CAPÍTULO 7
Aquele lugar era seu refúgio e fortaleza, amava incondicionalmente aquele lar. Muitas vezes se encontrava inundada em lágrimas pela real possibilidade de ser condenada e deixar aquele pedaço de chão para sempre. Sabia que as recordações lhe acompanhariam para qualquer lugar. Odiava-se por não tentar procurar alguma prova que ajudasse na defesa. A casa era enorme e nunca procurara pelo cofre que ficava escondido no escritório, aliás, para isto era preciso primeiro encontrar a chave. Ela nunca conseguiria arrombar aquela porta fabricada de cedro, a árvore mais resistente da região. Nos primeiros dias após a morte do esposo, procurou a chave como uma louca busca sair do sanatório. Depois de sucessivos fracassos, desistiu e se conformou com a situação. Ocupava o tempo cuidando do sogro e aproveitando cada minuto que lhe restava
CAPÍTULO 8 Quase não conseguira dormir. Mesmo fechando a porta do quarto à chave não se sentia segura com um estranho dormindo sob o mesmo teto. Melissa havia deduzido várias hipóteses de quem realmente era o recém-chegado. Ele poderia ser realmente quem disse ser, mas também poderia estar ali a mando de alguém que desejasse vê-la morta. Talvez fosse um policial disfarçado, investigando a sua real culpa pelo assassinato de Manoel Vargas. Quando acordou naquela manhã o visitante não se encontrava mais na sala, onde dormira no desconfortável sofá. Tomada por um impulso correu para o terreiro e constatou que a moto permanecia no mesmo lugar onde fora deixada no dia anterior. Deduziu que ele pudesse ter ido buscar um mecânico no povoado. Sentia-se estranha. Um sentimento irreconhecível tomava forma. Tentou não pensar nele, mas poucos minutos depois estava criando a imagem dele nas recentes lembranças. Resolveu ocupar a mente com os
CAPÍTULO 9 Era a capitã do próprio mundo, permitindo o naufrágio de toda a tripulação. Dona das sagradas paisagens que a mente inventara para enganar as besteiras de uma sociedade hipócrita comandando um sistema ainda mais hipócrita, regido por certas leis determinando que a liberdade deve sempre existir. Não era aplicado ao seu caso. Melissa constantemente se revoltava com as regras que a justiça lhe aplicara. Enquanto o veredito não saísse ela estava proibida de sair da própria casa. A solidão lhe consumia dia após dia. Muitas vezes agradecia a Deus por ter o sogro próximo, mesmo desmiolado era uma boa companhia. Em outras oportunidades culpava Deus por tanto sofrimento. Estava cansada e se pegara inúmeras vezes pensando em suicídio. Estranhamente, se sentia feliz com a presença do fotógrafo em sua casa. Não dissera nada a Severino. Desde cedo estava frustrada pela ausência dele. “Não posso ficar neste jogo de nervos e ne
CAPÍTULO 10 Olhou o relógio, eram cinco horas da manhã. Pensou dormir mais uma hora. Vozes discutindo o fizeram levantar rapidamente. Já devidamente vestido saiu em busca do local de onde vinham as vozes. Deu a volta pela lateral da casa e viu um homem de estatura mediana, gordo, bigode espesso cobrindo o lábio superior. Usava calça e camiseta militar. Aproximou-se com cautela até uma distância que lhe permitia ouvir claramente. Entedeu claramente a situação: a cadela permitiu que aquele homem entrasse por ser alguém conhecido. — Por favor, me deixe em paz — falou Melissa arrumando o cabelo. — Já lhe disse mais de uma vez que no momento não estou a fim de encontros. — Você se faz de difícil, mas, deitava com qualquer um em troca de uns centavos quando morava no cabaré. — Seu porco imundo. Não permito tal liberdade... — os soluços afogaram as palavras de Melissa. — Por favor, me deixe terminar de tirar o leite. C
CAPÍTULO 11 Galeano não pediu para acompanhá-la ao casebre. Também não foi convidado. Enquanto Melissa cumpria a missão noturna, Galeano ficou sentado na calçada apreciando a dança das estrelas no céu. Num momento o céu estava estrelado, minutos depois ficava completamente tomado pela névoa. Estas alterações tornavam o lugar ainda mais agradável. Sua mente discorreu nos detalhes dos últimos acontecimentos da investigação. Sabia que cometera um grave erro ao se envolver com o alvo. Fora fraco quando a beijou. Não cometeria o erro duas vezes. Não queria sofrer e nem a fazer sofrer. Bastava o “rolo” com Márcia. Deveria ter ido embora naquela manhã, estava usando a última muda de roupa que trouxera na mochila. Estava se arriscando demais. Seus planos mentais foram atropelados pelo tom aveludado da voz de Melissa. — Pronto para jantar? Ele sorriu e acenou com a cabeça. Levantou-se e seguiu a anfitriã para dentro da casa. O cardápio
