Sábado.
Assim que despertei, a minha mãe entrou no meu quarto e de imediato convidou-me para irmos às compras. Achei estranho, primeiro porque ela nunca me convidava para sair e segundo porque não tínhamos o vínculo de amizade entre mãe e filha. Mesmo assim, concordei por sentir que a minha mãe quis arranjar uma forma de compensar o tempo perdido. Cuidei da minha higiene pessoal de forma demorada, fiquei presa ao espelho durante minutos e minutos a olhar para o meu reflexo, não conseguia parar de pensar em tudo o que havia acontecido e, de hora em hora, perguntava a mim mesma se aguentaria continuar a suportar. - Marie, despacha-te! – gritava a minha mãe. - Já vou, mãe! Dá-me só mais um minuto. Passaram-se alguns minutos, coloquei a roupa e encontrei-a na cozinha. Estava sem fome, mas a minha mãe exigiu que eu comesse uma fruta. A fome se vai quando a tristeza invade a alma e o coração.No Angola Shopping Center,Chegara o dia de ver os resultados finais. Muito cedo fui despertada pela minha mãe, larguei o conforto da minha cama e em seguida tratei da minha higiene pessoal. Não tive tempo de me alimentar, de tão nervosa que estava. Com o senhor Jacinto ao volante, dirigimo-nos ao Colégio Nobre o mais rápido que podíamos e, chegando à escola, saudei todo mundo.- Bom dia! Desculpe por lhe interromper, tia, vim cá ver os meus resultados finais.- As pautas estão no andar de cima, menina, sou senhora secretária e não sua tia.- Ok. Peço desculpas, senhora secretária, não foi minha intenção faltar-lhe com o respeito.Tratei a funcionária da Secretaria por tia, porque a minha mãe sempre me disse que é um bom costume angolano respeitar as pessoas mais velhas, sendo parente ou não, desde que seja uma pessoa mais velha devemos tratar por tio/a e fui maltratada por ser educada.Ansiosa e bastante receosa, vi o meu nome e constatei que fui ao recurso. I
Terça-feira.Um novo dia e uma nova motivação. Fazer bem o último exame era o meu principal objectivo do dia. A determinação de transitar e atingir as novas metas era o que me deixava motivada. Despertei ao meio da madrugada, o enorme medo de desapontar os meus pais assombrava-me a cada minuto. Agarrei-me aos cadernos e apenas deixei de olhar para a matéria quando já estava quase a atrasar-me para o exame. Fiz a higiene pessoal. Rapidamente desci, comi apenas um pedaço de bolo e fui endiabrada para a escola.- Bom dia, senhor Jacinto! Como está? - Estou muito bem. E a menina Marie, como está?- Estou bem e totalmente pronta para a prova. Podemos ir. Por favor, acelere. Não me posso atrasar.- Está bem, menina.Mesmo no carro, eu não parava de ler a matéria de Geografia, a enorme pressão que estava sobre mim fazia-me ser dura comigo mesma. Eu não tinha um minuto de descanso sequer, pois aquele era o resultado da minha
No dia seguinte, acordei com uma excelente disposição. Abri os olhos da Evandra com o intuito de tirar-lhe o sono, mas mesmo assim ela não acordava. Usei um dos vários métodos para acordar alguém, e gritei bem alto.- Vá, acorda, dorminhoca!Ela não se demorou, acordou e atirou-me com um travesseiro. A seguir, começamos uma guerra de travesseiros que nos tornava cada vez mais crianças. Até a minha mãe subir para o meu quarto e gritar bem alto.- Meninas, parem já com isto! Vocês são crescidas demais para este tipo de brincadeiras.As palavras da minha mãe deram-me a prova de que a mente da maioria dos pais é demasiadamente complexa, pois quando as crianças agem como adultas, os pais reclamam e alegam precocidade, e quando finalmente agem como crianças, também reclamam. Ficamos em silêncio na presença da minha mãe e, quando ela saiu, matamo-nos de rir. As amizades femininas são tão íntimas que a minha melhor amiga e eu tomávamos banho jun
20 de Dezembro, o dia da partida.Nos dias anteriores, passei quase todas às noites em branco a estudar imenso para os exames, e na noite anterior o sono perdera moradia na minha cama por causa da minha ansiedade de viajar o quanto antes. Saímos de casa com o senhor Jacinto rumo ao Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro. Lembro que ao longo do trajecto eu me despedia da minha Kianda aos poucos. No Aeroporto, a ansiedade continuava a exercer um tamanho domínio sobre mim, enquanto aguardávamos pela hora de partida do nosso voo. De hora em hora, consultava o relógio e contava os minutos para a nossa viagem. Três horas antes, já estávamos no aeroporto, porque a pontualidade é uma das principais aliadas do meu pai. Passadas algumas horas, ouvimos a chamada de embarque para o nosso voo, porém não adiantava estar mais ansiosa, pois muitos são os quilômetros que separam Luanda de Londres.8 horas de viagem, suscitaram um enorme cansaço em mim, adormeci durante a viagem e des
