A sala estava exatamente como sempre, os móveis no mesmo lugar, o ar carregado pelo zumbido discreto do computador ligado, a luz fria da lâmpada piscando ocasionalmente no canto do teto. E, ainda assim, algo parecia fora do lugar. Talvez fosse apenas impressão, talvez fosse cansaço. Mas, para Bruno, o espaço parecia mais estreito do que de costume, as paredes pareciam avançar sobre ele, sufocando-o em um aperto invisível. Respirou fundo, tentando afastar a sensação incômoda. Precisava sair dali, espairecer.Levantou-se e saiu da sala sem destino certo, apenas movido pela necessidade de se movimentar. Caminhar pelo setor talvez ajudasse a aliviar o peso na mente. Enquanto passava pelos corredores, seu olhar percorria os colegas concentrados em suas próprias tarefas. Ninguém parecia notar sua presença de verdade. Isso o incomodava mais do que gostaria de admitir. Sempre gostou de atenção, de ser notado, mas no momento, estava mais para um entre tantos. Alguns olhares até se voltaram par
Os olhos de Ester se fixaram na gaveta de sua mesa, como se o simples ato de encará-la pudesse responder às perguntas que martelavam em sua mente. Sob uma pilha de papéis aparentemente inofensivos, repousava um pequeno drive externo, discreto, silencioso, mas carregado de um peso que parecia crescer a cada dia que ela o mantinha ali.Ela sabia que precisava agir. Aquele drive não era apenas um objeto sem importância; ele carregava informações que eram muito úteis. A questão era: como lidar com isso?Seu primeiro impulso foi pensar em Laura. Entre todas as pessoas da empresa, ela era, sem dúvida, a mais influente e confiável que Ester conhecia. Se alguém poderia ajudá-la a fazer algo com aqueles dados, era Laura. Mas entregar o drive assim, sem mais nem menos.Antes de qualquer coisa, precisava da aprovação de Ricardo.Ester respirou fundo, fechando brevemente os olhos, como se isso pudesse acalmar a tempestade de pensamentos dentro dela. Ricardo era uma peça fundamental nisso tudo, e
Ficar no banheiro não mudaria o que havia acabado de acontecer. O coração de Júlia ainda martelava no peito, e suas mãos tremiam levemente enquanto tentava se recompor. A reunião com Letícia se aproximava, e ela precisava recuperar o controle. Inspirou fundo, encarando seu reflexo no espelho, enquanto cobria, com movimentos delicados, o hematoma recém-formado em seu braço com maquiagem. O corretivo ajudava a esconder os vestígios físicos, mas não conseguia mascarar a dor que sentia por dentro.Ela sabia que não voltaria para sua mesa. O simples pensamento de cruzar o olhar com Bruno fazia seu estômago revirar. Ele estava ali, na sala dele, provavelmente se sentindo vitorioso, convencido de que havia conseguido o que queria. Júlia, porém, não podia permitir que aquele sentimento de impotência a dominasse.Sem pensar duas vezes, saiu do banheiro e seguiu para o setor de Recursos Humanos. Ainda faltavam algumas horas para sua reunião com Letícia, mas naquele momento não conseguia sequer
Ester retornou do almoço com Ricardo sentindo-se mais calma e segura, foi um bom tempo entre amigos, ela tinha se esquecido que podia e devia ter esse tipo de coisa em sua vida. Saber qual seria o próximo passo e o que fazer com o drive externo lhe dava uma sensação de controle. Ainda assim, antes de ir falar com Laura, decidiu sentar-se em sua mesa e retomar suas tarefas.Por mais que a informação que carregava fosse crucial, cumprir suas responsabilidades no trabalho também tinha sua importância. Enquanto digitava, sua mente oscilava entre os números na tela e o peso do segredo que carregava. A cada clique no teclado, sentia a urgência crescendo dentro de si, mas forçou-se a manter a compostura.Como secretária, Ester conhecia bem a rotina de Laura e sabia que sua agenda estava sempre lotada, um pouco mais ultimamente. O final do expediente parecia o momento ideal para conversar com ela, quando o escritório estivesse mais vazio e a gerente menos pressionada pelas demandas do dia.As
