecia mais pesado do que nunca, como se o destino estivesse prestes a se abrir com toda a sua brutalidade. Elena estava ao meu lado, silenciosa, mas seu corpo estava tenso, provavelmente sentindo o mesmo que eu. Quando os carros da máfia se aproximaram, cercados por nossos soldados, o peso de tudo o que estava acontecendo parecia cair sobre meus ombros, mais uma vez.Antes de entrar no carro, preciso falar com um dos soldados. Ele se mudou com cautela, e eu vi o nervosismo em seus olhos. Ele sabia, assim como eu, o que estava prestes a vir. Nossos sogros tinham usado a filha deles como moeda de troca, jogada com a vida dela, e agora tinham um ponto de desmascará-los, expor toda a verdade. Minha raiva era uma chama que queimava por dentro, e, se eles ainda estivessem
A escuridão foi se dissipando aos poucos, dando lugar a uma luz fraca e um zunido incômodo nos meus ouvidos. Meu corpo parecia pesado, como se estivesse coberto por um cobertor de chumbo, e levei alguns segundos para reconhecer o cheiro forte de antisséptico ao meu redor. Hospital.Pisquei devagar, tentando me situar, sentindo um peso incômodo no peito. As imagens voltaram de forma fragmentada — tiros, gritos, sangue no chão frio. Meu estômago revirou. Virei o rosto para o lado, sentindo a pele sensível, e foi quando o vi.Luca estava sentado em uma poltrona ao lado da cama, cotovelos apoiados nos joelhos, a cabeça baixa. Seus dedos estavam entrelaçados, os nós brancos de tanta força. Quando ele ergueu o rosto, seus olhos azul-escuros me analisaram com intensidade. Um alívio contido passou por suas feições antes que voltasse a assumir aquela expressão fria e controlada.— Você acordou.Minha garganta estava seca. Tentei engolir, mas parecia que tinha engolido areia. Luca se levantou i
O ronco do motor soava alto no silêncio da madrugada enquanto eu dirigia pelas estradas desertas. Meus dedos estavam apertados ao volante, a tensão ainda pulsando no meu corpo. Deixei Elena no hospital com minha mãe e Fiorella, mas minha mente não conseguia descansar. A promessa que fiz a ela ecoava na minha cabeça: ensiná-la a se defender. Proteger Elena não era uma opção. Era uma necessidade.Mas, antes disso, eu precisava de respostas.Pietro e Matia já estariam me esperando. Eu sabia que eles haviam conseguido capturar um dos desgraçados que atacaram o carro de Elena. O russo ainda estava vivo. Por enquanto.Quando cheguei ao barracão abandonado, o cheiro de ferrugem e umidade se misturava com o leve odor metálico de sangue. Saí do carro e caminhei para dentro do galpão escuro, iluminado apenas por algumas lâmpadas penduradas. O ar era denso, carregado de algo primitivo. Um som de respiração pesada e gemidos baixos veio da frente.— Até que enfim — Matia murmurou, encostado em uma
O som suave das ondas quebrando contra as pedras chegava até nós conforme subíamos os degraus da mansão. Eu mantinha minha mão firme na cintura de Elena, sentindo seu corpo ainda um pouco frágil contra o meu. Ela se recuperava bem, mas depois de tudo o que aconteceu, eu não deixaria que se esforçasse mais do que o necessário.— Devagar, piccola — murmurei, enquanto ela apoiava uma das mãos no corrimão.Seus olhos se voltaram para mim, cheios de determinação.— Estou bem, Luca.Fiz um som baixo de descrença, mas não insisti. Ela era teimosa. Sempre foi. Mas sua força era algo que eu admirava — e que, a partir de agora, eu garantiria que fosse usada a seu favor.Quando chegamos ao topo da escadaria, Pietro e Matia estavam nos esperando na entrada. O olhar atento de ambos analisava cada detalhe, cada movimento. Eram meus irmãos de sangue e lealdade. Se eu confiava minha vida a alguém, era a eles.Pietro se aproximou primeiro, os braços cruzados sobre o peito. Seus olhos cinzentos pousara
A manhã estava silenciosa na ala que agora chamava de minha. O cheiro do café fresco se misturava ao aroma salgado do mar, invadindo a ampla cozinha privativa. Eu estava sozinha. Luca havia saído cedo, sem me acordar, e o espaço que ele deixara na cama ainda estava quente quando despertei. Peguei minha xícara, apreciando o calor reconfortante entre os dedos, e fui até a varanda.A vista dali era deslumbrante. O sol nascia no horizonte, tingindo as águas do Mediterrâneo com tons dourados e alaranjados. O vento soprava suave, agitando meus cabelos enquanto eu respirava fundo. Eu precisava me acostumar com essa nova realidade, com essa nova vida. Mas ainda me sentia um peixe fora d'água.O som do elevador se abrindo me tirou dos meus devaneios. Virei-me e vi Pietro entrando no espaço, sua expressão neutra, mas os olhos avaliadores como sempre. Ele não era um homem de muitas palavras, mas sua presença sempre parecia dominar qualquer ambiente.— Bom dia — ele disse simplesmente, inclinando
O cansaço pesava sobre meus ombros quando entrei no quarto. Minhas mãos ainda doíam pelo impacto repetitivo da pistola, e meu corpo estava exausto depois de horas de treinamento com Pietro. O gosto amargo da pólvora ainda parecia impregnar minha língua, misturado com a inquietação que me acompanhava desde que pisei naquele armazém.Eu não estava acostumada com armas. Com a violência. Com essa nova realidade que Luca trouxe para minha vida. E, no entanto, havia algo dentro de mim que se recusava a recuar.Passei os dedos pelos cabelos, soltando um suspiro pesado enquanto desabotoava a jaqueta e a jogava sobre a poltrona. O chuveiro quente parecia a melhor opção para lavar não apenas o suor, mas também a tensão do dia.Antes que pudesse me mover, a porta do quarto se abriu. Luca entrou sem pressa, vestindo apenas uma calça de moletom escura, o peito nu revelando os traços definidos e as cicatrizes discretas que contavam histórias de batalhas passadas. Seu olhar encontrou o meu, avaliado