Eu não estava respirando.Era isso. Não tinha outro motivo pro meu corpo inteiro estar em alerta, a pele em brasa, o sangue latejando nas têmporas e a razão pendurada por um fio.Ela se aproximava com passos lentos, quase preguiçosos, e aquele maldito sorriso pintado nos lábios. O sorriso de quem sabe o que causa. O sorriso de quem sabe o quanto eu quero.Estávamos no meu apartamento. Ela tinha vindo “pra conversar”, depois de mais um dia onde passamos tempo demais tentando fingir que éramos apenas dois colegas de trabalho. A conversa tinha virado vinho. O vinho virou riso. O riso virou silêncio.E agora ela estava na minha frente, olhando pra mim daquele jeito.— Você tá quieto — ela disse, parando a um palmo de mim.Eu a encarei cada centímetro dela, dos olhos brilhantes ao jeito como ela mordia o canto da boca.— Tô tentando me controlar.— Por quê?— Porque eu te amo, Savannah. E porque eu sei que, por mais que você me deseje… você ainda não confia totalmente em mim.Ela piscou. F
A luz entrava pelas frestas das cortinas, dourada e suave, como se o universo tivesse finalmente entendido o que era paz e tivesse decidido me entregar um pedacinho dela naquela manhã.Me movi devagar entre os lençóis ainda bagunçados, sentindo a textura fina contra minha pele nua. A brisa fresca da serra entrava pela janela entreaberta, carregando o cheiro de terra úmida e folhas molhadas. Era um cheiro de recomeço, de algo limpo, puro… novo. Como se o mundo lá fora ainda estivesse em silêncio por respeito ao que tinha acontecido ali dentro. Ao que a gente tinha sido.Virei o rosto no travesseiro e encontrei Thomas ali, deitado de lado, me observando. Os cabelos bagunçados, a barba por fazer realçando ainda mais os traços marcantes daquele rosto que antes me assustava e agora... era abrigo.Ele não disse nada. Só passou o dedo devagar pela linha do meu maxilar, descendo até minha clavícula, e depois pousou a mão na curva da minha cintura como se fosse o lugar mais natural do mundo pr
A cidade nunca pareceu tão barulhenta.Assim que entramos no saguão da Montserrat Enterprises, a sensação de leveza que eu tinha desde o fim de semana se dissolveu como gelo ao sol. O som das teclas, dos saltos apressados, dos telefones tocando. Tudo parecia... fora de sintonia. E eu sabia por quê.Eric estava me esperando com o rosto pálido e os olhos arregalados.— Ele fez, Thomas — disse, antes mesmo de me dar bom dia.— O que ele fez?Eric apenas estendeu o tablet.Na tela, o rosto de Damon estampava uma capa de revista de negócios. A manchete?"A VERDADE SOBRE A MONTSSERRAT: FUI SILENCIADO PELO MEU PRÓPRIO IRMÃO"Meus olhos correram pelas palavras afiadas como navalha. Ele me acusava de ter manipulado o conselho para excluí-lo da empresa e dos lucros. Dizia que eu agia como ditador. Que a Montserrat se tornara um reflexo da minha vaidade.Meu sangue ferveu.— Filho da...Senti Savannah colocar a mão no meu braço. Calma. Firme.— Thomas, respira — ela disse, com a voz baixa, como
Se alguém me dissesse há dois meses que eu estaria aqui, nesse exato lugar, ao lado de Thomas Montserrat, eu provavelmente teria rido. Com desprezo, cansaço... e uma dose generosa de incredulidade. Mas ali estava eu, de pés descalços em uma varanda de pedra antiga, o vento da Toscana dançando entre os fios do meu cabelo, o cheiro de lavanda e uva se misturando no ar quente do fim da tarde… e o som de Thomas rindo na cozinha atrás de mim, tentando — e falhando miseravelmente — preparar bruschettas como um local.Ele disse que queria cozinhar para mim. Cavalheiro italiano de ocasião. Eu disse que se ele não fosse um CEO, provavelmente seria um desastre no MasterChef. Ele respondeu que não se importava em queimar o pão, desde que eu o comesse com aquele meu sorriso condescendente que me fazia parecer uma deusa romana julgando os mortais.E eu sorri mesmo.Fechei os olhos por um segundo, deixando o calor tocar meu rosto. A casa que ficamos hospedados era isolada, cercada por colinas e vin
