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Paralisia do Sono
Paralisia do Sono
Por: Lia Lopes
– Linhas do Passado –

Sentado em uma cadeira de balanço, fumando um cigarro e vendo as nuvens se dizimarem no céu, parece um dia normal e qualquer, mas na verdade é um dia normal e qualquer. Não estou fazendo nada de mais, apenas esperando o dia passar, quando uma brisa fria sopra sobre minha nuca, vindo de dentro, dentro de casa, a porta de tela batia contra o vento, me arrepio, com os olhos fechados já sei o que devo fazer é o meu destino, talvez eu não passe de hoje ou passe, quem sabe. Me levanto e entro, fechando a porta, caminho pela cozinha até chegar as escadas, seguro no corrimão por que minhas pernas não aguentam mais sozinhas, ao conseguir escalar aquela montanha de escadas, adentro o quarto, me sento em uma cadeira próximo a cama de minha pequena, que já tinha completado quinze, suspiro, fechando os olhos meu corpo entra em outro plano, enquanto isso minha pequena deitada com os olhos abertos, imóvel, seus dedos tentam me dizer algo, mas não conseguia, ao abrir meus olhos a cor já não existia apenas um fundo branco, minhas mãos se firmam junto aos braços da cadeira, meus pés tremem aos poucos, vocês não estão vendo o mesmo que eu. Olhando pelo outro lado, um ser, algo que muita gente pensa que não é real, mas é sim, algo que nos assombra todos os dias e não sabemos se é verdade ou não, mas cai entre nós, é verdade. Isso existe sim, gostaria que vocês vissem o que eu vejo, sentado sobre a barriga dela, ele ou ela ou sei lá o que seja, não a deixa se mexer, impedindo com que ela respire ou fale, além de estar sentado sobre ela, uma de suas mãos tampa sua boca e a outra pressiona sua garganta, minha função aqui é fazer com que ele ache o caminho para o outro plano e vá embora, não sei se ele vai para um lugar melhor, mas a única coisa que sei é que ele não pode ficar aqui, me concentro tanto que as vezes meu nariz sangra, já estou velho e meio sem forças, na verdade sem força nenhuma. Ele olha para mim, parece que quer me amedrontar, mas ele mal sabe que eu já estou acostumado e não vou deixa-lo vencer, aos poucos vou tomando mais força sobre ele, uma de suas mãos consegui tirar, a outra sai logo em seguida, parece que ele não está muito contente com isso, ao notar que está perdendo ele se vira apenas mexendo seu tronco, como se sua coluna quebrasse com esse movimento e grita em minha direção, pena, pois eu não terminei ainda, veja como eu te mando para outro lugar seu verme infame, com uma pulsação de luz consigo arremessa-lo, fazendo com que ele saia de cima dela e seja arremessado contra a parede, ele fica furioso e voa sobre a cama tentando me atacar, mas com um sorrisinho de canto me levanto da cadeira e meu corpo inteiro emana essa pulsação, ofuscando seus olhos e fazendo com que ele seja dizimado, aquilo se esfarela em uma poeira negra e eu caio sentado inconsciente.

— Pai? Pai você está bem?

— Filha, precisamos conversar

Ao olha-la, um de meus olhos já está claro, quase branco, meu nariz sangrando e meus ouvidos zunindo, esse é um preço que pagamos para eliminar essas coisas desse plano. O engraçado é que não pedimos por isso, mas no decorrer do tempo aceitamos e entendemos que se não for nós o mundo sucumbirá a algo terrível, fiz parte da geração que quis mudar algo e ainda deixo meu legado, por que não tenho muito tempo aqui.

Oito anos depois.

Sentada em uma cadeira de balanço, fumando um cigarro e vendo as nuvens se dizimar no céu, parece um dia normal e qualquer, mas na verdade é um dia normal e qualquer. Um carro encosta na frente de minha casa e buzina.

— Ei Kely!

