PESADELOEstava escuro. Meu corpo doía e eu não conseguia abrir os olhos, mas podia ouvir vozes ao meu redor.— Ele não vai aguentar aqui. O posto não tem estrutura para alguém no estado dele.— Vocês tem que dar um jeito, doutor. — PH respondeu. — Ele tem que ficar aqui.Tentei me mexer, mas não conseguia. Eu sabia que a situação era grave, mas não podia fazer nada além de escutar.— Se ele não for transferido para um hospital maior, pode ter complicações. — o médico insistiu, sua voz ficando mais baixa, quase como se estivesse implorando.— A gente entende, doutor. — Marreta interveio, a voz cheia de urgência. — Mas não temos como levar ele pra um hospital fora do morro. O que tiver que ser feito, precisa ser aqui mesmo. Dá teu jeito, tá ouvindo?Tentei focar na conversa, mas minha mente oscilava entre a realidade e a inconsciência.— Eu não tenho o equipamento necessário. — o médico falou, quase em desespero.— Então faz a lista, que a gente traz, porra! — a voz de Maicon era fria.
ARTHUR (PESADELO)Quando cheguei ao topo das escadas, virei à direita e caminhei até o quarto de hóspedes. A porta estava entreaberta, e empurrei lentamente, tentando não fazer barulho.Amélia estava deitada na cama, encolhida de lado e ela parecia completamente alheia ao meu movimento. Meu coração apertou vendo ela daquele jeito. Ela tinha passado por muito mais do que qualquer pessoa deveria suportar.Aquilo só aumentava ainda mais o meu ódio por aquele desgraçado. Eu não ficaria totalmente em paz enquanto não matasse ele.Entrei no quarto e fechei a porta atrás de mim com cuidado. Caminhei até a cama, meus passos silenciosos, e me deitei ao lado dela, ficando atrás do seu corpo tão fragilizado.— Amélia. — murmurei suavemente em seu ouvido.Ela não reagiu imediatamente, mas vi seus ombros tensos relaxarem um pouco com o som da minha voz.— Eu tô aqui agora, amor. — continuei, aproximando-me mais e passando um braço ao redor dela, puxando ela para mais perto de mim. — Vou cuidar de
PESADELOO matadouro era um lugar de terror puro. As paredes escuras e sujas de sangue refletiam os gritos e gemidos de dor. Era um espaço onde ninguém queria estar, a não ser que fosse para fazer o trabalho sujo. O chão era frio e úmido, com manchas que contavam histórias horríveis de gente que sofreu ali.Mas nada daquilo me incomodava, porque cada um que sofreu ali, mereceu.Esse era o lugar certo para pessoas como Russo, malditos que teriam uma morte tão ruim quanto eles.Entrei com Marreta, PH e Maicon ao meu lado e lá estava Russo, preso a uma cadeira, amarrado pelos pés e mãos. Exatamente como ele deixava a Amélia jogada naquele chão podre e imundo.O corpo dele estava coberto de feridas abertas e hematomas. O infeliz parecia um rato encurralado, mas ainda tinha a audácia de me xingar.— Você é um desgraçado, Pesadelo! — ele cuspiu, com a voz fraca mas cheia de ódio.Dei uma risada debochada e o som frio ecoou pelo lugar.Me aproximei dele, pegando seu rosto com brutalidade.—
PESADELOPH e Maicon começaram a desamarrar Russo, rasgando as roupas dele.Os olhos dele se arregalaram quando percebeu o que eu ia fazer e ele merecia cada segundo de dor que estava prestes a sentir.— Como você diz mesmo? — fingi não lembrar. — Ah, é hora de começar a diversão. — sussurrei, me aproximando dele com a barra de ferro.PH e Maicon imobilizavam seus braços, segurando Russo com força. O desgraçado finamente cedeu e começou a implorar em tom ameaçador.— Me soltem agora, seus infelizes! — gritou.— Eu juro que vou matar cada um de vocês!Cada pensamento meu se voltava para a Amélia e o meu filho.Eu não sentia pena, só necessidade de vingança. Peguei a barra de ferro e me aproximei mais.— Isso é pelo meu filho. — murmurei bem perto dele, com voz carregada de ódio.Aquilo para nós era justiça.PH e Maicon seguravam Russo firmemente, seus braços e pernas imobilizados, garantindo que ele não tivesse como resistir.— E isso é pela minha irmã e por pensar que poderia fazer al
