DonatellaEstou sentada sozinha nesse apartamento enorme, cercada por paredes de luxo e silêncio. O vazio é ensurdecedor. Raphael partiu há uma semana, deixando-me para trás com essa ausência que parece pesar em cada canto da sala, onde sua presença ainda parece pairar, mas distante. Sem uma palavra de despedida que durasse mais que o momento, sem um abraço que pudesse preencher essa sensação de desamparo que cresce em mim. Só deixou a promessa de que voltaria logo, como se a distância pudesse ser apenas um detalhe, algo que eu ignorasse. Mas como posso ignorar o tamanho dessa distância que agora se alarga entre nós?Seu destino? Itália. O lugar onde tudo começou. Onde a vida que ele tenta, às vezes, manter distante daqui, na verdade nunca o abandona. A Cosa Nostra. Sua família, a história, o legado. Ele agora está com o pai, o patriarca da família, que o convocou de volta. Raphael não hesitou em atender ao chamado, é claro. Negócios da família, foi o que ele me disse, sem mais detalh
DanteDespertei com o sol invadindo meu quarto pelas cortinas entreabertas. Outro dia em meio a essa mansão que, embora imponente, nunca me trouxe verdadeira paz. A Sicília tem esse contraste: é bela, mas carrega um peso constante, o peso de um legado que, por muito tempo, achei que seria exclusivamente meu. Vesti-me sem pressa, sentindo o cheiro do café que já estava sendo preparado na cozinha. O aroma preenchia os corredores de pedra fria, um convite ao ritual matinal de qualquer homem da nossa família.Caminhei até a sala de jantar, esperando o mesmo cenário de sempre: silêncio, solidão e a ocasional presença de meu pai, que passava mais tempo resmungando do que conversando. Mas assim que atravessei a porta e vi Raphael sentado à mesa, um aperto se formou em meu est&ocir
DanteEu estava sentado no escritório, os cotovelos apoiados na mesa, os dedos entrelaçados. O cheiro do café ainda pairava no ar, mas o sabor amargo em minha boca não vinha da bebida. Era outra coisa. Algo que eu tentava enterrar há anos, mas que agora, diante do que Raphael havia dito, ameaçava voltar à superfície com força total. Ele veio sem Donatella. Era uma frase simples, quase banal, mas carregava um peso que apenas eu parecia perceber. Ele não trouxe Donatella com ele para a Sicília. E mais do que isso, parecia que ele não se importava em justificar o motivo. Sua explicação foi vaga, desprovida de emoção, como se ela fosse apenas mais um detalhe insignificante entre todas as outras coisas que ele deixou no Brasil. E isso me incomodava mais do que eu queria admitir. Tentei me concentrar no motivo pelo qual estávamos ali: negócios. A Cosa Nostra exigia nossa atenção. Raphael, por mais que tivesse tentado escapar dessa responsabilidade ao ir para o Brasil, agora era o Do
RaphaelA manhã na Sicília sempre teve um aroma especial, uma mistura de maresia com o perfume das laranjeiras ao longe. Mas para mim, o ar não era leve, e sim pesado, carregado com a pressão de uma dinastia que meu pai ergueu e que agora repousava sobre meus ombros. O café que tomei com Dante ainda deixava um gosto amargo na boca, mas a razão não era a bebida. Era o silêncio dele. Sabia que algo estava incomodando Dante. Ele tentou disfarçar, mas eu o conhecia bem demais. Talvez fosse o fato de eu ter vindo sem Donatella. Não era uma decisão fácil, mas foi necessária. Ela não tinha lugar aqui, não agora, não com tudo o que está acontecendo. Caminhei pelo corredor da casa que crescemos, sentindo o peso das paredes decoradas com quadros de nossos ancestrais. Gerações que derramaram sangue para manter o poder. Meu pai me esperava em seu quarto, mais frágil do que eu jamais havia imaginado vê-lo. Conversamos brevemente, e eu prometi que faria tudo para honrar o legado dele. Quando