Achou que a história iria se repetir? Na verdade, ela se repete, mas de um outro modo. Me levanto, pegando minha bolsa que está no chão, sigo até o carro, Pietro, meu quase irmão, somos amigos desde o colégio, ele é a pessoa que mais sabe sobre mim, e claro eu mais sobre ele, somos parceiros e contamos tudo um para o outro, estamos em uma jornada, achar meu destino, ele disse que me ajudaria nisso já que trancou a faculdade e seu projeto de missangas não deu muito certo, ele achou que poderia fazer colares, mas o problema é que ele não sabe nem amarrar o cadarço, verdade ele usa tênis de velcro. Estamos seguindo viajem, pois temos que conhecer alguém, a senhora Mittis, ela era uma grande amiga do meu pai, ele morreu jovem aos trinta e nove anos, mas sua aparência era de noventa, preciso entender tudo o que aconteceu com ele e tudo que acontecerá comigo, tenho visto algumas coisas estranhas, que não fazem muito sentido, estamos quase lá, enquanto isso sinto o vento passar em meus cabelos e o sinto nas pontas dos dedos também, meu braço está para fora da janela, aparando toda essa brisa.

— Certo, depois de conhece-la o que vamos fazer?

— Ainda não sei, só vamos saber depois que ela nos disser tudo

— Entendo, daí vamos começar nossa caçada

— Caçada?

— Sim, dos demônios!

— Não vamos caçar demônio nenhum!

— Mas seu pai fazia isso e você sabe

— Claro que sei, eu era atormentada por eles todos os dias

— Já viu o rosto de algum deles?

— Não necessariamente, mas a sensação é horrível.

— Eu imagino

— Não, você não imagina.

Olhando bem para Pietro termino o assunto antes que eu meta a mão na cara dele, depois de algumas horas chegamos em nosso destino, uma casa até que bonitinha, na verdade não estava bemacabada, mas não esperaria uma casa linda e amável já que ela era amiga do meu pai e conhecendo bem meu pai, nossa casa não era linda e amável. Saímos do carro e vou na direção da porta da frente, caramba o que me espera? Preciso saber, marquei um horário com ela por telefone. Ao tocar a campainha ouço som de salto alto tocar o chão e vai ficando cada vez mais perto, até que alguém abre a porta.

— Senhora Mittis?

— Sim.

Claro que era ela, um metro e cinquenta aproximadamente, cabelos longos e negros, uma pele ótima, gostaria de perguntar o que ela está usando, mas mantive a calma, talvez quando pegasse um pouco mais de intimidade. Ela nos convidou para entrar, ficou surpresa com a nossa chegada e já foi logo dizendo que acabará de tirar biscoitos do forno, nem achei ruim, pois estava morrendo de fome, mas mantive a pose, já Pietro foi logo farejando onde ficava a cozinha, puxou uma cadeira e nem a esperou o convite.

— Você é bem rápido meu jovem

— Desculpe eu realmente estou com fome

— Não se preocupe, eu vivo sozinha então adoro quando vem pessoas me visitar, fiz esses biscoitos para vocês

— Então vamos comer!

Pietro atacou a comida como um leão ataca um servo, fiquei pasma, pois parecia que ele estava amarrado ao pé da cama, que vergonha, puxando uma cadeira sentei-me ao lado dele, enquanto senhora Mittis nos servia um café quentinho feito quase na hora, peguei um dos biscoitos e realmente estavam ótimos, lembrei quando meu pai fazia alguns para mim. Tendo cuidado para não falar de boca cheia comecei a perguntar:

— Senhora Mittis, você sabe por que estamos aqui?

— Sim, imaginei pelo seu tom de voz ao telefone

— Sabe que irei fazer algumas perguntas sobre isso.

— Já estava esperando querida

— Se importa?

— Claro que não pergunte, mas coma antes que seu amigo acabe com todos.

Olhei para Pietro e com a boca cheíssima ele sorriu para mim. Quis matá-lo naquela hora.

— Senhora Mittis, qual era sua relação com meu pai?