Dia 22 de Dezembro.Em tão pouco tempo fiquei gripada e enfebrada, pela mudança de clima. Por causa dessa congestão nas minhas vias respiratórias, a minha avó mimava-me cada vez mais. Acordei, e ela entrou logo cedo no meu quarto com o convite de irmos aproveitar o dia. Sem precisar da ajuda de um analista, aos poucos os dois implantavam em mim uma reeducação afectiva. Arrumei-me o mais rápido possível, eu estava desejosa por sair com a minha avó.A conversa da noite passada surtiu um efeito positivo em todos nós, excepto aquela notícia da doença do meu avô. Mesmo assim, a minha boa disposição era visível, estar positivo atrai coisas positivas e a minha família precisava estar positiva. Cheguei à mesa e encontrei um pequeno-almoço reforçado: ovos, bacon, tomate, salsichas e feijão com molho. Parecia tudo muito gorduroso, mas não dava para manter a forma, porque a minha avó acordou cedo e fez tudo com muito amor. O meu avô estava no jardim a conversar com o meu pai, e a m
Dia 24 de Dezembro, véspera de Natal.Mais um dia! Eu acordei, abri as janelas do meu quarto e dei de cara com um dia ensolarado, quase que pela primeira vez. Faziam dias que eu não olhava para o sol ao acordar.Passei quase todo o dia trancada no quarto, por tédio e inércia. À tarde desci para almoçar e retornei ao quarto, é estranho, mas existem dias em que abunda esta vontade. Tudo parece perder o sentido, é como se nada me cativasse lá fora. E ficar no meu quarto, no meu canto, a ouvir música é uma das minhas terapias para superar os dias cinzentos.Julgo que a paciência é mais do que necessária na compreenção dos recém adultos do mundo actual. No meu caso, eu trocava tudo para ficar no meu quarto, evitava questionamentos, gostava de estar no meu universo paralelo. O mais difícil de compreender é que
Novo dia. Acordei com uma óptima disposição naquela manhã e, como é habitual, a primeira coisa que fiz foi pegar de imediato no telemóvel. Mal consegui abrir os olhos directamente por causa das remelas, mas a minha dependência ao telemóvel era tanta que nem liguei para isso. No ecrã estava uma mensagem do Davi, nem me dei o trabalho de prestar atenção. Ignorei a mensagem e, em seguida, atirei o telemóvel para a cama.São raras as pessoas que acordam com apetite no dia de natal e eu não fiz parte da excepção. Assim que cheguei à sala, tive, pela primeira vez, contacto com os nossos vizinhos, que estavam tomando um chá com os meus avós. Estava ansiosa por conhecer os vizinhos e gostei muito de conhecer a família Eastmond, na primeira e única impressão que tivemos eles mostraram ser muito simpáticos e acolhedores.Pela primeira vez, saí do portão de casa sozinha, pela rua eu vi jovens brincando com a neve. Era a primeira vez que eu passava o natal fora de Angola.&nb
Dia 31 de Dezembro, véspera de ano novo.Um novo dia se pintou sobre o céu e o final do ano estava à vista. A nossa volta para Angola estava cada vez mais próxima, sendo que fora agendada para o mês de Janeiro. Olhei para o calendário e já estávamos no dia 31 de Dezembro, o dia que antecede o mítico dia 1 de Janeiro, e tal como boa parte da humanidade, eu só pensava em tudo novo para o ano novo.Deitada na cama, fiz uma introspecção para não voltar a cometer os erros que cometi naquele ano. Só assim eu podia seguir em frente, porque se fizermos uma análise extensiva da vida, podemos perceber que viver a cometer sempre os mesmos erros é um desperdício de vida. E eu tinha muito por corrigir.Levantei-me da cama, fui ao quarto de banho e, como todas as vezes que vou para o quarto de banho, eu olhei para o espelho antes de cuidar da minha higiene pessoal, mas no espelho eu só conseguia ver o interior, e no meu interior eu via uma Marie pensativa por dentro da Mari