Raphael Dante ficou em silêncio por alguns segundos, o que para ele era um feito raro. Seu olhar permanecia sobre mim, intenso, como se tentasse ler pensamentos que eu mesmo não ousava confessar. Ele finalmente deu de ombros e saiu do escritório, deixando apenas o rastro de sua frustração no ar. Eu respirei fundo, fechando o envelope com força demais, o papel amassando sob meus dedos. Tudo parecia estar desmoronando ao mesmo tempo: os negócios da família, a traição dos aliados e, é claro, Dante. Ele sempre foi meu pilar, mas ultimamente parecia mais uma rocha que ameaçava desabar e me esmagar. A cadeira de couro rangeu quando me recostei, os olhos fixos no teto. Por um breve momento, o rosto de Donatella cruzou minha mente, mas afastei o pensamento tão rápido quanto ele surgiu. Não era hora para distrações. Fui interrompido por uma batida suave na porta. — Entre. Era Luca novamente. Ele estava com pressa, o rosto marcado por uma mistura de urgência e preocupação. — Don Ra
Raphael A madrugada chegou com uma quietude inquietante. Estávamos a caminho do depósito dos Spinelli, nossos veículos cortando as ruas escuras como sombras. Eu estava no carro da frente, com Dante ao meu lado.— Está pronto para isso? — ele perguntou, quebrando o silêncio.— Sempre.Quando chegamos ao local, tudo aconteceu rápido. Os guardas foram neutralizados antes que pudessem dar o alarme, e logo estávamos dentro do depósito. O cheiro de madeira velha e combustível preenchia o ar enquanto nossos homens espalhavam explosivos.— Isso vai acabar com eles — disse Dante, observando as caixas de mercadorias que representavam uma fortuna para os Spinelli.Antes que eu pudesse responder, um tiro ecoou no ar.— Emboscada! — gritou um dos nossos homens.O caos tomou conta do depósito. Tiros vieram de todos os lados, e eu me joguei atrás de uma pilha de caixas, puxando minha arma. Dante estava ao meu lado, seu rosto iluminado pela adrenalina.— Eles sabiam que estávamos vindo! — ele gritou
Dante As chamas lambiam o céu como se quisessem tocar as estrelas, mas tudo o que conseguiam era tingir a noite de vermelho. O calor ainda era intenso, mesmo a distância, mas o frio que se instalava em mim vinha de outro lugar. Enquanto observava o depósito dos Spinelli ser consumido, minha mente viajava para longe dali. Raphael estava ao meu lado, a postura rígida e o olhar afiado. Eu sabia que ele estava planejando os próximos passos, como sempre fazia, mas meu pensamento insistia em retornar a Donatella.Aquela mulher era um enigma. Forte e doce ao mesmo tempo, com um olhar que poderia desarmar até o mais endurecido dos homens — e isso incluía a mim. E agora, no meio de todo esse caos, a necessidade de ouvi-la, de ter certeza de que estava bem, consumia minha mente. Mas como eu poderia ligar para ela? Não agora, não enquanto as chamas ainda ardiam e Raphael estava a poucos metros de mim, sempre atento a cada movimento meu."Você está me enfraquecendo, Donatella", pensei, apertando
DonatellaFaz semanas desde a última vez que Raphael foi para Sicília. A ausência dele se tornava cada vez mais insuportável, mas o que mais me incomodava era o silêncio. Um silêncio que parecia gritar segredos, mistérios que ele não estava disposto a dividir comigo. Desde que foi para a Itália, o único contato que tive foi uma ligação breve de Dante, como se Raphael não tivesse tempo para mim, mas tivesse para confiar a seu irmão o papel de intermediário. Eu estava exausta. A responsabilidade de cuidar da empresa enquanto Raphael estava fora era pesada, mas eu aceitaria o desafio sem hesitar. Era o mínimo que podia fazer por ele, por nós, por tudo o que construímos juntos. Mas a notícia que recebi ao chegar ao escritório naquela manhã foi como uma faca no coração. — Vendida? Como assim, vendida? — perguntei, a voz saindo mais alta do que pretendia. O advogado que me entregou a papelada desviou o olhar, visivelmente desconfortável com meu tom. — Senhorita Donatella, os documen