Sarah Ouço a ducha ser ligada e espalho na cama de cobertores floridos de doer os olhos, os documentos que Dylan me trouxe a uns cinco minutos. “Serafina Smith, 67 anos, viúva, sem filhos. Trabalhou como enfermeira por três anos após sua formação, mas foi demitida após um caso suspeito em 1973. Os dados da denúncia, foram retirados do sistema e sete semanas após o ocorrido, Serafina foi demitida. Manteve alguns empregos ao longo dos anos, mas se fixou como empresária de um pequeno negócio em meados de 2010.” A ficha de Serafina continua por mais duas folhas e eu permaneço lendo, tentando achar algo que possa ser útil. O que teria sido essa denúncia que custou seu emprego? E o que teria de tão ruim ao ponto de deletarem as informações? Esfrego meu rosto e junto os papéis, o cansaço me cobrando alto. Olho para a porta do banheiro e me espreguiço um pouco, a ideia de um Samuel nu e se banhando sendo um estimulante e tanto. Não importa quantas vezes eu o tenha, ainda assim não par
SarahO salão em cores roxas me parece fofo quando eu o encaro do lado de fora. Ao meu lado estão Samuel, Dylan e Nina e começo a achar uma comitiva e tanto, só para fazer algumas perguntas, mas não conseguindo abdicar do apoio deles, eu só respiro fundo e entro no salão, a sineta da porta anunciando que entramos.Uma senhora de cabelos vermelhos, a cor viva combinando com o corte curto que ela usa, está varrendo o chão e não se vira de imediato quando nós entramos.— Menino, avise a sua mãe que não poderei cortar seu cabelo hoje. Minhas duas meninas ficaram presas naquele curso na cidade vizinha e minhas costas estão me matando hoje. — Ela avisa, a voz rugosa de quem fuma um ou mais maços por dia.Troco um olhar com Dylan, que dá de ombros. Demoro um pouco a desviar o olhar dele, reparando que Dylan me parece um pouco pálido, sua pele geralmente de um tom retinto forte, hoje quase acinzentada.Ele não está bem.— Desculpe decepcionar, mas eu não vim cortar o cabelo. — Digo, alto o su
NinaTodos nós começamos um caminho tortuoso até o carro, todos em um silêncio pesado. Sarah caminha com os ombros retos, cabeça levantada, mas só de olhar para seu rosto, percebe-se que o estrago feito pelas revelações de Serafina foram grandes.Samuel caminha bem perto dela, todo seu corpo tensionado, a forma como ele parece cercar Sarah se tornando um padrão que eu entendo muito bem.Ela vai quebrar e temo que não demorará muito...Dylan está um pouco as minhas costas e não o olhei bem o suficiente para saber como ele está lidando com isso tudo.Eu tenho evitado olhar para ele e ponto.A forma como eu fui dura com ele ontem ainda parece me rachar o peito, a cada vez que me lembro, mas mesmo assim, não sinto que cometi um erro ou que não fiz o certo.Dylan me tratou como uma transa de uma noite e não tinha o direito de agir a minha volta daquela forma. Eu já tive relacionamentos ruins o suficiente para não ter a menor paciência com homens ciumentos, ainda mais aqueles que não querem
Nina Entro no quarto, meus sentimentos entrando em um estado caótico ao ver Dylan cochilar, a pele escura tendo recuperado aquele tom vivo que eu tanto gosto. Não parece mais um fantasma, prestes a desmaiar. Coloco a bolsa de lado e me coloco ao seu lado, meus dedos tocando suas bochechas como se tivessem vida própria. Não é como se eu achasse que ele fosse morrer, mas foi aterrorizante vê-lo tão fraco, o suficiente para eu perceber e aceitar que o que sinto por ele é bem mais do que uma atração de queimar meus neurônios. As pestanas de Dylan tremem e ele abre os olhos, a cor cinza clara me fitando com uma intensidade de destruir defesas, essa que eu nem consigo mais erguer. Afasto meu braço, mas a mão dele me segura no lugar. — Não se afaste. — Ele pede e não sei se é a vulnerabilidade em seu tom ou a ambiguidade que ele deixa na pergunta, mas me pego acariciando seu maxilar. Dylan fecha os olhos como se gostasse do meu toque o suficiente para não tentar fingir o contrário.
