Eu e Bryan resolvemos ir à casa de Kimberlly ver o que está acontecendo com ela. Chegando lá, ela mesma nos atende. Está com os olhos inchados, como os de quem passou horas chorando.
- Liv, Bryan, é tão bom ver vocês! - ela diz, com a voz rouca.
- Kim, o que está acontecendo...? - pergunto, preocupada.
- Precisamos conversar... Algumas coisas que venho tentando ignorar desde a infância estão vindo à tona... Eu não aguento mais esses sentimentos...
Olho para ela com dúvida. Eu não entendi o que ela queria dizer com aquilo.
- Tudo bem, eu vou tentar ser mais direta - diz Kim - assim, vocês vão me entender melhor.
Enquanto ela respira e se prepara para falar, penso no que pode ser. Acho que lá no fundo, eu tenho uma suspeita do que é. Conheci Kimberlly ainda criança, aos 13 anos. Nessa idade, muitas dúvidas começam a surgir em nossa cabeça, ao mesmo tempo que nosso corpo está mudando. É isso que em mais ou menos um ano vai diferenciar uma criança de um adolescente. É a famosa pré adolescência.
Nessa época, eu lembro de Kim tentando me explicar que sempre se sentiu uma menina diferente. Ela se vestia diferente, brincava de coisas diferentes e andava mais com meninos do que com meninas, até que eles começaram a estranhá-la e ela ficou solitária. Ela dizia que queria ter o cabelo curto, queria ter nascido menino para poder fazer o que ela quisesse sem ser julgada ou zoada pelos outros. Com o tempo e a pressão social que todo adolescente sofre nessa época da vida, ela acabou deixando tudo isso de lado para tentar se ajustar na escola.No meio de meus devaneios, ela começou a falar e eu me concentrei em suas palavras.- Bryan, Liv... Eu sei que vocês nunca me julgariam por nada, por isso tenho toda a coragem de compartilhar meus pensamentos com os dois. Não sei se vocês se lembram, mais sempre tive dúvidas sobre mim mesma. Mesmo tentando, nunca consegui me ajustar completamente aos outros em nossa época de escola. A verdade é que eu nunca me senti uma menina, uma mulher. Lembro de ser criança e pedir a Deus todas as noites para que ele me levasse e me botasse em um corpo de menino. Lembro de ser caçoada por fazer coisas "de menino", de ser chamada de machinha e coisas do tipo. Vocês eram meus únicos amigos. Eu já não consigo mais esconder isso de mim mesma. Liv, Bryan... Eu sou um homem trans. Eu tenho certeza disso, sempre tive e sempre fui. Os anos que passei tentando esconder isso de mim mesma e dos outros foram tristes, me sinto aprisionada nesse corpo. A minha dor é pelo que vou sofrer daqui pra frente se eu quiser me assumir a todos. Minha família, meus amigos. Meu corpo de mulher já é completamente desenvolvido, vou precisar de muitos hormônios se eu quiser adaptar ele. Eu só não consigo mais deixar isso guardado dentro de mim... Precisa sair de algum jeito.
Aquilo ao mesmo tempo me chocou e me aliviou. Eu sempre senti que havia algo de diferente na Kim, sempre soube. Ela apenas escondeu isso de si mesma.
Ela soluça de tanto chorar e Bryan a conforta, junto comigo. Nós dois dizemos a ela que está tudo bem.- Vamos te apoiar em tudo, Kim. Te levo até o médico para pegarmos hormônios e vermos como você pode os usar. Porém, você precisa falar com a sua família. Não toda, mas aqueles que você mais ama. Principalmente sua mãe.
Passamos a tarde na casa dela, a divertindo e conversando com ela. Daqui pra frente, eu sei que terei o papel de a apoiar nesse processo de se assumir e mudar seu corpo, e isso me animava porque faria minha amiga feliz.
Acordo um pouco atordoada por conta de tudo o que Kimberlly está passando, olho ao lado e Megan já tinha saído da cama. Me levanto, passo a mão em meus cabelos tentando arruma-los um pouco e vou até ao banheiro escovar os dentes e lavar meu rosto inchado de sono.Ao terminar, desço até a cozinha onde vejo Megan de costas preparando seu café da manhã, chego perto sem fazer barulho e á abraço por trás dando um beijo em seu pescoço, ela se vira de frente para mim, sorri e me beija enquanto me empurra até o sofá, onde sento e ela senta em cima do meu colo, ainda me beijando :- Uau! Você não me beijava assim à dias! - diz Megan enquanto dava leves beijos em meu pescoço.- Eu sei, meu amor. Me desculpe! Ult
Megan me liga, avisando que fechou a livraria, e vou buscá-la para a levar ao seu restaurante favorito. A avisto de longe. Desço do táxi e pegamos o carro. Ela está muito bonita.- Amor, você está linda... - digo, toda apaixonada.- Obrigada, amor. - ela cora e me dá um beijo demorado - vamos lá, estou com fome, mas não vamos demorar muito. Tenho uma surpresa pra você em casa - ela me olha com um sorriso safado.Beijo seu pescoço e começo a dirigir, indo em direção ao restaurante. Chegando lá, estaciono, descemos e vamos em direção à entrada. Peço pela reserva que fiz mais cedo e uma garçonete vem nos acompanhar até nossa mesa.
