Prólogo

De acordo com fatos mitológicos; além do campo de visão dos seres humanos, existe um submundo onde grandes deuses e deusas moram. Esses imortais moviam-se livremente pela realidade disfarçadamente até que um grande erro foi cometido!

A filha do grande chefe se apaixonou por um mortal e teve um filho com ele; um Semi Deus. Seu pai não aceitou, pois sabia que isso colocaria o segredo do submundo em risco, fazendo com que ela fugisse com o seu amado e seu filho para o mundo físico. O grande chefe muito apreensivo com o que havia acontecido e também muito machucado, determinou que a única regra para que os deuses continuassem passeando pelo mundo físico era que não poderiam criar laços ou se apaixonar pelos mortais! Mas; essa regra foi quebrada e os deuses passaram a ter famílias na terra, criando assim uma geração de Semi Deuses com poderes totalmente extraordinários.

Deuses da profecia; por exemplo, estavam criando deusas no mundo real, fazendo com que passassem despercebidas pelo controle do grande chefe. Ele vendo tudo escapar das suas mãos irou-se, pois a humanidade que estava notando o quanto o mundo estava lotado de coisas ‘estranhas’, deu início à pesquisas sobre mitologias, fatos sobrenaturais e etc. Os vigilantes; seres imortais que tinham o poder de materializar-se como aves melros, protetores do portão que rastreavam todos os deuses que falavam a palavra submundo, vendo que tudo estava saindo do controle resolveram criar uma rebelião pressionando o Grande Chefe, que sem saída decretou que para que voltasse a ordem e obediência todos os semideuses teriam que morrer. Uma pequena parte dos vigilantes ficaram contra essa regra, criando assim um plano. Os Deuses davam seus filhos para que os vigilantes fugissem e os criassem como tutores bem longe. Assim alguns deles morriam para proteger sua família sendo caçados e punidos por não entregarem seus filhos.” 

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Hoje é um dia muito importante para mim, há um ano enviei um artigo para o jornal da cidade e finalmente eles responderam marcando minha entrevista para daqui a uma hora. Coloco uma calça cintura alta e uma blusa de manga curta, faço uma make básica e coloco uma correntinha pingo de luz que ganhei da minha mãe, me olho no espelho e noto o quanto estou parecida com ela então respiro fundo com minha alma sorrindo.

 Eu não poderia estar mais feliz e orgulhosa! O nome da minha mãe era Niara, ela morreu a um ano e meio atrás, o ônibus em que ela voltava para casa de mais um dia árduo de trabalho caiu numa encosta quando o motorista perdeu a direção. Se doeu? Eu achei que não sobreviveria, mas a minha mãe me ensinou a ser forte e superar meus traumas assim como ela superou os dela!

Niara era filha de índio, vivia numa tribo até se apaixonar por um índio da tribo rival, ela engravidou e os dois resolveram fugir para a cidade grande, pois sabiam que seu amor jamais seria aceito. Minha mãe veio na frente e esperou, mas ele nunca chegou, dias e meses se passaram até ela descobrir que ele foi morto na noite da fuga acusado de traição a sua tribo, com pouco dinheiro e grávida ela ergueu a cabeça e procurou emprego.

Minha mãe refez a vida na cidade grande, enfrentou os preconceitos pela cor da pele, pela sua origem e por ser mãe solteira educadamente como se faz uma mulher sábia. Eu cresci com todo amor do mundo, muito curiosa, sempre acreditando que contos de fadas existiam e que outras galáxias também eram reais e mesmo quando me chamavam de estranha na escola; ou eram racistas comigo; ou falavam da minha mãe, ela quebrava todo o preconceito com amor e carinho me incentivando sempre e me dizendo que ser diferente não era ruim… Muitas vezes perguntei para ela porque eu não tinha pai e porque minha pele era escurinha ou porque as pessoas não aceitavam minhas raízes, e ela me dizia com toda convicção:

“Cor de pele não muda potencial e nossas raízes são motivo de orgulho e não de vergonha. Ser diferente é ser especial.”.

Terminei o colegial aos quinze anos como uma das melhores alunas, além de aprender com êxito, vários outros idiomas, escrevia artigos para o jornal da escola e com isso me destaquei, me aprofundei em fatos sobrenaturais, mitologias e lendas culturais. Mas quando minha mãe se foi eu percebi que era hora de recomeçar em outro lugar, foi aí que eu me mudei para uma cidade pequena da Alemanha, arrumei um novo emprego como garçonete e resolvi tentar a chance no jornal. Bom demorou, mas o meu dia chegou e eu espero que dê tudo certo. 

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Hoje eu só tenho a comemorar; o jornal está a todo vapor e preenchi mais uma vaga que está em aberto, isso significa sucesso. Levanto; tomo um banho coloco uma calça preta e uma camisa social preta de manga comprida que dobro até o cotovelo. Olho no espelho e observo o homem negro malhado com um black cacheado e um belo par de olhos castanhos que está a minha frente!

Só tenho a agradecer pelo belo homem, em todos os aspectos, que me tornei. O filme da minha vida passa em minha mente, me lembro do garotinho que foi criado em um orfanato em meio a tantos jovens negros que foram abandonados por causa da cor da sua pele, lembro do John meu vigilante que deu sua vida para me contar que eu era um semideus, lembro do choque que foi quando tive meus primeiros dons manifestados, quando mentalizei um gatinho e do nada ele apareceu, quando me teletransportei para o primeiro portal. Tive que fugir do orfanato para não ser caçado e morto, foi aí que mudei para essa cidade, morei na rua por um bom tempo e hoje eu penso que poderia ter tido tudo que eu queria, uma casa e riqueza com o meu dom, mas não era simples assim, eu ainda não sabia controlar e isso poderia chamar muita atenção e me colocar em perigo.