A coletiva da Savannah ainda ecoava na minha cabeça como um trovão elegante. Ela tinha incendiado o mundo com palavras frias e afiadas, e ninguém, absolutamente ninguém, saiu ileso. Damon desapareceu — covarde como sempre — e os investidores voltaram a nos ver com olhos de ouro.Mas não era só isso que latejava em mim. Era ela. Ela, de pé naquela maldita sala, olhando o mundo nos olhos e dizendo: "Não sou escudo. Sou espada."Porra.Eu estava apaixonado por uma mulher que podia me destruir — e ao mesmo tempo, era a única que podia me salvar de mim mesmo.O problema? Meu pai também sabia disso. E quando Harry Montserrat sabe de algo, ele age.— Entre, Thomas — a voz dele cortou o silêncio da sala do conselho. Estava de pé, à janela, segurando uma taça de vinho como se estivesse num leilão de arte, prestes a revirar meu mundo de cabeça pra baixo.— Recebi um telefonema da imprensa hoje — ele continuou, sem me olhar. — Um deles perguntou se você e Savannah têm um relacionamento. Se o en
O que ela não entende — ainda — é que esse jogo eu não estou jogando por diversão. Não se trata mais de ego, poder ou controle. Agora é pessoal. É por ela. E eu não sei fazer isso pela metade.Savannah deixou aquela sala como se tivesse vencido a discussão, com aquele andar altivo, os saltos ecoando como tiros de aviso nos corredores da Montserrat Enterprises, e a nuca erguida do jeito que só ela sabe fazer quando está tentando esconder o caos interior.Mas eu a conheço, ela está tão bagunçada quanto eu por dentro. Só que ainda não admite.Volto para minha sala e encaro a cidade através da parede de vidro. Meus punhos estão fechados ao lado do corpo. Eu a deixei respirar, deixei ela tomar o controle. Mostrei que posso ser o homem que ela merece. Mas... ela quer mais provas, mais garantias, sendo tão exigente. Eu não posso prometer perfeição, mas posso prometer guerra por ela.Meu celular vibra. É uma mensagem de Harry."Thomas. Na minha sala. Agora."Engulo a frustração. Ótimo.Harr
A tensão pairava no ar como uma tempestade prestes a desabar. Eu sentia, desde o momento em que pisei na calçada de mármore da entrada da empresa, que havia algo errado. Uma eletricidade amarga, como se o dia já começasse com veneno nas veias.Já era fim do expediente, o cansaço tomando conta do meu corpo e mente, e então o vi. Damon Montserrat, o homem que carregava o mesmo sobrenome que Thomas, mas não o mesmo sangue — ao menos não que alguém quisesse admitir. Ele estava lá, à minha espera, com o mesmo olhar cínico de sempre, escorado no corrimão como quem se acha dono do lugar.Meu corpo inteiro ficou em alerta. Eu podia sentir o instinto de Thomas se acender também, atrás de mim. Ele deu um passo à frente, mas eu levantei a mão, bloqueando-o sem dizer uma palavra.— Esse é meu momento, Thomas. — disse sem me virar, minha voz firme como aço. — Eu cuido disso.Ele hesitou. Eu o conhecia o suficiente para saber que isso era tortura para ele, mas Thomas confiava em mim. Ao menos o suf
O salão de reuniões da Montserrat Enterprises parecia maior do que eu lembrava, embora eu já o conhecesse tão bem quanto conhecia o caminho da minha própria casa. Mas hoje… havia uma tensão diferente no ar. Cada centímetro daquela sala carregava a pressão do momento. Sentei-me à mesa com as mãos apoiadas no tampo envernizado, o olhar firme, apesar da tensão por dentro.Harry Montserrat entrou com a presença de sempre — imponente, um homem forjado entre cifras e decisões que moldavam destinos. Seus olhos, sempre frios, hoje pareciam cansados. Não de fraqueza, mas de exaustão de um império que estava ameaçado pelas palavras venenosas de um bastardo ressentido.Ele se sentou em silêncio à minha frente, ajeitou os punhos da camisa com precisão cirúrgica e me encarou. Por um instante, não disse nada. Apenas me observou, como se quisesse medir o quanto eu aguentaria — e o quanto ele podia confiar em mim agora.— Savannah — começou, com a voz baixa, mas firme — não vou fingir que não estou p