— Bom nós éramos bem próximos, sempre almoçávamos juntos, íamos a igreja ou ao parque.

— Eram namorados?

— Não meu jovem, ele nunca pediu, mas eu sempre esperei por isso.

— Como assim? Meu pai nunca se interessou pela senhora?

— Creio que ele não queria me envolver tanto em sua vida, pois você sabe, ele fazia coisas fora do comum.

— E é sobre isso que quero falar também.

— Antes de entrarmos nesse assunto deixe-me te contar minuciosamente como eu e seu pai nos cruzamos.

Me preparei segurando a xícara de café e com outro biscoito em mãos, atenta para ouvir e entender cada detalhe.

— Éramos bem jovens ele deveria ter seus dezoito e eu dezessete, nos conhecemos aos cultos de domingo eu fazia parte do coral e ele era o orador, sempre ficávamos até mais tarde conversando sobre a igreja ou até mesmo sobre coisas de nossas vidas, seu pai era um amor, me deixava sempre em casa ou ia me buscar para irmos aos cultos, uma certa vez meu pai chegou a questionar quando ele me pediria em namoro, mas ele nunca respondia apenas abaixava a cabeça e saia pela porta da frente. Até em uma certa ocasião as coisas mudarem, uma de nossas amigas na igreja tinha um filho, ela havia engravidado bem cedo, sofreu abuso de seu próprio primo, em uma de nossas conversas casuais na igreja ela mencionou para ele que seu filho estava tendo problemas para dormir e como ele era uma pessoa capacitada na igreja concordou em ir orar pelo garoto, marcamos uma data e fomos até a casa dela, depois da oração ele pediu para passar aquela noite na casa dela, pois tinha sentido algo estranho.

— O demônio!

— Não interrompa Pietro, coma e fique quieto.

— Desculpe.

— Não se preocupe, quer mais café?

— Por favor, está ótimo!

— Bem como eu ia dizendo, seu pai pediu para passar a noite lá, ela concordou, fui embora com um outro colega nosso que me deu uma carona até em casa e eu o deixei por lá, a partir daqui são palavras dele que me fazem lembrar até hoje, ele mencionou que apenas pediu uma cadeira para se sentar à beira da cama, intrigada ela questionou o porquê, ele disse que era por precaução, apenas para estar pronto, ela seguiu suas orientações, bem eles jantaram a beira da mesa, conversando e rindo de vários fatos, a criança também se divertiu muito enquanto comiam, depois de ter feito seus preparativos do sono a criança dormiu e seu pai esperou um tempo para adentrar o quarto, logo após ele se sentou na cadeira e ligeiramente pegou no sono, acordando de supetão no meio da madrugada, ele me disse que a criança estava com os olhos esbugalhados e não conseguia se mover, ele tentou mexer nela, mas era como se algo o bloqueasse também, então ele disse que uma voz ao pé de seu ouvido começou a instrui-lo, ele se sentou na cadeira e fechou os olhos, quando abriu novamente a criança estava sentada no pé de sua cama olhando para ele. Sem ao menos perceber já estava de dia, mas ele não conseguia explicar o porquê de o tempo ter passado tão rápido sem ele ao menos perceber, foi quando apareceu seu primeiro cabelo branco.

— Espera senhora Mittis, está tentando me dizer que além dele não ter se lembrado do que

aconteceu, isso também faz encurtar o tempo de vida.

— Não sei querida, o que estou tentando dizer é que quando mexemos com algo que não faz parte de nosso plano, deixamos alguns rastros para trás e a partir daí perdemos forças, como ele nunca tinha feito isso sua cabeça estava um pouco confusa do que era realidade e do que não era.

— Entendi.

— Mas a senhora não falou nada ainda sobre demônios.

— Calma meu jovem irei entrar nessa parte, depois desse feito sempre quis estar ao lado de seu pai, para saber quando aconteceria de novo.

— Você era tipo uma assistente?

— Não, eu era quem o guardava

— Guardava?