CAPÍTULO 12 Galeano precisou de alguns segundos para ordenar os pensamentos. Sentia-se extremamente feliz pela noite anterior. Olhou para o lado e não encontrou a companheira. Haviam feito amor várias vezes. Ainda sentia o perfume de Melissa em sua pele. Ao longe ouvia o som do rádio. Sentiu-se péssimo por não ter conseguido acordar cedo e ajudar Melissa nos afazeres cotidianos. Tentou se vestir o mais rápido possível, porém, não encontrava as suas roupas em nenhum lugar do quarto. Encontrou uma toalha pendurada na cabeceira da cama. Enrolado na toalha se encaminhou para a cozinha, onde encontrou a anfitriã terminando de preparar o café da manhã. Pela janela aberta contemplou suas roupas penduradas no varal. — Não quis te acordar — Melissa falou sorrindo. — Desculpe pelas roupas. — Tudo bem. Se você não me fizesse esta caridade eu teria que ir até o povoado mudar o estoque da mochila — ele não conseguiu conter também o riso. —
CAPÍTULO 13 Devolveu a moto pagando pelos dias extras de uso e entrou no primeiro bar que encontrou. Colado ao balcão tomou várias cervejas. Já passava da meia noite quando Galeano saiu do bar. Antes de chegar à pensão foi atacado. Um indivíduo o imobilizou por trás prendendo seus pulsos às costas. Se estivesse sóbrio seria difícil escapar dos golpes e estando bêbado era praticamente impossível. Tomou dois golpes no estômago que o fizeram tombar no chão. Não conseguiu ver as fisionomias dos agressores e nem reconheceu o dono da única voz que falou. — Se não parar com a investigação, da próxima vez será pior. Tentou várias vezes se levantar, ação concretizada com a ajuda de Márcia, que havia chegado ao local após o ocorrido. — Você esta bem? — perguntou Márcia. — Estou — respondeu Galeano. Cambaleando mais pelo efeito do álcool do que pelos golpes recebidos, Galeano seguiu rumo à pensão em companhia de Má
CAPÍTULO 14 Deixara se envolver facilmente. Há tempos não sentia tais sensações. A solidão a fazia sofrer. A responsabilidade era muito pesada para as suas condições psicológicas. Melissa havia analisado naquela manhã que fizera a coisa certa ao se entregar a Galeano. Se fosse condenada, como achava que seria, nunca mais na vida encontraria ele novamente. Acordara naquele dia descontrolada emocionalmente. Há dois dias vivera um conto de fadas e agora, era obrigada a voltar para a dura realidade. Continuaria vivendo os últimos dias de liberdade cuidando do fardo que lhe cabia. Sua maior preocupação era com o sogro. Como ele iria viver depois de sua prisão? Planejava pedir à Justiça que o encaminhasse para um abrigo. A noite havia chegado rapidamente. Hora da visita ao sogro. — Os olhos do abismo engoliram meu filho — falou Severino. — De que o senhor esta falando? — quis saber Melissa. — Oxe menina, está esquecida? Manoe
CAPÍTULO 15 Ser capitão deste mundo, poder navegar em todos os mares e fronteiras, conhecer a realidade de cada povo. Os costumes de uma nação estão contidos naqueles que são eleitos para administrar o destino do povo — refletia Galeano enquanto analisava e organizava as provas que conseguira. Tudo se encaminhava para uma conclusão prévia daquele crime nebuloso. Naquela manhã não precisou da moto para viajar. O rumo que tomaria seria oposto ao local do crime. Havia dois dias que não via Márcia. Não sentia saudades, mas, era estranho o fato dela não o procurar. Deixou a preocupação de lado e saiu em disparada no veículo, entrando num território até então desconhecido. Se tudo corresse como o previsto, chegaria ao destino antes do almoço. Não poderia decepcionar quem estava a sua espera. *** Cinquenta quilômetros separava o povoado de Silvestre da cidade de Torrões, onde ficava situada a Diocese. Encantou-se com