Em minha vida sempre existiu uma chama acesa que me levava para lugares onde muitos se desviavam ao passar perto. Afinal eu nunca acreditei em tamanha besteira em toda minha vida. Espíritos, almas, monstros de outros mundos, tudo nunca passou de pura e mera besteira para mim.
Era noite. Eu estava em meu trabalho de sempre.
Investigando casos que muitos julgavam ser sobrenatural. Mas
eu estava lá para provar o contrário. Estudei parte da Teologia,
mas meu único foco era provar que não existia nada além da
nossa morte.
Digamos que eu era bem conhecido, quando se pronunciava
meu nome, todos sabiam de quem se tratava. Virgel Martinez
Martins.
Já estou com quarenta anos e até hoje nunca descobri nada
de anormal em nosso mundo. Isso se não contarmos com as
pessoas insanas e doentes que causam estragos e danos em
nossa sociedade que já se encontra em caos.
Hoje eu entrei na casa dos Jacksons, uma família muito
supersticiosa. E que não era muita adepta a igreja. Diziam estar
sofrendo com aparições e algumas manifestações do além.
Estou aqui desde cedo, a família está hospedada nos vizinhos.
Não gosto de ter alguém por perto nessas horas. Um a mais
sempre atrapalha.
Contudo nada de estranho ou incomum havia acontecido por
enquanto. Nem algo que explicasse o que fora descrito por eles.
Com o tempo adormeci.
Quando meu sono se avançava eu comecei a sonhar. Estava
na mesma casa, porem estava tudo escuro, não tinha luz
alguma. Enquanto vagava pelos corredores percebi mais alguém
na casa. Fui procurando e seguindo os sons de risos que me
levaram até uma porta trancada no porão. Parecia algo comum
para um sonho. Despertei por volta das três da manhã. Havia
ouvido um barulho alto. Certamente tinha alguém ali. Saquei
minha arma e procurei por alguém, mas nada. Desci no porão e
também não encontrei ninguém.
Mas a havia uma porta ali. Era idêntica a do meu sonho.
Eu não me lembrava de ter descido ali em baixo. Mas tentei
abri-la.
Sem sucesso.
Estava trancada. Procurei uma chave, mas não tinha nenhuma
por ali. Resolvi quebrar.
O prejuízo seria meu de qualquer jeito.
Quando consegui fazer com que a porta se abrisse tive uma
enorme surpresa.
Era uma mulher. Estava amarrada e amordaçada. Parecia sido
espancada e abusada.
Fui em direção a ela e lhe retirei a mordaça.
- Quem fez isso com você? – Perguntei a ela.
Mas ela parecia estar em choque não falava nada. A levei para
cima e chamei a polícia, que certamente teria alguma coisa a
informar, e depois tomaria as devidas precauções.
Enquanto ela não chegava eu deixei a mulher no sofá, mas
não chamei a família ainda. Eles poderiam tentar fugir, ou fazer
algo pior.
Fiquei a olhando fixamente durante vinte minutos. Foi
quando ela me disse seu nome:
- Dayse.
- O que?
- Meu nome, é Dayse.
- E o que fazia lá em baixo Dayse?
- Eles me colocaram lá, faz dois meses.
- Eles quem?
- O homem que mora aqui e o filho mais velho dele.
- Tudo bem. Fique calma que vai dar tudo certo.
- Eu tentei sair, mais eles não me deixaram ir embora, eu era
amiga da Sophia.
- A Sra. Jackson?
- Sim, eu vinha aqui de vez em quando, ela sempre pedia para
vir fazer uma sessão com ela, eu sou médium e ela regularmente
fazia algumas leituras comigo, mas um dia eu vim e ela não
estava em casa ainda. O marido dela me pediu para entrar e
esperar, mas eu percebi que queria algo de mim. Foi quando ele
me atacou me prendeu lá em baixo, ele junto com o filho.
Ficavam falando entre si. Como se tivessem feito um pacto de
silencio. E depois eles...
- Não precisa detalhar nada pra mim Dayse. A polícia vai
chegar logo e eles vão pagar pelo que te fizeram. Pode ficar
tranquila.