— Sim, quando você entra em um transe seu espirito sai desse plano para outro e seu corpo fica, como se fosse uma casca oca, e quando eles percebem que você está vulnerável atacam sorrateiramente.

— Os demônios?

— Pietro!

— Sim os demônios, o guarda têm a função de proteger o corpo em seu estado físico para que o espirito o encontre em segurança em seu retorno, há um outro fato, mas esse foi um pouco mais perigoso, querem saber?

Balançamos a cabeça informando que sim, mas estávamos com boca cheia, meu deus aqueles

biscoitos estavam ótimos.

—Depois que as notícias se espalharam as pessoas começaram a chamar pelo seu pai achando que ele fazia um trabalho de exorcismo, mas nem ele sabia o que ele realmente fazia, certa vez fomos até o leste da cidade em uma fazenda, onde tinha uma família com três crianças, elas tinham problemas para dormir à noite, ao chegarmos lá seu pai notou que tinha algo estranho pelas redondezas e me pediu para que eu desse a volta na casa por três vezes.

— Três vezes?

— Sim, seu pai começou a entender as coisas espirituais aos poucos e como eu não sabia de quase nada apenas obedecia, depois de ter dado as voltas entrei na casa, quando cheguei eles apontaram o dedo informando que ele estava lá em cima, subi as escadas em direção ao quarto, quando cheguei abri a porta aos poucos e vi seu pai sentado na cadeira com o olhos se revirando achei que ele pudesse estar tendo um ataque ou algo parecido, quando entrei no quarto fiquei chocada, duas crianças, uma estava no teto e uma ajoelhada na cama, parecia que seu pai tinha perdido o controle, quando ao menos percebi uma das crianças pulou para ataca-lo, não acreditei que ele pudesse estar perdendo o controle, entrei na frente dele e parecia que metade dele foi transportado para meu corpo, e então pude ver, pude ver o quão horrível era do outro lado, aquela criatura medonha tentou morder meu ombro, mas uma luz e uma energia o bloqueava, eu não sabia o que fazer estava apavorada, mas senti que meu corpo começava a ficar pesado, quando não aguentei mais cai ao chão de joelhos e seu pai se pôs de pé, a criança voltou a ser prensada contra a parede, mas ainda não tinha terminado, vendo tudo aquilo não podia deixa-lo só, me levantei com muito custo e segurei em sua mão, parecia muito fácil fazer isso com ele, e eu voltará a ver tudo novamente, o demônio estava sendo prensado contra a parede e gritava desesperadamente para sair, mas não conseguíamos manda-lo embora, creio que por serem dois a dificuldade era um pouco maior, até que seu pai começou a recitar algumas palavras, era como uma oração, segui pronunciando junto com ele o texto breve que dizia “As trevas não se perdura na tribo de luz”, depois de repetir por algumas vezes aquelas feras foram se dizimando, formando um nevoeiro negro, as crianças caíram sobre as camas e seus pais abriram a porta, elas choravam alto, pois suas vozes haviam voltado, seu pai caiu sentado enquanto eu cai de joelhos ao chão, minha visão foi voltando aos poucos e quando me virei um pouco da pele de seu pai havia ficado enrugada e olhando para minhas mãos o mesmo aconteceu comigo. Saímos da casa e fomos embora, depois de algum tempo aquilo nunca mais voltou. A única coisa que você precisa saber é que se uma porta foi aberta você não pode ir embora até fecha-la, eles percebem o medo e a fraqueza que encontrasse nesse plano, pelos rastros de linha do tempo.

— Linha do tempo? Pietro questiona.

— Sim, as linhas do tempo são rastros que deixamos pelo plano etéreo, pelo plano que não podemos ver a olho nu, essas linhas interligam os dois planos fazendo com que algo chegue até nós, seja ele bom ou ruim, se cortarmos a visibilidade dessa linha do tempo podemos fazer com que os espíritos nunca mais retornem.

— Entendi, é como se você apagasse pegadas.

