DAVID
Existe um determinado momento na vida de todo homem que as coisas mais simples, se tornam as mais importantes. Paramos de lutar contra a gravidade e tudo o que desejamos é mantermos os pés firmes no chão, mas comigo acontece o aposto, quanto mais velho fico e os dias se passam, a necessidade pela intensidade aumenta e a ideia de ter uma rotina é sufocante. Aderi a solidão como estilo de vida e vivo sem a intromissão de ninguém, vou aonde quero e fodo quem quiser. Sem compromisso.
Por isso, a ideia de me relacionar com qualquer pessoa beira ao absurdo. Ninguém pode assumir o lugar da minha Lígia, ela é única, a
DAVIDAfasto com certa delicadeza os braços magros de Carlota Maldonado e observo ainda meio incrédulo seu sorriso alargar, a garota passa seu peso de um pé para o outro enquanto brinca com uma mecha de cabelo enrolado entre os dedos e me encara como se eu fosse um amigo íntimo.— O que faz aqui? — Falo de uma vez, retirando nós dois da frente do elevador, guiando-a pelo braço para uma parte mais isolada. Ela solta um riso frouxo e traz a mão para o meu ombro assim que paramos, um de frente pro outro, deslizando para cima e para baixo como se estives
DAVID Duas semanas e já me sinto órfão de mãe e pai, porque Hordéllis Bragança pode ser extremamente cabeça dura quanto quer. Meu dedo coça para clicar no símbolo verde de celular e ligar para minha progenitora, mas posso ser tão ou mais cabeça dura quanto ela e quanto mais tempo passa desde a festa, mais vazio sinto. Ela deveria ter me ligado! Ela sempre liga. Esfrego meu rosto com minhas duas mãos e tento mais uma vez, lê o documento em p*f que recebi de um dos sócios da empresa. Cacete, eles não sentem minha falta? Sou seu único filho e a porra dessa viagem está se aproximando. Me levanto com raiva, desistindo de vez de ler qualquer coisa uma hora dessas, no meu estado atual é provável que eu tenha um ataque cardíaco e morra antes deles, motivo não vai faltar. Me sirvo um pouco de água com gás e fito a paisagem urbana de Arapuna pela janela do meu escritório, um município extremamente rico e independente de São Paulo que poderíamos ser emancipados sem nenhum problema, mas
NELLYGatilho.Eu não entendi o significado dessa palavra até ter idade suficiente para compreender que o aperto no meu peito não era uma doença física, mas um desconforto causado por determinadas situações e palavras. Precisei conversar com psicólogos diferentes para entender que haviam traumas cravados em mim, li livros buscando por autoconhecimento e aceitação sem entender o núcleo principal da minha ansiedade, então tentei lidar com esses traumas por meio de cirurgia estética, tentando eliminar os problemas pela raiz, mas não fui até o final e…
NELLY—Não fique sem jeito, menina.— Não estou. Hordéllis Bragança estala a língua, abanando a mão no ar. — É claro que não. — comenta com um sorriso de canto, e me pego pensando na mulher como uma espécie de bruxa, porque é impossível que ela saiba tanto sobre mim.Aperto meus olhos para ela.
DAVIDO perfume conhecido serve como despertador, intrigado com a fragrância feminina abro um olho de cada vez, permitindo que a claridade me guie, ainda sonolento inspiro o cheiro tentador com certa fome. Fazem mais de vinte dias que ela não ousa chegar perto de mim, então o que ela está fazendo na minha casa, no meu quarto, tão cedo?Quando meu cérebro recém acordado começa a processar com racionalidade o que está acontecendo, vasculho o cômodo de canto a canto a procura da responsável pela minha ansiedade e a encontro na porta do banheiro, me olhando com seu típico ar inocente, mordendo os lábios como se soubesse exatamente do que planejo fazer com ela. — Como entrou? —Questiono, ouvindo as batidas do meu próprio coração. Que porra, ela é só uma garota. Para de bater desse jeito, caralho!—Você me trouxe. —Diz, retirando o apoio do seu corpo da porta do banheiro e caminhando até mim. Abro a boca para questionar sua afirmação, porque eu não faço a mínima ideia do que ela está fala
DAVID— Cuidado, talvez eu não esteja mais disponível quando você resolver superar o passado e viver o presente. — A frase familiar me faz olhá-la desconfiado. — Essa frase…— Começo, mas sou interrompido pela imagem dela evaporando.Me acordo de sobre salto com o pau levemente duro, entendendo exatamente o que acabou de acontecer, foi um sonho, apenas mais entre tantos que passei a ter e todos acabam exatamente iguais. A Nelly repete as exatas mesmas palavras que minha mãe me disse antes de partir para seu cruzeiro com meu pai, talvez, apenas com algumas mudanças. Ela usou o primeiro pronome do singular, não pude deixar de perceber. Eu. Mal humorado, saio da cama e vou direto para o banheiro. Tomo uma ducha rápido e sigo minha rotina já estabelecida de ir para a empresa. Adentro o prédio minutos depois com um copo de café na mão e um óculos escuros no rosto para disfarçar minha expressão de merda. — Sr. Bragança, com licença...— Leyla se antecipa assim que me vê e balanço a cabeç
NELLYA águia é um animal com uma característica bastante interessante, ela possui a capacidade de enxergar um determinado alvo mesmo estando a quilômetros de distância, mas Kaciana Álvares, minha progenitora, vai além e enxerga com qualquer ser humano com apenas uma olhada rápida, ela é especialista em sacar as fraquezas de alguém com poucos minutos de conversa e consegue em poucos segundos dizer se estou mentindo ou não, embora que sou uma péssima atriz a ajude muito. Escondi todas as embalagens de doces num saco plástico e coloquei embaixo da minha mesa, mas conhecendo bem minha mãe sei que dará um jeito de descobrir. — Onde estão? —
NELLYEnvolvo meu corpo com meus braços e tento apaziguar o frio da noite com o calor do meu toque, arrependida por optar por um vestido longo de alças finas, de algodão, ao invés do conjunto de moletom quentinho com mangas longas, caminho pela rua de casa na força da necessidade. Hoje realmente não é meu dia.Menstruação e confusão mental.Eu acho é pouco.Último capítulo