Dormindo em praças foi que vivi na pele o racismo, as pessoas trocavam a rota para não passar perto de mim e muitas vezes fui chamado de preto imundo até encontrar o Jeremias, eu estava confuso; era uma criança que se achava estranha e acreditava que o meu dom era o motivo para toda aquela desgraça em minha vida, e isso me atormentava dia e noite quando eu tentava trancar minha mente para não materializar coisas.

Uma noite qualquer o Jeremias parou ao meu lado e me perguntou meu nome; foi o começo de uma linda amizade, ele e sua esposa não podiam ter filhos, ele queria um herdeiro e me adotou, me deu casa e comida, me ensinou regras de etiqueta, e me deu um emprego no jornal, comecei de baixo; mas não demorei muito para ir crescendo lá dentro.

 O Jeremias sempre me dizia que eu era especial e que eu tinha potencial para coisas grandes! Quando a esposa dele morreu, ele se mudou para outro país me deixando com a casa e à frente do jornal. Ele sempre me fez se sentir normal; acolhido, e hoje com vinte anos ainda sinto o peso do meu passado, mas ajudo as pessoas anonimamente, um presente tão desejado por um órfão; uma quantia significativa achada por um morador de rua me deixa um pouco completo. Mas escrever artigos sobre meu mundo me traz a esperança de um mundo igual e em paz. 

                                                                   ∞

Aradia chegou à sede do jornal faltando vinte e cinco minutos para a sua entrevista, ela subiu as escadas do pequeno e modesto prédio que ficava ao lado da biblioteca central da cidade, o secretário logo veio cumprimentá-la e pediu para que ela aguardasse na sala de espera. Depois de quinze minutos o Diretor chefe do jornal entrou na sala e logo a cumprimentou. 

— Bom dia. Senhorita Aradia, certo? Eu me chamo Odin Grimm sou o diretor chefe do jornal, me acompanhe, por favor. — Ele a olhou e se dirigiu para o escritório. 

— Sim. Obrigada. — Ela falou seguindo-o. 

— Sente-se. — Ele se alojou na cadeira de diretor e apontou para a cadeira à sua frente. Ela se sentou e cruzou as pernas prendendo discretamente seu olhar. — Diga-me por que o interesse em trabalhar com artigos sobre fatos sobrenaturais? 

— Sempre fui muito curiosa e cresci acreditando que havia algo mais, algo além do nosso campo de visão. Resolvi me aprofundar nesses fatos e acabei me apaixonando por essa área. 

— Como assim algo além do nosso campo de visão? — Ele olhou automaticamente no fundo de seus olhos como se pudesse penetrá-la, ela havia despertado nele uma curiosidade intensa e inexplicável. 

— A vida tem muitas coisas que não podemos enxergar, mas que podemos sentir. Tem o oxigênio; a alma, o vento, o perfume. — Ela falou como se estivesse perdida em pensamentos. — Por que não ter algo mais além? Todas as lendas e mitologias precisaram de uma base para serem feitas. — Ela parou instantaneamente e o encarou. 

— Continue... — Ele queria escutá-la.

— Eu só quero poder mostrar para as pessoas que o novo não é uma coisa ruim. Eu acredito que seja real e que só está escondido porque os seres humanos não sabem lidar com o diferente, não precisamos ter medo dessas pessoas e dessas coisas novas, eu quero poder mostrar uma nova perspectiva; um novo olhar sabe, sobre um mundo igual independente das diferenças. 

— Qual a certeza de que o novo pode ser bom e o que te faz acreditar que as pessoas te escutarão? — As palavras saíram de sua boca já ansiando pela resposta. 

— Eu sou negra; filha de índia e mãe solteira, por muito tempo fui e ainda sou diferente dos padrões que a sociedade me impõe, cresci sendo chamada de estranha na escola e me sentindo mal por isso. Mas a minha mãe me ensinou que ser diferente nunca vai ser ruim. — Ela sorriu. — Pessoas diferentes são especiais. A sociedade criou uma zona de conforto tão limitada que expulsa até pessoas como eu e você. Existem coisas boas e novas esperando para serem acolhidas e mostradas e por que não aceitar? — Ela o encarou.

       Odin a fitou intensamente; as palavras dela ecoaram em seu coração e ele viu toda a dor do passado ir embora. Ele estava vendo uma mulher guerreira; fora dos padrões e que tinha muito para o ensinar. Ele viu um brilho tão especial em seus olhos; que o fez querer conquistá-la, naquele momento ele não saberia explicar o que estava sentindo, mas poderia afirmar com convicção que aquela mulher era a certeza da felicidade que ele havia procurado por toda a sua vida.

Ele a queria intensamente, queria mostrá-la o mundo que ela ansiava por ver, queria ensinar-lhe o verdadeiro significado de ir além do seu campo de visão, e queria aprender todas as sabedorias que sairia de sua boca dali em diante. Poucos minutos de conversa bastou para que ele percebesse que estava diante de sua futura esposa. E mal sabia ele que enquanto falava, ela via em seus olhos a base para todo aquele diálogo e que seu coração de alguma forma estava dizendo para ela que seria dele. 

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