Me levantei e vi que a viatura estava na porta. Pedi para que
primeiro prendessem os dois que estavam na casa vizinha para
evitar qualquer fuga, e deixei a mulher com uma das policiais
que vieram, pois uma ambulância também estava a caminho.
Fui para fora e detalhei o que ouvi para o policial.
- Virgel Martinez, o que manda dessa vez?
- Um clássico caso de sequestro. Atacaram e violentaram-na.
Prenderam no porão e de certo iriam mata-la e descartar o
corpo para que ninguém descobrisse.
- E nada de sobrenatural outra vez.
- Sim, nada de sobrenatural. Além da moça que diz falar com
espíritos.
- Uma médium? Quem diria, mas pode deixar com a gente
agora. Vamos cuidar para que eles sejam presos e levados a
julgamento.
- Eu espero que sim. Foi desumano o que eles fizeram com
ela. E interrogue a Sra. Jackson também, elas eram amigas.
- Tudo bem.
Sai e fui até o Sr. Jackson que estava na viatura. Seu olhar de
medo era compreensível, pois pegaria uma bruta pena pelo que
eles fizeram.
Cheguei perto dele e lhe disse:
- Ali está seu fantasma Sr. Jackson, nada mais do que medo e
intranquilidade pelo que você e seu filho haviam feito. O medo
de ser pego pela policia, ou de que a esposa descobrisse seus
atos sórdidos com outra mulher. Isso tudo estava te causando
alucinações e desconfortos. Os sons de que sua esposa me falou
eram certamente dessa mulher que a todo custo tentava
escapar daquele lugar. Daria um ótimo livro, mas dispenso a
oportunidade. Passar bem. E boa estadia na prisão para o senhor
e para seu filho.
Ele não me disse nada, mas seu olhar furioso já era o bastante
para saber que mais uma vez eu estava certo. O ser humano cria
seus demônios para esconder seus erros e por a culpa em outra
pessoa.
E por fim tudo acabou bem. Pelo menos para aquela mulher.
Sai dali e fui para casa. Onde finalmente eu pude descansar.
No dia seguinte fiquei pensativo quanto ao sonho que tive na
noite anterior.
Ultimamente eu estava tendo sonhos recorrentes com locais
sombrios, escuros e meio enevoados. Há muito tempo eu não
tinha sonhos assim.
Pelo que me lembre, já faziam mais de quinze anos.
Mas o que é um sonho bobo perto da vida que eu tinha
salvado?
Fiz meus afazeres do dia e fiquei em casa para descansar da
noite mal dormida que tive.
Quando o dia começou a se avançar eu decidi sair um pouco e
mais tarde ir ao escritório que tinha.
Já eram seis da tarde soube que havia um novo delegado na
cidade. Infelizmente o ultimo tinha se enforcado na sua própria
sala. Nunca descobrimos o porquê. O dia estava quente e as ruas
lotadas, e eu já estava no meu escritório apenas esperando um
telefonema para poder sair e provar o quanto o sobrenatural
não passava do normal disfarçado de mentiras e medo de que se
não haja mais nada para nós após essa breve estadia na Terra.
Tudo não passava de algo encoberto para esconder a verdadeira
natureza humana, uma natureza fria e cruel.
E para minha surpresa recebi um telefonema dele.
- Alô. – disse ao atender.
- Virgel vem tenho um caso pra você, de estrema
importância.
- O que ouve? Alguma casa mal assombrada por ratos de
novo?
- Não dessa vez não. Mas será melhor se você vier aqui no
seu escritório, por que não vai te agradar muito essa noticia.
- Esta bem, dentro de meia hora eu estarei ai.
Desliguei o telefone e me fiquei a perguntar qual era o caso
desta vez. Como detetive paranormal, eu não sou muito dos
convencionais, pois, sou ateu e não acredito nessas bobagens, e sendo assim
acho incrível o que uma pessoa perturbada pode fazer para se
mostrar e ganhar atenção, a forma como o ser humano se usa e usa as demais pessoas para
satisfazer bels prazeres e desejos que muitas vezes são mais grotescos que a imagem do
inferno em que os cristões acreditam.
Diversos desses casos levaram muitos a loucura, outros a cadeia, contudo eu me vejo apenas
andando em círculos em meio a essa loucura toda em que se tornou a humanidade em que
vivemos. Isso me enoja.