Sarah— Dylan... poderíamos muito bem esperar mais dois dias e voltar para casa. — Argumento, vendo-o colocar a bolsa no ombro.Hoje foi a alta de Dylan e apesar dele parecer muito melhor, com as bochechas coradas como antes e andar confiante de volta, eu ainda me sinto mal por continuarmos nessa busca, sendo que ele acabou de sair do hospital.— Nossa audiência e única chance em muito tempo é em apenas algumas semanas Sarah e não quero contar com mais nenhuma novidade. — Dylan me diz e abre o banco de trás, logo se sentando.Vejo que Nina o imita, os dois parecendo muito satisfeitos em estar um ao lado do outro.Ora... acho que algumas coisas mudaram então...Sorrindo o mais discretamente que consigo, eu me sento no banco do passageiro, meu olhar encontrando o de Samuel, a pergunta neles me fazendo respirar fundo.Ele quer saber se estou pronta para continuar... bom, não muito, mas vou tentar.Assinto para Samuel, de certa forma mais do que grata por ter não somente o apoio dele, com
SarahChegamos à prefeitura da cidade, um prédio de tijolos avermelhados antigos, uma frase muito bem posta em uma placa, onde eles dizem se orgulhar pelos anos de crescimento.Dessa vez eu peço que Samuel e Nina fiquem no carro, pois eu sinto que nós quatro estamos chamando atenção demais e também consigo um tempo para que Samuel se acalme. Ele não parece muito feliz em me ver ir, mas assente, as mãos segurando o volante, como se fosse um piloto de fuga só esperando um sinal.Espero não precisar fugir daqui. Nina sorri para mim, um sorriso encorajador e eu saio do carro, caminhando ao lado de Dylan, com minhas esperanças de achar algo de útil nesse lugar consideravelmente diminuídas.O rapaz que nos atende dessa vez, nos enrola bem menos, mas em contrapartida, é bem mais hostil. Ele nos informa poucos segundos após solicitarmos os documentos, que houve um conveniente na minha opinião, incêndio a cerca de dez anos atrás e que boa parte dos registros se perderam.Há uma imobilidade qu
SamuelO som rouco e carregado de um terror real me arranca de um sono pesado. Abro os olhos ainda enevoados pelo sono e olho em volta do quarto, procurando o que faz Sarah gritar com tanto ímpeto.Como em todas as vezes nas últimas semanas, me movo para as costas de Sarah, envolvendo meus braços ao seu redor, sentindo seu corpo suado e tremente no meu.Desde que voltamos daquela pequena viagem e quanto mais nos aproximamos da audiência que reverá o caso de Laura, Sarah tem ficado cada vez mais agitada, seu sono indo de leve, para os terrores noturnos que ela tinha muito quando ainda era adolescente.Eu não sei mais o que fazer...Existem noites em que ela acorda e não se lembra de nada e existem noites em que ela acorda e não volta a dormir, lutando o restante do dia para se manter desperta.Luci e até mesmo outros empregados já tem me perguntado, claro, de forma sutil o motivo para Sarah parecer tão cansada, de estar emagrecendo.Eu tento conversar com ela, lhe tirar um pouco do pes
SarahSamuel está estranho.Ele não me trata de forma diferente, não disse nada de diferente, mas há algo em seu olhar quando ele me mira que me assusta um pouco.É como se ele realmente me visse e eu não gosto disso.Sinto Luci e Rui se moverem a minha volta, os dois tão afoitos para me agradar que eu quase consigo rir disso, mas o nervosismo é mais forte.Hoje é o dia em que tudo pode ir muito bem ou muito mal.Depois de quase três meses de muitas reuniões e organizações de provas com Dylan, nós finalmente chegamos ao dia.Sei que eu perdi mais de três quilos nesse meio tempo, sei que meu rosto é uma marca completa do cansaço, pois as noites se tornaram um tipo especial de tortura, em que eu luto para fugir de memórias que eu achei já terem se guardado bem fundo em minha memória.Sei que boa parte dos empregados ou está preocupado comigo ou conjecturando qual doença eu estou e principalmente eu sei que Samuel tem sofrido junto comigo.É ele quem acorda com meus gritos, é ele quem me