AMÉLIADois anos depois...Arthur e eu agora vivíamos juntos. Tomávamos café numa sensação de paz que, há dois anos, eu jamais imaginaria ser possível. A mesa estava posta com pães, bolo, e o nosso café da manhã habitual. Arthur estava sentado à mesa, mexendo no celular enquanto eu me ocupava de arrumar o restante das coisas.Dois anos haviam se passado desde aquele dia terrível no matadouro. Dois anos desde que a vingança tinha consumido Arthur, e a violência parecia ser a única linguagem que ele conhecia. Muito mudou desde então. Arthur, o dono do morro, o Pesadelo que todos conheciam, havia se tornado meu companheiro, alguém com quem eu dividia não só a casa, mas também a vida e os sonhos. Olhei para ele e sorri ao lembrar de tudo o que passamos para chegar até aqui.Naqueles primeiros meses após o incidente, a relação entre nós foi complicada. Arthur estava sempre em alerta, preocupado com a segurança e o poder no morro. Ele continuava a liderar com mão de ferro, mas algo em seus
AMÉLIA— Você está sozinha, mãe? — perguntei, notando a ausência de Agenor.Minha mãe balançou a cabeça, concordando, mas seu olhar estava cheio de hesitação.— Sim, estou. — ela disse, e então, depois de um momento de silêncio, acrescentou: — Agenor e eu começamos a brigar muito depois que você foi embora. Assim que eu pedi o divórcio, ele foi preso.Fiquei surpresa.— Por quê?Minha mãe suspirou.— Estupro de vulnerável. Foi pego em flagrante molestando duas crianças da igreja.Senti um nó se formar na minha garganta. Embora soubesse que algo assim poderia acontecer, ouvir as palavras de minha mãe tornou tudo ainda mais real. — Eu sabia que algo assim iria acontecer uma hora ou outra. — sussurrei, mais para mim mesma do que para ela.— Você está indo visitar ele? — perguntei, embora já soubesse a resposta.Minha mãe negou veementemente. Mais um vez ficou surpresa.— Não. Já estávamos separados há um tempo quando isso aconteceu e logo depois, o divórcio saiu.Houve um momento de sil
AMÉLIAMinha mãe abaixou a cabeça, eu podia ver a culpa e a vergonha no seu rosto. Eu podia ver que as palavras do Arthur a machucavam, e mesmo assim ela não contestou. Em vez disso, levantou a cabeça novamente e olhou diretamente para ele.— Deixe, filha. É a verdade. — disse ela, sua voz fraca, mas firme. — Eu falhei com Amélia de maneiras que nunca poderei perdoar a mim mesma. Eu deveria ter visto o que estava acontecendo, deveria ter protegido a minha filha. Mas fui cega e fraca. — fez uma pausa, engolindo em seco antes de continuar. — Mas quero que saiba que eu vou fazer de tudo para recuperar a confiança dela... E fazer com que você também acredite em mim, Arthur.Arthur ainda parecia relutante, mas o olhar da minha mãe o fez parar por um momento.— Vou provar a vocês que sou capaz de mudar, de ser uma mãe melhor, uma pessoa melhor. — ela disse, olhando para mim com uma expressão de súplica. — Eu sei que não mereço perdão, mas vou lutar para reconquistar sua confiança, Amélia.A
JUSSARAO sol brilhava intensamente sobre o quintal da casa de Arthur e Amélia, onde um churrasco animado estava em pleno andamento. A churrasqueira estava acesa, e o cheiro de carne grelhando se misturava com as risadas.Eu observava todos, tentando me sentir parte daquele momento, mas a verdade era que me sentia deslocada. Minha filha estava à vontade, conversando com os amigos e rindo com Arthur.Eles pareciam tão felizes.Olhei ao redor e vi dois homens e uma mulher. Amélia tinha dito que aquela era Liliana, mas os outros dois eu não lembrava o nome.Era como se todos ali tivessem um lugar, menos eu. A única que conversava comigo era minha filha.— Mãe, você tá bem? — Amélia perguntou, percebendo meu desconforto.— Tô sim, filha. — respondi, forçando um sorriso. — Só um pouco cansada. Acho que daqui a pouquinho vou embora.Eu olhava ao redor, vendo os outros se divertirem, e me sentia ainda mais diferente, fora do lugar.— Acho que o carvão tá acabando. Vou buscar mais lá dentro.