SarahSeguro bem firme o casaco a minha volta, enquanto uma brisa fria nos cerca. Após acordar me sentindo especialmente aventureira, tive um árduo trabalho para tirar Samuel da cama, tentando convencê-lo a dar um passeio nos arredores.Meu marido se espreguiçou, fingiu cochilar mais um pouco, mas depois com um sorriso genuíno, ele se levantou e tivemos longos minutos um com o outro, só sentindo o contato de nossas peles, nossa harmonia e tranquilidade que não conseguimos aproveitar desde o começo do nosso casamento.Agora, depois de um café da manhã preparado por nós dois, caminhamos, sob o olhar vigilante de Ren a alguns metros atrás.Não tão perfeito.... mas ao menos um pouco mais seguros.— É realmente deserto aqui, né? — pergunto, olhando as árvores a nossa volta e o barulho das ondas que quebram nas rochas do nosso lado direito.— Eu comprei a propriedade justamente por isso. — Ele me responde, os cabelos loiros revoltos com o vento, a mão em minhas costas, me apoiando nas subid
Sarah“Algo pesa em minha mão, mas não consigo abaixar meu olhar para ver o que é. Eu caminho, mesmo que não entenda para onde estou indo. Os corredores em que estou parecem conhecidos, os ladrilhos escuros de uma parede, me remetendo a algo muito antigo em minha memória. Mais uma vez, tento pensar, rever, o que é, mas não consigo distinguir o que é. Minhas pernas batem em algo e me abaixo, pegando algumas folhas, as letras nela, sendo algo que eu reconheço bem. Eu identificaria o autor dessas palavras sempre que necessário.É a carta de minha mãe... aquela que eu guardei muito bem no cofre. Não deveria estar assim.A dor que a descoberta da carta me trouxe, parece ganhar vida novamente, me lambendo como fogo, me fazendo arquejar em negação, impedindo a qualquer um, a qualquer erro do destino que seja um engano.O peso em minha mão se intensifica e eu novamente tento olhar para baixo, mas não consigo.Que diabos está acontecendo?Olho para o meu lado esquerdo, todos os meus movimento
SarahAbro a porta dupla devagar, a expectativa fazendo um estrago e tanto em meus batimentos cardíacos. As imagens vão sendo absorvidas com demora, cada detalhe me arrebatando um pouco mais da alma, dos sentimentos que eu achei já não terem como mudar.Um caminho de pedras lisas abaixo de mim, me dá uma trilha para Samuel, sentado em uma espécie de pedestal de pedra simples, uma manta branca sob ela.Meus olhos percorrem o nosso arredor, as árvores altas e curvadas nos acobertando com carinho em uma espécie de túnel, as folhagens laranjas, quase avermelhadas caindo no solo e sob nós como pequenos pedaços de puro paraíso.A emoção vai me dominando como um manto, meus olhos queimando com as lágrimas que deixo guardadas, meu peito parecendo não caber de tanta alegria.Certa vez, quando menina, eu havia confidenciado a Samuel, minha voz petulante:“— Se algum dia, um cara me der meu conto de fadas, aí sim eu vou acreditar nessa bobagem de felizes para sempre.”Samuel naqueles dias, nada
SarahOs sons que oscilam a minha volta, aumentam ainda mais a tensão que me consome cada nervo do corpo. Eu sinto, através do tecido fino de meu vestido, o suor começar a descer por minhas costas.Não consigo ver nada além dos vultos que o saco de pano em minha cabeça permite. Já não ouço a voz de Samuel desde que eles me fizeram entrar tropeçando para o que eu acredito ser um carro.Uma bile amarga me sobe a garganta e fecho meus punhos com força, para não vomitar, a lembrança de como tudo aconteceu, ainda muito fresca em minha mente.Duas coisas aconteceram depois que voltamos por aquela trilha apertada: Primeiro nós nos vimos cercados. Homens que tentei marcar os rostos, mas que em meio ao seus gritos em uma língua que desconheço, acabei por não conseguir.Eles olharam bem para o meu rosto e depois olharam para Samuel e Ren. Houve uma breve discussão, em que eles tentaram falar algo com Ren, mas o nosso segurança ou não entendeu de fato o que estava acontecendo, ou ele foi muito i