— Exato.

— Pode me explicar como fazer isso?

— Acredito que essa não seja a hora mais apropriada para te ensinar isso.

— E por que ao fazer isso envelhecemos?

— Bom nesse caso, envelhecemos mais rápido por que aparentemente estávamos lhe dando

diretamente com o chefe da matilha.

— Como assim?

— No plano espiritual há uma certa hierarquia, como posso dizer, há os subordinados e os chefes, quando conseguimos eliminar rapidamente significa que era um subordinado, mas quando aquilo luta contra você, querendo fazer com que seu medo tome

conta da situação.

— É um chefe. Diz Kely.

— Exatamente, depois que seu pai resolveu morar em outra parte da cidade não íamos mais a

esses lugares juntos.

— Senhora Mittis, espera. Meu pai era apaixonado pela senhora pelo que entendi, e pelo que nos contou vocês ficaram tempo demais juntos, claro que aconteceu algo, por que meu pai deixou a senhora?

— Bem, acho que aqui entra uma história pior ainda.

A senhora Mittis levanta da cadeira, se vira e desce um pouco sua camisa.

— A não senhora Mittis eu não sou esse tipo de cara.

— Pietro! Olha de novo.

Ao destampar seus olhos, ele consegue ver a marca que foi deixada de todos esses anos.

— Senhora Mittis, como aconteceu?

— Na verdade eu e seu pai estávamos em um relacionamento bem sério, todos perguntavam quando iriamos nos casar, ainda não tínhamos certeza, certa noite ele recebeu uma ligação, era uma antiga amiga do colégio pedindo sua ajuda, ele perguntou se eu queria ir, pois pelo tom de voz da sua amiga notou algo errado, eu não medi esforços disse que iria com ele sim, eu tinha acabado de passar por uma cirurgia recente, já tinha me recuperado, mas estava debilitada, essa amiga morava na extremidade do oeste onde ninguém mais vai, pois não há postos, não há lojas de conveniência, compramos galões de gasolina e solicitamos uma hospedagem em um hotel próximo a praia, já estávamos tão acostumados a termos sucesso que planejamos passeios mediante a essas viagens, pegamos a estrada curtindo, nos amando

incondicionalmente, até que chegamos a casa, era bem bonita no topo da serra, a vista era incrível, ela nos cedeu um quarto, pois tinha dito que essas atividades aconteciam só pela noite, como de costume, bom ficamos e nos enturmamos com a família, passeamos pelas redondezas e voltamos a casa, já pela noite seu pai fez o mesmo ritual de sempre, esperou as crianças dormirem, só que o que não sabíamos é que o problema não vinha das crianças, seu pai se sentou na cadeira e como sempre pegou no sono e eu cochilei na poltrona ao lado, quando acordei com um barulho, seu pai escandaloso me chamando, (risos de Kely e Pietro)

seu pai já estava pronto para começar, fiz um círculo ao chão com sal do Líbano, dizem que é o sal mais puro para selamento de rituais.

— Selamento?

— Sim, como disse o corpo deve estar protegido, sendo assim, fazendo um círculo ao redor do corpo outros espíritos não podem encontra-lo, enfim, fiz o círculo e deixei seu pai fazer o restante só que nada estava acontecendo, as horas foram se passando até que senti uma estranha presença atrás de mim, logo seu pai sentiu também e então começou, seus olhos revirados e suas mãos precisando os braços da cadeira, só mostravam que ele já estava travando uma batalha, seu nariz começou a sangrar, eu precisa saber o que estava acontecendo, quando encostei minha mão sobre seu ombro fui transferida para outro plano onde pude ver realmente o que era, parecia um gigante, estava encurvado, pois sua cabeça batia ao teto, horrível o pior que eu poderia ver, senti que ele estava sugando toda minha energia então comecei as preces, seu pai não estava fazendo as orações, mas consegui ver o

ricocheteio de energia no ar que impedia com que o monstro se aproximasse das crianças, era muita pressão para mim, até que vi um rastro passar pelo corredor, seu pai tinha me ensinado uma oração de compartilhamento, onde eu, mesma estando longe dele poderia ficar no mesmo plano, foi quando segui para o outro quarto e vi, tinha outro do mesmo tamanho e tão terrível quanto, ele tentou me atacar, mas consegui barra-lo, combater um daqueles sozinha era muito difícil, mas não poderia deixa-lo acabar com aquela família, foi quando fiz algo perigoso, não tinha mais o que fazer era a única chance.