Depois que Julia se acalmou e foi para casa, Leticia permaneceu na sala por alguns minutos, refletindo sobre tudo o que havia acabado de ouvir. O peso daquela confissão ainda pairava no ar, misturado com a preocupação e a frustração que começavam a tomar conta dela.Decidiu então voltar à sua mesa. Sentou-se com um suspiro cansado, ligou o computador e acessou o sistema interno da empresa. Navegou até a aba de solicitações e liberações de folga. Sem hesitar, liberou dois dias de descanso para Julia, ela precisava de tempo, de espaço e, principalmente, de segurança para processar o que tinha vivido.Ao concluir a liberação, Leticia encostou-se na cadeira, passando as mãos pelo rosto. Sua mente girava em torno das próximas decisões. Sabia que Bruno era o responsável direto pelo caos que assolara o setor de RH semanas atrás. E agora, além de tudo, havia agredido uma colega de trabalho, um limite que jamais poderia ser ignorado.No entanto, havia um obstáculo imenso entre a verdade e a ju
Ester mal conseguia acompanhar o ritmo frenético da sua caixa de entrada. A cada dez e-mails que lia, outros dez pareciam surgir como mágica, formando uma pilha digital interminável. Ser secretária exigia atenção a cada detalhe, e ela sabia que nenhum e-mail podia passar despercebido — mas um, em particular, capturou sua atenção de imediato.O assunto era direto e intrigante: “Detalhes da Visita do Supervisor”.O e-mail havia sido enviado simultaneamente para ela e para Laura, o que já indicava a importância do conteúdo. Ao abrir, deparou-se com um documento minucioso, que continha o cronograma completo da visita do supervisor à filial. Os horários estavam organizados por setor, especificando com exatidão quanto tempo ele permaneceria em cada área e quais aspectos seriam avaliados, desde a organização do ambiente até relatórios de produtividade e conduta de liderança.Mais abaixo, os dados do supervisor chamaram sua atenção: nome completo, cargo, número da credencial e até uma breve d
Laura estava completamente concentrada na tela do computador, os olhos atentos analisando cada detalhe dos slides que estava preparando. Antes, aquela apresentação seria dedicada aos números de desempenho do setor de qualidade, gráficos de crescimento, relatórios de eficiência, uma maneira de se promover e mostrar o quanto ela era uma ótima profissional. Agora, tudo havia mudado. O foco era outro: expor os bastidores obscuros das ações de Bruno.Os dados comuns deram lugar a provas e observações selecionadas. Cada slide era uma peça no quebra-cabeça que desmontaria a fachada construída por ele. A cada modificação, o rosto de Laura endurecia mais e o cansaço mental aumentava. Porém não havia mais espaço para hesitação.A manhã passou tão rapidamente quanto sua determinação se intensificava. Já era quase início da tarde quando a porta se abriu suavemente, revelando Ester, com um sorriso discreto e um saco de papel com cheiro de comida fresca.Laura ergueu os olhos, era inevitável se sent
O dia tão aguardado finalmente chegou. Para Laura, a noite anterior foi uma batalha contra a ansiedade que a mantinha desperta a cada instante. Após muitas tentativas frustradas de dormir, recorreu a um relaxante muscular na esperança de aliviar a tensão. Embora tenha conseguido adormecer por três horas, acordou sentindo-se ainda exausta, com o corpo pesado e a mente inquieta. Sabia que os relaxantes musculares podem induzir sonolência e causar efeitos colaterais como tontura e fadiga, mas, naquelas circunstâncias, parecia a única solução. Ester, por outro lado, conseguiu dormir, mas o descanso foi perturbado por pesadelos relacionados à visita iminente do supervisor à filial. Despertou sentindo-se mais cansada do que quando foi para a cama, como se a noite tivesse sido uma extensão de suas preocupações diurnas. Determinada a enfrentar o dia, recorreu a uma maquiagem cuidadosa para disfarçar os sinais de fadiga e preparou uma generosa xícara de café, esperando que a cafeína lhe forn