PixieEstico a minha mandíbula, sentindo o músculo dolorido da face em que eles me bateram da última vez. Eu sabia que após descobrirem que eu sou um segurança, eles tentariam me derrubar de algum jeito e fico feliz que tenha sido só um soco no rosto.Mas que mão pesada desses cretinos...Olho para o canto direito da espécie de cela em que estamos, o corpo adormecido de Samuel caído de qualquer jeito. Ele já está dormindo assim por quase seis horas, o que não é muito bom. Eu fingi ainda estar apagado quando ele acordou louco, procurando pela esposa.Eu entendo o desespero dele, de verdade, mas quebrar o nariz de quem quer que apareça não é uma tática muito inteligente, ainda mais quando somos obviamente aqueles que estão sobrando na equação.Eu preciso de tempo, tempo o suficiente para que minha equipe nos encontre. Minha mão vai ao meu brinco pequeno, como em um tique nervoso.Assim que pus meus olhos em Sarah Scott, eu sabia que ela era problema. Eles não me deram todos os detalhes
SarahO raspar em minha garganta é dolorido, a sede competindo ferozmente com a fome que me assola o estômago. Faz pouco mais de duas horas que um homem me trancou nesse quarto, as paredes com um papel de parede antigo descascando, a única luminária que funciona piscando furiosamente, sem nenhuma janela para me guiar em que horas é.Toda vez que giro meu olhar pelo cômodo, um estremecimento me percorre e já nem sei mais se é pela fome ou pelo medo.Nessa altura eu já sei que deu algo errado. Posso estar me confundindo, mas tenho quase certeza de que já passa do segundo dia.O filho da puta não me deu uma gota de água sequer. Sei o que ele planeja, sei muito bem. Ele quer me enfraquecer, me tornar mais maleável. Posso até não recuar ainda, mas começo a pensar que se não o fizer, tenho a séria possibilidade de pôr a minha gravidez em risco. Se fosse só por mim, eu o mandaria pro inferno, nem que fosse definhando... mas essa criança em meu ventre.... ela merece mais do que isso.Levo m
SamuelMeu punho acerta a textura rígida do saco de areia com força. Uma vez e de novo. Faço desse movimento um mantra, para não me perder no desespero como fiz a pouco mais de meio dia atrás. Olhar para aquela sala vazia e subir os níveis daquele subsolo no meio de uma cidade deserta na Europa foi como levar um soco na boca do estômago. Eu a perdi, perdi seu rastro, perdi a porra da minha mulher e filho. Meu último soco faz uma dor subir pelo pulso, tamanha a força que eu usei para o golpe. Eles nos jogaram em uma cidade que já nem me lembro o nome, a equipe de Ren tendo me dito apenas uma vez. Não havia um carro sequer passando pela estrada de barro, escondida por entre as árvores.Nós erroneamente partimos do pressuposto que eles nos colocariam no mesmo lugar e claramente, o desgraçado que armou tudo isso, tinha outros planos. Um grito rouco, desesperado sai por entre meus lábios, enquanto meus golpes se fazem mais rápidos, mais furiosos.— Quebrar os pulsos não vai te adianta
Samuel A venda escura é retirada dos meus olhos com força e eu pisco incessantemente, tentando me adaptar a nova luz. Surpreso, eu olho ao redor, do que deveria ser um castelo antigo, as ruinas, dando ao lugar um aspecto quase lúgubre. Eu estou em uma cadeira e vejo Ren ao meu lado, se remexendo no assento de ferro, tentando verificar se está com todas as suas pistolas e claro, ele se decepciona. — Achou mesmo que eles te deixariam armado, em meio a o que deveria ser uma negociação? — eu pergunto, para me distrair do constante nervosismo em meu estômago. — Seria muito apreciado. — Ren me responde, a voz um pouco estressada. — Se concentre, Ren. — Peço, vendo que alguém se aproxima. Minha primeira reação é olhar embasbacado, para a mulher que seria estranhamente bela, se não fosse pela expressão em seu rosto de traços delicados, as sobrancelhas bem delineadas e olhos azuis quase incandescentes, nos encarando com frieza, os cabelos curtos e quase platinados de tão loiros, emoldura