— O que a senhora fez?

— Existe uma oração que faz com que você transfira metade da sua energia vital, transformandoa em mais força no plano que está, ou seja, você retira de um para compensar no outro, mas claro há suas consequências, rapidamente comecei a orar fiquei tão forte que consegui dizimar aquele monstro com apenas um faixo de luz enorme, corri para o

outro quarto, quando vi, seu pai estava próximo a cama, em pé aquele monstro estava tentando sugar toda sua energia, mas ele tinha criado uma barreira impedindo com que o monstro a ultrapassasse, rapidamente lancei uma rajada de energia, o demônio desapareceu por um segundo e surgiu atrás de mim, com um golpe me acertou nas costas, antes de cair ao chão meu corpo liberou mais uma rajada de luz que o dizimou em instantes, ao ter acabado

cai no chão inconsciente, me recompondo, olhei para minhas mãos e estava completamente

enrugadas, me deparei à frente de um espelho e meus cabelos estavam completamente brancos, como disse há um preço que devemos correr quando fazemos algo do tipo.

— Por isso ele decidiu deixar a senhora?

— Ele não queria que eu me machucasse mais, então partiu para o sul, foi quando ele conheceu sua mãe, ela era como ele, falávamos algumas vezes por cartas e teve um dia que eu fui sem avisar, quando cheguei a casa dele vi a cena, ela na varanda com uma barriga linda e ele por trás dela, acariciando-a.

— Eu sinto muito.

— Não sinta minha querida, acho que eu não fui o suficiente para ele, e ele enxergou nela o que eu não tinha, bom, fomos muito felizes enquanto estávamos juntos, a vida fazia total sentido, mas depois percebi que não fazia não, eu era apenas uma de suas mãos naquela época e ela se tornou os braços e ombros dele.

— Tocante. Pietro completa.

— Não interrompa! Então senhora Mittis, depois do ocorrido, nunca mais viu meu pai?

— Não, mas eu sempre sabia onde ele estava

— Como assim?

— Depois que se compartilha uma alma com alguém você nunca mais se separa, apenas quando ...

— Ele morre.

— Exatamente querido, olha só você comeu todos os biscoitos.  Mittis pega o prato de biscoitos, se levanta dando risada e abre o forno.

— Ainda bem que fiz mais.  Ele a olha deslumbrado e ainda morrendo de fome, eles ficam um tempão conversando, até que ela os convida para se juntar a ela em um chá, eles vão para parte de trás da casa, onde há uma pequena varanda, passando por ela chegam a um pequeno

jardim, com uma mesa linda de centro e três cadeiras, a mesa estava composta por algumas

xícaras e bule, e o melhor tinha alguns bolinhos.

— Bolo de limão? Diz Pietro olhando fixamente para aqueles lindos bolinhos e pareciam

estar ótimos.

— Meu Deus, você ainda está com fome?

— Não, mas tem espaço para alguns bolinhos

— Alguns? Diz Kely.

— Sem problemas pode comer Pietro.

Ele se senta rapidamente e começa a comer como se fosse a última coisa do mundo.

— Ai meu deus, esses bolinhos são ótimos!

— Que bom que gostou, eles são de ontem, mas eu adoro comer bolo de um dia para outro.

— Parece que você já estava pronta para nos receber.

— Você notou. Kely e Mittis caem na risada.

— Querida, eu estive ligada a seu pai por anos e sei como ele morreu também

— Sabe?