- ... É... O que? - pergunto gaguejando .- Ah, você não sabe o que é isso, Olivia? - pergunta Megan, mostrando o papel para mim - Então eu vou ler para você:Eu quero ser aquela que você pensa antes de dormir. Aquela que domina seus sonhos. Aquela que te acerta a memória. Aquela que arranca sorrisos. Aquela que você espera. Aquela que você sempre procurou. Quero ser quem te conforta, quem te consola, quem TE AMA. Eu quero ser a saudade que assola os seus pensamentos. A sua saudade mais profunda . O seu sorriso mais ardente. Aquela pelo qual você se orgulharia em dizer "Ela é tudo o que eu sempre quis".Eu quero ser aquela que você não trocaria por nada, nem agora e nem em um milhão de anos.
O despertador toca. Me levanto e vou ao banheiro. Prometi à Megan que cuidaria da livraria enquanto ela viaja, então preciso ir trabalhar. Tomo um banho e me arrumo. É estranho estar aqui sem a Megan, sozinha. Tudo fica silencioso demais, o que me faz ter mais saudade dela ainda. Vou para a cozinha tomar café, sem demorar, escovo os dentes e pego o carro para ir à livraria.Dirijo alguns quarteirões, chego lá, estaciono e a abro. Está linda, como sempre. A Megan é muito dedicada e cuidadosa, então deixou tudo já limpo e arrumado. Vou para trás do balcão.Logo cedo, alguns clientes começam a entrar para olhar ou comprar livros, nada de anormal. De repente, avisto uma viatura de polícia estacionando bem em frente à Rowling Story. Um policial sai dela, entra na livraria e vem em minha direção. Não dei
Era manhã e eu já tinha acordado bem cedo para fazer compras no mercado aqui próximo, pois noite passada prometi para Kimberlly que passaríamos o dia todo juntas até dar a hora dela ir para Los Angeles.Me arrumei e esperei ela chegar, o apartamento estava quieto e então fui para cozinha preparar algumas coisas para nós irmos beliscando durante a tarde.Depois de 20 minutos, quando eu já estava toda suja de farinha e açúcar, a campainha toca e eu vou atender:- Tá atrasada! - digo limpando as mãos em um pano.Kimberlly entra sorrindo carregando 4 malas para dentro, nas costas ela estava usando uma mochila da onde tirou uma tequila:- Isso é uma festa ou não é? - pergunta K
No dia seguinte, acordei sentindo uma ressaca de leve pela noite passada e para arrebatar aquela dor chata de cabeça, tomei uma bela xícara de café forte e então eu fui trabalhar na livraria. O dia estava lindo e eu estava de bom humor, apesar de um garoto ter derramado milk shake na sessão de livros do Star Wars. Tudo estava bem, pessoas entravam e saiam pela porta, o que não era nada fora do comum. Para falar a verdade eu não parava de pensar no Jacob e então decidi mandar uma mensagem para ele ir me visitar, mandei o endereço e logo após fui limpar toda aquela bagunça.Os minutos iam passando e enfim o Jacob havia respondido meu sms dizendo que estava vindo para cá. Ótimo! Continuei organizando os livros na prateleira quando duas garotas chegaram perto de mim:- Com licença, aonde fica o banheiro? -perguntou uma delas.
Acordei em minha cama, com a cara amassada e algumas toalhas de papel em volta de mim. Aparentemente, eu tinha chorado até de noite e acabei dormindo sem perceber. Megan ainda não tinha voltado para casa, então eu estava, mais uma vez, sozinha. Logo tirei minha roupa e me enfiei debaixo do chuveiro. Fiquei um bom tempo pensativa, deixando a água cair em minha cabeça enquanto raciocinava sobre o que tinha acabado de acontecer. Uma tentativa de assassinato a mim acabara de destruir algo que construí com Megan. Não tinha sido algo exatamente fácil de se fazer. Comecei a chorar de novo. Eu estava arrasada e sentia muita falta dela, mal esperava o momento de ela voltar. Também sentia falta de Liz... Liz!Decidi que iria até a casa de Emma para visitá-las. Fazia algum tempo desde que não via ela. Saí do chuveiro, comi alguma coisa, me arrumei e fique
A noite, não consigo dormir direito. Penso em tudo que está me acontecendo, penso nas pessoas que morreram, nas que estão em perigo e também naquelas que por algum motivo me traíram. Sei que não sou a melhor pessoa do mundo mas eu achava que pelo menos havia pessoas que me amavam de verdade. Sei lá.Em meio aos meus devaneios emocionais, me levanto para tomar uma xícara de chá e assistir um pouco de TV para ver se o o sono chega.Desço até a cozinha, pego minha xícara e me sento em meu sofá branco. Está chovendo muito e quase não dava para ver a rua da janela do meu apartamento. Por um momento achei que tinha ouvido alguém gritar, mas com certeza era o barulho de algum relâmpago.Me levanto novamente para pegar mais um pouco de chá, quando alguém bate na porta de um jeito um pouco d