— Na verdade, você também sabe Kely

— O que sabe sobre a morte dele querida?

— Bom teve um dia que ...

Kely olha para Pietro e depois para Mittis tentando escolher as palavras certas.

— Não se preocupe querida, pode falar, do seu modo.

— Teve uma vez, eu era bem jovem, eu tinha problemas para dormir e meu pai sempre ficava ao meu lado na cama, com o passar dos tempos ele já nem dormia mais, sempre preocupado comigo e com meu bem estar, um dia, eu estava tendo pesadelos a noite toda, mas quando abri os olhos, senti uma energia, como se tivesse algo sobre meu peito, impedindo me de respirar, falar e me mexer, fiquei por alguns minutos tentando sair daquela situação, mas estava começando a ficar cada vez mais fraca, até que meu pai apareceu, se sentou em uma cadeira em frente à minha cama e eu vi o que realmente ele fazia, ele expulsou aquela criatura e quando levantei ele estava sangrando pelos olhos, nariz e ouvidos, não passou muito tempo até ele morrer.

— Na verdade querida, essa foi uma das coisas o que fez morrer.

— Uma?

— Sim, teve alguns fatos que o fez partir desse plano para outro.

— O que são esses fatos?

— Bom um desses é que outra pessoa a um tempo abriu uma espécie de portal, onde ele conseguia trazer qualquer criatura do outro lado para cá, seu pai enfrentou muitas delas. A segunda é que há uma espécie de ritual para fechar esse portal de uma vez por todas, só que seu pai nunca conseguiu fazer.

— E você tem alguma pista sobre isso?

— Ao longo dos anos desenvolvi uma capacidade de localização, meu espirito pode viajar pelo plano astral por um certo tempo, com o treinamento intenso consegui viajar por dias.

— E encontrou? Diz Kely.

— Encontrei, mas não podia ir até lá sozinha.

— Por que?

— Digamos que eu ainda não tinha forças o suficiente para travar uma batalha, mas enviei uma carta para seu pai e depois acabei descobrindo que ele foi até lá, ele encontrou a pessoa que abriu esse portal, mas na batalha ele não teve muitas chances, certamente por que seu oponente era forte e jovem ainda.

— Quem é esse oponente? Mittis abre um caderno de anotações que estava sobre a mesa, pega uma foto e entrega para eles. Observando a foto ficam surpresos.

— É o dono da corporação Sidney. Kely afirma.

— Sim, ele mesmo. O dono da maior construtora do país.

— Não acredito, mas ele está tão jovem, do mesmo jeito que lembro quando criança.

— Ele deve usar algum feitiço para se manter jovem. Pietro diz.

— Não utilizamos feitiços querido, há um ritual que permite com que você fique jovem ao decorrer dos tempos, mas como disse há um preço que deve ser pago, às vezes é pago com outras vidas.

— Não acredito. Kely fica perplexa e paralisada com tamanha noticia

— É como se fosse ...

— Não é como se fosse, ele mata as pessoas e absorve a vitalidade delas.

— Eu ia falar isso senhora Mittis.

— Então acho que temos que encontrá-lo. Diz Kely.

— Como disse querida?

— Temos que pará-lo!

— Sem entender seu poder, sem saber como combate-lo, sem conhecer suas habilidades antes? Você é bem esperta.

— O que quer que eu faça? Fique esperando enquanto ele anda pelas ruas livremente?

— Não disse isso, disse que antes de começar qualquer coisa você precisa se fortalecer e conhecer seu inimigo.

— Como?

— A resposta você já tem, ele é o dono da corporação Sidney Kely sorri para Mittis entendendo seu ponto de vista.

— Por que vocês estão rindo uma para a outra, a meu deus Kely você está flertando com ela?

— Cala essa boca e come! Kelly enfia um pedaço de bolo na boca de Pietro.

— A propósito senhora Mittis, o que usa na sua pele?

— Isso eu já não posso revelar.

Novamente elas caem na risada.

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